REl - 0600370-31.2020.6.21.0067 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/12/2020 às 10:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

Inicialmente, cabe esclarecer que o autor ingressou com representação por propaganda irregular, tendo em vista a publicação de vídeo em rede social e a adesivagem de veículo usado na campanha da candidata, mas a magistrada recebeu como Ação de Investigação Judicial Eleitoral e concluiu pela ocorrência de propaganda institucional. Não houve prejuízo no processamento, respeitadas as devidas oportunidades das partes.

1. Preliminares

1.1 Tempestividade

O recurso é tempestivo. A sentença foi prolatada em 28.10.2020 e a irresignação eleitoral interposta dois dias após – dentro do tríduo legal previsto tanto para representação quanto para ação de investigação judicial eleitoral.

1.2 Da inépcia da inicial

Argui a recorrente que a inicial é inepta por não apresentar pedido certo e determinado, mas, de forma genérica, postular a retirada do material da candidata. De fato, a inicial não aponta de modo claro a URL da publicação, objeto da ação; contudo, não houve discordância entre as partes sobre a especificação da postagem, sendo que a peça processual oferece elementos suficientes a delimitar a postagem refutada e imagens do carro adesivado, tomado como propaganda irregular.

No dizer do douto Procurador Regional Eleitoral, os fatos foram coerentemente narrados e o pedido formulado apresentou-se como sua consequência lógica, não havendo nenhum defeito na referida peça processual.

Afasto, assim esta preliminar.

1.3 Da ilegitimidade passiva

A irresignação sustenta, ainda, que a "representada não possui legitimidade para figurar no pólo passivo desta demanda, visto que a publicação referida pelos Representados, de fato, foi realizada por terceiro, sem a autorização e/ou participação da Candidata".

Sem razão, a recorrente.

É inequívoca a participação da candidata na gravação, diga-se, como personagem central, e, como consigna a sentença, o vídeo foi gravado pela própria candidata, que aparece nas imagens portando a câmera. Além, a postagem do vídeo foi reproduzida em sua própria rede social, ainda que marcado por terceiro – a reprodução ou não de postagens de terceiros na própria rede social está sob o controle do dono do perfil.

Afasto, igualmente, esta prefacial.

1.4 Do cerceamento de defesa

Por ocasião da contestação, a defesa requereu a produção de prova oral, qual seja, a oitiva de testemunha e, como não atendida, pretende que seja reconhecida a nulidade processual por cerceamento de defesa.

Nesse ponto, melhor sorte não assiste à recorrente.

Ao entendimento do juízo a quo, a quem cabe a condução do processo e a seleção das provas cabíveis, a oitiva de pessoa que teria publicado o vídeo produzido pela recorrente não acrescentaria elementos úteis ao julgamento.

Afastadas as preliminares, passo ao mérito.

2. Mérito

No mérito, trata-se da análise de conteúdo de vídeo produzido pela candidata e postado em redes sociais, para concluir se a referida publicação configura propaganda irregular. Destaco que os adesivos aplicados no carro de campanha não foram considerados irregulares, pelo que descabida a análise sobre eles, visto não haver recurso do representante.

O juízo de origem entendeu ser caso de propaganda institucional, determinou a retirada do vídeo e fixou a multa “no valor de 500 UFIRs”.

Meu entendimento é diverso. No caso, não há falar em propaganda institucional, pois esta se refere à publicidade, subsidiada por verbas públicas, de atos, programas, obras, serviços e campanha dos órgãos públicos – o caso em tela, a despeito de ser a candidata vereadora concorrendo à reeleição, não se conforma à previsão legal.

Quanto à propaganda eleitoral, especificamente na internet, a Resolução n. 23.610/19 assim disciplina:

Art. 10. A propaganda, qualquer que seja sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais (Código Eleitoral, art. 242, e Lei nº 10.436/2002, arts. 1º e 2º).

[...]

Art. 28. A propaganda eleitoral na internet poderá ser realizada nas seguintes formas (Lei nº 9.504/1997, art. 57-B, I a IV):

I - em sítio do candidato, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de aplicação de internet estabelecido no país;

II - em sítio do partido político ou da coligação, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de aplicação de internet estabelecido no país;

III - por meio de mensagem eletrônica para endereços cadastrados gratuitamente pelo candidato, pelo partido político ou pela coligação, observadas as disposições da Lei Geral de Proteção de Dados quanto ao consentimento do titular;

IV - por meio de blogs, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e aplicações de internet assemelhadas, dentre as quais aplicativos de mensagens instantâneas, cujo conteúdo seja gerado ou editado por:

a) candidatos, partidos políticos ou coligações, desde que não contratem disparo em massa de conteúdo (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J);

[...]

Ainda, por oportuno, observo que, no tocante ao conteúdo, especialmente quanto à divulgação de atos de parlamentares, a resolução é permissiva, apenas ressalvando que não se faça pedido de votos no caso de propaganda antecipada – diferente da situação dos autos, que ocorreu em meados de outubro.

Na publicação, tem-se, inicialmente, notícia do representante que se resume a relatar que a representada, além de anunciar obra, utiliza, consoante se pode extrair das imagens (...), veículo Kombi.

Ainda, na sentença, tem-se que a magistrada consultou o endereço informado na rede social da candidata representada, sendo que, do exame da postagem referida pela parte representante, vê-se um vídeo onde a candidata apresenta obra de asfalto no bairro Lago Azul, afirmando que foi graças ao seu trabalho que a obra está sendo realizada.

Ora, o fato de estar ausente a URL da postagem já fragiliza em muito a representação, quanto mais a verificação do pouco conteúdo acessado, a mostrar uma manifestação absolutamente adequada e pertinente à propaganda regular de candidato a mandato sucessivo na Câmara de Vereadores. Legítimo “anunciar obra” e creditar “ao seu trabalho” os feitos anteriores que enaltecem a candidatura.

Mesmo entendimento apresenta o órgão ministerial, em excerto que transcrevo:

Um agente político que busca a reeleição tem o legítimo interesse de demonstrar o que executou no cargo que lhe foi confiado pelo voto. O processo eleitoral não é apenas um momento de elaboração de promessas, mas de demonstração das realizações passadas, inclusive no cargo ocupado anteriormente. Essa demonstração, por meio da propaganda eleitoral, não se confunde com a utilização indevida de órgãos públicos para enaltecer candidatos.

De todo o exposto, não se vislumbra resquício de irregularidade na publicação, muito menos publicidade institucional.

Não desbordando a publicação aqui examinada dos limites legais, e tratando-se de exercício da liberdade de expressão, a sentença deve ser reformada, e a ação, julgada improcedente.

ANTE O EXPOSTO, VOTO por afastar as preliminares e, no mérito, por dar provimento ao recurso para julgar improcedente a ação de investigação judicial eleitoral, afastando a imposição da multa.