REl - 0600533-91.2020.6.21.0008 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/01/2021 às 10:00

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Inicialmente, cabe registrar que o recorrido NERI MAZZOCHIN, em sede de memoriais, arguiu cerceamento de defesa, pois não foi intimado para contrarrazões, bem como referiu a existência de erro material no despacho que recebeu o recurso, pois nele constou como recorrente pessoa estranha à lide. Ultrapassando a matéria preliminar, nos próprios memoriais o recorrido apresentou suas contrarrazões, manifestando-se de forma pormenorizada e requerendo o desprovimento do recurso.

Com razão o recorrido.

De fato, verifica-se que, no despacho (ID 10032333), a magistrada da 8ª Zona Eleitoral deixou de intimar o recorrido para contrarrazões, bem como recebeu o recurso, equivocadamente, como tendo sido interposto por pessoa estranha ao feito.

Contudo, a fim de imprimir celeridade e economia ao presente processo, sem, com isso, trazer qualquer prejuízo à defesa do recorrido, tenho por receber como contrarrazões os argumentos trazidos pelo recorrido em seus memoriais.

Quanto ao erro material constante no despacho, entendo como desimportante para o deslinde do feito, haja vista que a recorrente COLIGAÇÃO GENTE QUE FAZ BENTO constou corretamente tanto na peça recursal (ID 10032233) quanto na autuação do recurso realizada neste Tribunal, sendo devidamente intimada de todos os atos relativos à demanda, inclusive quanto à inclusão do processo na pauta de julgamento.

Portanto, superadas essas questões preliminares, passo ao exame do mérito.

Quanto ao mérito, trata-se de representação por divulgação de pesquisa eleitoral fraudulenta e sem registro, veiculada no WhatsApp por NERI MAZZOCHIN, então candidato a vereador no Município de Bento Gonçalves.

A representação teve por base a mensagem a seguir transposta:


 

 

 

A sentença julgou procedente o pedido “para fins de, confirmando a liminar, determinar a suspensão da divulgação da pesquisa sem registro” e deixou, expressamente, de aplicar a multa.

Por consequência, a irresignação da recorrente é exclusivamente quanto à não aplicação da multa.

Pois bem.

Adianto que não vejo razões para alterar a sentença recorrida, pois a postagem sob análise não possui aptidão para atrair a imposição da penalidade prevista no §3º do art. 33 da Lei 9.504/97 (50 a 100 mil UFIR).

O fato é que a previsão supracitada sujeita os responsáveis (pela conduta de divulgação de pesquisa eleitoral irregular) à multa em valor entre R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) e R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais).

A envergadura de tal sancionamento impõe que a leitura do dispositivo ocorra em caráter restritivo, e não extensivo.

Por certo que as pesquisas eleitorais possuem forte poder de influência sobre os eleitores, funcionando como termômetro das intenções de voto da população, especialmente pelo grau de idoneidade do complexo trabalho realizado pelas entidades de pesquisa de opinião pública.

Por conta dessa complexidade e potencial de influência, a legislação eleitoral impõe às empresas de pesquisa o prévio registro da metodologia de trabalho, a fim de viabilizar um controle público e judicial das pesquisas, como se pode extrair do art. 33, caput, da Lei n. 9.504/97:

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

I - quem contratou a pesquisa;

II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

III - metodologia e período de realização da pesquisa;

IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro;

V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal.

 

Igualmente por conta da natureza técnica das pesquisas e de seu potencial de influência sobre o eleitor, o § 3º do referido artigo estabeleceu elevada penalidade pecuniária para o caso de divulgação de pesquisa sem prévio registro.

Ocorre que a hipótese dos autos se distancia das situações fáticas que a referida sanção busca coibir. A postagem impugnada evidentemente não traz características técnicas de uma verdadeira pesquisa eleitoral.

Conforme evidenciado nos prints acima colacionados, a postagem ocorreu em grupo fechado de WhatsApp denominado “Bar Santa Rita (jantas)”, e abaixo da tabela na qual constam os resultados da sondagem, há referência de que foi realizada “em uma indústria moveleira”.

Entretanto, a sanção por veiculação de pesquisa eleitoral sem registro pressupõe que a publicação tenha contornos de uma pesquisa eleitoral, com dados capazes de conferir seriedade à intenção de votos, o que evidentemente não se verifica no caso dos autos.

Ausentes esses elementos, tenho que a postagem se revestiu como mera manifestação eleitoral, sem caracterizar o tipo previsto pela legislação eleitoral de divulgação de pesquisa sem registro.

Nessa linha é a jurisprudência deste Regional:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. DIVULGAÇÃO DE PESQUISA ELEITORAL IRREGULAR. REDE SOCIAL. FACEBOOK. PROCEDÊNCIA PARA CONDENAR APENAS O AUTOR DA MENSAGEM. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS PARA CARACTERIZAR A POSTAGEM COMO PESQUISA. ART. 33 DA LEI N. 9.504/97. INAPLICABILIDADE DE MULTA. DESPROVIMENTO.

1. Inconformidade que visa à condenação e aplicação de multa a todos os representados, por divulgação de pesquisa irregular, visto que a sentença de primeiro grau foi procedente apenas com relação a um deles e improcedente quanto aos demais. Determinada na origem a exclusão da publicação. Não aplicada multa ao entendimento de que tal incidência dependeria do ajuizamento de ação penal específica.

2. Ato isolado do representado que realizou a publicação em seu perfil do Facebook, não havendo comprovação da participação das demais partes demandadas. Tratando de dispositivo que atribui penalidade ao infrator, é necessário que a participação no fato esteja cabalmente provada.

3. A análise da publicação é fundamental para a caracterização da pesquisa eleitoral, a qual deve cumprir os requisitos do art. 33 da Lei n. 9.504/97, e para a viabilidade de eventual aplicação da multa prevista no art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19. Sanção que não carece de ação penal específica, pois está prevista na lei, sendo a representação o meio processual adequado à obtenção da tutela pretendida.

4. Por conta da complexidade e potencial de influência das pesquisas eleitorais, a legislação impõe às empresas especializadas o prévio registro da metodologia de trabalho, a fim de viabilizar seu controle público e judicial. Entretanto, na hipótese, a postagem impugnada evidentemente não traz resultados de uma pesquisa eleitoral.

5. Não havendo elementos mínimos para que se caracterize a divulgação como verdadeira pesquisa eleitoral, incabível a imposição da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

6. Provimento negado.

(TRE-RS - Rel 0600083-84.2020.6.21.0172, Relator: Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Data de Julgamento: 21.5.2020.) (Grifo nosso)

 

E no mesmo sentido é a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL COM AGRAVO. ELEIÇÕES 2016. PESQUISA ELEITORAL NÃO CARACTERIZADA. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que negou seguimento a agravo nos próprios autos que visava impugnar decisão de inadmissão de recurso especial eleitoral.

2. A jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que, para que seja caracterizada pesquisa eleitoral, é necessária a indicação, dentro do rigor técnico-científico que a define, de percentuais, margem de erro, índices ou intenções de votos e alusão ao instituto responsável pelo levantamento. Precedentes.

3. O acórdão regional concluiu que a divulgação de gráfico de linha, composto por dois eixos, um vertical e outro horizontal, mostrando a evolução do desempenho da campanha dos diversos candidatos, desacompanhado da indicação de percentuais ou números, não caracteriza a divulgação de pesquisa eleitoral sem registro, mas, sim, propaganda eleitoral. A modificação dessas conclusões exigiria o reexame do conjunto fático-probatório, o que é vedado nesta instância especial (Súmula nº 24/TSE).

4. Tendo em vista que a decisão recorrida está em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal Superior, não se conhece do recurso por dissídio jurisprudencial (Súmula nº 30/TSE).

Agravo interno a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(Relator Min. Luis Roberto Barroso, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N.288-13.2016.6.26.0144 CLASSE 6 UBATUBA SÃO PAULO, DJE 25.02.2019.) (Grifo nosso)

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PESQUISA ELEITORAL. DIVULGAÇÃO DE DADOS DO GOOGLE TRENDS NA REDE SOCIAL FACEBOOK. IMPOSSIBILIDADE. EQUIPARAÇÃO A PESQUISA ELEITORAL. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 33, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DESPROVIDO.

1. A norma contida no art. 33, § 3º, da Lei nº 9.504/97 desafia interpretação restritiva por encerrar hipótese de sanção, não sendo possível o seu alargamento para abranger situações que não foram expressamente previstas no dispositivo.

2. O recurso especial eleitoral interposto com o fim de reexaminar o conjunto fático-probatório dos autos não admite cabimento em razão da vedação contida na Súmula nº 24 do TSE. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(TSE - AI: 06030074720186060000 FORTALEZA - CE, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 07.5.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 111, Data 05.6.2020.) (Grifo nosso)

 

Dessarte, não havendo elementos mínimos para caracterizar a divulgação como pretensa pesquisa eleitoral, incabível a imposição da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

ANTE O EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, mantendo íntegra a sentença prolatada.