REl - 0600277-10.2020.6.21.0054 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/12/2020 às 10:00

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Quanto ao mérito, adianto que devem ser rejeitados.

A alegada obscuridade teria ocorrido porque o acórdão não teria demonstrado, com clareza, quais os critérios utilizados para entender os documentos como inservíveis à comprovação de filiação partidária, visto que utilizada argumentação genérica, sem explicitar os motivos pelos quais as provas teriam sido descartadas.

Assevera a embargante, então, que “[...] resta obscuro, o que exige que sejam esclarecidos, especifica e objetivamente, quais foram os critérios legais, doutrinários e jurisprudenciais que levaram o acórdão a interpretar que as provas juntadas aos autos, em comunhão aos depoimentos testemunhais não se prestariam a comprovar a tempestiva filiação partidária”.

Contudo, consta no acórdão embargado que a sentença, que a embargante desejaria ver mantida, foi prolatada de maneira desalinhada à jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

Aqui, a sentença, de maneira fundamentada, conferiu força comprobatória aos documentos apresentados pela parte para superar o que considerou um formalismo excessivo. Entendeu a prova oral “sincera e autorizada”, e que a ausência de impugnação seria “um claro indicativo de a filiação ostensivamente pública da candidata ser notória”, para deferir o registro baseada no princípio da primazia da realidade, que deve orientar a “máxima efetividade dos direitos individuais fundamentais”.

Contudo, tal posicionamento encontra-se de maneira desalinhada com a jurisprudência pacífica do Tribunal Superior Eleitoral:

(...) 1. A documentação unilateralmente produzida pelo candidato/partido político (e.g., ficha de filiação, relatório extraído do sistema Filiaweb, atas de reunião, declaração emitida por dirigente partidário) não se reveste de fé pública e, precisamente por isso, não possui aptidão para demonstrar o preenchimento da condição de elegibilidade insculpida no art. 14, § 3º, V, da CRFB/88 e no art. 9º da Lei nº 9.504/97 (Precedentes: AgR-REspe nº 144-55/PI, Rel. Min. Henrique Neves, PSESS de 13.10.2016; AgR-REspe nº 728-24/SP, Rel. Min. Maria Thereza, PSESS de 9.10.2014; AgR-REspe n° 641-96/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, PSESS de 25.9.2014; AgR-REspe n° 90- 10/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 25.3.2013; e AgR-REspe n° 74-88/PE, Rel. Min. Nancy Andrighi, PSESS de 29.11.2012).

2. As atas de reuniões internas dos partidos políticos que não são submetidas a nenhum tipo de registro público não se prestam a comprovar a filiação partidária. Precedente.

3. In casu, o TRE/PB manteve o indeferimento do pedido de registro de candidatura por entender não comprovada a filiação partidária, porquanto os documentos juntados aos autos - requerimento de filiação partidária, atas de reunião do Diretório Municipal do Partido e declaração firmada pelo Presidente e Secretário do Partido - não seriam aptos a comprovar a regularidade da filiação, visto que foram produzidos unilateralmente pelo Agravante. Incide, na espécie, a Súmula nº 20 do TSE.

4. Agravo regimental desprovido.

(TSE - Recurso Especial Eleitoral nº 10171, Acórdão, Relator(a) Min. Luiz Fux, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 08/11/2016.) (Grifei.)

 

Eleições 2016. Registro de candidatura. Filiação partidária. Ata de reunião partidária. Comprovação. Registro ou anotação perante a justiça eleitoral ou órgão público. 1. A jurisprudência do TSE é firme no sentido de que a comprovação da filiação partidária, quando o nome do filiado não aparece nas listas de que trata o art. 19 da Lei 9.096/95, pode ser realizada por meio da apresentação de outros elementos de convicção. Não se admite, contudo, a apresentação de documentos produzidos unilateralmente pelos candidatos ou pelos partidos políticos, como, por exemplo, ficha de filiação ou relação interna das agremiações, conforme dispõe a Súmula 20 desta Corte. 2. As atas partidárias que não são submetidas a nenhum tipo de controle ou verificação externa efetivamente não se prestam à comprovação da filiação partidária. Por outro lado, aquelas cuja existência e forma sejam essenciais aos registros públicos da vida e da organização do partido político são suficientes para tal fim, quando a sua apresentação é feita perante os órgãos competentes antes do prazo mínimo de filiação partidária. 3. Na espécie, a ata de deliberação sobre a escolha de dirigentes partidários para compor a comissão provisória do partido político na circunscrição do pleito, assinada pelo candidato e pelos demais membros da agremiação, é apta para demonstrar a condição de filiado daquele”.

(TSE - Ac de 03.11.2016, Respe nº 25163, rel. Min. Henrique Neves.) (Grifei.)

 

Ou seja, da lógica decorrente da mera leitura do corpo do acórdão se depreende que, se a sentença não se alinhou à jurisprudência do TSE, o acórdão, ao reformar a sentença de primeiro grau, está a se alinhar ao posicionamento daquele Tribunal Superior, para entender que atas partidárias não se prestam para comprovação de filiação, pouco importando as alegadas “solenidades”, eis que ínsitas a toda e qualquer ata, e valoradas pela sentença de maneira dissonante à pacífica jurisprudência.

Além, no que toca à alegada omissão, a embargante afirma que “seria necessário que o acórdão rebatesse” a fundamentação da sentença, “apontando qual solenidade faltaria a qual documento”.

Novamente, consta no corpo do acórdão o seguinte trecho, ao qual se roga leitura:

A título de desfecho, ressalto que os argumentos trazidos nas contrarrazões, pela recorrida, em muito se alinham àquelas expostas na fundamentação da sentença, e foram colocadas em evidente confronto ao entendimento do e. Tribunal Superior Eleitoral. Os documentos apresentados por JOSIANE BORGES não são suficientes para que se entenda pela comprovação do vínculo partidário, e as alegações de superação de formalismos em prol do exercício de direito fundamental não podem ser sedutores.

Isso porque todos – sem exceção – todos os direitos e garantias fundamentais (liberdade de expressão, de locomoção, à intimidade, etc.) são regulados por legislação infraconstitucional – essa, aliás, uma característica do Estado Democrático de Direito, exatamente para prestigiar a igualdade perante a lei.

Nessa linha, o direito político fundamental do jus honorum merece, certamente, todo o respaldo, mas há de ser exercido conforme as balizas previamente dispostas pelo legislador (devido processo legal). No caso, todos os candidatos com pedido de registro de candidatura assim procederam.

Exercício de direito fora de parâmetros legais, portanto, consubstanciaria abuso de direito, e a manutenção da sentença destoaria das decisões desta Corte ao longo de todo período eleitoral do ano de 2020, em evidente e injustificável desequilíbrio de tratamento, pois todos aqueles pretensos candidatos que intentaram comprovar filiação partidária nos mesmos moldes da recorrida receberam o juízo de indeferimento do registro de candidatura.

 

Ou seja, demonstrada a inviabilidade da exegese defendida pela embargante, a qual redundaria em injustificável benefício de tratamento. As alegadas “realidades fáticas e jurídicas” trazidas pela embargante fizeram parte de inúmeros pretensos candidatos que, em idênticas situações, também tiveram julgamento de indeferimento do pedido de registro de candidatura.

E o mesmo ocorreu em relação à valoração da prova testemunhal para fins de comprovação do vínculo partidário – inviável, até do ponto de vista lógico, assunto para o qual se apontou precedente específico do e. TSE, acompanhado do rol de julgados no mesmo sentido:

Aliás, o TSE entende que a prova testemunhal não é, sequer em tese, apta a comprovar filiação partidária, de modo que o indeferimento de sua produção não implica cerceamento de defesa, ante a sua inutilidade:

Filiação partidária. Ausência de comprovação. 1. Se o Tribunal de origem considerou que os documentos apresentados pela candidata são insuficientes para se comprovar a filiação partidária, a revisão de tal entendimento demandaria o revolvimento do contexto fático-probatório, vedado na instância extraordinária, a teor das Súmulas 279 do Supremo Tribunal Federal e 7 do Superior Tribunal de Justiça. 2. Na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a ficha de filiação partidária, mensagens eletrônicas e declarações de outros filiados, por se tratar de documentos unilaterais, não servem para a prova do vínculo partidário. 3. Segundo o entendimento desta Corte, o indeferimento de produção de provas testemunhais para a comprovação de filiação partidária não implica cerceamento de defesa [...]”

(Ac. de 30.9.2014 no AgR-REspe nº 186711, rel. Min. Henrique Neves; no mesmo sentido o Ac. de 23.9.2014 no AgR-REspe nº 150925, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura e o Ac de 6.10.2010 no AgR-Respe nº 338745, rel. Min. Aldir Passarinho Junior.)

 

Às decisões judiciais cabe, por óbvio, o cumprimento do constitucional dever de fundamentação; contudo, desnecessário que aduza os fundamentos que a parte desejaria ver abordados, mas sim apenas aqueles imprescindíveis ao deslinde do feito.

Nítido está, dessarte, que o caminho da embargante há de ser o recurso à instância superior, pois, na realidade, a insurgência está voltada ao mérito do julgamento, e não por quaisquer dos vícios ensejadores de oposição.

 

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.