PC - 0602371-64.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/12/2020 às 14:00

VOTO

A UNIÃO interpôs agravo interno com o intuito de ver reformada decisão deste Relator que, em sede de cumprimento de sentença destinada ao recolhimento da quantia de R$ 9.937,06 ao Tesouro Nacional por MAURO LUIS BORGES MATIOTTI, considerou impenhorável o valor de R$ 1.329,74, encontrado em contas bancárias pertencentes ao EXECUTADO, com respaldo no art. 833, inc. X, do Código de Processo Civil, o qual, segundo orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, abarca valores inferiores a 40 (quarenta) salários-mínimos depositados em caderneta de poupança, conta-corrente e fundos de investimento, assim como guardados em papel moeda.

Em suma, a argumentação recursal está centrada em haver divergência jurisprudencial quanto à amplitude da norma contida no art. 833, inc. X, do Código de Processo Civil, temática que voltaria a ser debatida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 1660671/RS, na sessão de 16.9.2020, e, ainda, à violação ao procedimento previsto no art. 854, §§ 2º e 3º, inc. I, do Diploma Processual Civil.

A irresignação não comporta conhecimento.

O recurso de agravo interno, interposto pela UNIÃO com fulcro no art. 1.021 do Diploma Processual Civil, c/c o art. 115, § 2º, do Regimento Interno deste Tribunal, destina-se ao controle do órgão colegiado do Tribunal sobre a atividade jurisdicional desempenhada de forma monocrática pelos seus membros.

Entretanto, a previsão genérica de cabimento do recurso de agravo interno em face dos pronunciamentos unipessoais do Relator não tem incidência nas hipóteses em que a lei processual prevê expressamente modalidade recursal própria e específica para a impugnação de decisões monocráticas, a exemplo do que acontece com aquelas de natureza interlocutória proferidas na fase de cumprimento de sentença, atacáveis por meio do recurso de agravo de instrumento, conforme dicção expressa do art. 1.015, parágrafo único, do Código de Processo Civil:

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

(...)

Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.

Ressalto que, na fase de cumprimento de sentença dos feitos eleitorais, não se discute matéria eleitoral propriamente dita, mas técnicas insertas nas regras do Código de Processo Civil direcionadas à cobrança de valores e à expropriação de bens, de modo que as decisões tomadas nessa etapa procedimental se revestem de natureza preclusiva, a qual atrai a oposição de recursos por instrumento, não se lhes aplicando o princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias, previsto no art. 19, caput, da Resolução TSE n. 23.478/16, sendo inconteste, ademais, a incidência subsidiária e supletiva das normas processuais às demandas em trâmite perante esta Especializada, por força do art. 2º, parágrafo único, da citada resolução (RE n 1434, Relator Des. El. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA, DEJERS de 17.8.2016, p. 5.)

Registro, ainda, ser inviável a conversão do recurso de agravo interno em agravo de instrumento, porquanto, na forma da jurisprudência predominante do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, o princípio da fungibilidade recursal somente tem incidência diante de lacuna legislativa ensejadora de dúvida objetiva quanto à espécie recursal a ser manejada pela parte, desde que não reste caracterizado erro grosseiro e tenha sido observado o prazo legal estipulado ao recurso adequado (STF, AgRARE n. 1136841/PR, Relator Ministro DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, DJe n. 257, de 03.12.2018; STJ, AgInt no AREsp n. 1601341/SP, Relator Ministro BENEDITO GONÇALVES, 1ª Turma, DJe de 10.6.2020).

Nessa linha, firmou-se a jurisprudência deste Regional, como demonstram as ementas dos seguintes arestos:

RECURSO INOMINADO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA POR ARBITRAMENTO. RECURSO INCABÍVEL. ERRO GROSSEIRO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO CONHECIDO. O Código de Processo Civil, em seu art. 1.015, é expresso ao indicar o cabimento de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário. Incabível a interposição de recurso inominado com base na aplicação do princípio da fungibilidade recursal. Não conhecimento.

(TRE-RS, RE n. 1284 SÃO FRANCISCO DE ASSIS - RS, Relator Desembargador Eleitoral GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 19/11/2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 225, Data: 03/12/2019, Página 2.)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. DESAPROVAÇÃO. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DA SENTENÇA JULGADA IMPROCEDENTE. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO ACOLHIDA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ART. 1.015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. PRECEDENTE. NÃO CONHECIDO. Preliminar acolhida. Consoante o disposto no art. 1.015, parágrafo único, do Código de Processo Civil, o agravo de instrumento é o recurso adequado para atacar decisão interlocutória na fase de cumprimento da sentença. Inaplicável o instituto da fungibilidade recursal à hipótese, devido à impossibilidade de conversão de recurso inominado, previsto no art. 265 do Código Eleitoral, em agravo de instrumento, apelo que possui endereçamento diverso, requisitos específicos e rito próprio. Não conhecimento.

(TRE-RS, RE n. 3874, Relator Desembargador Eleitoral SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 21/08/2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 154, Data 24/08/2018, Página 9).

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE MULTA COM SENTENÇA JÁ TRANSITADA EM JULGADO. INTERPOSIÇÃO CONTRA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE REJEITOU A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE.

1. A cobrança de multa, salvo no caso das condenações criminais, será feita por ação executiva na forma prevista para a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, tramitando perante os juízos eleitorais, nos termos do art. 367, inc. IV, do Código Eleitoral. Observância dos preceitos contidos na Lei n. 6.830/80 e no Código de Processo Civil, este último aplicável naquilo que a Lei de Execução Fiscal for omissa.

2. Teses trazidas pelo recorrente já analisadas em momento anterior, não havendo como se cogitar da relativização da coisa julgada. Aplicação da lei da época dos fatos, com a redação então vigente do art. 81 da Lei n. 9.504/97.

3. Inadequação procedimental. Utilização de recurso eleitoral quando o adequado seria o agravo de instrumento. Inaplicável ao caso o princípio da fungibilidade recursal.

Não conhecimento.

(TRE/RS, RE n. 1487, Relatora DRA. MARIA DE LOURDES GALVÃO BRACCINI DE GONZALEZ, DEJERS Tomo 42, Data: 14/03/2017, Páginas 3-4.)

Em desfecho, não verifico, na situação sob análise, a utilização da via recursal de forma abusiva com o intuito de procrastinar a marcha processual, em clara ofensa aos princípios da lealdade e da boa-fé processuais, contexto em que se poderia cogitar a incidência da penalidade da multa cominada no art. 1.021, § 4º, do Diploma Processual Civil, posto que, segundo orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, a sua imposição à parte agravante não constitui efeito automático ou decorrência lógica da inadmissibilidade ou do desprovimento do recurso em votação unânime, devendo ser, ao contrário, sopesadas as circunstâncias do caso concreto (STJ, AgInt no AgInt no REsp n. 1753850/PR, Relator Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, DJe de 26.6.2020).

Diante do exposto, VOTO pelo não conhecimento do agravo interno interposto pela UNIÃO, em virtude da inadequação da via processual eleita, nos termos da fundamentação.