REl - 0600209-26.2020.6.21.0033 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/11/2020 às 16:00

VOTO

A declaração da ilegitimidade ativa das recorrentes merece ser mantida.

O enunciado da Súmula n. 53 do TSE é expresso ao garantir somente a filiados a legitimidade e o interesse para impugnar irregularidades havidas em convenção partidária: “O filiado a partido político, ainda que não seja candidato, possui legitimidade e interesse para impugnar pedido de registro de coligação partidária da qual é integrante, em razão de eventuais irregularidades havidas em convenção”.

No caso dos autos, se as próprias recorrentes reconhecem que no momento da propositura da ação já haviam apresentado requerimento de desfiliação partidária, o qual foi inclusive juntado aos autos (ID 10221483 e ID 10221533), é manifesta a ausência de legitimidade e de interesse em contestar a convenção realizada pela agremiação.

O fato de a desfiliação não ter sido submetida a registro perante a Justiça Eleitoral, na forma do art. 21 da Lei dos Partidos Políticos, jamais poderia ser considerado para a legitimação ao pedido, pois, segundo o art. 276 do CPC, “quando a lei prescrever determinada forma sob pena de nulidade, a decretação desta não pode ser requerida pela parte que lhe deu causa”.

Aplica-se ao caso a teoria dos atos próprios, como concreção do princípio da boa-fé objetiva, sintetizada nos brocardos latinos tu quote (ou falácia da hipocrisia) e venire contra factum proprium (vir contra seus próprios atos), segundo o qual a ninguém é lícito fazer valer um direito em contradição com a sua conduta anterior ou posterior interpretada objetivamente, segundo a lei, os bons costumes e a boa-fé.

Portanto, a ilegitimidade ativa ad causam é manifesta.

Ademais, sequer há espaço para se questionar a convenção partidária, pois a ação foi ajuizada em 18 de outubro de 2020, após o trânsito em julgado do processo que deferiu o DRAP da coligação integrada pelo PSDB, ocorrido em 16.10.2020 nos autos do processo n. 0600091-50.2020.6.21.0033, que tramitou perante a 33ª Zona Eleitoral.

Assim, considerando que as recorrentes não impugnaram o pedido de registro do DRAP, merece ser acolhida a preliminar de coisa julgada arguida em contrarrazões.

E, ainda que assim não fosse, no mérito a ação é totalmente improcedente, porque a falta de registro de filiação partidária no sistema próprio pode ser suprida conforme prevê o Enunciado da Súmula n. 20 do TSE: “A prova de filiação partidária daquele cujo nome não constou da lista de filiados de que trata o art. 19 da Lei nº 9.096/95, pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública”.

Desse modo, o simples fato de o candidato não estar com o registro de filiação no Sistema Filia não causa qualquer nulidade.

Por fim, entendo que o recurso merece provimento parcial tão somente para afastamento da multa fixada por litigância de má-fé.

A pena por litigância de má-fé é sanção processual grave, que deve ficar reservada a situações onde se evidencie, prima facie, a deslealdade processual, o que aqui não parece ser o caso. Nesse sentido, colaciono jurisprudência:

RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO IMPROCEDENTE. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. NÃO COMPROVAÇÃO DA CONTRAPRESTAÇÃO ONEROSA EM PROPAGANDA NA INTERNET. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. AUSÊNCIA DE ARTIFÍCIO ARDIL OU CONDUTA QUE OFENDA A BOA-FÉ PROCESSUAL. RECURSO PROVIDO PARA AFASTAR A INCIDÊNCIA DE MULTA. 1 – Ausência de artifício ardil ou manobra a fim de levar o juízo a erro, mas situação que, de fato, para quem não é expert no tema, pode compreender tratar-se de anúncio pago. 2 – Não há pretensão contra texto expresso de lei, mas sim partindo de uma subsunção a um dispositivo normativo que proíbe a propaganda eleitoral paga. 3 – A litigância de má-fé não deve ser aplicada pelo simples fato de ser improcedente a pretensão, há que se demonstrar conduta incompatível com a boa-fé processual, o que não restou comprovado nos autos. 4 – Não consta nos autos nenhum ato praticado pelos representantes ou seus advogados que denotem agir temerário e a pretensão não era manifestamente infundada, tanto é que pela análise de todo material, ao conceder a tutela antecipatória, o magistrado chegou à mesma conclusão que os representantes. 5 – Recurso provido para afastar a condenação em litigância de má-fé.
(TRE-MT – RE: 25396 CÁCERES – MT, Relator: VANESSA CURTI PERENHA GASQUES, Data de Julgamento: 05/03/2018, Data de Publicação: DEJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 2598, Data 08/03/2018, Página 2-3)

 

Recurso. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Conduta vedada. Abuso de poder. Art. 73, inc. VI, letra ¿b¿ e art. 74, ambos da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016. (...). Inviável o pedido de aplicação de multa por litigância de má-fé, a qual exige pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso, bem como o dolo específico. Manutenção da sentença. Provimento negado.
(TRE-RS – RE: 37289 ENCANTADO – RS, Relator: DR. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 16/11/2016, Data de Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 210, Data 21/11/2016, Página 4-5)

 

Portanto, a sanção por litigância de má-fé deve ser afastada, reformando-se a sentença apenas nesse ponto.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento parcial do recurso, tão somente para afastar a multa por litigância de má-fé.