REl - 0600093-39.2020.6.21.0059 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/12/2020 às 10:00

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Quanto ao mérito, a Procuradoria Regional Eleitoral opõe embargos de declaração, ao argumento de omissões relativamente a:

(1) argumento do recurso da Promotoria Eleitoral – ausência de condição de registrabilidade. Aduz que, ainda que não concedidos efeitos infringentes, para fins de recurso especial, torna-se necessário que as premissas fáticas estejam reconhecidas na decisão embargada;

(2) questão fática e probatória, qual seja, o afastamento do “reconhecimento do documento ao final apresentado como certidão de objeto e pé do processo no qual o candidato recebeu condenação criminal em segunda instância, notadamente as informações constantes nas certidões narratórias do STF e do STJ, que demonstram que o processo foi julgado e retornou ao Tribunal de Justiça ainda no ano de 2016”.

Quanto ao vício apontado no item 1, há parcela de razão ao embargante. O voto condutor não se manifestou relativamente à alegada ausência de condição de registrabilidade, apontada pela Promotoria Eleitoral no recurso, nos termos do art. 27 da Resolução TSE n. 23.609/19, de modo que deve haver integração.

Gizo, contudo, que com a apresentação das certidões narratórias perante este Tribunal (situação aceita nos registros de candidatura), houve a superação lógica do argumento. A condição de registrabilidade foi atendida formalmente, e passou-se a perquirir se o documento apresentado era adequado.

Cito trecho do acórdão:

No recurso, o Ministério Público Eleitoral se insurge contra a decisão ao argumento central de que o recorrido “[…] em momento algum juntou certidão de objeto e pé do referido processo que se encontra, ainda, em trâmite junto ao Tribunal de Justiça. Juntou, apenas, certidão expedida pela 1ª Vara Criminal da Comarca de Viamão (fl. 70), dando conta que o processo aguarda julgamento em instância superior”.

E, nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral apresenta posicionamento alinhado ao do recorrente, no sentido de que, ao candidato, caberia demonstrar a inexistência de nova decisão colegiada, em substituição àquela anulada. Entende ser desarrazoado que “um processo, tendo retornado com anulação do acórdão do TJ/RS em outubro de 2016, não tenha mais recebido, na Corte Estadual, qualquer outro andamento desde então, como consta na certidão trazida pelo requerente”.

[…]

Diante do documento novo, concedi segunda vista dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral, que manteve sua posição pela procedência da AIRC e, portanto, pelo provimento do recurso para indeferir a candidatura.

[…]

Sigo.

No que toca à questão de fundo, qual seja, o conteúdo da certidão narratória, nos termos da Resolução TSE n. 23.609/19, entendeu-se que o candidato se desincumbiu de seu ônus probatório:

Colegas, após refletir de forma especial sobre o caso dos autos, entendo que o recurso não merece provimento, em que pese os judiciosos argumentos apresentados pelo Ministério Público Eleitoral, oficiante tanto na origem quanto perante esta Corte.

E assim concluí para conferir efetividade a direito político fundamental, o jus honorum.

Explico.

Ainda que o teor da “certidão de objeto e pé” seja um tanto lacônico – e de fato, o é, há que se considerar que o recorrido não tem controle sobre tal documento – foi certificada, por servidor da Justiça Estadual gaúcha, a situação do processo criminal pelo qual responde.

E é inegável: resta inconclusivo, da leitura da certidão, que Alex Sander Alves Boscaini esteja em situação de inelegibilidade.

Tem razão o d. Procurador Regional Eleitoral, no sentido de que causa estranheza o fato de que, anulada decisão ainda no ano de 2016, e retornado os autos do STJ em outubro do mesmo ano, referida ação criminal continue sem desfecho em grau de apelação.

Contudo, o recorrido envidou todos os esforços ao seu alcance para esclarecer a situação, e não há como negar que cumpriu o disposto pela redação expressa do § 7º do art. 29 da Resolução TSE n. 23.609/19: o documento obtido se trata de uma certidão de “objeto e pé”.

E o “pé” lá constante, a situação do processo, não indica condenação criminal por órgão colegiado, como exige a al. “e” do inc. I do art. 1º da LC n. 64/90.

Presunção, portanto, de que há de beneficiar o candidato recorrido, sobremodo quando visa a conferir o pleno exercício do direito de ser votado, como já dito.

Ademais, como o Ministério Público Eleitoral atua como parte no feito, uma vez que é impugnante ao registro de candidatura, poderia ter encontrado uma decisão, um andamento processual, que indicasse a incidência da hipótese de inelegibilidade sob testilha. Não há nos autos tal elemento de prova.

Há, em verdade, um indício que talvez possa sinalizar o motivo da ação ainda não ter recebido novo acórdão: o cadastro equivocado do assunto da demanda, o que pode, e aqui apenas se está a especular, ter ocasionado empecilhos, por exemplo, no andamento processual.

De todo modo, penso que milita em favor do recorrido a ausência de prova cabal de que, contra ele, tenha ocorrido condenação criminal transitada em julgado, ou proferida por órgão colegiado, pela prática de crime contra a economia popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio público. Diante de notícias vagas, o recurso não merece provimento.

E é por isso que a decisão indica a ausência de atendimento, de parte do Ministério Público Eleitoral, do respectivo ônus probatório. A própria Promotoria Eleitoral refere que inicialmente “[…] havia postulado o indeferimento do registro de candidatura, porque o recorrido se enquadra na hipótese prevista no art. 1º, I, e, da Lei Complementar n. 64/90 [...]”.

Ou seja, com a apresentação de certidão de objeto e pé perante este Tribunal, a análise do documento mostrava-se suficiente tanto para afastar alegações de inelegibilidade, quanto para entender cumpridas as condições de elegibilidade.

Ainda, e no que diz respeito ao argumento de que a certidão de objeto e pé, juntada pelo candidato, não seria atualizada, desobedecendo-se os termos da Resolução TSE n. 23.609/19, indico que a data da lavra do documento foi o dia 04.11.2020 e que há que se diferenciar a atualidade do documento, da atualidade das informações nele contidas; a certidão acostada é, portanto, atualizada – se as informações nela constantes não estão atualizadas, é circunstância alheia ao candidato, conforme o acórdão embargado faz constar.

Fique claro: a supressão da omissão não acarreta a concessão de efeitos infringentes.

Faço constar: as certidões narratórias do STJ e do STF juntadas nos ID 9182583 e 9182633 informam que, em 28.10.2016, o processo a que se refere a apelação n. 70061332250 voltou ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e que tal é aquele processo referido pela certidão criminal estadual juntada pelo Ministério Público na primeira instância, em relação ao qual consta condenação criminal em segunda instância em nome do requerente do registro (ID 9178233), com o adendo de que o candidato posteriormente apresentou, ID 10012083, certidão do TJ-RS, datada de 04.11.2020, com o seguinte texto:

“CERTIFICO que, consultando os dados informatizados do 1º e 2º grau, bem como o acórdão que recebeu a denúncia e a sentença, disponíveis na consulta processual, verifiquei que Alex Sander Alves Boscaini teve a denúncia recebida na Ação Penal n. 70040760357 como incurso no art. 359-C, do Código Penal. Durante a instrução do processo, os autos foram remetidos à Comarca de Viamão, por declínio de competência, recebendo o número 039/2.13.0001863-7. O Magistrado proferiu sentença condenando Alex Sander Alves Boscaini como incurso no art. 359-C. O réu apelou (Apelação nº 70061332250). O processo ainda não possui trânsito em julgado pois aguarda o julgamento do Recurso Especial nº 70066413501. CERTIFICO, ainda, que quando o processo veio ao Tribunal de Justiça em grau de apelação, foi cadastrado erroneamente em seu assunto o crime de “DESOBEDIÊNCIA A DECISÃO JUDICIAL SOBRE PERDA OU SUSPENSÃO DE DIREITOS”, cujo equívoco não pode ser corrigido neste momento”.

Diante do exposto, VOTO pelo acolhimento dos embargos, para integrar o acórdão embargado relativamente à omissão ocorrida, sem, contudo, atribuir efeitos modificativos.