REl - 0600687-60.2020.6.21.0089 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/02/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a AIJE proposta na origem sustenta que os recorridos divulgaram uma “coligação fictícia”, pois teriam se apresentado perante o eleitorado com uma união de forças distinta daquela que foi registrada na Justiça Eleitoral, inserindo falsamente em suas propagandas eleitorais os partidos PSB e PSDB, quando, em realidade, integravam a coligação apenas o PT e o MDB.

Assim, entendem os recorrentes que a conduta configuraria abuso de poder político e utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social em benefício da candidatura majoritária, provocando verdadeiro desequilíbrio no resultado do pleito eleitoral.

A douta Magistrada a quo, porém, entendeu pela ausência de elementos mínimos para o cabimento da ação, extinguindo o feito sem resolução de mérito por inépcia da inicial, com os seguintes fundamentos (ID 11946283):

No caso em apreço, das alegações narradas na petição inicial não se verifica a descrição de uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou de autoridade, tampouco a utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social.

Anoto que não há notícias nos autos de que os representados Eduardo Maahs Marasca e Delci Eliane Froeder sejam agentes públicos ou desempenham cargo eletivo, o que seria necessário para caracterizar eventual abuso do poder de autoridade.

Ainda, não houve exposição, na petição inicial, de utilização indevida dos meios de comunicação, na medida em que não mencionado qualquer espécie de desequilíbrio decorrente de preferência dada a um ou outro candidato. Não é a simples divulgação de campanha supostamente irregular que caracteriza o uso errôneo dos meios de comunicação.

A via processual eleita pelos representantes para questionar a conduta dos representados, portanto, não é adequada para o objetivo almejado.

Pelo exposto, indefiro a petição inicial, por carecer o autor de interesse processual, e julgo extinto o processo sem apreciação do mérito, com fulcro no art. 485, VI, do NCPC.

 

A bem-lançada sentença não merece reforma.

Com efeito, sob a ótica do caput do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, o abuso de poder representa um instituto de textura aberta, não sendo definido por condutas taxativas ou verbos predefinidos na lei. Trata-se, na dicção de José Jairo Gomes, “de conceito fluido, indeterminado, que, na realidade fenomênica, pode assumir contorno diversos” (Direito eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 655).

Uma ação somente pode ser considerada abusiva a partir da constatação do caso concreto e de suas circunstâncias, tendo por mote a finalidade da norma, qual seja, impedir que práticas e comportamentos destoantes do exercício regular e legítimo de posições públicas influenciem na normalidade e na legitimidade do pleito, bem jurídico tutelado pelo dispositivo, nos exatos termos do art. 14, § 9º, da CF/88.

Portanto, a caracterização do ato abusivo reclama a demonstração, por prova robusta e segura, da gravidade das circunstâncias, aptas a romper a normalidade e legitimidade da eleição.

É assim o preceito contido no art. 22, inc. XVI, da LC n. 64/90, consoante o qual, “para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam”.

No tocante à utilização indevida dos meios de comunicação social, ensina a doutrina de Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral. 5ª ed., Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016, p. 542) que “a utilização indevida dos meios de comunicação social ocorre sempre que um veículo de comunicação social (v.g., rádio, jornal, televisão) não observar a legislação de regência, causando benefício eleitoral a determinado candidato, partido ou coligação”.

Nesses autos, além de não haver sequer a delimitação do veículo de comunicação social para que se possa analisar a caracterização do seu uso indevido, não se verifica a necessária gravidade dos fatos a ensejar a caracterização de abuso.

Com efeito, a simples divulgação irregular ou errônea dos partidos componentes da coligação, ainda que possível de caracterizar propaganda eleitoral ilícita, não é suficiente para a configuração de abuso de poder político, econômico ou midiático, pois os fatos descritos na peça inicial não ostentam gravidade capaz de acarretar a quebra na normalidade e legitimidade das eleições que fundamenta a aplicação das penalidades insculpidas no art. 22, caput, da LC n. 64/90.

Dessa forma, na esteira do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, não imputados fatos que confiram substrato mínimo à alegação de prática de abuso do poder político ou a utilização indevida dos meios de comunicação social em benefício de candidato, deve ser integralmente confirmada a sentença que julgou inepta a petição inicial.

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.