REl - 0600514-08.2020.6.21.0066 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/11/2020 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas.

O apelo é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais, motivo pelo qual dele conheço.

Quanto ao mérito, verifica-se que a inicial aponta, como suporte fático do direito de resposta, afirmações ofensivas e supostamente inverídicas divulgadas pelos representados/recorridos no programa eleitoral obrigatório no rádio, em várias inserções nos dias 5 e 6 de novembro de 2020, referentes ao candidato a prefeito JAIRO JORGE DA SILVA.

Em relação ao tema, o art. 58 da Lei 9.504/97 dispõe que, a partir da escolha em convenção, é assegurado o direito de resposta aos candidatos, partidos ou coligações atingidos por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica:

Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

 

No campo do debate político, o confronto de ideias admite pontos de vista divergentes e espaços para diversas interpretações acerca dos fatos de interesse social. Este espaço aberto aos candidatos permite o cotejo de opiniões e a construção de ideias que viabilizarão ao eleitor a livre formação de sua posição política.

Assim, para o direito de resposta, apenas a afirmação sabidamente inverídica, ou seja, a deliberada distorção da verdade sobre fatos incontroversos, dará ensejo à concessão do direito de resposta, exatamente para permitir da forma mais ampla possível o embate de ideias e opiniões entre os candidatos.

Nesse sentido é a doutrina de Rodrigo López Zílio:

Assim, para o deferimento do direito de resposta, não basta apenas veicular afirmação de caráter inverídico, porquanto a lei exige um plus – vedando a afirmação “sabidamente” inverídica. A distinção guarda relevância, na medida em que o debate de ideias entre os candidatos é fundamental para a formação de opinião do eleitorado, sendo reconhecida determinada flexibilização nos conceitos de honra e privacidade dos homens públicos. Portanto, somente é passível de direito de resposta a afirmação que, de modo evidente, configura-se como inverídica, dado que a divergência de posicionamento acerca de fatos de interesse político-comunitário é essencial ao desenvolvimento do debate eleitoral. Daí que é cabível o direito de resposta quando assacada uma inverdade escancarada, evidente, rotunda, manifesta, e não quando o fato narrado admite contestação, ensejando espaço para uma discussão política. O TSE já assentou que “a mensagem, para ser qualificada como sabidamente inverídica, deve conter inverdade flagrante que não apresente controvérsias. Não é possível transformar o pedido de resposta em processo investigatório com intuito de comprovar a veracidade das versões controver-sas sustentadas pelas partes” (Representação n. 3675-16 – Rel. Min. Henri-que Neves – j. 26.10.2010). (Direito Eleitoral, 5ªed., Verbo Jurídico, 2016, p. 433.)

 

Na mesma linha é a lição do doutrinador José Jairo Gomes, ao explanar que “o direito de resposta constitui oportunidade conferida ao ofendido para se manifestar. Sua concessão pressupõe a ocorrência de ofensa, ainda que indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica”. (Direito Eleitoral – 14ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2018. p. 633.)

A jurisprudência segue a mesma compreensão, conforme se verifica pelas conclusões a que chegou o TSE sobre o tema em diversos julgados: “o fato sabidamente inverídico a que se refere o art. 58 da Lei nº 9.504/97, para fins de concessão de direito de resposta, é aquele que não demanda investigação, ou seja, deve ser perceptível de plano” (Representação n. 139448, Relator Min. Admar Gonzaga, Publicação: 02.10.2014); “o exercício de direito de resposta, em prol da liberdade de expressão, deverá ser concedido em hipóteses excepcionais. Poderá ser outorgado apenas quando for possível extrair, da afirmação apontada como sabidamente inverídica, ofensa de caráter pessoal a candidato, partido ou coligação” (Representação n. 126628, Relator Min. Antonio Herman Benjamin, Publicação: 30.09.2014); “a mensagem, para ser qualificada como sabidamente inverídica, deve conter inverdade flagrante que não apresente controvérsias” (R-Rp 2962-41, de 28.09.2010, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, PSESS de 28.09.2010).

Destacado o alcance a ser conferido ao requisito da afirmação sabidamente inverídica, importa ressaltar que é ônus do representante comprovar a falsidade incontroversa das afirmações impugnadas, conforme orientação jurisprudencial:

Representação. Pedido. Direito de resposta. Afirmação sabidamente inverídica. Salário-mínimo. Aumento real. Governo anterior. Não-comprovação.

1. Hipótese em que a representante não se desincumbiu do ônus de provar que a afirmação, relativa ao aumento real do salário-mínimo em governo anterior, seja sabidamente inverídica.

Representação julgada improcedente.

(REPRESENTAÇÃO n. 1266, Acórdão de 17.10.2006, Relator(a) Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data: 17.10.2006.)

 

Na hipótese sob análise, os representados (ora recorridos) divulgaram a seguinte mensagem em relação ao candidato a prefeito representante (ora recorrente):

(...) Pesquise no Google, Jairo Jorge condenado e veja quem é o ex-Prefeito, Jairo Jorge é investigado pelo Núcleo de Combate à Corrupção e pode ser cassado! Já Busato é sério e ficha limpa de verdade! O canoense sabe quem é melhor, vote Busato! (…) (Grifei.)

O magistrado da 66ª Zona Eleitoral indeferiu o pedido com os seguintes argumentos:

Ocorre que, no caso em concreto, não se pode afirmar, de forma taxativa e estreme de dúvida, que a afirmação do representado a respeito da possibilidade de cassação do representante não é "sabidamente inverídica", pois, consoante destacado pelo MPE, ele responde a ações judiciais que, ao menos em tese, podem levar a esse desfecho.

Pode-se discutir se a formulação das afirmações durante a inserção foi a mais adequada, no sentido jurídico do termo.

Essa eventual inadequação, porém, não gera o pretendido direito de resposta, cabendo, a meu juízo, a quem se sentiu prejudicado exercer o contraponto no próprio debate eleitoral, pela via que entender mais adequada, auxiliando, assim, a formação da convicção do eleitorado local.

Como antes mencionado, o direito de resposta é medida de exceção, que só cabe em casos de induvidosa e flagrante falsidade.

Dessarte, deve ser rechaçado o pedido formulado na exordial.

(Grifei.)

 

Não vejo razões para alterar a decisão de primeiro grau.

De fato, como consta nos autos, o recorrente responde a ação penal que pode, em tese, conduzir à declaração de inocência, ou à condenação com a consequente suspensão de seus direitos políticos.

A questão foi analisada com extrema percuciência pelo douto Procurador Regional Eleitoral, motivo pelo qual transcrevo suas razões, adotando-as como fundamentos para decidir pelo desprovimento do recurso:

(…) pelo que se verifica do teor da mensagem divulgada no horário eleitoral pelo representado, não houve veiculação de fato sabidamente inverídico. O recorrente efetivamente responde à ação penal nº 5030328-15.2020.404.7100, ajuizada pelo Núcleo de Combate à Corrupção do MPF (ID 11164883) imputando-lhe a prática dos crimes previstos nos artigos 89 e 92 da Lei nº 8.666/93, cujas penas cominadas são, respectivamente, de 3 a 5 e de 2 a 4 anos de detenção, além de multa. E nas condenações criminais a pena privativa de liberdade superior a 4 anos ou por crimes cometidos contra a administração pública a perda do cargo é efeito da sentença, de modo que, ainda que em tese, é admissível afirmar que o candidato estaria sujeito à “cassação”, ou seja, à interrupção do seu mandato em razão de uma condenação judicial.

Assim, apesar de algumas imprecisões no teor da propaganda eleitoral questionada, não se pode falar de veiculação de fatos sabidamente inverídicos, desconectados dos efeitos que a eventual condenação do recorrente pode produzir.

Assim, concluo que a mensagem impugnada não traz informação sabidamente inverídica, devendo a propaganda ser rebatida por meios próprios pelo recorrido, uma vez que se recomenda a intervenção mínima do Judiciário nas manifestações e críticas próprias do embate político, sob pena de se tolher substancialmente o conteúdo da liberdade de expressão.

Por fim, este Tribunal recentemente decidiu que “cabe ao candidato que se sentir atingido, ou que discordar das afirmações, usar de seu espaço na campanha eleitoral para rebater as acusações, sendo inviável a concessão de direito de resposta para tal fim” (TRE-RS, RE 060021795, Rel. Des. El. Gustavo Alberto Gastal Diefenthäler, Publicado em Sessão 29.10.2020).

Portanto, diante do minucioso exame da questão realizado na instância a quo, acrescido das razões expostas pelo douto Procurador Regional Eleitoral, não vejo motivos para a reforma da sentença.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.

É como voto, Senhor Presidente.