REl - 0600505-83.2020.6.21.0086 - Voto Relator(a) - Sessão: 26/01/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Quanto ao mérito, assevera o combativo embargante que “parece que não estamos falando do mesmo vídeo”, ao contestar a conclusão do acórdão embargado no sentido de inexistência da irregularidade constante no art. 77 da Lei n. 9.504/97.

Aduz que “beira ao absurdo, nos tempos atuais (…) venham a se exigir pecuinhas que se utilizavam à época das cavernas”, pois, ainda conforme as razões de embargos, “não existe fato mais claro, incontroverso, iniludível de inauguração virtual de obra pública”.

Requer, ao final, que, “devido a pandemia da COVID 19” haja uma “reinterpretação do conceito de cerimônia de inauguração”.

Em resumo: o embargante desejava que este Tribunal entendesse que os vídeos, objeto da prova dos autos, configuram inauguração de obra pública para fins do art. 77 da Lei n. 9.504/97.

Contudo, foi proferida decisão em sentido contrário aos interesses do embargante, fundamentada nos seguintes termos:

1. Não há nos autos prova de que, para a realização do vídeo, tenha sido praticado ato administrativo. Em uma inauguração de obra pública, a estrutura (palanque, sistema de som, mão de obra de preparação do evento) são públicos, atos administrativos, pois se trata de uma cerimônia oficial. Repito: o vídeo não retrata tais circunstâncias, pois, ao contrário, a filmagem ocorre de maneira totalmente informal, com a participação deste ou daquele cidadão que concordou em falar sobre a obra de distribuição de água, e sempre sob o viés de demonstrar, aos eleitores, a competência da candidatura que pretende reeleição.

2. Não houve veiculação do vídeo em páginas web públicas ou oficiais. O vídeo não consta, por exemplo, na página do Facebook da Prefeitura de Tiradentes do Sul, mas sim e apenas na página do Facebook da candidatura dos recorrentes, comparável esta a um comitê de campanha. Ora, nenhum cidadão de Tiradentes do Sul foi exposto ao vídeo da candidatura ao acessar serviço na página da internet da administração municipal, por exemplo. Traçando tal paralelo com uma inauguração presencial de obra pública, os cidadãos lá se encontram para presenciar a novidade da gestão, e não para receberem pedidos de votos – essa a teleologia da norma – evitar a confusão entre gestão e candidaturas. No vídeo, não há a prática irregular.

3. Ademais, a legislação que reprime as condutas vedadas assim procede porque visa proteger a isonomia entre os candidatos concorrentes desta espécie de abuso de poder. Nessa linha, não se vislumbra desequilíbrio na situação posta, notadamente porque, a qualquer momento, poderiam os concorrentes terem se dirigido às mesmas localidades e também elaborarem vídeo criticando algum aspecto da obra, por exemplo, tendo à mão idênticas circunstâncias de propagação de conteúdo.

4. O que se pretende demonstrar, aqui, é o nítido caráter de propaganda eleitoral do caso posto, de enaltecimento dos feitos de gestão, aliás absolutamente típico dos candidatos à reeleição, ou concorrentes lançados pela situação, sem o cometimento de irregularidade. Tenho dificuldades em entender, dessarte, como inauguração de obra pública, a divulgação de um vídeo gravado (não se tratou de uma live, portanto), sem qualquer anúncio precedente, sem a participação dos candidatos enquanto agentes públicos – ao contrário, os recorrentes fazem questão de se apresentarem como candidatos.

5. Finalmente, gizo que a peça não se utiliza de símbolos ou emblemas de Governo e, da mesma forma, não se vislumbra na postagem uso indevido ou influência do poder econômico ou político capaz de afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos, posto que os elementos da peça são de produção ordinária em campanha eleitoral, sem expressão econômica relevante, e a divulgação, em sítio próprio de campanha, é acessível a qualquer candidato. Qualquer alegação sobre o alcance da postagem, aqui, se mostra de inviável aceitação portanto, pois se tratou de ato de propaganda eleitoral. Inauguração virtual teria havido se algum elemento governamental estivesse presente, item que não se nota da prova dos autos.

Ou seja, tenho que a situação consubstancia simples divulgação de informações sobre a obra pública desenvolvida pelo candidato, pondo-se ao escrutínio da população para a continuidade de sua gestão, e divulgada em próprio espaço de propaganda, razão pela qual é inviável caracterizá-la como ato irregular.

 

Nítido está, dessarte, que o caminho do embargante há de ser o recurso à instância superior, pois na realidade a insurgência se dá no relativo ao mérito do julgamento, e não por quaisquer dos vícios ensejadores de oposição.

Deseja, em suma, que o Tribunal reconheça como irregularidade uma conduta que a Corte entendeu como regular. A opção da “reinterpretação” do conceito de inauguração de obra pública, aceitando-se uma modalidade virtual devido à pandemia causada pela COVID-19, não foi tese admitida no julgamento – ao menos não diante das circunstâncias da prova dos autos.

Inviável a revisão do mérito da causa em sede de embargos de declaração.

E mesmo o pedido de prequestionamento expresso mostra-se despiciendo, pois, conforme o art. 1025 do CPC, “consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”.

 

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.