REl - 0600699-53.2020.6.21.0096 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/12/2020 às 10:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, comportando conhecimento.

Passo ao exame do mérito.

Mérito

Na presente demanda, OSMAR TERRA, ora RECORRENTE, busca a condenação de BERTIL BOLIVAR NILSSON, LEONARDO ESTANISLAU SZINWELSKI e a COLIGAÇÃO UM NOVO TEMPO (PDT/PT/PTB) às penas cominadas no art. 324 do Código Eleitoral (calúnia eleitoral) e nos arts. 92 e 93 da Resolução TSE n. 23.610/19, que reproduzem os tipos descritos nos arts. 325 e 326 do Código Eleitoral (difamação e injúria eleitoral, respectivamente), devido à publicação e  ao compartilhamento da matéria jornalística “FRAUDE NO MINISTÉRIO DA CIDADANIA PODE DERRUBAR OSMAR TERRA”, na página da referida COLIGAÇÃO (PDT – Guarani das Missões@coligação PDT, PT e PTB), na rede social Facebook.

De acordo com o RECORRENTE, a referida matéria jornalística, que havia sido veiculada no site “Poder 360”, no dia 12.9.2020, foi produzida com o intuito de distorcer notícia que fora publicada, dias antes, no site da Política Federal, a respeito de investigações conduzidas no âmbito da “Operação Gaveteiro” e relacionadas a crimes e fraudes cometidos dentro do Ministério do Trabalho entre os anos de 2016 e 2018 (“Polícia Federal deflagra Operação Gaveteiro contra fraude em licitação e desvio de recursos públicos no Ministério do Trabalho”).

Os RECORRIDOS teriam se utilizado da referida matéria para denegrir a sua dignidade pessoal e reputação política, compartilhando informação falsa entre os eleitores, levando-os a acreditar no cometimento de fraude no Ministério da Cidadania que, à época, se encontrava sob o seu comando, mediante a publicação dos seguintes dizeres:

VOCÊ SABIA?

FRAUDE NO MINISTÉRI DA CIDADANIA PODE DERRUBAR OSMAR TERRA A PASTA, COMANDADA POR TERRA, CONTRATOU EM 2019 A EMPRESA BUSINESS TO TECHNOLOGY (B2T) QUE, DE ACORDO COM A POLÍCIA FEDERAL,

FOI USADA PARA DESVIAR R$ 50 MILHÕES DE DINHEIRO PÚBLICO ENTRE 2016 E 2018

O recurso, contudo, não merece prosperar.

Inicialmente, como mencionei ao indeferir a tutela provisória de urgência, as infrações penais eleitorais devem ser apuradas em ação penal pública, de titularidade do Ministério Público Eleitoral, consoante dicção expressa do art. 355 do Código Eleitoral:

Art. 355. As infrações penais definidas neste Código são de ação pública.

Logo, resta evidente a inadequação da via processual eleita pelo RECORRENTE ao valer-se de representação, ação eleitoral de natureza tipicamente cível, para deduzir a pretensão condenatória pelo cometimento dos aludidos crimes eleitorais, sendo que o juízo de primeira instância, ao tomar conhecimento da notícia-crime veiculada nestes autos, determinou fosse dada ciência ao Ministério Público Eleitoral, nos termos do art. 40 do CPP, que assim dispõe:

Art. 40. Quando, em autos ou papéis de que conhecerem, os juízes ou tribunais verificarem a existência de crime de ação pública, remeterão ao Ministério Público as cópias e os documentos necessários ao oferecimento da denúncia.

Portanto, no pertinente à imputação das condutas criminosas aos RECORRIDOS, houve o esgotamento das providências juridicamente possíveis no âmbito da presente ação eleitoral.

Ademais, embora tenha referido, ao longo da fundamentação recursal, o caráter calunioso, difamatório e injurioso da notícia publicada, o RECORRENTE, como advertiu o ilustre Procurador Regional Eleitoral (ID 10125483), renovou apenas o requerimento de remoção do conteúdo ofensivo da internet, sem fazer qualquer referência ao pedido de condenação criminal, limitando-se, quanto a esse aspecto, a postular o envio dos autos ao Ministério Público Eleitoral.

Da mesma forma, incabível o provimento do recurso ao efeito de reformar-se a sentença, determinando-se o processamento e o julgamento da representação por propaganda eleitoral irregular, uma vez que o art. 96, caput, e 96-B, § 1º, da Lei n. 9.504/97, em disciplina reproduzida no art. 3º, caput e parágrafo único, da Resolução TSE n. 23.608/19, conferem legitimidade para a sua propositura exclusivamente aos candidatos, aos partidos políticos, às coligações e aos membros do Ministério Público Eleitoral:

Lei n. 9.504/97

Art. 96. Salvo disposições específicas em contrário desta Lei, as reclamações ou representações relativas ao seu descumprimento podem ser feitas por qualquer partido político, coligação ou candidato, e devem dirigir-se:

I - aos Juízes Eleitorais, nas eleições municipais;

(...).

Art. 96-B (...)

§ 1º O ajuizamento de ação eleitoral por candidato ou partido político não impede ação do Ministério Público no mesmo sentido. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

 

Resolução TSE n. 23.608/19

Art. 3º As representações, as reclamações e os pedidos de direito de resposta poderão ser feitos por qualquer partido político, coligação e candidato e devem dirigir-se (Lei nº 9.504/1997, art. 96, caput e I a III):

(...)

III - aos juízos eleitorais, na eleição municipal.

Parágrafo único. O Ministério Público Eleitoral é parte legítima para propor as representações e reclamações previstas no caput deste artigo.

O pré-candidato, por sua vez, tem a sua situação jurídica equiparada à do candidato, a partir do momento em que torna publicamente conhecida a sua pretensão de participar da disputa eleitoral, porquanto não seria legítimo, à luz dos ditames da Teoria da Aparência, do princípio da boa-fé e da normativa objetivamente posta no art. 36-A da Lei das Eleições (correspondente ao art. 3º da Resolução TSE n. 23.608/19), admitir a existência de descontinuidade da tutela jurisdicional aos seus direitos em período anterior ao requerimento do registro da sua candidatura à Justiça Eleitoral.

Sob esse viés, o RECORRENTE, que exerce o cargo de deputado federal, não ostentava, ao tempo da propositura da presente ação, em 29.10.2020, quando já se havia encerrado o prazo para o pedido de registro de candidatura a esta Especializada, a condição de concorrente ao pleito, a qual é de todo indispensável à sua legitimação como autor de representação por propaganda eleitoral irregular.

Dessa circunstância, além da ilegitimidade ativa ad causam, denota-se a ausência de interesse processual do RECORRENTE, na medida em que eventual pronunciamento de mérito que viesse a ser proferido em nada refletiria na proteção de direito individual que estivesse diretamente relacionado às eleições do corrente ano, ou à proteção da lisura e da normalidade do pleito, que justificassem a interveniência da Justiça Eleitoral por meio da remoção de conteúdos alegadamente ofensivos da internet.

Ressalto, nesse particular, que o fato de o RECORRENTE exercer influência nas eleições municipais de Cerro Largo e demais cidades da região, devido às alianças político-partidárias estabelecidas entre o MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (MDB) e o PROGRESSISTAS (PP), como alegado nas razões recursais, traduz interesse meramente indireto ou reflexo na solução da lide, incapaz de caracterizar o interesse jurídico enquanto condição essencial ao exercício do direito de ação.

Seguindo essa ordem de ideias, a reparação de danos morais decorrentes de ilícitos cometidos durante o exercício do direito de propaganda eleitoral, que tenham afetado os direitos de personalidade do RECORRENTE, por não serem tolerados pela legislação eleitoral, deve ser buscada perante o juízo cível competente, segundo regramento constante do art. 243, inc. IX e § 1º, do Código Eleitoral, incorporado ao texto dos arts. 22, inc. X, e 23 da Resolução TSE n. 23.610/19.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e desprovimento do recurso, mantendo a sentença que indeferiu a petição inicial da presente representação, extinguindo o feito sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, inc. I, c/c o art. 330, inc. III, do CPC, nos termos da fundamentação.