REl - 0600049-79.2020.6.21.0007 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/12/2020 às 14:00

 VOTO

Os embargos de declaração são adequados, tempestivos e comportam conhecimento.

No mérito, a Procuradoria Regional Eleitoral sustenta que, no recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral em primeiro grau e no parecer escrito lançado aos autos, houve menção expressa à incidência, no caso, do art. 15 da LC n. 64/90, dispositivo que não restou referido no acórdão, sendo, portanto, necessário o seu enfrentamento explícito pela Corte a fim de viabilizar o acesso à instância superior.

Da mesma forma, alega que não constou na decisão a análise sobre a interpretação do art. 257, § 2º, do Código Eleitoral e dos arts. 15 e 26-C da LC n. 64/90, em conformidade com o art. 14, § 9º, da CF/88, expressamente deduzida no parecer ministerial acostado nos autos.

Transcrevo a argumentação vertida dos aclaratórios opostos:

No caso em apreço, nota-se que, no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, houve referência expressa à incidência, no caso, do art. 15 da Lei Complementar nº 64/90, conforme segue (grifos nossos):

Os recursos eleitorais, de regra, não possuem efeito suspensivo. Porém, para resguardar o direito de candidatar-se na eleição que é objeto do processo, bem como assegurar o exercício do mandato eletivo (derivado da soberania popular), foi conferido efeito suspensivo ao recurso de decisões que importem em cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo.

No presente caso, o único recurso que deveria ter efeito suspensivo seria o do Deputado Luiz Augusto Lara, pois somente sobre esse recaiu a determinação de perda do mandato.

O ora recorrido sofreu apenas sanção pecuniária e a declaração de inelegibilidade futura, logo não atende à finalidade da norma conferir efeito suspensivo ao recurso que o mesmo interpôs da decisão dessa egrégia Corte. Não foi para essa hipótese que restou instituído o efeito suspensivo, como ficou claro do texto legal.

Atribuir tal interpretação extensiva à norma contraria um princípio basilar da hermenêutica, que é o de que as exceções devem ser interpretadas de maneira estrita. E tal norma (§ 2º) constitui exceção à regra geral prevista no caput do art. 257 do CE, que é a de que “os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo”.

Inclusive, no tocante à vigência imediata das causas de inelegibilidade decorrentes do acórdão do TRE-RS existe norma expressa afastando o efeito suspensivo de eventual recurso, que é o art. 15 da LC 64/90, cuja redação é a seguinte:

Art. 15. Transitada em julgado ou publicada a decisão proferida por órgão colegiado que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado registro, ou cancelado, se já tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se já expedido.

E este art. 15 é complementado pelo art. 26-C do mesmo diploma legal, sobre o qual discorreremos melhor à frente.

Assim, os dispositivos legais acima referidos, instituídos para finalidades diversas, se conjugam para levar ao entendimento da suspensão do acórdão apenas em relação ao recorrente que sofreu cassação do mandato.

Não olvidemos que estamos tratando de partes distintas, que interpuseram distintos recursos. Assim, o recurso de Luís Augusto Lara está amparado pelo efeito suspensivo do recurso no que tange aos efeitos do acórdão a ele dirigidos, mas para o recurso de Divaldo Lara, cuja condenação não prevê qualquer das hipóteses elencadas no § 2º do art. 257 do CE, deve valer a regra geral (art. 257, caput, do CE e art. 15 da LC 64/90) de que não possui efeito suspensivo.

O art. 15 da LC 64/90 também foi citado nas razões recursais do Ministério Público Eleitoral (ID 9049983):

Assim, considerando que ao recorrido foi aplicada pena de multa e inelegibilidade por órgão colegiado, invariavelmente o efeito de tal decisão é imediato, em consonância com o já citado art. 15 da Lei Complementar nº 64/1990, restando afastada, a priori, a possibilidade de aplicação do disposto no art. 257, §2º, do Código Eleitoral, pois embora eventual Recurso Ordinário interposto pelo requerido devolva integralmente ao TSE o conhecimento dos fatos, nenhum dos efeitos expressos dispostos neste último dispositivo (cassação de registro, afastamento do titular ou perda do mandato) lhe poderia ser aplicado, pois não participou do pleito em questão (Eleições de 2018).

Tal dispositivo, contudo, não recebeu nenhuma menção no acórdão prolatado, sendo necessário o seu enfrentamento explícito pela Corte originária a fim de viabilizar o acesso ao TSE.

 

Outrossim, houve, no parecer ministerial, menção ao art. 14, § 9º, da Constituição Federal, conforme segue:

RECURSO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA PARA CARGO DE PREFEITO. ELEIÇÕES 2020. REGISTRO DEFERIDO. CONDENAÇÃO POR CONDUTA VEDADA E ABUSO DE PODER EM DECISÃO COLEGIADA DO TRE-RS. AUSÊNCIA DE EFEITO SUSPENSIVO AO RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO DO ACÓRDÃO QUE ENSEJOU AS CAUSAS DE INELEGIBILIDADE. COMPREENSÃO DOS ART. 257, § 2º, DO CÓDIGO ELEITORAL, BEM COMO ARTS. 15 E 26-C, DA LC 64/90, INTERPRETADOS EM CONFORMIDADE COM O ART. 14, § 9º, DA CF/88 E O PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PRESENÇA DAS CAUSAS DE INELEGIBILIDADE PREVISTAS NAS ALÍNEAS “D” E “J” DO INCISO I, DO ART. 1.º, DA LC 64/90. PARECER PELO CONHECIMENTO E PROVIMENTO DOS RECURSOS, PARA QUE SEJA INDEFERIDO O REGISTRO.

(...)

Primeiramente, cumpre referir que estão presentes, no caso, as causas de inelegibilidade previstas no art. 1.º, inciso I, alíneas “d” e “j”, da Lei Complementar n.º 64/90, com a redação dada pela LC n.º 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), que neste ponto conferem efetividade ao disposto no art. 14, § 9.º, da Constituição Federal, in verbis:

 

Constituição Federal

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

[...]

§ 9.º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

LC 64/90

Art. 1.º São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

[…]

d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes;

[...]

j) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação do registro ou do diploma, pelo prazo de 8 (oito) anos a contar da eleição;

(Grifo acrescido)

 

O prequestionamento dos dispositivos em questão se torna indispensável à eventual propositura de recurso às instâncias extraordinárias, visto que conforma, no plano constitucional, todo o estatuto legal das inelegibilidades.

 

A despeito dos relevantes fundamentos deduzidos, entendo que não assiste razão à Procuradoria Regional Eleitoral, pois o acórdão analisou de forma detida e minudente os diversos posicionamentos em relação aos efeitos da interposição do recurso ordinário eleitoral, à luz do art. 257, § 2º, do Código Eleitoral, e a compatibilidade desses entendimentos com a previsão constante no art. 26-C da LC n. 64/90.

Tal análise ocorreu justamente por força dos efeitos imediatos do acórdão condenatório colegiado proferido em sede de ação de investigação judicial eleitoral. Assim, embora sem menção explícita ao art. 15 da LC n. 64/90, sua vigência e eficácia são reconhecidas no aresto, posto que se trata de premissa essencial para a correta compreensão da sistemática das hipóteses legais de suspensão das inelegibilidades.

Da mesma forma, houve o suficiente exame dos dispositivos legais pertinentes à solução do caso, especialmente aqueles previstos na LC n. 64/90, aos quais remete o teor do art. 14, § 9º, da CF/88, adotando-se a linha de entendimento acolhida pela jurisprudência então reconhecida como predominante no TSE quanto à conjugação do art. 257, § 2º, do Código Eleitoral com o art. 26-C da LC n. 64/90, suficiente para se afastar tese interpretativa diversa, ainda que baseada em dispositivo ou princípio constitucional.

Consoante cediço, os embargos de declaração são considerados pela doutrina como recurso de fundamentação vinculada, porquanto os casos previstos para sua oposição são específicos, isso é, somente são admissíveis quando houver obscuridade, contradição ou omissão de ponto controvertido sobre as quais deveria o juiz ou o tribunal,  necessariamente, ter se pronunciado ou, ainda, erro material a ser corrigido.

No caso dos autos, todavia, consoante explanado, não há omissão a ser sanada, ainda que para fins de prequestionamento, tendo a decisão embargada apreciado todas as questões relevantes ao deslinde da controvérsia e capazes de infirmar as teses deduzidas pelo embargante, nos limites do que foi submetido ao órgão julgador.

No que diz respeito ao alegado prequestionamento, a jurisprudência entende pela desnecessidade de que o órgão julgador se manifeste, expressamente, a respeito de todas as teses e dispositivos legais que tenham sido indicados pelas partes em suas razões quando não se mostrem capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão.

A esse respeito, é a expressa dicção do art. 489, inc. III, do CPC, in verbis:

Art. 489. São elementos essenciais da sentença: [...] § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

[...].

IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

 

Nessa senda, mesmo que para fins de prequestionamento, o órgão julgador não está obrigado a se manifestar sobre todos os textos legais e constitucionais aduzidos pelas partes, assim como sobre todos os fatos elencados pelo recorrente, bastando que se pronuncie sobre o que se mostra necessário e suficiente à fundamentação do decisum e ao afastamento da tese em contrário.

Nesse sentido, elenco julgados do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/1973. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO. PREQUESTIONAMENTO. QUESTÃO DEBATIDA. MENÇÃO EXPRESSA DO DISPOSITIVO LEGAL. DESNECESSIDADE.

1. O acórdão recorrido abordou, de forma fundamentada, todos os pontos essenciais para o deslinde da controvérsia, razão pela qual não há o que se falar na suscitada ocorrência de violação do art. 535 do Código de Processo Civil de 1973.

2. O prequestionamento não exige que haja menção expressa dos dispositivos infraconstitucionais tidos como violados, entretanto, é imprescindível que no aresto recorrido a questão tenha sido discutida e decidida fundamentadamente, como ocorreu no caso em apreço.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp 1354686 / SP – Relator Ministro BENEDITO GONÇALVES - PRIMEIRA TURMA - Data do Julgamento: 16.02.2017 – Publicação: 03.03.2017.)

 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE, ERRO MATERIAL. AUSÊNCIA.

1. Os embargos de declaração, conforme dispõe o art. 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado, o que não ocorre na hipótese em apreço.

2. O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida.

4. Percebe-se, pois, que o embargante maneja os presentes aclaratórios em virtude, tão somente, de seu inconformismo com a decisão ora atacada, não se divisando, na hipótese, quaisquer dos vícios previstos no art. 1.022 do Código de Processo Civil, a inquinar tal decisum.

5. Embargos de declaração rejeitados.

(EDcl no MS 21315 / DF – Relator Ministra DIVA MALERBI - PRIMEIRA SEÇÃO - Data do Julgamento - 08.06.2016 -Data da Publicação/Fonte - DJe 15.06.2016.)

 

Registro, ainda, que os embargos manejados trazem a lume um elemento jurisprudencial novo, que deve ser especialmente analisado.

Vejamos.

No acórdão ora embargado, após reconhecer as divergências doutrinárias e jurisprudenciais sobre o tema e os judiciosos fundamentos para ambos os posicionamentos, esta Corte acolheu a compreensão de que o efeito previsto no art. 257, § 2º, do Código Eleitoral resulta automaticamente da interposição do recurso ordinário de forma ampla, inclusive sobre a inelegibilidade aplicada ao terceiro não candidato, conforme pronunciado na fundamentação da decisão monocrática proferida pelo eminente Min. Alexandre de Moraes, que negou seguimento à tutela cautelar antecedente n. 0601450-22.2020.6.00.0000, ajuizada por Divaldo Vieira Lara perante o TSE, em razão da ausência de interesse jurídico (ID 9049033).

Como registra o acórdão, naquela ocasião, a despeito de não conceder expressamente a suspensão pleiteada, a decisão da Corte Superior reforçou, por via oblíqua, a força normativa do art. 257, § 2º, do Código Eleitoral como óbice à aplicação das inelegibilidades no caso concreto, razão pela qual acolhi o posicionamento para privilegiar o direito à elegibilidade do candidato.

Entretanto, julgado o feito no dia 09.10.2020, o Tribunal Superior Eleitoral, em sessão do dia posterior (10.10.2020), pôs fim às divergências internas e, no julgamento do RO n. 0608809-63, fixou a orientação plenária no sentido de que "o efeito suspensivo automático referido no art. 257, § 2º do Código Eleitoral limita-se à cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo, não alcançando, portanto, a inelegibilidade".

Assim foi lavrada a certidão do aludido julgamento:

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL Nº 0608809-63.2018.6.19.0000

EMBARGANTE: RENATO COZZOLINO HARB

ADVOGADOS: VINICIUS COZZOLINO ABRAHAO E OUTROS

EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL

ORIGEM: RIO DE JANEIRO - RIO DE JANEIRO

JULGADO EM: 10/11/2020

RELATOR(A): MINISTRO(A) MAURO CAMPBELL MARQUES

PRESIDENTE: MINISTRO(A) LUÍS ROBERTO BARROSO

PROCURADOR(A)-GERAL ELEITORAL: RENATO BRILL DE GOES

ASSESSOR DE PLENÁRIO: JOÃO PAULO OLIVEIRA BARROS

 

DECISÃO

O Tribunal, por unanimidade, recebeu os embargos de declaração como agravo interno, e, por maioria, negou provimento ao recurso, para manter o indeferimento do pedido liminar de suspensão da inelegibilidade, nos termos do voto do Relator. Ainda, por maioria, fixou orientação plenária no sentido de que o efeito suspensivo automático referido no art. 257, § 2º do Código Eleitoral limita-se à cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo, não alcançando, portanto, a inelegibilidade, nos termos propostos pelo Ministro Luís Roberto Barroso (Presidente), vencido o Ministro Sérgio Banhos. Votaram com o Relator os Ministros Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Sérgio Banhos, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão e Luís Roberto Barroso (Presidente).

Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos.

Por ser verdade, firmo a presente.

(Grifei.)

 

O julgado, ainda pendente de publicação, representa, no contexto em que prolatado, clara diretriz para uniformizar a jurisprudência, posto que, não só solucionou o caso concreto, mas pretendeu elidir o dissídio de entendimentos no próprio TSE, expressamente fixando a orientação do Órgão Pleno sobre a matéria.

Porém, apesar da vocação uniformizadora, com a explícita demarcação de uma tese a ensejar a sua observância pelas instâncias inferiores como forma de manutenção da integridade e coerência do sistema, não torna viável o seu conhecimento em sede de embargos de declaração nem possui efeito vinculante.

Com efeito, a tese jurisprudencial restou formada apenas posteriormente ao julgamento de mérito da demanda e, por consequência, foi trazida ao processo apenas por ocasião da oposição dos aclaratórios, em flagrante inovação recursal.

Ademais, não consiste a hipótese em decisão com eficácia vinculante em sentido próprio, ainda que produzida com o intento de orientação plenária da Corte Superior.

Sobre o tema, colho a lição de Alexandre Freitas Câmara ao diferenciar os precedentes vinculantes daqueles meramente persuasivos, na forma como elencados na legislação processual:

De sua parte, o Código de Processo Civil atribui expressamente eficácia vinculante aos acórdãos proferidos no julgamento do incidente de assunção de competência, no incidente de resolução de demandas repetitivas e na apreciação de recursos especiais e extraordinários repetitivos (art. 927, III). Esta eficácia vinculante está expressamente prevista nos arts. 947, § 3º (para o julgamento do incidente de assunção de competência), 985 (para o julgamento do incidente de resolução de demandas repetitivas) e 1.040 (para o julgamento de recurso extraordinário ou especial repetitivo). Pois apenas estes acórdãos (e os enunciados de súmula vinculante, que não são acórdãos nem podem ser tidos por precedentes) têm eficácia vinculante, enquanto os enunciados das súmulas do STF em matéria constitucional e do STJ em matéria infraconstitucional (art. 927, IV) e a orientação do plenário ou do órgão especial (art. 927, V) devem ser vistos como dotados de eficácia meramente persuasiva. E essas diferentes eficácias, como se demonstrará a seguir, resultam da amplitude do contraditório, muito maior nos procedimentos de produção dos padrões decisórios que têm eficácia vinculante. Em outros termos, a formação dos padrões decisórios vinculantes observa uma comparticipação subjetivamente ampliada que a qualifica. E a legitimidade democrática e constitucional de tais padrões decisórios exige, também, uma forma qualificada de deliberação por parte dos órgãos jurisdicionais.

(Levando os padrões decisórios a sério. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 182. Grifei.)

 

Nessa linha de distinção, a jurisprudência formou a compreensão de que a superveniência de julgado sem eficácia vinculante não representa “fato novo” apto a ser conhecido originariamente em embargos de declaração, consoante ilustram as seguintes ementas:

E M E N T A EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. SUPERVENIENTE TESE FIRMADA EM SISTEMA DE PRECEDENTES. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. UNIFICAÇÃO DO DIREITO. CELERIDADE PROCESSUAL. EFEITOS INFRINGENTES. POSSIBILIDADE. DEMAIS VERBAS. REDISCUSSÃO DE TESES. NÃO CABIMENTO - Não se conhece dos embargos de declaração quanto ao aviso prévio, tendo em vista a ausência de discussão quanto a essa verba - Primados do processo como a igualdade, a segurança e a eficiência da prestação jurisdicional impõem que os embargos de declaração sirvam para que o mesmo Órgão judiciário prolator retifique seu pronunciamento visando ajustá-lo àquele consolidado pelo obrigatório sistema de precedentes do E.STJ ou do E.STF (repetitivo ou repercussão geral) ou pelo vinculante entendimento do Pretório Excelso, ainda que supervenientes à decisão embargada. O mesmo não ocorre se a orientação de tribunais superiores for desprovida de força obrigatória ou vinculante, quando então efeitos infringentes em embargos de declaração somente podem ser conferidos em casos de erro, obscuridade, omissão ou contradição (art. 1022 do CPC) - No caso dos autos, a decisão recorrida foi proferida em 04/06/2019 e, posteriormente, o E.STF firmou entendimento no sentido de que “É legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias” (tese fixada no Tema 985 de repercussão geral - RE nº 1072485, Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, Sessão Virtual de 21/08/2020 a 28/08/2020)- É imperativo que a decisão recorrida seja ajustada, em favor da unificação do direito e da celeridade processual, sendo necessário conferir efeitos infringentes aos presentes embargos de declaração no tocante à incidência de contribuições previdenciárias sobre o terço constitucional de férias - O acórdão é claro quanto à incidência de contribuições previdenciárias sobre os valores pagos nos primeiros quinze dias de auxílio-doença e auxílio-acidente, não havendo qualquer omissão, obscuridade ou contradição a ser suprida - São incabíveis os embargos de declaração para fins de prequestionamento a fim de viabilizar a interposição de recurso às superiores instâncias, se não evidenciados os requisitos do art. 1.022 do Código de Processo Civil - Embargos de declaração parcialmente providos, com efeitos infringentes, na parte em que conhecidos.

(TRF-3 - ApelRemNec: 00002553520154036103 SP, Relator: Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, Data de Julgamento: 24.09.2020, 2ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 28.09.2020.)

 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - FATO NOVO - PRECEDENTE STJ. NÃO APLICABILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. 1. O voto condutor do julgamento entendeu pelo afastamento da prescrição no presente caso. A UFRGS apontou recente julgado do Eg. STJ que manteve acórdão prolatado por esta Turma, que trata de matéria idêntica à presente, reconhecendo a prescrição. Em análise mais percuciente das peculiaridades que envolvem a execução do título advindo da ação ordinária n. 97.00.00920-3/RS, entendi pela modificação da posição anteriormente adotada no precedente apontado pela embargante/executada (AC 0024782-50.2009.404.7100), de forma que hodiernamente o entendimento adotado é pelo afastamento da prescrição nas lides que envolvem os título executivos advindos da referida ação ordinária. Vale gizar que o julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça quando da análise do REsp. 1.261.151/RS, de rigor, não ostenta efeito vinculante, razão pela qual a sua invocação não consubstancia motivação suficiente, per se, à modificação do julgado proferido neste caderno processual. 2. Solucionada a lide com espeque no direito aplicável, tem-se por afastada a incidência da legislação em confronto, senão pela total abstração, com as adequações de mister, resultando, assim, prequestionada, sem que isso importe sua violação. 3. Embargos de declaração da UFRGS acolhidos sem efeitos infringentes para tão somente adir aos fundamentos da decisão aclarada os argumentos ora apontados quanto à prescrição e para fins de prequestionamento.

(TRF-4 - ED: 50620516720114047100 RS 5062051-67.2011.4.04.7100, Relator: CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Data de Julgamento: 11.07.2012, TERCEIRA TURMA.) (Grifei.)

 

Caminhando na mesma direção, o TSE, no julgamento dos Embargos de Declaração em Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 060077827/RN, sessão de 11.06.2020, entendeu que a tese jurisprudencial firmada posteriormente à prolação do julgado, sem caráter vinculante, não caracteriza omissão do acórdão, sendo assim ementado:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO INTERNO. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO FEDERAL. ERRO JUDICIÁRIO. RECONHECIMENTO. RETORNO DOS AUTOS. NOVA ANÁLISE. INSURGÊNCIA. TERCEIRO PREJUDICADO. VÍCIOS. INEXISTÊNCIA. REJEIÇÃO. 1. No aresto embargado, em decisum unânime, não se conheceu do agravo interno do embargante, não eleito ao cargo de deputado federal pelo Rio Grande do Norte em 2018, por ausência de legitimidade recursal, haja vista que a sua habilitação como assistente simples no processo de registro de candidatura fora indeferida. 2. Explicitaram-se inúmeros impeditivos para o ingresso na causa, dentre eles, o fato de, na espécie, não haver "polo passivo a ser assistido, na medida em que inexistiu impugnação". Assentou-se, ainda, que o Parquet - parte que em tese se pretende auxiliar - figura no processo apenas como custus legis e, ademais, não recorreu. 3. Assinalou-se, também, ser incabível analisar hipotético prejuízo decorrente do decisum proferido no caso dos autos, pois, nos processos de registro de candidatura, incide o óbice objetivo da Súmula 11/TSE, segundo a qual, "[...] o partido que não o impugnou não tem legitimidade para recorrer da sentença que o deferiu, salvo se se cuidar de matéria constitucional". 4. Quanto ao vício oriundo da determinação de recontagem dos votos atribuídos ao embargado, ressalte-se que, nos termos da jurisprudência desta Corte, não há omissão acerca da matéria de mérito se o recurso anterior nem sequer ultrapassou a barreira da admissibilidade. 5. Descabe conhecer da omissão quanto ao superveniente julgamento do REspe 06012675-53/SC, por se tratar de tese formulada apenas na via aclaratória, a caracterizar indevida inovação recursal. Precedentes. 6. Os alegados vícios denotam propósito de se rediscutir matéria já decidida, providência inviável na via aclaratória. Precedentes. 7. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE - RESPE: 06007782720186200000 NATAL - RN, Relator: Min. Luis Felipe Salomão, Data de Julgamento: 11.06.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 130, Data 01.07.2020.) Grifei.

 

Esclareço que, no aludido julgado, o precedente superveniente dizia respeito ao AgR-REspe n. 0601267-53.2018.6.24.0000/SC, apreciado na sessão de 03.03.2020, no qual o TSE concluiu que o decisum que indefere registro de candidatura pode ser publicado por meio do mural eletrônico, sem a necessidade de intimação pessoal do candidato.

Desse modo, os vícios aduzidos demonstram inconformismo com o juízo veiculado no aresto e propósito de promover novo julgamento da causa, providência que não se coaduna com a sistemática dos embargos declaratórios, devendo o recorrente levar as suas razões para a reforma do julgado à avaliação da instância superior, considerando-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou para fins de prequestionamento, na linha do disposto no art. 1.025 do Código de Processo Civil.

 

Ante o exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.