REl - 0600173-72.2020.6.21.0133 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/12/2020 às 14:00

VOTO

Inicialmente, afasto a preliminar de intempestividade do recurso principal, suscitada pelo recorrente Glauco dos Reis da Silva, uma vez que a contagem foi realizada em horas, enquanto o art. 22 da Resolução TSE n. 23.608/19 é expresso ao estabelecer que tal prazo é de um dia.

Nas contrarrazões, o recorrente aponta:

A intimação da sentença proferida foi publicada no Mural Eletrônico às 18h08min do dia 21/10/2020 (PUBLICAÇÃO EM MURAL ELETRÔNICO Nº 40921/2020).

O recurso foi protocolizado às 20h17min do dia 22/10/2020 (ID 20067950 ). Conforme art. 12 da Resolução TSE nº 23.608/2019, “Art. 12. No período previsto no art. 11, caput, as intimações das partes nas representações fundadas no art. 96 da Lei nº 9.504/1997, nas reclamações e nos pedidos de direito de resposta serão realizadas pelo mural eletrônico, fixando-se o termo inicial do prazo na data de publicação.”

Nos termos do art. 96, §8º, da Lei nº 9504/97: “§ 8º Quando cabível recurso contra a decisão, este deverá ser apresentado no prazo de vinte e quatro horas da publicação da decisão em cartório ou sessão, assegurado ao recorrido o oferecimento de contra-razões, em igual prazo, a contar da sua notificação.” Desta forma, conclui-se ter sido interposto intempestivamente o recurso, pelo que requer o seu não conhecimento.

Desse modo, foi observado o prazo de 1 dia previsto no art. 22, caput, da Resolução TSE n. 23.608/19:

Art. 22. Contra sentença proferida por juiz eleitoral nas eleições municipais é cabível recurso, nos autos da representação, no PJe, no prazo de 1 (um) dia, assegurado ao recorrido o oferecimento de contrarrazões em igual prazo, a contar da sua intimação para tal finalidade (Lei nº 9.504/1997, art. 96, § 8º).

Assim, o recurso é tempestivo, razão pela qual rejeito a preliminar.

No mérito, o recurso interposto pelo representado Rivair Adir Lagranha busca afastar a penalidade imposta por ter repassado vídeo, via WhatsApp, contendo propaganda eleitoral negativa, enquanto o recurso interposto pelo representante Glauco dos Reis da Silva postula a majoração da condenação de R$ 5.000,00 para R$ 30.000,00.

Efetivamente, da análise do conteúdo do vídeo impugnado, verifica-se ter havido veiculação de ofensa à honra do representante, mediante afirmações que atingem a sua conduta como agente político, com a utilização de montagens de modo a degradar a sua imagem, assim descritos na sentença:

Diante da documentação acostada, especialmente do vídeo objeto da representação, destarte, produzido de maneira grotesca, com sobreposição de imagens e de fatos, deslocados no tempo, além das aleivosias assacadas, resulta configurada a existência da ocorrência de propaganda eleitoral irregular, com a divulgação de notícia que se reputa falsa, de propaganda de cunho negativo. Logo, razões suficientes a justificar a concessão da medida liminar, como forma de resguardar a igualdade, a normalidade e a legitimidade do certame eleitoral em curso.

De fato, consistindo em uma montagem de imagens relacionadas a matéria jornalística que trata de assunto diverso, na qual foi inserida uma locução distinta da original – embora produzida de forma grosseira – o vídeo desinforma, veiculando, mediante manipulação de imagens e divulgação de informação inverídica, ofensas contra o representante.

Além disso, conforme aponta a Procuradoria Regional Eleitoral,

a divulgação do vídeo pelo representado em grupos de WhatsApp (para além do único envio por ele admitido) está demonstrada pela documentação trazida com a inicial da representação, especialmente pela Ata Notarial de ID 8678533, que comprova a postagem em grupo com 74 integrantes, que, pelo seu tamanho, apresenta enorme potencial para amplificar o risco de dano à imagem do representante. Nesses termos, tem-se que deve ser mantida a ordem de proibição de nova veiculação do citado vídeo pelo recorrente, inclusive em relação à fixação das astreintes.

Registro que a garantia da liberdade de expressão e pensamento é um dos mais caros valores, e também dos mais ameaçados, demandando especial atenção. No que concerne à propaganda eleitoral, forma de liberdade de expressão política, como nas demais áreas, essa garantia sofre necessárias restrições: vedação ao anonimato, proteção à honra dos concorrentes ao pleito, vedação à desinformação, entre outras.

Na hipótese dos autos, sendo manifesta a ofensa à honra do candidato representante, andou bem a sentença ao determinar que o próprio representado realizasse a exclusão do vídeo, pois a publicação não consensual escapa da regra prevista no art. 33, § 2º, da Resolução TSE n. 23.610/19:

§ 2º As mensagens eletrônicas e as mensagens instantâneas enviadas consensualmente por pessoa natural, de forma privada ou em grupos restritos de participantes, não se submetem ao caput deste artigo e às normas sobre propaganda eleitoral previstas nesta Resolução (Lei n. 9.504/1997, art. 57-J).

Não se desconhece o fato de que o aplicativo WhatsApp, utilizado para compartilhar o vídeo em questão, envolve, no mais das vezes, ambiente particular, sem alcance geral, ficando restrito aos grupos de conhecidos.

Ocorre que, em casos extremos, como se afigura o dos presentes autos, a análise da irregularidade não pode escapar da Justiça Eleitoral, na esteira da jurisprudência:

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO POR PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA NEGATIVA. MENSAGEM EM GRUPO DO APLICATIVO WHATSAPP. EXTRAPOLAÇÃO DO DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO. OFENSA À HONRA. PEDIDO DE NÃO-VOTO. PROIBIÇÃO NA PRÉ-CAMPANHA. PROPAGANDA PERMITIDA A PARTIR DE 26/09/2020. IRREGULARIDADE CONFIGURADA. REMOÇÃO DA PROPAGANDA. PROIBIÇÃO DE NOVA VEICULAÇÃO, SOB PENA DE MULTA. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 36, § 3º DA LEI Nº 9.504/1997. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

1. A veiculação de expressões que excedem o limite da crítica política, com nítido intuito de macular a honra e/ou a imagem do candidato configura propaganda eleitoral negativa, proibida no período de pré-campanha.

2. Configurada a realização de propaganda eleitoral antecipada negativa, impõe-se a determinação de remoção do vídeo, bem como a proibição de reexibi-lo, sob pena de multa e, ainda, a aplicação da multa prevista no art. 36, § 3º da Lei nº 9.504/1997.

3. Recurso conhecido e provido, para julgar procedente a Representação, determinar a remoção do vídeo, bem como a proibição de reexibição, por qualquer meio, sob pena de multa pelo descumprimento, fixada em R$ 10.000,00 (dez mil reais) por veiculação, além da aplicação da multa fixada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em razão da propaganda antecipada.

(TRE-PR, RECURSO ELEITORAL n. 0600127-63.2020.6.16.0023, ACÓRDÃO n. 56425 de 13.10.2020, Relator ROBERTO RIBAS TAVARNARO, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 19.10.2020.) (Grifei.)

 

RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO POR PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA NEGATIVA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. VÍDEO VEICULADO PELO APLICATIVO WHATSAPP COM CONTEÚDO OFENSIVO À HONRA E À IMAGEM DE PRÉ–CANDIDATO A PREFEITO. MENSAGEM QUE EXTRAPOLA OS LIMITES DA LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO E DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO. RECURSO DESPROVIDO.

(TRE-SP, RECURSO ELEITORAL n. 060006605, Acórdão, Relator Min. PAULO SERGIO BRANT DE CARVALHO GALIZIA, Publicação: DJE - DJE, Tomo 178, Data 17.9.2020.) (Grifei.)

Desse modo, correta a sentença ao entender pela necessidade de remoção do material.

Quanto à ordem de exclusão da postagem, assiste razão à Procuradoria Regional Eleitoral ao apontar que a inicial não foi instruída de acordo com a exigência do art. 17 da Resolução TSE n. 23.608/19, com o código hash da postagem impugnada, que é o endereço equivalente ao URL de publicações de internet.

Esse requisito consta da regulamentação do TSE porque é possível determinar judicialmente que o WhatsApp proceda à exclusão de seus servidores das mídias com conteúdo ilícito.

A partir do código hash (um expediente técnico capaz de individualizar um arquivo) da criptografia atribuída à postagem, a empresa coloca essa assinatura digital (código hash) em uma blacklist, impossibilitando compartilhamentos.

De qualquer sorte, considerando que o cumprimento foi realizado pelo próprio representado, não houve qualquer prejuízo.

Por fim, nos termos referidos pelo órgão ministerial, a conduta narrada nos autos não atrai a penalidade prevista no art. 30, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19, que regulamenta o art. 57-D, caput e § 2º, da Lei n. 9.504/97, pois tal sanção é especificamente prevista para a hipótese de anonimato, a qual não se verifica na espécie. Com esse entendimento o seguinte acórdão do TSE:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. FACEBOOK. ANONIMATO. INEXISTÊNCIA. MULTA DO ART. 57-D DA LEI 9.504/97. INAPLICABILIDADE. PROVIMENTO. REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA. RESTABELECIMENTO DO ACÓRDÃO REGIONAL.

1. Nos termos do art. 57-D da Lei 9.504/97, "é livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores - Internet", sujeitando-se o infrator à pena de multa de R$ 5.000,00 a R$ 30.000,00.

2. Na espécie, não sendo anônima a postagem de vídeo em página da rede social Facebook (na qual se veiculou vídeo em tese ofensivo a candidato), descabe sancionar o agravante com base no referido dispositivo, impondo-se a manutenção do aresto a quo.

3. A inaplicabilidade do referido dispositivo a manifestações cuja autoria é sabida não significa permitir que se veicule propaganda ofensiva à honra de candidatos, havendo previsão de outras medidas judiciais para cessar o ilícito, a exemplo do direito de resposta (art. 58 da Lei 9.504/97).

4. Agravo regimental provido para, reformando-se a decisão monocrática, restabelecer o acórdão do TRE/MG e, por conseguinte, a improcedência dos pedidos.

(TSE - RESPE: 00000763820166130278 UBERLÂNDIA - MG, Relator: Min. Jorge Mussi, Data de Julgamento: 1º.3.2018, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 62, Data 02.4.2018, p. 79.)

Assim, merece ser provido em parte o recurso interposto por RIVAIR ADIR LAGRANHA, tão somente para que seja afastada a pena de multa no valor de R$ 5.000,00 fixada na sentença, por ausência de previsão legal, restando desprovido o recurso adesivo interposto por GLAUCO DOS REIS DA SILVA.

Ante o exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo provimento parcial do recurso interposto por RIVAIR ADIR LAGRANHA, tão somente para que seja afastada a pena de multa no valor de R$ 5.000,00 fixada na sentença, e pelo desprovimento do recurso adesivo interposto por GLAUCO DOS REIS DA SILVA, nos termos da fundamentação.