REl - 0600202-76.2020.6.21.0116 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/11/2020 às 14:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

Porque tempestivo o recurso, e presentes os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

Mérito

O Juízo da 116ª Zona Eleitoral de Butiá, julgando improcedente a impugnação proposta pela ora recorrente, deferiu o pedido de registro de candidatura de SAULO MOISES LOPES MARTINS, para concorrer ao cargo de vereador pelo PROGRESSISTAS, no pleito de 2020.

Nos termos do art. 1º, inc. II, al. “l”, da Lei Complementar n. 64/90, para concorrer ao cargo de vereador, o prazo para servidores públicos desincompatibilizarem-se das suas funções é de 3 (três) meses antes da data do pleito:

Art. 1º São inelegíveis:

(...)

II – para presidente e vice-presidente da República:

(…)

l) os que, servidores públicos, estatutários ou não, dos órgãos ou entidades da administração direta ou indireta da União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e dos territórios, inclusive das fundações mantidas pelo poder público, não se afastarem até 3 (três) meses anteriores ao pleito, garantido o direito à percepção dos seus vencimentos integrais;

VII – para a câmara municipal:

(…)

No caso em apreço, resta incontroverso que o recorrido integra o Programa Mais Médicos, promovido pelo Governo Federal, exercendo suas funções em posto de saúde municipal.

Nas contrarrazões, o candidato sustenta que não pode ser equiparado a servidor público, para quem a norma eleitoral exige prazo de afastamento das funções para que possa participar do pleito, pois inexiste vínculo empregatício de qualquer natureza com a administração pública. Para tanto, embasa seus argumentos no art. 17 da Lei n. 12.871/13 e no art. 33 da Portaria Interministerial MS/MEC n. 1.369/13.

Ocorre, no entanto, que, na linha dos precedentes do TSE, somente o médico credenciado ao SUS, que esteja no exercício particular da medicina e preste atendimentos eventuais, não está sujeito à desincompatibilização:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. MÉDICO PARTICULAR. CREDENCIADO DO SUS. DESNECESSIDADE DE AFASTAMENTO. [...].

1. Na esteira dos precedentes do TSE, o médico credenciado ao SUS que esteja no exercício particular da medicina não está sujeito à desincompatibilização do art. 1º, II, l, c.c. o inc. IV, a, da Lei Complementar nº 64/90.

2. A teor da Súmula-STF nº 279, é vedado nesta instância especial o reexame de fatos e provas.

3. Agravo a que se nega provimento.

(AgRgAg n. 6.646/GO, DJ de 06.8.2008, rel. Min. Joaquim Barbosa.)

 

Na mesma linha, é o entendimento desta Corte:

RECURSOS. ELEIÇÕES 2020. REGISTRO DE CANDIDATURA. VEREADOR. IMPUGNAÇÃO. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. MEMBRO DE JUNTA MÉDICA OFICIAL. SERVIDOR PÚBLICO LATO SENSU. PRELIMINAR. NULIDADE DE SENTENÇA. INDISPONIBILIDADE PJE. COMPROVADO. PRORROGAÇÃO DE PRAZO. CONHECIDA A IMPUGNAÇÃO. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. INOBSERVÂNCIA DO PRAZO. REGISTRO INDEFERIDO. PROVIMENTO.

1. Recursos contra a sentença que não conheceu uma impugnação em razão de sua intempestividade e julgou improcedente a outra, deferindo o pedido de registro de candidatura ao cargo de vereador.

2. Preliminar de nulidade da sentença. Impugnação apresentada intempestivamente em razão da indisponibilidade do sistema PJe ocorrida tanto no dia final do prazo quanto no dia subsequente, na forma das certidões apresentadas com o recurso. Circunstância certificada pelo TSE, o que teria prorrogado o último dia do prazo para 02.10.2020, por aplicação do caput do art. 11 da Resolução TSE n. 23.417/14. As referidas disposições contidas na regulamentação do TSE são idênticas às editadas pelo CNJ na Resolução n. 185/13, também em seu art. 11, norma que institui o Processo Judicial Eletrônico (PJe) como sistema de processamento de informações e prática de atos processuais e estabelece os parâmetros para sua implementação e funcionamento. Razoável e proporcional considerar prorrogado o prazo para apresentação da impugnação, especialmente por se tratar de prazo decadencial para a propositura da Ação de Impugnação ao Registro de Candidatura (AIRC). Entretanto, considerando que a matéria trazida na impugnação também constou da impugnação manejada pelo Ministério Público Eleitoral, a qual foi processada pelo rito próprio, com garantia da ampla defesa e do contraditório, desnecessária a baixa dos autos para processamento. Feito maduro para julgamento, conforme estabelece o art. 1.013, § 1º, do CPC. Acolhida a matéria preliminar e declarada a nulidade parcial da sentença, no ponto em que considerou intempestiva a impugnação apresentada pela coligação.

3. Na linha dos precedentes do TSE, somente o médico credenciado ao SUS, que esteja no exercício particular da medicina e preste atendimentos eventuais, não está sujeito à desincompatibilização. Na hipótese, considerando que a candidata mantinha vínculo direto com a administração pública municipal, tendo sido nomeada para integrar a junta médica da cidade, não é possível considerar que sua atividade representa exercício particular da medicina, uma vez que se trata de atividade direta desempenhada ao ente público, embora de forma não remunerada.

4. Desimporta se atividade habitual ou eventual, remunerada ou não, porquanto é manifesta a existência de vínculo direto entre a candidata e o ente municipal a partir da sua nomeação para integrar a junta médica oficial, realizando perícia dos servidores públicos municipais. Circunstância que exige a desincompatibilização no prazo de três meses antes da eleição.

5. Provimento dos recursos. Indeferimento do registro de candidatura. (Grifo nosso)

(TRE/RS - RE n. 0600202-76.2020.6.21.0116, Acórdão de 09.11.2020, Relator Substituto DES. ELEITORAL MIGUEL ANTONIO SILVEIRA RAMOS)

 

E trago ainda:

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DECISÃO MONOCRÁTICA. CONHECIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. MÉDICO. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS).

1. Em se tratando de médico que realiza atendimentos diários no Posto de Saúde da Família e em escala de plantões no Hospital Municipal, é necessária a desincompatibilização, nos termos do art.1º, I, l, da LC nº 64/90.2. Embargos de declaração conhecidos como agravo regimental e desprovidos.

(Recurso Especial Eleitoral nº 29936, Acórdão, Relator(a) Min. Marcelo Ribeiro, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 29/09/2008) (Grifei)

 

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. VEREADOR. FUNDAMENTOS DA DECISÃO NÃO IMPUGNADOS. SÚMULA Nº26/TSE. AFRONTA AOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC. INEXISTÊNCIA. ACÓRDÃO REGIONAL SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADO. MÉRITO. INELEGIBILIDADE SUPERVENIENTE. AUSÊNCIA. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO DE FATO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO ARCABOUÇO PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA Nº 24/TSE. VIOLAÇÃO AO ART. 368-A DO CÓDIGO ELEITORAL. NÃO CONFIGURADO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. MERA TRANSCRIÇÃO DE EMENTAS. FALTA DO COTEJO ANALÍTICO. SÚMULA Nº 28/TSE. MANUTENÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO DESPROVIDO.

1. O princípio da dialeticidade impõe ao agravante o ônus de impugnar os fundamentos da decisão agravada, sob pena de ver mantidos os fundamentos que a embasaram. Incidência da Súmula nº 26 do TSE.

2. Inexiste violação aos arts. 489 e 1.022 do CPC quando todas as questões suscitadas pela parte são enfrentadas pelo Tribunal a quo, embora com conclusão em sentido contrário àquela por ela pretendida.

3. O art. 368-A do Código Eleitoral proscreve a condenação à perda do mandato eletivo fundamentada exclusivamente em prova testemunhal singular.

4. No caso dos autos, o reconhecimento da inelegibilidade superveniente se deu com base em diversos depoimentos, além de prova documental, que atestam que o agravante continuou trabalhando no posto médico durante o período eleitoral e, juntos, formaram o caderno probatório do qual se erigiu a convicção do julgador.

5. A ausência de desincompatibilização de fato do serviço público configura inelegibilidade superveniente apurável em sede de Recurso contra Expedição de Diploma. Nesse sentido: RCED n°1384/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe de 16.4.2012.

6. A moldura fático-probatória delineada no acórdão regional não viabiliza conclusão diversa da que chegou a Corte de origem, de modo que a modificação do julgado, a fim de acolher os argumentos recursais do ora agravante, no sentido de que esse não teria exercido sua função de chefe administrativo de posto de saúde durante o período eleitoral, resvalaria no reexame dos fatos e provas dos autos, providência que esbarra no óbice plasmado no enunciado de Súmula nº 24/TSE.

7. A utilização do fundamento da divergência jurisprudencial em recurso especial eleitoral exige que a parte demonstre a similitude fática entre o acórdão paradigma e a decisão que pretende reformar, por força da Súmula nº 28 do TSE, sendo insuficiente para tanto a mera transcrição das ementas dos acórdãos confrontados. 8.Agravo interno a que se nega provimento.

(Agravo de Instrumento nº 1976, Acórdão, Relator(a) Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 32, Data 14/02/2020,Página 26/27) (Grifei)

 

Logo, como muito bem sublinhado pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral, era de rigor a desincompatibilização do recorrido até três meses antes do pleito (14.5.2020) como requisito obrigatório à viabilização da sua candidatura a cargo eletivo, verbis:

Na esteira da jurisprudência do TSE, somente o médico credenciado ao SUS que esteja no exercício particular da medicina não está sujeito à desincompatibilização do art. 1º, II, l, c.c. o inc. IV, a, da Lei Complementar nº 64/90.

Ademais, não é o fato de a atividade ser relevante para a população que serve de argumento para livrá-la do dever geral de desincompatibilização, uma vez que, se fosse esse o caso, nenhum servidor público necessitaria se desincompatibilizar.

Assim, exercendo o requerente função em órgão público, sendo servidor público por equiparação, deveria ter se desincompatibilizado do cargo até 14.08.2020.

Conforme restou incontroverso nos autos, o requerente permanece realizando atendimentos na rede pública municipal de saúde no âmbito do programa pelo qual remunerado.

Assim, a dispensa do exercício das funções não ocorreu no prazo legal para a desincompatibilização.

Destarte, entendemos que era exigível do requerente sua desincompatibilização pelo prazo de 03 (três) meses, por força do art. 1.º, inciso II, alínea “l”, c/c inciso VII, da LC 64/90, o que não ocorreu, sendo a ausência de desincompatibilização causa de inelegibilidade (art. 11, inciso III, da Resolução TSE n.º 23.609/2019)

Portanto, configurada a hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. II, al. “l”, da LC n. 64/90, o recurso deve ser provido.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso para, reformando a sentença de primeiro grau, indeferir o registro de candidatura de SAULO MOISES LOPES MARTINS, requerido pelo PROGRESSISTAS do Município de Butiá.