REl - 0600109-20.2020.6.21.0050 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/01/2021 às 10:00

VOTO

Preliminar de nulidade parcial da sentença

Inicialmente, afasto a preliminar suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral no sentido da nulidade da sentença por falta de fixação de prazo de suspensão de quotas do Fundo Partidário.

Conforme se observa do exame dos autos, o órgão do Ministério Público Eleitoral com atribuição perante o juízo de origem foi intimado da sentença prolatada e manifestou ciência (fl. 100 do ID 6593283), tendo a agremiação partidária interposto recurso apenas visando à melhora de sua situação jurídica.

Dessa forma, considerando que o Parquet Eleitoral não promoveu a oposição de embargos de declaração contra a decisão na instância originária, para que a omissão quanto ao apenamento fosse examinada pelo juízo a quo, é inviável o agravamento das penalidades fixadas ao recorrente, por força da proibição de reformatio in pejus.

Idêntica questão foi recentemente analisada por esta Corte na sessão de 26.6.2020, nos autos do recurso eleitoral RE PC n. 0600003-22, da relatoria do Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, cuja ementa cumpre transcrever:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2018. DESAPROVAÇÃO. FONTE VEDADA. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APLICAÇÃO DE MULTA. PROVIMENTO NEGADO.

1. Suscitada a preliminar de nulidade parcial da sentença, em razão de não ter sido observada a sanção vigente no exercício sob exame, disciplinada no art. 36, incs. I e II, da Lei n. 9.096/95. Tratando-se de recurso interposto somente pelo prestador, não é possível agravar sua situação jurídica em grau recursal, sob pena de violação ao princípio da não reformatio in pejus.

2. Recebimento de recursos advindos de fontes vedadas. O art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95 não deixa dúvidas sobre a ilegalidade das citadas doações, que seriam consideradas lícitas apenas se oriundas de doadores filiados a partido político, o que não se verifica no caso. Matéria não impugnada pelo prestador, operando-se a coisa julgada.

3. Aporte de valores de origem não identificada (RONI), em ofensa ao art. 13, inc. I, da Resolução TSE n. 23.546/17. Não basta que o prestador realize a declaração com o valor, nome do doador e CPF para que a prestação das contas esteja adequada. Para que seja possível rastrear a origem dos recursos e comprovar a veracidade das afirmações, é necessário que constem nas contas bancárias os dados para conferência.

4. Provimento negado. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(RE PC n. 0600003-22.2019.6.21.0041, Rel. Des. Fed. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, PJe 24.6.2020.) (Grifei.)

 

No julgamento, após voto-vista apresentado pelo Vice-Presidente, Desembargador Arminio José Abreu Lima da Rosa, bem se verificou que a matéria se encontra pacificada no âmbito do TSE, pois a Corte Superior Eleitoral tem negado provimento aos recursos aviados pelo órgão ministerial tendentes a piorar a situação do prestador de contas quando esse foi o único recorrente.

Por oportuno, transcrevo o seguinte excerto das razões de decidir do voto-vista:

É bem verdade que o Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, ao julgar o RE n. 42229.2016.6.21.0128, interposto pela PRE/RS contra decisão deste Tribunal, acolheu a tese do recorrente e determinou o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, mesmo inexistindo insurgência do Ministério Público Eleitoral contra a sentença de primeiro grau, em decisão transitada em julgado em 05.9.2018. Ocorre que, na sessão de 05 de setembro de 2019, aquela Corte, aprofundando a discussão sobre o tema a partir de divergência inaugurada pelo próprio Ministro Tarcísio, consignou a impossibilidade de agravar a situação do recorrente, dada a natureza jurisdicional do processo de prestação de contas, conforme ementa que passo a transcrever:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. CANDIDATA. DESAPROVAÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. DETERMINAÇÃO DE OFÍCIO. AUSÊNCIA DE RECURSO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. TESE DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA NON REFORMATIO IN PEJUS. PROCEDÊNCIA. PROVIMENTO. 1. As contas da candidata relativas à sua campanha eleitoral de 2012 foram desaprovadas pelo juízo de primeiro grau. O TRE/SP, ao confirmar a sentença, determinou de ofício o recolhimento ao Erário dos valores de origem não identificada recebidos pela agravante. 2. Desde a inserção do § 6º ao art. 37 da Lei dos Partidos Políticos pela Lei nº 12.034/2009, o processo de prestação de contas passou a ostentar natureza jurisdicional, de modo que não há espaço para modificação que agrava a situação do recorrente no âmbito do seu próprio recurso. 3. Configura reformatio in pejus o agravamento da pena imposta quando não houve recurso da parte contrária sobre a matéria.

4. Agravo provido para dar provimento ao recurso especial e afastar a determinação de recolhimento de recurso ao Tesouro Nacional. (Agravo de Instrumento n. 74785, Acórdão, Relator(a) Min. Og Fernandes, Redator para o acórdão Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto; Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 216, Data: 08.11.2019, p. 93.) (Grifei.)

 

A partir de então, o TSE passou a negar, por unanimidade, provimento aos recursos da Procuradoria Regional Eleitoral, consoante se pode observar pelo teor da ementa relativa ao Recurso Especial Eleitoral nº 65793, publicada na última sexta-feira, 20.06.2020:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL NÃO IMPOSTO NA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE RECURSO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRECLUSÃO DA MATÉRIA. PRINCÍPIO DA NON REFORMATIO IN PEJUS. NEGATIVA DE PROVIMENTO. 1. Configura reformatio in pejus a determinação, de ofício, de recolhimento ao Tesouro Nacional de valores irregulares (art. 18, § 3º, da Res.-TSE 23.463/2015) na hipótese em que essa providência não foi imposta na sentença e não houve recurso no particular pelo Ministério Público. Precedente: AI 747-85/SP, redator para acórdão Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 8/11/2019. 2. Na espécie, inexistindo recurso contra a sentença na parte em que não impôs a devolução ao Tesouro Nacional, correto o entendimento do TRE/RS no particular. 3. Inviável conhecer da alegação acerca da eficácia executiva da sentença declaratória com esteio no art. 515, I, do CPC/2015, porquanto inaugurada apenas em sede de agravo interno, caracterizando indevida inovação recursal. Ademais, o tema não foi objeto de prequestionamento (Súmula 72/TSE). 4. Agravo interno a que se nega provimento. (Recurso Especial Eleitoral nº 65793, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data: 19.6.2020, p. 74-77.) (Grifei.)

Esse entendimento do TSE quanto à impossibilidade de agravar a situação do único recorrente resta sedimentado tanto em questões relativas a recolhimento de recursos ao Tesouro Nacional – que seria decorrência lógica da impossibilidade de utilização, por exemplo, de recursos de fonte vedada e de origem não identificada –, como no caso dos precedentes acima referidos, quanto em casos de suspensão de recursos do Fundo Partidário, que é uma sanção, propriamente dita. No processo ora em julgamento discute-se a possibilidade de fixação, de ofício, da suspensão de recursos do Fundo Partidário. Nessa toada, para ilustrar, transcrevo trecho de decisão monocrática da lavra do Ministro Luis Roberto Barroso, proferida em 17.04.20, nos autos do RESPE nº 060007860 (ALVORADA D'OESTE – RO):

No recurso especial, ainda foi requerida a aplicação da sanção prevista no art. 25 da Lei nº 9.504/1997, combinado com o art. 77, § 6º, da Res.–TSE nº 23.553/2017, a saber, a imposição da sanção de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário em razão da desaprovação das contas. Neste caso, contudo, isso não é possível, porque a sanção não fora imposta na sentença de primeiro grau que julgou as contas desaprovadas (ID 19491138) e contra a decisão somente foi interposto recurso pela agremiação. Assim, uma vez que o Ministério Público Eleitoral não impugnou a omissão perante aquele juízo, a imposição da sanção pelo Tribunal, como resultado do recurso especial, caracterizaria reformatio in pejus”. (Grifei.)

E em igual sentido, a decisão do Ministro Sérgio Banhos (RE N° 55524.2016.6.18.0009 – CLASSE 6 – FLORIANO – PIAUÍ), datada de 02.4.2020, da qual extraio o seguinte excerto: “(…) Diante disso, o recurso especial deve ser provido parcialmente, apenas para afastar a reformatio in pejus, configurada por meio da imposição da sanção de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário pelo período de um mês”. (Grifei.)

 

Portanto, o argumento apresentado pela Procuradoria Regional Eleitoral não infirma a conclusão no sentido da inviabilidade de agravar-se o apenamento aplicado à agremiação.

Com essas considerações, rejeito a matéria preliminar.

 

Mérito

Antes de analisar as razões de reforma da sentença, observo que, embora o partido afirme ter anexado ao apelo o histórico das faturas de energia elétrica do exercício de 2018, não se encontra nos autos a referida documentação, conforme se observa do ID 6593283.

De qualquer modo, considerando que durante a tramitação a grei foi intimada a juntar as contas de energia elétrica do ano de 2018 e manteve-se inerte, é manifesta a preclusão para o oferecimento da prova após sentenciado o feito, conforme dispõe a Resolução TSE n. 23.546/17, em seu art. 35, §§ 8º e 9º:

Art. 35. (...)

(...)

§ 8º Os órgãos partidários podem apresentar documentos hábeis para esclarecer questionamentos da Justiça Eleitoral ou para sanear irregularidades a qualquer tempo, enquanto não transitada em julgado a decisão que julgar a prestação de contas (Lei nº 9.096/1995, art. 37, § 11).

§ 9º O direito garantido no § 8º não se aplica na hipótese de não atendimento pelo órgão partidário das diligências determinadas pelo juiz ou relator no prazo assinalado, o que implica a preclusão para apresentação do esclarecimento ou do documento solicitado.

(Grifei.)

 

Em igual sentido, colaciono precedentes do Tribunal Superior Eleitoral acerca da inadmissibilidade de documentos juntados intempestivamente por desídia do interessado:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. AUSÊNCIA. INOVAÇÃO NA TESE RECURSAL. DESCABIMENTO.

1. Não há que se falar em omissão no acórdão embargado, pois a questão abordada nos aclaratórios alusiva à afronta aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório não foi objeto de discussão no recurso especial e, portanto, consiste em inadmissível inovação recursal.

2. O Tribunal analisou a questão no exato limite em que exposta no recurso, assentando a consonância do acórdão regional com a orientação dessa Corte no sentido de que, no processo de prestação de contas, ocorre preclusão para a juntada de documentos quando o partido político foi anteriormente intimado para sanar as falhas e não o fez tempestivamente, mesmo que isso ocorra ainda antes do julgamento.

3. É vedada a inovação de tese recursal em sede de embargos de declaração, ainda que se trate de matéria de ordem pública. Precedente: AgR-RCED 8015-38, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 13.5.2016.

4. Mesmo para fins de prequestionamento, os embargos somente são cabíveis quando houver no julgado algum dos vícios descritos no art. 275 do Código Eleitoral, o que não se averigua na espécie.

Embargos de declaração rejeitados.

(TSE, ED-AgR-Al n. 175-77.2016.6.09.0000/GO, Relator Min. Admar Gonzaga, julgado em 18.12.2018, publicado no DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 128, em 08.02.2019, pp. 130-131.) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CARGO. DEPUTADO ESTADUAL. JUNTADA. DOCUMENTOS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO. NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL QUE ACOLHEU O RECURSO INTEGRATIVO COM EFEITOS MODIFICATIVOS A FIM DE APROVAR COM RESSALVAS AS CONTAS DO AGRAVANTE. DETERMINAÇÃO DE RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA NOVO JULGAMENTO. FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA NÃO INFIRMADOS. DESPROVIMENTO. 1. A questão relativa à falta de prequestionamento das matérias insertas nos arts. 266 e 275 do Código Eleitoral e 397 do Código de Processo Civil/73 não pode ser apreciada no caso concreto, porquanto não foi arguida nas contrarrazões ao recurso especial e representa inovação de tese recursal, incabível em âmbito de agravo regimental. Precedentes. 2. Mostra-se inviável o agravo regimental que não traz argumentos aptos a infirmar a decisão agravada, a qual se fundamentou na pacífica jurisprudência desta Corte Superior, segundo a qual, no processo de prestação de contas, deixando a parte de sanar as irregularidades apontadas pela Justiça Eleitoral no prazo concedido para tanto, não é admissível a juntada posterior de documentos. 3. “Diante da natureza jurisdicional do processo de prestação de contas, não praticado o ato no momento processual próprio, ocorre a preclusão, em respeito à segurança das relações jurídicas” (AgR-REspe n.º 258-02/RS, rel. designado Min. DIAS TOFFOLI, DJE de 10.11.2015). 4. Agravo regimental desprovido.

(TSE – RESPE 166871, Relatora Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, julgado em 09.8.2016, publicado no DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 164, de 25.8.2016, pp. 35-36.) (Grifei.)

 

Portanto, ainda que as faturas de energia elétrica alegadamente juntadas ao recurso estivessem efetivamente presentes nos autos, os documentos não poderiam ser conhecidos por força da preclusão.

No tocante às irregularidades, foram constatadas quatro falhas nas contas apresentadas pela agremiação: doações, no valor de R$ 4.716,32, que não transitaram por conta bancária, mediante identificação dos doadores por CPF, caracterizando recursos de origem não identificada; ausência de juntada de comprovante de remessa da escrituração digital à Receita Federal; divergência nos valores declarados nos relatórios apresentados; e ausência de comprovação dos pagamentos de energia elétrica a partir de setembro de 2018.

Quanto à falha referente ao recebimento de recursos de origem não identificada, a unidade técnica observou a ausência de trânsito por conta bancária do valor de R$ 4.716,32.

O recorrente, por sua vez, alegou que foram juntados recibos, identificando o valor, o nome e o CPF dos doadores, e que, por isso, a ausência de trânsito dos valores por conta bancária não pode prejudicar a aprovação das contas. Além disso, sustentou que houve a demonstração da movimentação dos valores de pequena monta por meio de caixa.

Não assiste razão ao recorrente.

Como bem asseverado pelo órgão ministerial, o permissivo para que os valores considerados de pequena monta transitem por fora do sistema bancário refere-se exclusivamente às despesas de pequeno vulto do partido, e não às suas receitas. Tanto é assim que o art. 19 da Resolução TSE n. 23.546/17 dispõe que as reservas em dinheiro que constituem o “Fundo de Caixa” devem transitar previamente por conta bancária:

Art. 19. Para efetuar pagamento de gastos de pequeno vulto, o órgão partidário, de qualquer esfera, pode constituir reserva em dinheiro (Fundo de Caixa) que observe o saldo máximo de R$5.000,00 (cinco mil reais), desde que os recursos destinados à respectiva reserva transitem previamente por conta bancária específica do partido e, no ano, não ultrapasse 2% (dois por cento) dos gastos lançados no exercício anterior.(...) (Grifei.)

 

Nesse sentido, os valores financeiros doados ao partido devem obrigatoriamente ingressar por meio das suas contas bancárias, como dispõe o art. 4º, inc. II, da Resolução TSE n. 23.546/17 e o § 3º do art. 39 da Lei n. 9.096/95:

Art. 4º Os partidos políticos, em todos os níveis de direção, devem:

II – proceder à movimentação financeira exclusivamente em contas bancárias distintas, observada a segregação de recursos conforme a natureza da receita, nos termos do art. 6º; (grifei)

 

Art. 39. (...)

§ 3º As doações de recursos financeiros somente poderão ser efetuadas na conta do partido político por meio de: (Redação dada pela Lei n. 13.165, de 2015)

I – cheques cruzados e nominais ou transferência eletrônica de depósitos; (Incluído pela Lei n. 13.165, de 2015)

II – depósitos em espécie devidamente identificados; (Incluído pela Lei n. 13.165, de 2015)

III – mecanismo disponível em sítio do partido na internet que permita o uso de cartão de crédito, cartão de débito, emissão on-line de boleto bancário ou, ainda, convênios de débitos em conta, no formato único e no formato recorrente, e outras modalidades, e que atenda aos seguintes requisitos: (Redação dada pela Lei n. 13.877, de 2019)

a) identificação do doador; (Incluído pela Lei n. 13.165, de 2015)

b) emissão obrigatória de recibo eleitoral para cada doação realizada. (Incluído pela Lei n. 13.165, de 2015.) (Grifei.)

 

Dessa forma, ao manter arrecadação sem a abertura de conta bancária, o partido incorreu em grave irregularidade, que compromete de forma insanável a transparência e a confiabilidade das contas.

Ainda, cumpre salientar que a mera juntada de recibos de doação não é suficiente para a comprovação dos recursos. Isso porque os documentos juntados, além de não seguirem o disposto no § 1º do art. 11 da resolução de regência (não contêm numeração em ordem sequencial e não foram emitidos na página do TSE na internet), possuem um caráter meramente declaratório, dependendo de outros elementos para atestar a sua veracidade com segurança.

Destarte, os valores arrecadados que não transitaram pela conta bancária são considerados recursos de origem não identificada. Este é o posicionamento desta Corte:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2018. DESAPROVAÇÃO. FONTE VEDADA. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APLICAÇÃO DE MULTA. PROVIMENTO NEGADO. (...) 3. Aporte de valores de origem não identificada (RONI), em ofensa ao art. 13, inc. I, da Resolução TSE n. 23.546/17. Não basta que o prestador realize a declaração com o valor, nome do doador e CPF para que a prestação das contas esteja adequada. Para que seja possível rastrear a origem dos recursos e comprovar a veracidade das afirmações, é necessário que constem nas contas bancárias os dados para conferência. 4. Manutenção da sentença. Provimento negado. (Recurso Eleitoral n. 060000322, ACÓRDÃO de 22.6.2020, Relator DES. FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Publicação: PJE – Processo Judicial Eletrônico-PJE.)

 

Considerando ser vedada aos partidos a utilização de recursos de origem não identificada (art. 13 da Resolução TSE n. 23.546/17), os valores arrecadados a esse título devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, por expressa previsão contida no art. 14 da Resolução TSE n. 23.546/17:

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º, sendo vedada a devolução ao doador originário.

 

Além disso, embora a irregularidade de recebimento de valores de origem não identificada seja causa suficiente para a desaprovação das contas, nos termos do § 3º do art. 14 da Resolução TSE n. 23.546/17, cumpre observar as demais irregularidades apontadas pela unidade técnica que também não foram sanadas pelo recorrente. A agremiação, em todas as suas manifestações, limitou-se a alegar que tais falhas não teriam o condão de acarretar a desaprovação das contas.

De acordo com o art. 29, inc. I, c/c a al. “b”, inc. III, do art. 46 da Resolução TSE n. 23.546/17, o comprovante de remessa da escrituração digital à Receita Federal constitui documento obrigatório, e a ausência de sua juntada ao processo é causa suficiente para desaprovação das contas.

De igual sorte, a falta de transparência para a comprovação dos gastos com energia elétrica e a apresentação de relatórios que apontam valores de receita e despesa divergentes constituem inconsistências que reforçam a ausência de idoneidade nas contas.

Por fim, verifico que as irregularidades totalizam R$ 4.716,32, quantia que representa 98,74% da arrecadação de todo o exercício financeiro de 2018 do partido, a qual alcançou R$ 4.776,32.

Dessa forma, mostra-se adequada, razoável e proporcional a conclusão da decisão recorrida ao desaprovar as contas, diante do grave impacto das irregularidades sobre a movimentação financeira do partido.

Além disso, nos termos do art. 14, caput, da Resolução TSE n. 23.546/17, norma que reflete a aplicação do princípio da vedação ao enriquecimento ilícito, a quantia de R$ 4.716,32 deve ser recolhida ao Tesouro Nacional.

Por fim, não comporta provimento o pedido de redução da multa aplicada na sentença, fixada em 10% sobre esse valor pelo juízo a quo, totalizando R$ 471,63, pois o percentual já está bastante reduzido e sequer atende aos critérios da proporcionalidade e da razoabilidade, uma vez que se apresenta diminuto frente à extensão do impacto das irregularidades sobre as contas, no patamar de 98,74%.

Desse modo, o total a ser recolhido pelo recorrente deve ser mantido em R$ 5.187,95 (R$ 4.716,32 + R$ 471,63).

Ante o exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a desaprovação das contas e o recolhimento do valor de R$ 4.716,32 ao Tesouro Nacional, acrescido de multa de 10%, à razão de R$ 471,63, totalizando o montante de R$ 5.187,95, nos termos da fundamentação.