REl - 0600049-80.2020.6.21.0039 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/02/2021 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

O apelo é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais, razão pela qual dele conheço.

Quanto ao mérito, entendo que a sentença não merece reforma.

O Juízo da 39ª Zona Eleitoral julgou extinta a presente AIJE, sem resolução de mérito, por extemporaneidade da propositura da ação e ilegitimidade ativa do representante.

Com razão o magistrado.

A respeito do termo inicial para a sua propositura, é pacífica na doutrina e na jurisprudência eleitorais a necessidade de haver ocorrido, pelo menos, a convenção partidária, ainda que seja possível veicular fatos abusivos praticados antes mesmo do registro ou das convenções.

Como observa o renomado autor José Jairo Gomes,

pode a AIJE ser intentada desde o início do processo eleitoral (que se dá com a realização das convenções) até a data da diplomação dos eleitos. Esse marco inicial não é aleatório. A ação em apreço tem sempre em mira determinado processo eleitoral, bem como fatos relacionados a candidatos ou pré-candidatos que nele disputarão mandato eletivo. Se procedente o pedido exordial, o resultado será a declaração do abuso de poder aliada à desconstituição do registro ou mandato e/ou decretação da inelegibilidade do candidato beneficiado com a prática malsã. Nesse quadro, inútil será o processo judicial iniciado antes da convenção se o representado não vier a ser escolhido – ou mesmo se nem disputar a indicação de seu nome.

Na mesma linha, veja-se a lição do Professor Távora Niess, especialista no tema, quando afirma que a AIJE somente poderá ser proposta a partir dos registros das candidaturas, porque somente naquele momento é possível cogitar dos efeitos dos atos no resultado do pleito.

Tal entendimento também encontra eco na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER ECONÔMICO E POLÍTICO. CONDUTA VEDADA. PROPAGANDA EXTEMPORÂNEA. AJUIZAMENTO. PRAZO. INÍCIO. REGISTRO DE CANDIDATURA. ANÁLISE. FATOS ANTERIORES AO REGISTRO. POSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA.

1. Recurso especial recebido como recurso ordinário, pois a decisão recorrida versa matéria passível de ensejar a perda do mandato eletivo.

2. O termo inicial para ajuizamento da AIJE é o registro de candidatura, não sendo cabível a sua propositura se não estiver em jogo a análise de eventual benefício contra quem já possui a condição de candidato, conforme interpretação do art. 22, inciso XIV, da LC nº 64/1990. No caso concreto, a AIJE foi ajuizada em março de 2014, bem antes do pedido de registro de candidatura. Entendimento que não impede o ajuizamento da referida ação após o registro de candidatura, mormente quando se sabe que a jurisprudência do TSE admite na AIJE o exame de fatos ocorridos antes do registro de candidatura, motivo pelo qual não há que se falar em violação ao art. 5º, inciso XXXV, da CF/1988. Tampouco impede que a parte interessada requeira a sustação cautelar daquele ato abusivo, como previsto, por exemplo, no art. 73, § 4º, da Lei nº 9.504/1997, segundo o qual "o descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR".

3. Agravo regimental desprovido.

(TSE, RO - Agravo Regimental em Recurso Ordinário n. 10520 – Belo Horizonte–MG, Acórdão de 15.12.2015, Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, publicado no DJE, em 23.02.2016.) (Grifei.)

No presente caso, tal como consignou o douto Procurador Regional em seu parecer,

a ação foi proposta em 28 de agosto de 2020 (ID 10621133), antes mesmo do termo inicial do período previsto para a realização das convenções, que é de 31 de agosto de 2020 a 16 de setembro de 2020, conforme o artigo 9º, III, da Resolução TSE nº 23.624/2020, sendo que convenção do Partido Trabalhista Brasileiro – PTB, para escolha dos candidatos e coligações nas eleições de 2020, ocorreu em 05 de setembro de 2020 (ID 10622133).

Portanto, devido à não observância do lapso temporal previsto, considero extemporânea a propositura da ação.

No que se refere à ilegitimidade ativa aventada, nos termos do art. 22 da LC n. 64/90, os legitimados para propositura da AIJE são partidos políticos, coligações, candidatos e o Ministério Público:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: (...) (Grifei.)

 

Por oportuno, convém evocar lição de José Jairo Gomes sobre o polo ativo da AIJE:

O polo ativo da relação processual pode ser ocupado por partido político, coligação, candidato, pré-candidato e Ministério Público. Por précandidato compreende-se quem foi escolhido em convenção, mas que ainda não teve o pedido de registro deferido pela Justiça Eleitoral. Confere-se legitimidade aos personagens do processo eleitoral, independentemente do proveito imediato que possam colher. Prevalece o interesse público na coibição de condutas que afetem a lisura do pleito. Assim, não se exige que autor-candidato tenha disputado a mesma eleição do réu, ou que nela tenha logrado êxito. (Grifei.)

Como se vê, a doutrina alarga um pouco o rol dos legitimados ativos da AIJE, conferindo ao pré-candidato a possibilidade de propô-la. Todavia, só detém essa condição quem já foi escolhido em convenção partidária e ainda não teve seu registro de candidatura deferido por esta Justiça Especializada. Ainda, conforme o autor, antes da convenção inexiste pré-candidato, havendo somente a “mera expectativa de ser candidato”.

Nos termos da jurisprudência eleitoral, esse rol é taxativo, não se estendendo àqueles que não detenham a condição ali descrita. Nesse sentido:

Representação. Investigação judicial. Desvio e uso indevido de poder político. Acolhimento. Preliminar. Ilegitimidade ativa. Extinção do processo. Arquivamento. São entes legítimos para propositura de ação de investigação judicial eleitoral apenas os elencados no art. 22 da Lei Complementar no 64/90.

(TSE, Acórdão na Representação n. 878 –São Paulo/SP, Relator: Ministro César Asfor Rocha, julgado em 06.6.2006.)

Soma-se a isso o fato de que o recorrente sequer foi escolhido pela agremiação para concorrer ao cargo de prefeito de Rosário do Sul e, portanto, nem mesmo poderia ser considerado pré-candidato.

Diante disso, cumpre reconhecer a carência da ação, por ilegitimidade ativa, tendo em vista que a parte não se enquadra nas hipóteses acima transcritas.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo íntegra a decisão de primeiro grau.

É como voto, Senhor Presidente.