REl - 0600510-95.2020.6.21.0057 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/02/2021 às 14:00

VOTO

Preliminarmente, não conheço do recurso interposto pela Coligação Uruguaiana Para Todos, assistente litisconsorcial, com fundamento no art. 76, § 2º, inc. I, do CPC, uma vez que a entidade não apresentou procuração válida ao advogado que subscreve o recurso do ID 12272433, visto que o instrumento de mandato juntado no ID 12452383 contém apenas poderes específicos para o causídico atuar em causa diversa, no processo n. 0600081-31.2020.6.21.0057, e que, após ser intimada, a coligação não regularizou a sua representação processual.

No mérito, os recorrentes postulam a condenação dos recorridos por abuso de poder econômico, político ou de autoridade e por prática de condutas vedadas aos agentes públicos, com fundamento nos seguintes dispositivos legais:

Constituição Federal

Art. 14 (...)

(...)

§ 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

 

Lei das Inelegibilidades

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: (Vide Lei nº 9.504, de 1997)

 

Lei das Eleições

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;

(...)

III - ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado;

(…)

VI - nos três meses que antecedem o pleito:

(...)

b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;

 

Conforme consta dos autos, a ação fundamenta-se na divulgação de dois vídeos na propaganda eleitoral dos recorridos e na alegação de que o material teria sido elaborado mediante o uso de serviços, servidores e bens públicos, em benefício da campanha eleitoral e sob a forma de publicidade institucional em período vedado.

Inicialmente, quanto à caracterização das propagandas como publicidade institucional, considerando-se que o material não foi divulgado pela municipalidade em seus canais de comunicação e diante da ausência de provas de que tenha sido custeado com recursos públicos, não se verifica hipótese de incidência de condutas vedadas a agentes públicos.

No tocante às demais infrações, importa ter-se presente que as condutas vedadas são espécie do gênero abuso de poder, e que o abuso de poder econômico e político ou de autoridade somente acarreta a procedência da ação de investigação judicial quando comprovada a gravidade das circunstâncias, capaz de afetar a normalidade e a legitimidade das eleições e ensejar a aplicação das sanções de inelegibilidade e cassação dos registros dos representados.

Quanto à prova dos fatos, a sentença bem pondera que a vedação ao uso de servidores e bens públicos em benefício da campanha não equivale à proibição do emprego da imagem de bens e locais públicos ou de servidores, já tendo o TSE decidido que “a mera utilização de imagem de bem público em propaganda eleitoral não configura conduta vedada, exceto na hipótese excepcional de imagem de acesso restrito ou de bem inacessível” (RO n. 060219665, Rel. Min. Edson Fachin, DJE 14.4.2020).

De igual modo, o TRE-RS já assentou que “o emprego de imagens de bens públicos em campanha eleitoral, desde que captadas de forma privada, não constitui ilícito” (RE n. 59, Rel. DES. SYLVIO BAPTISTA NETO, DEJERS 25.11.2008).

Quanto à questão da inacessibilidade dos locais retratados nas imagens, porque teriam sido colhidas no pátio interno de escola e de postos de saúde, de modo a ferir a igualdade do pleito, não se tem notícia de que a administração pública tenha negado o acesso de candidatos e partidos aos locais da filmagem em questão, ou proibido que servidores públicos gravassem entrevistas aos demais concorrentes à eleição majoritária de Uruguaiana.

Assim, não importa ao deslinde do feito se o pátio do posto de saúde em que ocorreu a gravação era interno ou externo. Somente seria malferida a isonomia caso outros candidatos fossem impedidos de utilizar as mesmas áreas para captação de imagens, circunstância que sequer restou alegada durante a tramitação.

Além disso, em judiciosos fundamentos, o julgador bem demonstrou, de forma suficientemente segura, que a maior parte das imagens divulgadas na propaganda impugnada retrata a fachada de prédios públicos e estava disponível na internet pela coletividade:

Com efeito, primeiramente, ressalto o que já fora observado quando do despacho liminar (exame da tutela provisória), que a maioria das imagens veiculadas são de fachadas de prédios públicos, postos de saúde e escolas, sendo patente, portanto, o caráter não restrito.

Os investigados esclareceram que as capturas foram obra sociedade empresária TG Mídia, sendo imagens de arquivo. De fato, mesmo constatando que algumas das imagens foram capturadas no interior de prédios públicos, observo que se tratam de imagens públicas de arquivo, oriundas da divulgação de atos de publicidade institucional, os quais, uma vez veiculadas, caíram no domínio público.

Para bem ilustrar a questão aponto as imagens retiradas do Instagram do candidato, tombadas no corpo da inicial, com os números 07, 08 e 09. Saliento que foi também com base nas referidas imagens que deferi a tutela provisória. Não obstante, após a instrução processual, foi possível constatar a natureza pública destas, uma rápida pesquisa no buscador Google pelo nome das unidades públicas ilustradas revela tal natureza.

As imagens 07 e 08 são do interior da EMEI Deise Clausell, também o é a imagem da fachada (imagem 06). A imagem 07, do interior da escola pode ser obtida do sítio do Jornal Correio do Povo e é oriunda da inauguração da escola vide: <https://www.correiodopovo.com.br/not%C3%ADcias/cidades/escola-de-educa%C3%A7%C3%A3o-infantil-denise-clausell-%C3%A9-inaugurada-em-uruguaiana-1.402551>.

A imagem 08 também é de inauguração da mesma escola e está disponível em sítio do Jornal Cidade, ilustrando a reportagem que cobriu a mencionada inauguração: <https://www.jornalcidade.net.br/not%C3%ADcias/educa%C3%A7%C3%A3o/prefeitura-inaugura-nova-escola-de-educa%C3%A7%C3%A3o-infantil-1.2206353>.

Por sua vez, a imagem 09, que ilustra o Centro de Fisioterapia, inclusive o interior do prédio, também é oriunda da divulgação da inauguração da unidade pública e pode ser facilmente obtida no sítio do Jornal Correio do Povo, em reportagem que noticiou a inauguração: <https://www.correiodopovo.com.br/not%C3%ADcias/cidades/centro-de-fisioterapia-de-uruguaiana-completa-um-ano-e-j%C3%A1-soma-10-mil-atendimentos-1.448249>.

No que concerne aos vídeos ilustrando a rotina escolar, cumpre reconhecer que eles, de fato, também são de arquivo e não foram produzidas durante a campanha eleitoral, uma vez que, como bem lembrado na contestação, as escolas não não funcionaram no período, sendo este um fato notório, conforme ilustra a seguinte reportagem:<https://gauchazh.clicrbs.com.br/educacao-e-emprego/noticia/2020/10/dois-municipios-nao-vao-retomar-aulas-presenciais-na-rede-estadual-no-cronograma-proposto-pelo-governo-do-rs-ckfzyxaze000l016v0rixvo6k.html>.

Por fim, também é possível perceber que as imagens que ilustraram a propaganda de televisão (eventos nº 37397027, 37397024 e 37394323) caracterizam-se por típicos vídeos retirados de arquivos de publicidade institucional, muitos deles encontrando-se até a presente data na pública página do Facebook da Prefeitura de Uruguaiana, conforme pode ser facilmente constatado no seguinte endereço: <https://pt-br.facebook.com/pg/prefeiturauruguaianaoficial/videos/?ref=page_internal>. Ressalte-se que as próprias imagens do candidato, retratado em diferentes períodos (notadamente com e sem barba), já demonstra que a propaganda de televisão foi uma compilação deste vídeos institucionais.

Com a devida vênia, a objeção dos investigantes e do Ministério Público quanto ao ponto não prospera. As ilações do Parquet, em sede de alegações finais, no sentido de que os candidatos, de forma premeditada, durante todo o mandato, produziram material para campanha eleitoral não tem qualquer respaldo no quadro probatório exposto nos autos. Não há de se confundir a publicidade institucional do Município com a campanha eleitoral, bem como há de se ter a compreensão que tal publicidade, uma vez divulgada, como in casu, pode, posteriormente, ser utilizada na campanha eleitoral, por quem quer que seja.

(...)

Não tendo sobrevindo qualquer prova de que as imagens utilizadas para ilustrar a campanha eram de acesso restrito, não há como se invocar a incidência da regra em comento.

Uma situação, contudo, ainda há de ser verificada neste tópico. Isto porque, embora a veiculação de imagem de bem público não configure, por si só, a violação da regra do art. 73, I da Lei das Eleições, é possível que o bem público tenha sido, indevidamente, cedido e/ou utilizado para a produção de tais imagens, o que pode, por conseguinte, dar ensejo a concretização da regra.

No caso, não houve a cedência de bens públicos, ao menos formalmente. É o que atesta o ofício juntado ao evento nº 38254722.

 

Quanto à alegação de a gravação dos servidores públicos que figuram nos vídeos ter sido feita em horário de expediente normal de trabalho, a sentença destaca que as entrevistas gravadas com profissionais da saúde foram objeto de prova, tanto de inspeção judicial quanto de prova oral, a partir do testemunho dos próprios entrevistados.

Restou demonstrado, por auto circunstanciado de inspeção, que as imagens foram gravadas “na área externa, mais precisamente no pátio, na frente do posto, dois dos locais nos quais foram gravadas entrevistas veiculadas na propaganda. As fotografias acostadas aos autos (evento n. 38776680 e n. 38776682) indicam esses locais”.

A decisão recorrida assenta que os documentos “deixam patente que não foi utilizada nem sequer a fachada do posto de saúde na propaganda”.

Quanto à prova oral, foram ouvidas duas testemunhas, Maria Batista de Santana e Vinícius Filipi Polessi, servidores públicos municipais que aparecem nos vídeos concedendo entrevistas, e nenhum deles confirmou a tese de que a gravação foi realizada durante o horário normal de trabalho.

A testemunha Maria Batista de Santana foi expressa ao dizer ter sido abordada pela equipe de filmagem quando já estava saindo do portão, indo embora, porque já eram onze e meia da manhã.

De igual maneira, Vinícius Filipi Polessi foi enfático ao afirmar que estava saindo do Posto de Saúde, para o horário do almoço, no momento em que foi abordado para a gravação, relatando: “Eu lembro bastante assim, eu tinha acabado de conversar com a enfermeira do posto, eu tava (sic) saindo, abri a porta, daí eu vi essas duas pessoas, que estavam com câmeras e aí elas me perguntaram isso daí”.

Conforme bem observado na sentença, o fato não caracteriza conduta vedada:

No caso posto, não restou evidenciado que o candidato, agente público, valeu-se de tal condição para utilizar do bem, com exclusividade, desequilibrando a disputa com os seus concorrentes. O que, isto sim, constatou-se foi um mal agir, uma descortesia, uma falta de educação da equipe de filmagem que abordou o entrevistado e, sem pedir autorização, adentrou no interior do posto, no horário do almoço, quando o servidor saia, e gravou a entrevista no pátio lateral, sem pedir autorização. A referida equipe, no entanto, não foi impedida pelo entrevistado ou por qualquer funcionário responsável, não utilizou o nome do candidato ou impôs uma ordem superior para praticar a ação. Não se identificou, portanto, que o investigado tenha se valido de sua condição de Prefeito para utilizar o espaço no qual a entrevista foi concedida. Alias, o depoimento da testemunha bem indica que o local foi escolhido de modo aleatório, circunstancialmente.

De fato, por mais que se entenda a importância da causa, a frustração dos investigantes pela não consagração de um projeto político, não há como se compreender que o ato concretizado tendeu a afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos no pleito.

Não há como vislumbrar qualquer benefício que o candidato agente público possa ter tido ou pretendido ter com a utilização do espaço físico no qual captadas as imagens, um pátio, praticamente um terreno baldio, conforme constatou este Magistrado, ilustrado na fotografia 39560980, mostrando uma árvore e um muro branco, mal conservado, um recinto o qual a testemunha ressaltou ser inutilizado, que ninguém frequenta.

(…)

Como se percebe, as entrevistas foram concedidas espontaneamente, não tendo sido os servidores obrigados a tanto, tampouco tendo os investigados se valido de sua condição de agentes públicos para impor a prática do ato. O ato ocorreu, durante o intervalo dos funcionários, ou seja, quando eles já não estavam mais trabalhando para a coletividade e detinham tempo livre.

Nesse sentido, cumpre esclarecer que o tempo de intervalo é de livre gozo do trabalhador, não sendo computado na duração da jornada de trabalho, o servidor não esta a disposição da Administração no referido período. Vide o que dispõe o art. 71, § 2º da CLT, o qual, no mínimo, pode ser aplicado, analogicamente, à espécie:

Art. 71 (...)

§ 2º - Os intervalos de descanso não serão computados na duração do trabalho.

De outra banda, observo que a circunstância de a equipe de publicidade não ter se identificado, adequadamente, não elucidando para os entrevistados para o que efetivamente as entrevistas seriam utilizadas, consoante restou evidenciado pela prova colhida, não se enquadra no tipo de conduta vedada em comento, podendo, isto sim, gerar a responsabilização civil de quem promoveu o ato, sendo os próprios entrevistados, cujas imagens foram, eventualmente, utilizadas de forma indevida, os legitimados para o pedido na seara própria.

Por fim, a alusão a circunstância de que uma servidora do Município - Daiany Mossi - teria conduzido o ato, além de não ser objeto do feito, não restou suficientemente provada. Como bem se depreende dos depoimentos, as testemunhas ouvidas não souberam precisar quem as teria entrevistado. De mais a mais, ainda que o fato possa ser verdadeiro, convém lembrar que as entrevistas ocorreram em horário de almoço.

Em assim sendo, o que o quadro probatório demonstra é que não houve violação da regra disposta no art. 73, II da Lei nº 9.504/1997.

 

Desse modo, a decisão não merece reparos, pois baseada na prova coligida durante a instrução, a qual não demonstra a ocorrência de condutas vedadas, e em remansosa jurisprudência, a qual cumpre reproduzir:

DIREITO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2014. CONDUTA VEDADA. ART. 73, I E III, DA LEI Nº 9.504/1997. BEM PÚBLICO. USO COMUM. CESSÃO OU USO. UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE – UBS. VISTORIA DAS DEPENDÊNCIAS. GRAVAÇÃO DE PROGRAMA ELEITORAL. PRESENÇA DA PRESIDENTE DA REPÚBLICA CANDIDATA À REELEIÇÃO. CAPTAÇÃO DE IMAGENS. REUNIÃO E ENTREVISTA COM MÉDICOS. CONDUTA VEDADA CONFIGURADA. SERVIDOR PÚBLICO. CESSÃO OU USO DE SERVIÇOS. CORPO CLÍNICO DA UBS. MERA APRESENTAÇÃO DO LOCAL A AUTORIDADES E ENTREVISTA SOBRE COTIDIANO DE TRABALHO. MINISTRO DA SAÚDE. INAPLICABILIDADE DO CONCEITO DE HORÁRIO DE EXPEDIENTE. CONDUTA VEDADA NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE IMPACTO E DE GRAVIDADE DO ILÍCITO RECONHECIDO. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO. MULTA. APLICAÇÃO A CANDIDATO BENEFICIADO. I – Hipótese 1. Representação, com pedido de liminar, ajuizada contra a Coligação Com a Força do Povo (PT/PMDB/PDT/PCdoB/PP/PR/PSD/PROS/PRB), Dilma Vana Rousseff, Michel Miguel Elias Temer Lulia, então Presidente e Vice–Presidente da República candidatos à reeleição em 2014; Ademar Arthur Chioro dos Reis, então Ministro da Saúde; César Tamashita, Juan Gusmelie e Hilda Suares, médicos; e Walter Freitas Júnior, servidor público municipal, por suposta prática de conduta vedada, com fundamento no art. 73, I e III, da Lei nº 9.504/1997. 2. Gravação de propaganda eleitoral nas dependências de Unidade Básica de Saúde, com presença da Presidente da República e do Ministro da Saúde, captação de imagens e concessão de entrevista, por médicos. II – Agravo interno 3. Decisão liminar de suspensão da veiculação da propaganda. Exclusão dos médicos e do servidor público municipal do polo passivo da ação. Interposição de agravo interno no qual sustentada a necessidade de manutenção de todos os representados no polo passivo. 4. Art. 29 da Res.–TSE nº 23.398/2013, aplicável às Eleições 2014. Irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias proferidas no curso das representações, cabendo à parte interessada o ônus de suscitar a matéria em alegações finais, a fim de que seja apreciada pelo colegiado por ocasião do julgamento. Procedimento não observado pela agravante, que interpôs recurso incabível. III – Mérito 5. Para fins eleitorais, entendem–se como bens públicos de uso comum os assim definidos pelo Código Civil e também aqueles aos quais a população em geral tem acesso. Escolas e bibliotecas públicas também já foram consideradas bens públicos de uso comum, desde que: (i) o local das filmagens seja de acesso livre a qualquer pessoa; (ii) o uso das dependências seja igualmente possibilitado aos demais candidatos (AgR–RO nº 1379–94/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 28.11.2016); (iii) a utilização do bem se restrinja à captação de imagens, verificada pela "ausência de interação direta entre os que são filmados e a câmera" e de encenação (RO nº 1960–83/AM, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 27.06.2017) e (iv) não haja interrupção da prestação do serviço ao público em virtude das filmagens. Precedentes. 6. Para que seja constatada a mera captação de imagens, é necessário que não haja a identificação expressa do estabelecimento público, servindo o local apenas como pano de fundo, a fim de ilustrar as propostas dos candidatos para as áreas relacionadas ao local das filmagens. 7. Art. 73, I, da Lei nº 9.504/1997. O conjunto probatório demonstra que a conduta dos representados extrapolou a mera captação de imagens, uma vez que: (i) medidas preparatórias para a visita foram adotadas ante a comunicação de que um representante do Ministério da Saúde realizaria uma visita técnica no local; (ii) a candidata circulou por áreas internas da UBS e realizou reunião em sala administrativa, espaços em relação aos quais não se pode presumir acesso do público em geral; (iii) as circunstâncias não permitem concluir que outros candidatos poderiam ter acesso idêntico. Assim, ficou configurado o uso de bem público em benefício da candidatura. 8. Art. 73, III, da Lei nº 9.504/1997. Não se caracterizou cessão de servidores públicos ou uso de seus serviços por comitê de campanha em horário de expediente normal, pois: (i) os médicos não praticaram ato de campanha ou disponibilizaram sua força de trabalho a comitê eleitoral, limitando–se a dialogar com as autoridades e conceder entrevista sobre seu cotidiano de trabalho, durante o que acreditavam ser uma visita técnica, o que constitui conduta atípica; (ii) Ministros de Estado, na qualidade de agentes políticos, "não se sujeitam a expediente fixo ou ao cumprimento de carga horária, posto que titulares de cargos estruturais à organização política do País" (Rp nº 145–62/DF, Rel. Min. Admar Gonzaga, j. em 07.08.2014), razão pela qual não viola o art. 73, III, da Lei das Eleições a sua "presença moderada, discreta ou acidental [...] em atos de campanha" (Rp nº 848–90/DF, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, j. em 04.09.2014). IV – Aplicação das sanções 9. Configurada a conduta vedada, a proporcionalidade e a razoabilidade devem nortear a aplicação das penalidades. No caso, a prática do ilícito previsto no art. 73, I, da Lei nº 9.504/1997: (i) não impactou significativamente no cotidiano de trabalho dos servidores públicos e de funcionamento da UBS; (ii) isoladamente, não possui gravidade no contexto de eleição presidencial, uma vez que redundou em cenas de pouco mais de um minuto na propaganda dos candidatos, não havendo nos autos indicativo de repercussão anormal da sua veiculação. Assim, é suficiente a aplicação da multa em seu patamar mínimo. 10. A multa deve ser aplicada individualmente a cada réu, uma vez que os §§ 4º e 8º do art. 73 da Lei nº 9.504/1997 preveem a condenação tanto do agente público responsável quanto dos partidos políticos, coligações e candidatos que se beneficiaram da conduta vedada, independentemente de autorização ou anuência para a prática do ato. 11. As circunstâncias fáticas autorizam a condenação de Arthur Chioro dos Reis como agente público responsável pela conduta vedada pelo art. 73, I, da Lei nº 9.504/1997. Isso porque: (i) a organização do evento ocorreu a partir do comunicado de que um representante do Ministério da Saúde visitaria o local, fator decisivo para que medidas excepcionais fossem adotadas para receber a suposta visita técnica oficial; (ii) a presença do então Ministro da Saúde durante os fatos corrobora essa narrativa; e (iii) não foram contrapostas versão ou provas ao relato da petição inicial e aos depoimentos. 12. São beneficiários da conduta, aos quais também se aplica a multa, nos termos do art. 73, §§ 4º e 8º, da Lei nº 9.504/1997: (i) Dilma Vana Rousseff, então Presidente da República, candidata à reeleição, que ademais participou da gravação da propaganda; (ii) Michel Miguel Elias Temer Lulia, então Vice–Presidente, candidato à reeleição; e a Coligação Com a Força do Povo, que se beneficiou da prática da conduta vedada, independentemente de sua participação ou anuência na prática ilícita. V – Conclusão 13. Agravo interno não conhecido. 14. Pedido julgado parcialmente procedente, para aplicar, a cada representado, multa de R$ 5.320,50.

(TSE, Representação n. 119878, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 26.8.2020.)

 

Recurso. Propaganda eleitoral. Eleições 2012. Representação julgada improcedente no juízo eleitoral "a quo" ao entendimento de que a propaganda eleitoral veiculada não apresenta irregularidade. Veiculação de propaganda eleitoral no horário gratuito na televisão, na programação do candidato à majoritária, em que teriam sido utilizadas imagens de bens públicos e a declaração de servidora municipal acerca do ensino público do município. O enfoque dado aos bens e serviços públicos é circunstância inerente ao discurso político dos candidatos, seja para fins de promoção da candidatura, seja como instrumento de críticas em desfavor de adversários da disputa eleitoral. Ademais, não há nos autos prova de que a servidora municipal tenha gravado as imagens em horário de expediente, o que poderia, em tese, configurar conduta vedada. Provimento negado.

(TRE, Recurso Eleitoral n. 10108, ACÓRDÃO de 05.10.2012, Relator DR. ARTUR DOS SANTOS E ALMEIDA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 05.10.2012.)

 

Por fim, a última questão a ser considerada, e que foi bastante discutida nas razões apresentadas pelo Ministério Público Eleitoral e pelo PSDB de Uruguaiana, é que, nos termos do § 3º do art. 304 do CPC, a tutela antecipada concedida durante o trâmite processual é eficaz até que decisão fundamentada a revogue ou modifique: “A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2º”.

Assim, por ser concedida com base na verossimilhança da alegação da parte, a antecipação de tutela precisa ser confirmada ou rejeitada pela sentença, decisão que exaure a cognição da causa por quem proferiu a decisão interlocutória.

Portanto, não há incoerência alguma entre a decisão que concede liminarmente a tutela antecipada e a sentença de improcedência proferida no feito, uma vez que são diversos os juízos cognitivos utilizados para o deferimento da medida liminar, baseado em percepção sumária e superficial, e o que fundamenta a sentença judicial, calcado em compreensão exauriente, definitiva e completa.

 

ANTE O EXPOSTO, preliminarmente, não conheço do recurso apresentado pela COLIGAÇÃO URUGUAIANA PARA TODOS (DEM/PSB) e, no mérito, VOTO pelo desprovimento dos recursos interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL e pelo PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB) DE URUGUAIANA/RS, nos termos da fundamentação.