PC - 0600004-78.2020.6.21.0103 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/01/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado e tempestivo, de forma que está a merecer conhecimento.

Da preliminar – omissão ou ausência de fundamentação

A grei sustenta não ter sido enfrentado pela decisão quesito acerca da incidência do § 1º do art. 42 da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19, que torna dispensável a abertura de conta bancária em caso de ausência de movimentação financeira, não obstante seu preceito deva ser aplicado aos processos em andamento, por força do art. 3º do novo diploma.

Ainda, o recorrente alega ter arguido omissão no tocante à retroatividade de norma eleitoral, pois a tese teria sido enfrentada tendo como parâmetro a Lei n. 13.165/15, enquanto o fundamento invocado seria a Lei n. 13.831/19, mais especificamente o seu o art. 3º.

Contudo, as alegações não prosperam.

Nota-se que constou na sentença o entendimento de que as alterações trazidas pela Lei n. 13.831/19, sobretudo a prevista no § 4º do art. 32 da Lei n. 9.096/95, são inaplicáveis às contas referentes ao exercício do ano de 2013, verbis:

Em sua defesa, o partido sustenta que se aplica, no presente caso, do artigo 32, §4º, da Lei 9.096/1995, alterado pela Lei 13.831/2019, nos seguintes termos: “Com a entrada em vigor da Lei 13.831/2019, que alterou dispositivos da Lei 9.096/1995, a obrigação de abertura de conta bancária para órgãos partidários municipais que não ostentem movimentação financeira passou à [sic] constituir faculdade” (fls. 79). Alega, ainda, que as inovações legislativas devem ser aplicadas aos processos de prestação de contas em trâmite, colacionando julgado do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de São Paulo, pleiteando, assim, a aprovação das contas. Entretanto, a argumentação trazida pelo partido deve ser afastada. Tratando-se do exercício financeiro de 2013, devem ser aplicadas às disposições processuais da Resolução TSE n. 23.546/2017 e, no mérito, as regras da Resolução TSE n. 21.841/2004. Desta feita, ainda que a agremiação não tenha movimentação financeira no exercício em questão, resta a possibilidade de estipulação de valores estimáveis em dinheiro, conforme artigo 13, parágrafo único, da Resolução TSE n. 21.841/04. Além disso, entendo que as alterações trazidas pela Lei 13.831/2019 são inaplicáveis ao caso em análise, forte nos princípios da anualidade eleitoral, da isonomia e do tempus regit actum, não se aventando a possibilidade de apresentação da declaração de ausência de movimentação de recursos, hipótese prevista apenas no artigo 45 da Resolução TSE n. 23.464/2015. As exigências atinentes à apresentação da documentação pelos partidos são imprescindíveis para viabilizar o exame da movimentação financeira de valores, ou sua ausência. Neste caso, a abertura de conta, com a apresentação dos extratos bancários respectivos, era obrigação imposta a todas as agremiações partidárias vigentes no exercício 2013. O descumprimento deste dever resulta na impossibilidade de ser aferida a veracidade das informações prestadas.

Ora, resta cristalino que o juízo a quo enfrentou a tese do recorrente, em especial ao consignar que “as alterações trazidas pela Lei 13.831/19 são inaplicáveis ao caso em análise, forte nos princípios da anualidade eleitoral, da isonomia e do tempus regit actum”.

À vista disso, não verifico a existência de omissão no julgado ou ausência de fundamentação na decisão recorrida. A sentença descreveu a tese do embargante e afastou os argumentos com base em princípios jurídicos, havendo coerência e adequação na elaboração das razões de decidir.

Assim, afasto a preliminar.

Do mérito

A título de esclarecimento inicial, anoto que as contas do exercício de 2013 do PSDB de TUPANCI DO SUL foram julgadas não prestadas nos autos da ação n. 43-37.2014.6.21.0103, com decisão transitada em julgado em 08.7.2014, conforme certidão de ID 5958183, p. 32.

Logo, no presente pedido de regularização não caberá exame de fundo da causa, mas somente a fixação de recolhimento de valores – ou a verificação do cumprimento de anterior determinação, bem como o afastamento da sanção de proibição de recebimento de recursos oriundos do Fundo Partidário, acaso cumpridos os requisitos legais.

No caso, a decisão recorrida recebeu o requerimento apresentado pelo PSDB de Tupanci do Sul/RS, desaprovou as contas e declarou regularizada a situação de inadimplência, determinando a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 01 (um) ano, e fundamentou, litteris:

“Desta feita, a “a ausência de abertura de conta bancária e da apresentação dos extratos bancários respectivos, documentos essenciais, representa irregularidade que afeta a prestação de contas, constituindo falha grave que compromete, de forma substancial” a confiabilidade e transparência da prestação de contas [...]."

De fato, a ausência de abertura de conta bancária impede a verificação contábil da agremiação, como vinha entendendo esta Corte antes da edição da Lei n. 13.831/19, diploma que passou a desobrigar a manutenção de conta bancária pelos partidos, acaso inexistente movimentação financeira.

Embora tal diploma estabeleça, art. 3º, que as disposições terão eficácia imediata nos processos de prestação de contas em andamento (ainda que julgados e não transitados em julgado), os seus efeitos não podem alcançar processos como o que aqui se examina.

Explico: a presente demanda trata de regularização de situação de inadimplência e, assim sendo, devem imperar os princípios da isonomia e da segurança jurídica e ser observadas as normas vigentes ao tempo do ano de 2013.

Tal parâmetro tem relevância destacada nas prestações de contas partidárias, tanto que as sucessivas regulamentações da espécie (Resolução TSE n. 23.604/19, Exercício 2020; Resolução TSE n. 23.546/17, Exercícios 2018 e 2019; Resolução TSE n. 23.464/15, Exercícios 2016 e 2017, e Resolução TSE n. 23.432/14, que regulamenta o Exercício 2015) contêm disposições transitórias para o fim de estabelecer que suas regras não atingem o mérito dos processos de prestação de contas relativos aos exercícios anteriores ao da sua vigência.

E o sistema faz, assim, com que os partidos, independentemente do momento em que apresentem as contas, sejam submetidos às mesmas regras sobre permissões e vedações de natureza material e sobre a elaboração e manutenção de sua escritura contábil ou, em outras palavras, a agremiação que prestou as contas do exercício de 2013 intempestivamente, em 2019 (caso dos autos), há de ser submetida ao mesmo regulamento daquela que apresentou em 2014, forma tempestiva.

Assim, inicialmente, surge como inviável a aplicação retroativa do § 1º do art. 42 da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831, de 2019.

De todo modo, antecipo que entendo desproporcional e irrazoável, no caso dos autos, a imposição de novo período de suspensão do recebimento de recursos públicos, devido a uma série de fatos e fundamentos. Senão, vejamos.

Em primeiro lugar, note-se não haver registro de ato de arrecadação ou realização de despesa do PSDB de Tupanci do Sul no exercício de 2013, ano não eleitoral, o que soa ainda mais verossímil quando constatado que o diretório está instalado em pequeno município, que conta atualmente com cerca de 1.700 habitantes. Ademais, como já asseverado, há determinação de suspensão do recebimento de recursos do Fundo Partidário desde 2014, por ocasião do julgamento da PC n. 43-37.2014.6.21.0103 (art. 28, inc. III, da Resolução TSE n. 21.841/04).

Somem-se a tais dados fáticos as circunstâncias de que (1) não pode haver nova análise de mérito da prestação de contas, no pedido de regularização; (2) não foi verificado, pelo órgão técnico, percebimento de recursos de fonte vedada, origem não identificada ou oriundos do Fundo Partidário.

Não há motivo para nova reprimenda. 

Nessa linha, cito precedente do TRE/MT, no sentido de dispensar novo período de restrição ao recebimento de verbas públicas, in verbis:

PEDIDO DE REGULARIZAÇÃO DE CONTAS ANUAIS NÃO PRESTADAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO REGIONAL. EXERCÍCIO DE 2011. ARTIGO 59 DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.546/2017. PRESTAÇÃO DE CONTAS ZERADAS. DECLARAÇÃO DE AUSÊNCIA DE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. AUSÊNCIA DE EXTRATOS BANCÁRIOS, LIVROS CONTÁBEIS E DE REGISTRO DE DESPESAS COM MANUTENÇÃO DO PARTIDO. DIRETÓRIO EM FUNCIONAMENTO DURANTE O EXERCÍCIO DE 2014. IMPOSSIBILIDADE DE AFERIR A REAL MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA DO PARTIDO. TEMPUS REGIT ACTUM. PEDIDO DE REGULARIZAÇÃO DEFERIDO.

1. A apresentação das contas enseja o levantamento da situação de inadimplência pela não prestação.

2. A ausência total de registros, mesmo daqueles somente estimáveis em dinheiro, por meio de contas zeradas não condizem com a realidade, o que retira a confiabilidade das informações prestadas e impossibilita o seu controle por parte do Poder Judiciário Eleitoral. Precedentes.

4. O indeferimento da regularização das contas e a manutenção da condição das contas como não prestadas, seria medida que assumiria caráter permanente e desarrazoado quando apresentadas à Justiça Eleitoral.

5. A coisa julgada na regularização tem o caráter rebus sic stantibus, ou seja, admite-se a sua modificação uma vez que se alterem as circunstâncias que renderam ensejo à decisão judicial.

6. A norma possibilita a regularização e deve, também, atentar para fatos nos quais não há qualquer numerário público envolvido, recebimento de fontes vedadas ou de origem não identificada.

7. Sendo possível a regularização nos casos mais graves, deve-se admitir a mesma solução para os casos menos graves, nos quais não há recursos públicos envolvidos ou recebimentos de fontes vedadas ou RONI.

8. A não apresentação das contas ocasiona a suspensão automática das novas cotas do Fundo Partidário, pelo tempo em que o partido permanecer omisso (art. 28, III, Resolução TSE 21.841/2004).

9. A penalidade aplicada em caso de apresentação tempestiva das contas seria justamente a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo partidário pelo período de até 12 (doze) meses, nos termos da redação do artigo 37, § 3º, com a redação ainda vigente da Lei nº 12.034/2009 e aplicável ao caso.

10. Não se justifica deixar de acatar o presente pedido de regularização, mesmo porque os documentos que não foram apresentados não existem. A negativa redundaria em pena de caráter perpétuo, e as especificidades do caso concreto - não recebimento de fontes vedadas ou de recursos públicos - são particulares e aptas a trazer um tratamento adequado à questão.

11. Encerramento da penalidade de suspensão de recebimento de cotas do Fundo Partidário pelo tempo em que o partido permaneceu omisso, conforme entabulado no acórdão originário.

12. Inaplicabilidade das sanções dos arts. 47 e 49, pois o caso não se adequa ao referido preceptivo legal - não há recursos públicos de Fundo Partidário ou FEFC, de fontes vedadas ou RONI, bem como preceito secundário que seria aplicável em caso de desaprovação das contas, é menor do que o lapso temporal já experimentado pelo requerente referente ao não recebimento de recursos públicos.

13. Pedido de regularização deferido.

(Petição n. 60009420, RESOLUÇÃO n. 2352 de 29.8.2019, Relator ANTÔNIO VELOSO PELEJA JÚNIOR, Publicação: DEJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 2999, Data: 04.9.2019, pp. 4-5.) (Grifei.)

 

A título de desfecho, pondero: acaso se considerasse, aqui, que a ausência dos documentos relativos à conta bancária impediria a regularização das contas, a sanção aplicada à agremiação – suspensão do recebimento de recursos do Fundo Partidário – adquiriria a feição de pena perpétua.

 

Diante do exposto, VOTO pela rejeição da preliminar de nulidade e, no mérito, por dar provimento ao recurso para deferir o pedido de regularização e afastar (1) a desaprovação das contas do exercício de 2013 do PSDB DE TUPANCI DO SUL e (2) a determinação de suspensão do recebimento de recursos do Fundo Partidário.