REl - 0600282-90.2020.6.21.0164 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/12/2020 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e adequado, motivo pelo qual dele conheço.

No mérito, cuida-se de analisar a similaridade entre os slogans adotados pela recorrente e pela recorrida, concorrentes ao cargo de prefeito do Município de Pelotas – RS.

A sentença foi no seguinte sentido (ID 9127233):

 

ELEIÇÕES 2020 ADOLFO ANTÔNIO FETTER JÚNIOR – COLIGAÇÃO JUNTOS POR PELOTAS, qualificada na inicial, ajuizou a presente em face de COLIGAÇÃO VAMOS EM FRENTE PELOTAS, dizendo: a representada incorreu, e segue na prática, em ilícito eleitoral ao apresentar peça gráfica, ¨perfurites¨ e outros, cujo ¨slogan¨ foi plagiado da peticionária; desde o primeiro programa a peça publicitária da peticionária termina com a seguinte frase: ¨(Fetter) fez muito, vai fazer mais; também no ¨jingle¨ da peticionária, tal frase é sempre reprisada, com pequena alteração; a frase faz parte do refrão da música principal da peticionária; o ¨slogan¨ de campanha é fruto de árduo trabalho de publicidade, com vistas a representar e vincular o candidato à dada ideia/imagem; a seu turno, desde as primeiras aparições em televisão e redes sociais, a representada ou a Prefeita lançam mão do ¨slogan¨: ¨Usa a razão, ouve o coração¨; a frase também surge em página no ¨Facebook¨ e em ¨jingle¨; na data de hoje, 18.10.2020, a representada promoveu ¨adesivaço¨, espalhando material entre apoiadores e cabos eleitorais; ali se distribuiu material publicitário irregular, já que plagiado e copiado da peticionária; mudando o ¨slogan¨ original e plagiando, a representada agora diz: ¨já fez muito, vai fazer mais¨; assim a representada somente acrescentou a palavra ¨já¨; a legislação veda condutas que contenham mensagens subliminares e induzam o eleitor a atrelar uma situação à outra; a representada deseja confundir ou induzir em erro o eleitor; transcreveu legislação; o CONAR, órgão regulamentador da propaganda no País, condena, em seu Código de Auto-Regulamentação Publicitária, anúncio que se baseie em plágio ou imitação; trata-se de preservar a originalidade da marca, evitando proposital confusão; nítida a má-fé da representada; presente inclusive a propriedade intelectual da equipe publicitária; dá-se indevida apropriação de marca; fica no imaginário do eleitor que as realizações de ¨Fetter¨ foram feitas por ¨Paula¨; imperiosa tutela de urgência, recolhendo-se todo o material de campanha com a irregularidade e impedindo-se a veiculação em programas ou redes sociais; necessária a fixação de multa. Requereu: tutela de urgência; caso prossiga o uso, retratação no programa eleitoral da representada; e procedência, com multa. Juntou procuração. Determinouse manifestação da representada, em vinte e quatro horas, e, após, vista ao M.P.E.. Intimada, a representada, qualificada na peça, contestou: incomprovado o plágio; tal merece investigação mais profunda; ausente promoção de marca ou produto e/ou conduta de causar na opinião pública estados mentais, emocionais e passionais; acosta ¨e-mails¨ trocados com a empresa que confeccionou os adesivos perfurados, mostrando que o pedido ocorreu em 05.10.2020, dias antes de aparecer em televisão do ¨slogan¨ da representante; descabido portanto falar em cópia ou plágio; a data de confecção do material publicitário deu-se em 24.09.2020; a peticionária está valendose de dois ¨slogans¨ de campanha: ¨já fez muito vai fazer muito mais¨ e ¨usa a razão ouve o coração¨; ainda no horário eleitoral gratuito também se usa um terceiro ¨slogan¨: ¨foi a Paula que fez¨; o uso de frase de muita semelhança constitui mera coincidência; as partes apresentam Prefeita, concorrendo à reeleição, e ex-Prefeito, que deseja voltar ao cargo; normal que ambos tenham conquistas nas gestões e desejem enfatizar que mais farão; inaceitável tutela de urgência à falta de ilegalidade; inexistem peças com mensagem subliminar ou disfarçada; o ¨slogan¨ em tela deixou de ser usado, sendo substituído pelo terceiro. Pleiteou desacolhimento da liminar e improcedência. Acostou procuração. Sobreveio manifestação da representante: se anterior seu ¨slogan¨, por que a representada deixou de ofertar representação?; o primeiro ¨slogan¨ da representada era totalmente diverso. Deu parecer o M.P.. É o relatório. Na inicial a representante argumenta que a situação afronta a regra do art. 44, § 2º, da Lei nº 9.504/97, que diz: ¨No horário reservado para a propaganda eleitoral, não se permitirá utilização comercial ou propaganda realizada com a intenção, ainda que disfarçada ou subliminar, de promover marca ou produto¨. Também aduziu que ocorreu ofensa à norma do art. 242, do Código Eleitoral, que fala: ¨A propaganda, qualquer que seja a sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo empregar meios publicitários destinados a criar artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais.¨ Por fim aditou que a conduta feriu o Código de Auto-Regulamentação Publicitária, que nos arts. 38, 41 e 42 dispõe: ¨Em toda a atividade publicitária serão respeitados os direitos autorais nela envolvidos, inclusive dos intérpretes e os de reprodução. Este Código protege a criatividade e a originalidade e condena o anúncio que tenha por base o plágio ou imitação, ressalvados os casos em que a imitação é comprovadamente um deliberado e evidente artifício criativo. Será igualmente condenado o anúncio que configure uma confusão proposital com qualquer peça de criação anterior.¨. De logo se afirme que nos ¨slogans¨ da campanha da representada não se vê, de qualquer modo, intenção, ainda que disfarçada ou subliminar, de promoção de marca ou produto, e, mais, a busca de criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais. Atente-se ao parecer do eminente Dr. Promotor de Justiça Eleitoral. Sua Excelência ponderou: ¨… Ao nosso sentir, a causa está madura para ser julgada ante aquilo da matéria trazida aos autos que está afeto à competência da Justiça Eleitoral. E, diga-se, a celeridade deve nortear os processos de representação eleitoral que seguem o rito do art.96 e seguintes da LE. Como é sabido, questões envolvendo direito autoral não são de competência da Justiça Eleitoral, mas sim da Justiça Comum. Tem-se que a Justiça Eleitoral deve se manifestar quando tal questão repercutir no âmbito eleitoral, no processo eleitoral. Aqui, se aduz que o alegado plágio do slogan de campanha eleitoral feriu a regra do art.242 do CE. Então, ao nosso sentir, é essa a questão a ser enfrentada. Não se discute, porque óbvia, a enorme similitude entre as frases utilizadas nas duas campanhas eleitorais. A norma contida no art. 242 do Código Eleitoral contém cláusula geral abstrata, sujeita a todo tipo de interpretação, tendo em vista a abertura hermenêutica que se nos oferece a expressão ‘meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais’; Na esteira, tal regra legal é reproduzida no art.10, ‘caput’, da Resolução 23.610/19. Mas veja-se o que diz o §1º deste art.10: ‘§ 1º A restrição ao emprego de meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais e passionais não pode ser interpretada de forma a inviabilizar a publicidade das candidaturas ou embaraçar a crítica de natureza política, devendo-se proteger, no maior grau possível, a liberdade de pensamento e expressão.’ Isso significa que não se pode utilizar o art.242 do CE de forma generalizada, mediante uma interpretação ampla e que, justamente, venha a inviabilizar a propaganda eleitoral. A utilização do art.242 do CE para inibir propaganda eleitoral deve ser feita com muita parcimônia, em casos onde perfeitamente demonstrada criação de um estado emocional ou mental que cause consequências nefastas e prejuízos aferíveis de forma induvidosa, até por que toda publicidade, toda propaganda tem como objetivo criar estados mentais. No caso em tela, considerando um dado relevante da realidade, qual seja o de que ambos os candidatos exerceram – a candidata Paula ainda exerce – o cargo de prefeito(a), normal que ambos queiram passar ao eleitor mensagens semelhantes, dizendo que já fizeram e que podem fazer mais. E, ao nosso sentir, a utilização de slogans nesse sentido, ainda que quase iguais, não afeta o discernimento dos eleitores, que têm bem presente que ambos exerceram o cargo. E cada propaganda está bem individuada por outros elementos. Enfim, não se entende esteja delineada situação que aponte para a infringência do art.242 do CE. E, repita-se, a questão da violação do direito autoral em si a partir do alegado plágio diz respeito à Justiça Comum em ação onde, inclusive, a legitimidade ativa ‘ad causam’ seria da empresa publicitária que criou o slogan por não verificar qualquer ilegalidade, o Ministério Público opina pela improcedência ...¨. Comunga-se do entendimento do Ministério Público Eleitoral. Ausente situação de afronta à legislação eleitoral em vigor. Bem dito nos autos que concorrem, entre os onze postulantes ao cargo de Prefeito Municipal, a atual Prefeita, buscando reeleição, e um ex-Prefeito Municipal, que pretende o retorno ao Paço. Natural que gestores municipais enfatizem o que, em suas visões, foram realizações positivas e reforcem a ideia de que, se aprovados nas urnas, mais farão pelos munícipes. Fosse outra situação, talvez a solução devesse ser diversa. Imagine-se alguém que se lance a Prefeito, sem qualquer experiência anterior em gestão pública, e que, vendo um ¨slogan¨ similar ao ora em discussão, monte sua campanha em termos parecidos, como: ¨Eu já fiz e, se eleito, tanto mais farei¨. Restaria claro aí um inaceitável oportunismo eleitoral, já que, objetivamente, tal pretendente, ao menos na Administração Pública, não atuara. Indesmentivelmente os ¨slogans¨ ressaltados na inicial são muito semelhantes. A legislação eleitoral em vigor sobreleva a mínima interferência da Justiça Eleitoral na propaganda, com vistas a proporcionar ao máximo a liberdade de expressão e pensamento, a não inviabilizar a publicidade, e a não embaraçar as críticas de natureza política. Também veio à discussão, de modo subsidiário, que a representada criou antes o ¨slogan¨ e que teria a propriedade intelectual a respeito. Disse bem o Dr. Promotor de Justiça Eleitoral que tal discussão, se judicializada, deveria ir à Justiça Comum, pois tema de direito autoral. Alguma ação da Justiça Eleitoral seria possível se, em face dos ¨slogans¨, o eleitor ficasse perplexo, embaraçado ou confuso. Não é o caso! Tais candidatos são largamente conhecidos na sociedade local e a campanha de ambos enfatiza suas trajetórias, independentemente de ¨jingles¨, músicas, ou ¨slogans¨. Isto posto, JULGO IMPROCEDENTE a representação. Sem sucumbência conforme entendimento do Colendo TSE.

 

Em suas razões, a recorrente postula a aplicação do art. 242 do Código Eleitoral, que assim dispõe:

Art. 242. A propaganda, qualquer que seja a sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais. (Redação dada pela Lei nº 7.476, de 15.5.1986)

Parágrafo único. Sem prejuízo do processo e das penas cominadas, a Justiça Eleitoral adotará medidas para fazer impedir ou cessar imediatamente a propaganda realizada com infração do disposto neste artigo.

 

O dispositivo não veda, expressamente, que os candidatos possam utilizar, em sua propaganda eleitoral, palavras, projetos e promessas semelhantes a de outros concorrentes. Não havendo vedação expressa, deve preponderar a liberdade de expressão e a autonomia privada.

É comum e natural coligações e candidatos utilizarem expressões similares em suas campanhas, visto que, em regra, todos os candidatos pretendem demonstrar suas virtudes para a conquista de votos do eleitorado. Quanto a isto, inexiste qualquer vedação.

Ademais, refoge à competência da Justiça Eleitoral examinar a anterioridade da utilização de determinada expressão na campanha e se, no caso concreto, haveria alguma violação de direito autoral. O exame da matéria é da Justiça Comum.

É natural e recomendável que os candidatos apresentem aos eleitores seu histórico de experiência, currículo profissional e principais qualidades. Todas as informações que possam contribuir para que o eleitorado conheça a trajetória dos candidatos devem ser aceitas e estimuladas, desde que não contrariem a legislação eleitoral. Análise sobre eventual “plágio” deve ocorrer no âmbito da Justiça Comum.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença em sua íntegra.