REl - 0600202-32.2020.6.21.0066 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/12/2020 às 14:00

VOTO

Passo ao enfrentamento da preliminar de ilegitimidade ativa ad causam suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral, e adianto que prospera.

Conforme narrado pelo douto Procurador Regional Eleitoral substituto, “a representação foi proposta, isoladamente, pelo Partido Trabalhista Brasileiro – PTB, em que pese, no tocante à eleição majoritária no município de Canoas, se encontrar coligado com o PL, PDT, REDE, MDB e DEM, na coligação denominada Pra Canoas Seguir em Frente, cujo registro do DRAP (Rcand 0600360-77.2020.6.21.0134) foi deferido em 06.10.2020, decisão transitada em julgado”.

A situação sob análise fere a disposição prevista no art. 6º, § 4º, da Lei n. 9.504/97, segundo a qual o partido político coligado somente detém legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral quando questionar a validade da própria coligação, durante o período compreendido entre a data da convenção e o termo final do prazo para a impugnação do registro de candidatos.

A questão não se refere exclusivamente à ilegitimidade para a causa, mas também à falta de interesse processual do partido isolado para o ajuizamento de representação contra a propaganda eleitoral do cargo majoritário (art. 17, do CPC), para o qual tem interesse apenas a coligação formada para a disputa majoritária.

Essa questão foi recentemente enfrentada por esta Corte, em 27.10.2020, no julgamento recurso REL 060034645, da relatoria Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. FACEBOOK E INSTAGRAM. INDEFERIMENTO. CONTRARRAZÕES. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE ATIVA. PARTIDO POLÍTICO COLIGADO. ATUAÇÃO ISOLADA. ACOLHIMENTO. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. (…) 2. Preliminar de ilegitimidade ativa. Agremiação integrante de coligação. Nos termos do disposto no art. 6º, § 1º, da Lei n. 9.504/97, a coligação deve funcionar como um só partido no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses interpartidários. Em seu § 4º, o qual foi incluído pela Lei n. 12.034/09, é expresso em determinar que, quando coligado, o partido político detém legitimidade para atuar de forma isolada perante a Justiça Eleitoral exclusivamente para questionar a validade da própria coligação. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e desta Corte é uníssona no sentido de entender que partido político, quando coligado, não possui legitimidade para atuar isoladamente no processo eleitoral. Sendo a demanda atinente à eleição majoritária, em que o partido se encontra coligado, é patente sua ilegitimidade ad causam, impondo-se a extinção do feito, sem julgamento do mérito. 3. Acolhida a preliminar. Extinção sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do CPC.

(TRE-RS - RE: 060034645 CAPÃO DA CANOA - RS, Relator: DES. ELEITORAL SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 27.10.2020, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 29.10.2020.) - Grifei.

 

Ao pesquisar sobre o tema, verifiquei que, a partir de 2005, o TSE consolidou o entendimento de que até mesmo para as ações cassatórias o partido coligado não tem legitimidade para atuar isoladamente no polo ativo, assentando que "é nula a investigação suscitada sem aprovação de todos os partidos coligados". Essa diretriz se fundamenta numa questão bem relevante: se o partido se coligou, deve haver um consenso nas ações eleitorais que ajuíza, o qual é demonstrado pela presença da coligação na condição de autora da ação.

Investigação Judicial Eleitoral. Abuso do poder econômico. Art. 22 da LC nº 64/90. Propositura. Presidente. Partido político. Participação. Coligação. Ilegitimidade. Aplicação. Art. 6º, § 1º, da Lei nº 9.504/97. Legitimidade.

Presidente. Partido político. Atuação. Justiça Eleitoral. Hipótese. Ajuizamento. Ação. Condição. Pessoa física. Comprovação. Dirigente partidário. Atuação. Ministério Público. Possibilidade.

1) A representação proposta, mesmo embasada no art. 1º, inciso I, alínea h, e art. 22 da LC nº 64/90, deu-se em meio ao processo eleitoral, assim, a invocar-se a aplicação do art. 6º, § 1º, da Lei nº 9.504/97, não podendo o presidente do partido agir isoladamente.

2) "A unicidade da coligação resulta de sua própria natureza, não contrariando qualquer dispositivo da Lei Complementar nº 64/90. O art. 6º, § 1º, da Lei nº 9.504/97, disciplina as relações externas das coligações. É nula a investigação suscitada sem aprovação de todos os partidos coligados" (Acórdão nº 25.002, de 1º.3.2005, rel. Min. Humberto Gomes de Barros).

3) Agravo a que se nega provimento.

(TSE, AGRAVO DE INSTRUMENTO n. 5485, Acórdão de , Relator Min. Caputo Bastos, Publicação: DJ - Diário de justiça, Volume I, Data 02.09.2005, Página 154.) - Grifei.

 

RECURSO ESPECIAL. Eleições 2004. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Partido coligado. Ilegitimidade ativa. Provimento.

A coligação aperfeiçoa-se com o acordo de vontade das agremiações políticas envolvidas e com a homologação deste pela Justiça Eleitoral. A partir de tal acordo, considera-se que os partidos estão coligados. O partido coligado não possui legitimidade para, isoladamente, propor Investigação Judicial.

(TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 25015, Acórdão de , Relator Min. Gomes de Barros, Publicação: DJ - Diário de justiça, Volume 1, Data 30.09.2005, Página 122.) - Grifei.

 

Em 2017, esse raciocínio foi reforçado por novo acórdão do TSE afirmando, de modo categórico, que partido coligado não pode ajuizar ação, de modo isolado, envolvendo candidaturas ao pleito para o qual se coligou. Colaciono precedentes:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. VEREADOR. DECISÃO REGIONAL. ILEGITIMIDADE ATIVA. PARTIDO POLÍTICO COLIGADO. PROPOSITURA DA DEMANDA NO CURSO DO PROCESSO ELEITORAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.

1. O Tribunal de origem asseverou que o partido integrou coligação tanto para o pleito proporcional como para o majoritário, propondo, individualmente, a ação eleitoral ao final de setembro do ano da eleição municipal, ou seja, durante o curso do processo eleitoral, o que evidencia a sua ilegitimidade ativa.

2. A jurisprudência desta Corte Superior é pacífica no sentido de que o partido político coligado não tem legitimidade para atuar de forma isolada no curso do processo eleitoral, o que abrange, inclusive, as ações eleitorais de cassação. Tal capacidade processual somente se restabelece após o advento do pleito e em observância à preservação do interesse público. Precedentes.

3. O § 1º do art. 6º da Lei das Eleições dispõe que: “A coligação terá denominação própria, que poderá ser a junção de todas as siglas dos partidos que a integram, sendo a ela atribuídas as prerrogativas e obrigações de partido político no que se refere ao processo eleitoral, e devendo funcionar como um só partido no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses interpartidários”.

4. Ainda que a legitimidade do partido seja a regra, nos termos dos arts. 22, caput, da LC 64/90 e 96, caput, da Lei 9.504/97, fato é que, caso seja celebrada coligação para atuação no processo eleitoral, a legitimidade, durante a campanha, fica reservada a ela, e não aos partidos coligados, de forma individual, considerando, notadamente, o acordo de vontades firmado para a aglutinação de legendas e a comunhão de interesses envolvidos durante o período crítico eleitoral.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE, Agravo de Instrumento n. 50355, Acórdão, Relator Min. Admar Gonzaga, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 186, Data 26.09.2017, Página 7.) - Grifei.

 

Portanto, considerando que em face da promulgação da Emenda Constitucional n. 97/17 está proibida a formação de coligação para a eleição proporcional, o partido político que se coligou apenas para pleito majoritário de 2020 tem legitimidade para agir de modo isolado somente nas ações que envolvem a eleição proporcional (TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 156388, Acórdão, Relator Min. Herman Benjamin, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 199, Data 17.10.2016, Página 35-36).

Anoto que, para as eleições 2020, observei que TRE-SE, TRE-PR e TRE-SP já manifestaram o entendimento de que o partido coligado para a majoritária apenas pode ajuizar, isoladamente, representação contra a propaganda da eleição proporcional, e não detém legitimidade e interesse para atuar isoladamente nas ações contra a propaganda da majoritária no pleito para o qual se coligou, por força da regra prevista no art. 6º, § 4º, da Lei n. 9.504/97:

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS. PARTICIPAÇÃO ATIVA NO PROCESSO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL. MATERIAL DE CAMPANHA. REPRESENTAÇÃO PROPOSTA POR PARTIDO ISOLADO. PARTIDO QUE INTEGRAVA UMA COLIGAÇÃO À ÉPOCA DA PROPOSITURA. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA DA AGREMIAÇÃO REPRESENTANTE. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. EXTINÇÃO DA AÇÃO DE TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE 0600374-64.2020.6.25.0000. 1. O art. 6º, § 4º, da Lei nº 9.504/1997 prescreve que o partido político coligado somente possui legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral quando questionar a validade da própria coligação, durante o período compreendido entre a data da convenção e o termo final do prazo para a impugnação do registro de candidatos. 2. No caso sob exame, considerando que se trata de pleito majoritário e que a representação eleitoral foi ajuizada em 29 de setembro do corrente ano e que, à época, a coligação entre o Partido Social Cristão - PSC, ora recorrido, e o Partido Liberal - PL já estava devidamente formada (coligação "Pra Continuar, Pra Avançar!"), conforme consulta pública do DivulgaCand, flagrante a ausência de legitimidade do Partido Social Cristão - PSC. 3. Extinção do feito, sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa e extinção da Ação de Tutela Cautelar Antecedente 0600374-64.2020.6.25.0000, por falta de interesse processual, ambos com fulcro no art. 485, VI, do Código de Processo Civil.

(TRE-SE - RE: 060036672 CAPELA - SE, Relator: EDIVALDO DOS SANTOS, Data de Julgamento: 03.11.2020, Data de Publicação: PSESS - Sessão Plenária, Data 03.11.2020.) - Grifei.

 

RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO POR PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR – ELEIÇÕES 2020

Ilegitimidade ativa de coligação majoritária para discutir questões envolvendo o pleito proporcional – Precedentes. Processo extinto, sem resolução do mérito, restando prejudicado o recurso da representada.

(TRE-SP, RECURSO ELEITORAL n. 060030077, Acórdão, Relator Min. Afonso Celso da Silva, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 13.11.2020.) - Grifei.

 

RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. IRREGULARIDADE EM PROPAGANDA ELEITORAL PARA O CARGO DE VEREADOR. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. ILEGITIMIDADE ATIVA DA COLIGAÇÃO FORMADA PARA A DISPUTA DO PLEITO MAJORITÁRIO PARA DISCUTIR PROPAGANDA ENVOLVENDO A ELEIÇÃO PROPORCIONAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. PRELIMINAR ACOLHIDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM A RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO PREJUDICADO.

(TRE-SP, RECURSO ELEITORAL n. 060029251, Acórdão, Relator Min. PAULO SERGIO BRANT DE CARVALHO GALIZIA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 04.11.2020.) - Grifei.

 

ELEIÇÕES 2020 - RECURSO ELEITORAL- REPRESENTAÇÃO ELEITORAL - PRELIMINAR - ILEGITIMIDADE ATIVA DE PARTIDO ISOLADO EM RAZÃO DE TER SE COLIGADO EM ELEIÇÃO MAJORITÁRIA - IMPOSSIBILIDADE DE COLIGAÇÃO PARA ELEIÇÕES PROPORCIONAIS - REJEIÇÃO - MÉRITO - VEICULAÇÃO DE OUTDOORS - PUBLICIDADE DE COMÉRCIO DE PROPRIEDADE DE PRÉ-CANDIDATA - AUSÊNCIA DE CONTEÚDO ELEITORAL - INDIFERENTE ELEITORAL - RECURSO DESPROVIDO.

1. Na impossibilidade de celebração de coligações para o pleito proporcional municipal de 2020, em face da promulgação da Emenda Constitucional nº 97/2017, o partido político, isoladamente, passa a ser dotado de legitimação ativa para a propositura de Representações Eleitorais relacionadas às eleições proporcionais, ainda que tenha se coligado para as eleições majoritárias.

(...)

4. Recurso desprovido.

(TRE-PR, RECURSO ELEITORAL n 0600152-33.2020.6.16.0199, ACÓRDÃO n 56373 de 05.10.2020, Relator VITOR ROBERTO SILVA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 07.10.2020.) - Grifei.

 

Portanto, na forma do art. 485, inc. VI, do CPC, é forçoso reconhecer a ilegitimidade ativa do recorrente, Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) de Canoas/RS, bem como a ausência de interesse para ajuizar a presente representação, visto que, apesar de coligado, atua no processo de forma isolada.

 

ANTE O EXPOSTO, acolho a matéria preliminar e VOTO pela extinção do feito, sem resolução de mérito, por ausência de legitimidade e interesse do recorrente, nos termos do art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil.