REl - 0600477-58.2020.6.21.0008 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/11/2020 às 14:00

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo, assim como preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

RAFAEL PASQUALOTTO, JOCELITO LEONARDO TONIETTO e SIDINEI DA SILVA (candidatos ao cargo de vereador) buscam a reforma da sentença de improcedência proferida pelo Juízo da 8ª Zona Eleitoral de Bento Gonçalves (ID 8596933), com a condenação de ARIALDO GIRARDI EITELVEN à remoção de propaganda eleitoral negativa, veiculada na rede social Facebook, e ao pagamento de multa.

De início, ressalto que, no tocante à propaganda eleitoral negativa, na jurisprudência da Corte Eleitoral Superior, o voto de reprovação (“não voto”), as críticas que excedem os limites da liberdade de expressão e informação em contexto atrelado à disputa eleitoral e a divulgação de fatos que induzem o eleitor a não votar em determinado candidato constituem referenciais à sua caracterização, aferida em face das circunstâncias de cada caso concreto.

Para o pleito de 2020, o legislador eleitoral expressamente associou a propaganda eleitoral negativa, inclusive no período da pré-campanha, às situações de ofensa à honra e à imagem de candidatos, partidos políticos ou coligações, ou de divulgação de fato sabidamente inverídico, tendentes a desigualar a disputa entre os concorrentes ao pleito, em contexto que desborde dos limites delineados pelo princípio democrático dentro do espaço político-eleitoral, e que, por essa razão, requeiram a imposição de restrição ao exercício da liberdade de pensamento e de expressão, segundo o teor do art. 27, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 27. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57- A). (Vide, para as Eleições de 2020, art. 11, inciso II, da Resolução nº 23.624/2020)

§ 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatos, partidos ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos.

§ 2º O disposto no § 1º deste artigo se aplica, inclusive, às manifestações ocorridas antes da data prevista no caput, ainda que delas conste mensagem de apoio ou crítica a partido político ou a candidato, próprias do debate político e democrático.

Nessa senda de garantia do direito de liberdade de manifestação do pensamento (art. 5º, inc. IV, da Constituição Federal), a intervenção da Justiça Eleitoral, por intermédio da remoção de conteúdos da internet, deve ser parcimoniosa, limitando-se à restauração do equilíbrio das forças em disputa, sempre que houver ofensa a direitos das pessoas que participam do processo eleitoral, ou a difusão de informações falsas, que induzam o eleitor em erro sobre dado relevante à formação da sua convicção, conforme dispõe o art. 38, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 38. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J).

§ 1º Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.

No caso concreto, as postagens publicadas pelo recorrido em seu perfil no Facebook, na data de 23.01.2019, portanto muito antes do período eleitoral em curso, contêm os seguintes dizeres (ID 8596333):

....Esses 4 vereadores se aproveitaram de uma brecha na lei e sem consultar os demais da câmara, trouxeram prá (sic) Bento Gonçalves, determinação para que cada vereador possa ter direito a 140 litros de combustível por mês para seus carros particulares........ façamos algo......

Os recorrentes sustentam que as mensagens acima transcritas veiculam informação manifestamente inverídica, com nítido caráter eleitoreiro, e induzem os eleitores a acreditar na falsa mensagem, denegrindo a imagem pessoal, causando-lhes prejuízo na disputa à eleição deste ano, configurando propaganda eleitoral negativa, vedada pela legislação eleitoral.

Contudo, a análise do conteúdo das postagens revela, antes disso, o mero questionamento e a crítica, dentro de limites aceitáveis e inerentes ao jogo democrático, sendo, portanto, inapto a traduzir excesso passível de contenção ou sancionamento pela Justiça Eleitoral.

Nesse aspecto, é importante ponderar que, no que se refere ao direito de crítica à atuação de autoridades públicas, a preservação da liberdade de expressão é ainda mais ampla, porque a circulação de ideias e opiniões apresenta-se como instrumento legítimo de controle social da gestão administrativa e de formação de juízos críticos por parte do eleitor, sendo, por conseguinte, fundamental à própria conformação do Estado Democrático de Direito.

Nessa linha, entendo que não houve a veiculação de informação sabidamente falsa e tampouco de ofensa à honra dos candidatos, de modo que adoto os fundamentos expostos na sentença como razões para decidir (ID 8596933):

Analisando as postagens do perfil ARIALDO GIRARDI EITELVEN, tenho que os dizeres contidos não ofendem a honra dos representantes.

Para que haja censura aos comentários em redes sociais, exige-se que as publicações atacadas contenham afirmações caluniosas, injuriosas, difamatórias ou sabidamente inverídicas, não bastando que a mesma seja contrária ao entendimento do candidato, coligação ou partido que a impugna. No caso em tela, embora as notas veiculadas pelo perfil do representado contenham críticas ásperas aos candidatos e tenha sido compartilhada por diversos usuários do Facebook, não vislumbro que as referidas notas transgridam a lei eleitoral a ponto de ensejarem a sua retirada do espaço onde estão publicadas.

O fato, objeto da presente representação não é sabidamente inverídico, pois existiu. A medida previa uma cota de 140 litros de gasolina , inclusive foi publicado no Diário Ofícial do Município, mas foi revogado 03 dias depois da publicação, após a Câmara Legislativa ouvir as manifestações da população.

Ainda como ressaltou o Ministério Público Eleitoral: Trata-se de comentário sobre uma suposta aprovação de projeto da Casa Legislativa com vantagens, conforme a publicação, em favor dos vereadores, particularmente indicando os representantes como responsáveis pelo processo.

Portanto, ainda que as publicações dos usuários contenham forte apelo eleitoral, como alegam os representantes, tal não destoa do próprio debate eleitoral e do momento em que se encontra o processo eleitoral em si, em que se tolera críticas mais agudas. Está-se, pois, em meio ao debate eleitoral, onde é comum críticas aos candidatos, notadamente aos atos administrativos praticados pelos que já são vereadores. Não há vedação na norma quanto a este aspecto, podendo o ofendido dar as suas explicações e mesmo contra-atacar a crítica pela propaganda eleitoral que lhe é assegurada legalmente.

(Grifo nosso)

Por essas razões, estou encaminhando meu voto no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso interposto, mantendo a decisão de primeiro grau, por considerar não configurada a prática de propaganda eleitoral negativa em desfavor dos recorrentes.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo conhecimento e desprovimento do recurso, mantendo integralmente a sentença que julgou improcedente a presente representação.