REl - 0600934-13.2020.6.21.0163 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/02/2021 às 14:00

VOTO

Inicialmente, cabe examinar a tempestividade do recurso apresentado.

Com efeito, a douta Procuradoria Eleitoral suscitou a intempestividade do recurso, nos seguintes termos:

O prazo para interposição de recurso contra sentença proferida em representação sobre pesquisa eleitoral/enquete irregular, como é o caso dos autos, é de 24 horas, nos termos do art. 96, § 8.º, da Lei 9.504/971.

No caso, a interposição do recurso deu-se em 07.11.2020, ao passo que a intimação da sentença ocorreu em 05.11.2020, portanto fora do prazo legal.

Assim, o recurso é intempestivo, pelo que não merece ser conhecido

 

De fato, o prazo para a interposição de recurso contra sentença proferida em representação por pesquisa eleitoral irregular é de 24 horas, nos termos do art. 96, § 8º, da Lei n. 9.504/97, convertido em 1 (um) dia pelo art. 22, caput, da Resolução TSE n. 23.608/19.

Por sua vez, a partir de 26 de setembro de 2020, os prazos relativos a representações, reclamações e pedidos de direito de resposta passaram a ser contínuos e peremptórios, não se suspendendo aos sábados, domingos e feriados.

As intimações, nessas ações, serão realizadas pelo mural eletrônico, fixando-se o termo inicial do prazo na data de publicação (art. 12 da Resolução TSE n. 23.608/19).

No caso, a intimação da sentença foi publicada no mural eletrônico em 05.11.2020, às 17h08min (intimação n. 4072731). O recurso só foi interposto em 07.11.2020. Seria intempestivo, portanto.

Contudo, na intimação n. 4072731 do mural eletrônico, constou como prazo final à interposição do apelo a data de 08.11.2020, 23h59min.

Dessa forma, considerada essa circunstância, tenho por rejeitar a intempestividade suscitada, na medida em que o equívoco cartorário pode ter induzido o recorrente em erro.

Conheço do apelo.

No mérito, trata-se de representação por divulgação de pesquisa eleitoral sem registro, em relação ao cargo de vice-prefeito do Município de Rio Grande, na rede social Facebook, no perfil do recorrente, no dia 28.10.2020.

A sentença foi de procedência, o que reproduzo parcialmente:

No caso em tela, tem-se uma postagem, no perfil do representado LENON no Facebook, de dados do que seriam uma pesquisa eleitoral.

A imagem publicada tem como título "PESQUISA ESTIMULADA", mostrando fotos de cada um dos candidatos a prefeito e indicando percentuais referentes a cada um deles, além de "BRANCOS/NULOS" e "NÃO SABE/NÃO QUIS RESPONDER".

Abaixo das barras há a seguinte observação: FORAM OUVIDAS 2000 PESSOAS NO PERÍODO DE 11/10/2020 a 17/10/2020. E na linha seguinte: CRITÉRIO RESULTADO EM OPINIÃO PÚBLICA CNPJ 14938065/0001-37 PORTO ALEGRE/RS-BRASIL.

Assim, a postagem sim pretendeu caracterizar uma pesquisa eleitoral, indicando número de pessoas ouvidas, período (método) e entidade responsável pela aferição, mostrando-se, portanto, apta a influenciar os eleitores.

Ressalte-se que foi confirmado que o perfil usado para a divulgação é sim do representado e que a publicação foi feita pelo então coordenador de sua campanha.

Ainda que o equívoco tenha sido de tal pessoa, não calha a invocação de tratar-se de erro, mormente em estando expressa a vedação na legislação eleitoral.

Também é irrelevante se quem teria feito a divulgação, mediante uso consentido do perfil do representado na rede social, se mantém ou não como coordenador de campanha.

Cabível, então, a sanção prevista no dispositivo transcrito.

No entanto, conforme mencionado na representação e também na defesa, a postagem foi retirada em menos de um dia, indicando ter tido pouco poder influenciador, ainda que tenham ocorrido pouco mais de dez compartilhamentos.

Assim, entendo adequada a aplicação da multa no patamar mínimo de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais).

Ante o exposto, julgo PROCEDENTE a representação contra LENON MACHADO MARQUES para condená-lo ao pagamento de multa de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais).

É incontroverso que houve a publicação, no perfil do recorrente, da intenção de votos descrita na inicial, circunstância que constou na defesa apresentada sob ID 10524483.

A sanção por divulgação de pesquisa sem prévio registro sujeita os responsáveis (pela conduta de divulgação de pesquisa eleitoral irregular) à multa no valor de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais). Assim, a envergadura da multa impõe que a leitura do dispositivo ocorra em caráter restritivo e não extensivo.

Por certo que as pesquisas eleitorais possuem forte poder de influência sobre os eleitores, funcionando como termômetro das intenções de voto da população, especialmente pelo grau de idoneidade do complexo trabalho realizado pelas entidades de pesquisa de opinião pública.

Por conta dessa complexidade e do potencial de influência, a legislação eleitoral impõe às empresas de pesquisa o prévio registro da metodologia de trabalho, a fim de viabilizar o controle público e judicial das pesquisas, como se pode extrair do art. 33, caput, da Lei n. 9.504/97:

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

 I - quem contratou a pesquisa;

 II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

 III - metodologia e período de realização da pesquisa;

 IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro;

 V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

 VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

 VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal.

 

Igualmente, em razão da natureza técnica das pesquisas e de seu potencial de influência sobre o eleitor, o § 3º do referido artigo estabeleceu uma elevada penalidade pecuniária para o caso de divulgação de pesquisa sem prévio registro.

Ocorre que a hipótese dos autos se distancia das situações fáticas que a referida sanção busca coibir. A postagem impugnada não traz resultados de uma pesquisa eleitoral.

Explico.

O art. 10 da Resolução TSE n. 23.600/19 dispõe:

Art. 10. Na divulgação dos resultados de pesquisas, atuais ou não, serão obrigatoriamente informados:

I - o período de realização da coleta de dados;

II - a margem de erro;

III - o nível de confiança;

IV - o número de entrevistas;

V - o nome da entidade ou da empresa que a realizou e, se for o caso, de quem a contratou;

VI - o número de registro da pesquisa.

 

Na publicação impugnada, constaram, efetivamente, percentuais do que seria a intenção de votos (ID 10524083), mas foram lançados apenas como reforço das expressões inseridas anteriormente: “Para limpar a corrupção vem conosco povão. A campanha da humildade a campanha do tostão. Podemos não ter dinheiro nem tempo de televisão mas somos ficha limpa e a esperança de Renovação #22”. Não houve a informação de margem de erro, nível de confiança, número de registro da pesquisa, dados que poderiam caracterizar pesquisa eleitoral com capacidade de influenciar o eleitorado.

Além disso, como restou mencionado na sentença, a postagem foi retirada em menos de um dia, indicando ter tido pouco poder influenciador, ainda que tenham ocorrido pouco mais de dez compartilhamentos.

Igualmente, apesar de ser critério periférico, o recorrente não obteve êxito no pleito, o que vem a corroborar a ausência de impacto e influência em relação ao eleitorado.

Com essas considerações, tenho que a postagem se revestiu de mera manifestação de propaganda eleitoral, sem caracterizar o tipo previsto pela legislação eleitoral de divulgação de pesquisa sem registro.

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no mesmo sentido:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL COM AGRAVO. ELEIÇÕES 2016. PESQUISA ELEITORAL NÃO CARACTERIZADA. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que negou seguimento a agravo nos próprios autos que visava impugnar decisão de inadmissão de recurso especial eleitoral.

2. A jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que, para que seja caracterizada pesquisa eleitoral, é necessária a indicação, dentro do rigor técnico-científico que a define, de percentuais, margem de erro, índices ou intenções de votos e alusão ao instituto responsável pelo levantamento. Precedentes.

3. O acórdão regional concluiu que a divulgação de gráfico de linha, composto por dois eixos, um vertical e outro horizontal, mostrando a evolução do desempenho da campanha dos diversos candidatos, desacompanhado da indicação de percentuais ou números, não caracteriza a divulgação de pesquisa eleitoral sem registro, mas, sim, propaganda eleitoral. A modificação dessas conclusões exigiria o reexame do conjunto fático-probatório, o que é vedado nesta instância especial (Súmula nº 24/TSE).

4. Tendo em vista que a decisão recorrida está em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal Superior, não se conhece do recurso por dissídio jurisprudencial (Súmula nº 30/TSE).

Agravo interno a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(Relator Min. Luis Roberto Barroso, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 288-13. 2016.6.26.0144 CLASSE 6 UBATUBA SÃO PAULO, DJE 25.02.2019.) (Grifo nosso)

 

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PESQUISA ELEITORAL. DIVULGAÇÃO DE DADOS DO GOOGLE TRENDS NA REDE SOCIAL FACEBOOK. IMPOSSIBILIDADE. EQUIPARAÇÃO A PESQUISA ELEITORAL. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 33, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DESPROVIDO.

1. A norma contida no art. 33, § 3º, da Lei nº 9.504/97 desafia interpretação restritiva por encerrar hipótese de sanção, não sendo possível o seu alargamento para abranger situações que não foram expressamente previstas no dispositivo.

2. O recurso especial eleitoral interposto com o fim de reexaminar o conjunto fático-probatório dos autos não admite cabimento em razão da vedação contida na Súmula nº 24 do TSE. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(TSE - AI: 06030074720186060000 FORTALEZA - CE, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 07.5.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 111, Data 05.6.2020.) (Grifo nosso)

 

Dessarte, não havendo elementos mínimos para a caracterização da divulgação como verdadeira pesquisa eleitoral, deve ser reformada a sentença, de modo a julgar improcedente a representação, absolvendo o recorrente da imposição da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso.