REl - 0600552-33.2020.6.21.0094 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/12/2020 às 14:00

VOTO

Foi suscitada, no parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral, a intempestividade do recurso interposto.

O prazo para a interposição de recurso contra sentença proferida em representação por conduta vedada é de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no DJe, conforme previsto no art. 51 da Resolução TSE n. 23.608/19:

Art. 51. Os recursos contra sentenças, decisões e acórdãos que julgarem as representações previstas neste capítulo deverão ser interpostos no prazo de 3 (três) dias, contados da publicação no DJe, observando-se o mesmo prazo para os recursos subsequentes, inclusive recurso especial eleitoral e agravo, bem como as respectivas contrarrazões e respostas.

No presente caso, de fato, o recurso foi protocolado em 26.10.2020, sendo que a intimação da sentença ocorrera em 22.10.2020 (ID 8921383), conforme se constata na certidão de ID 8921533.

O prazo findaria no dia 25.10.2020, domingo. Contudo, em se tratando de feito submetido ao procedimento do art. 22 da LC n. 64/90, o prazo a ser considerado é o dia 26 de outubro, segunda-feira. Nesse sentido, o art. 22 da Resolução TRE-RS n. 347:

Art. 22. Entre 26 de setembro e 18 de dezembro de 2020, os prazos processuais relativos aos feitos das eleições de 2020, salvo os submetidos ao procedimento do art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990, não se suspenderão aos sábados, domingos e feriados (Resolução TSE n. 23.627 /2020). (grifo nosso)

Assim, interposto no dia 26.10.2020, o apelo é tempestivo e dele conheço.

No mérito, imputa-se ao recorrido a concessão de bens da administração pública a três empresas, de forma gratuita, sem a efetiva execução da Lei n. 1.685/19 no exercício anterior.

Assim, a ação tinha por objeto apurar a conduta vedada prevista no art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais

[…]

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.

A sentença recorrida bem analisou a controvérsia:

A distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios pela Administração Pública ou por entidade vinculada a candidato é vedada por força do art. 73, §10, da LE, ao preconizar o seguinte:

“No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.”

A Administração Pública está limitada, no ano eleitoral, a distribuir gratuitamente bens, valores ou benefícios nas hipóteses de calamidade pública, estado de emergência ou existência de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. Fora das referidas hipóteses legais, tem-se conduta vedada pela norma eleitoral.

O aludido dispositivo legal tem como finalidade evitar programas oportunistas ou a distribuição de bens gratuitamente em ano eleitoral para fins de angariar um maior número de eleitoral, desequilibrando o pleito eleitoral pelo uso da máquina pública.

Entretanto, não é esta a hipótese dos autos. Há comprovação suficiente que o Município ostenta dois diplomas normativos, um datado de 2005 e outro de 2019, que autorizam a cessão de bens imóveis, de modo a demonstrar não se tratar de benefício concedido apenas em período eleitoral, deturpando a igualdade entre os concorrentes nas eleições.

Ainda, como pontuou o Ministério Público, a cessão levada a efeito não ostenta caráter gratuito como consta na representação, dadas as contrapartidas exigidas pelas empresas beneficiárias dos incentivos municipais, de modo a não caracterizar uma conduta vedada.

Pensar o contrário, seria vedar a cada dois anos a cessão de bens passíveis de fomentar o desenvolvimento econômico regional, o que viria a prejudicar de sobremaneira o município, de modo que o período eleitoral teria o condão de obstar a realização de empreendimentos por empresas privadas, sob pena de serem consideradas condutas violadoras da legislação eleitoral. E certamente o que a lei eleitoral pretende proteger é a lisura do certame e não servir para impedir o desenvolvimento e a atração de investimentos em qualquer dos entes da federação.

Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na represente representação.

Com efeito, ao vedar a distribuição gratuita de bens e benefícios por parte da Administração em ano eleitoral, a lei tem a finalidade de impedir o implemento de novas políticas públicas de viés oportunista em período próximo ao pleito, evitando que essa situação possa influenciar indevidamente os eleitores em proveito de candidatos que estão à frente da Administração Pública, em detrimento da igualdade de oportunidades na campanha. Ao contrário, a manutenção de serviços já implementados é admitida, em verdadeira ponderação entre a continuidade do serviço público e a igualdade entre os candidatos.

A respeito do tema, oportuna a lição de José Jairo Gomes:

Claro está que a regra é a proibição de distribuição. Segundo se tem entendido, para a configuração da presente conduta vedada “não é preciso demonstrar caráter eleitoreiro ou promoção pessoal do agente público, bastando a prática do ato ilícito. [...]” (TSE – AgR-REspe nº 36026/BA – DJe, t. 84, 5-5-2011, p. 47). Note-se, porém, que o fato deve ser considerado à luz do princípio da proporcionalidade.

Em ano eleitoral, a Administração Pública só pode distribuir gratuitamente bens, valores ou benefícios se ocorrer alguma das hipóteses legais especificadas, a saber: calamidade pública, estado de emergência ou existência de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. Ainda assim, o artigo 73, IV, da Lei nº 9.504/97 veda o uso político-promocional dessa distribuição, que deve ocorrer da maneira normal e costumeira, sem que o ato seja desvirtuado de sua finalidade estritamente assistencial.

A última das hipóteses permissivas pressupõe a existência de política pública específica, prevista em lei e em execução desde o exercício anterior, ou seja, já antes do ano eleitoral. Quer-se evitar a manipulação dos eleitores pelo uso de programas oportunistas, que, apenas para atender circunstâncias políticas do momento, lançam mão do infortúnio alheio como tática deplorável para obtenção de sucesso nas urnas.

(Direito Eleitoral, 14ª ed, 2018, p. 683)

In casu, os contratos anexados à inicial (ID 8919233) dão conta de que a concessão de uso com as empresas KS CONSTRUTORA E COMÉRCIO DE MATERIAIS, EDUARDA DORNELES KOPP DE SOUZA e LEONICE CRISTINA ZACHI FACCI não foi realizada de forma gratuita. Ao contrário, foram firmados “com encargos” (contratos n. 048, 049 e 058).

Além disso, fazem parte da política de incentivo ao desenvolvimento econômico e social do Município de Pinheirinho do Vale, implantada com a Lei Municipal n. 700 de 2005, que estabelece no art. 4º:

Art. 4º Para fins de instalação, ampliação, manutenção ou funcionamento de indústrias, considerando a função social e expressão econômica do empreendimento, os incentivos poderão consistir isolada ou cumulativamente em: (NR)(caput com redação estabelecida pelo art. 1º da Lei Municipal nº 1.482, de 10.04.2017)

I - venda subsidiada, concessão de uso ou doação de imóveis para a instalação ou ampliação;

II - auxílio financeiro reembolsável, para construção de prédio ou aquisição de equipamentos;

III - pagamento de aluguel de prédio destinado ao empreendimento;

IV - reembolso de despesas com consumo de água, energia elétrica, transporte de matéria prima e produção industrializada e outros;

V - execução de serviços de terraplenagem, transporte de terras, materiais de construção, rede de água, rede de energia elétrica, rede de telefone e outros similares;

VI - cessão de uso ou doação de bens e equipamentos;

VII - isenção de tributos municipais.

A Lei Municipal n. 1.685/19 (ID 8919183) apenas detalhou a forma específica da concessão dos pavilhões localizados na área do distrito Industrial Enio Selito Seidel.

Dessa forma, o conjunto probatório demonstra que, desde 2005, o município previa política de incentivos para o desenvolvimento econômico e social, e os contratos não foram celebrados de forma gratuita.

A caracterização da conduta vedada pelo art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97 requer o implemento, no ano do pleito, de programa (a) sem previsão legal que (b) não esteja em execução no ano anterior ao da eleição e (c) de caráter gratuito.

O fato, portanto, não se enquadra na descrição legal, pois estava previsto em lei e foi celebrado de forma onerosa.

Correto, portanto, o juízo de improcedência da ação.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso.