REl - 0600183-77.2024.6.21.0036 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/06/2025 às 16:00

VOTO

Inicialmente, rejeito a preliminar de intempestividade do recurso, suscitada em contrarrazões e no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral.

Com efeito, assim dispõe o art. 7º da Resolução TSE n. 23.608/19:

Art. 7º Os prazos relativos a representações, reclamações e pedidos de direito de resposta são contínuos e peremptórios, correndo, conforme o caso, em cartório ou secretaria ou no PJe, e não se suspendem aos sábados, domingos e feriados, entre 15 de agosto do ano da eleição e as datas fixadas no calendário eleitoral do ano em que se realizarem as eleições ( Lei Complementar nº 64/1990, art. 16 ). (Redação dada pela Resolução nº 23.672/2021)

§ 1º Os cartórios eleitorais e os tribunais regionais eleitorais divulgarão o horário de seu funcionamento para o período previsto no caput deste artigo. (Incluído pela Resolução nº 23.672/2021)

§ 2º Às representações especiais, submetidas ao procedimento do art. 22 da Lei Complementar nº 64 , de 18 de maio de 1990, não se aplicam as disposições do caput deste artigo ( Lei Complementar nº 64/1990, art. 16 ). (Incluído pela Resolução nº 23.672/2021)

 

Na espécie, a sentença foi publicada no DJE em 25.10.2024 (ID 45808844), começando a fluir o prazo do recurso somente em 28.10.2024 e findando em 30.10.2024.

Como o recurso foi interposto em 30.10.2024, é tempestivo.

Portanto, a preliminar merece ser rejeitada.

No mérito, versam os autos acerca das condutas vedadas previstas no art. 73, incs. I e III, Lei n. 9.504/97 e abuso do poder político e econômico, conforme o previsto no art. 22, caput, da Lei Complementar n. 64/90.

Imputou-se aos ora recorridos a utilização da estrutura pública, bem como de servidores públicos para benefício da campanha; exemplificativamente, contratos de mídia pagos pela Prefeitura para filmagens de campanha, uso de servidores durante o expediente e utilização de veículos da Administração Pública para realizar atos de campanha.

A sentença examinou com percuciência os fatos e concluiu pela não caracterização de ilícito eleitoral, razão pela qual, para evitar tautologia, incorporo a fundamentação nela desenvolvida como razões de decidir do meu voto (ID 45808840):

O constituinte originário, ao definir que lei complementar viria a estabelecer casos de inelegibilidade a serem observados pelos postulantes a cargos eletivos, assim estabeleceu:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

[...]

§ 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

Por conseguinte, coube à Lei Complementar 64/90 prever os casos de inelegibilidade, bem como, em seu Art. 22, fornecer os meios adequados para combater eventual ato abusivo na seara eleitoral, através da Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Vejamos:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: 

[…]

 O abuso de poder político tendente a causar desequilíbrio na disputa eleitoral é expressamente vedado em âmbito constitucional  (art.14,§9º) e legal. 

Por sua vez, o Código Eleitoral aduz:

Art. 237. A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos.

Especificamente sobre o tema posto em causa, disciplina o art. 73, I e III da Lei nº 9.504/1997:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;

[...]

III - ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado;

Pois bem, a controvérsia dos autos gira em torno da caracterização ou não de abuso de poder político nos atos de propaganda eleitoral praticados pelos investigados no decorrer da campanha, em especial em razão da alegação de utilização de servidores e contratos da prefeitura para captura e edição de imagens para a coligação requerida, senão vejamos:

 

A) DOS VÍDEOS GRAVADOS NA RUA FRANCISCO CARLOS REVERBEL:

Os autores afirmam que no dia 26 de julho, o atual prefeito Jeferson da Silva Pires publicou um vídeo de manutenção de uma obra que estava sendo realizada naquele dia pela Prefeitura Municipal no referido logradouro, na sequência, em 1º de agosto, que o senhor Jackson Castro, Secretário do Trabalho, Comunicação e Relações Institucionais do Município de Quaraí, transmitiu um vídeo o qual refere ao melhoramento da estrutura na educação do município. Por fim, dia 13 de agosto de 2024, que o senhor Jeferson Pires publicou um vídeo no qual aparecem os alunos da banda municipal em ensaio na Praça General Osório, bem como o depoimento do diretor da escola Emilio Callo e diretor da referida banda, exaltando o trabalho firme e sério da banda. Aduz que essas oportunidades os outros candidatos não teriam, bem como que o professor, ao exaltar o trabalho dos alunos estaria exaltando o trabalho do prefeito Jéferson Pires.

Ao analisar os 3 (três) vídeos, é possível perceber que não há interrupção das obras ou apresentação dos alunos. Ainda, em sua entrevista, o diretor apenas apresenta a banda e diz que irão se apresentar em breve, além do mais, apenas exalta o trabalho firme e sério dos alunos, a interpretação de que essa afirmação se estenderia à atual gestão é desarrazoada. 

A jurisprudência é pacífica ao entender que a divulgação de atos de governo, em seu perfil privado, se encaixa no direito legítimo à liberdade de expressão. Ademais, as gravações foram feitas em local público, utilizando recursos próprios, e todos os candidatos tiveram a oportunidade de realizar as mesmas gravações, inclusive, poderiam fazê-las criticando as obras ou apresentação, se fosse do interesse destes.

Nesse sentido:

Recurso. Propaganda eleitoral. Imagem de candidato prestando atendimento médico nas dependências de órgão público. A vedação de cessão ou uso real de bens públicos não deve ser confundida com a gravação de imagens de bens públicos e servidores no exercício de suas funções.  Filmagem realizada por particular, com equipamento e recurso privado, e a sua ulterior utilização por candidato, partido ou coligação, não caracteriza infringência ao art. 73 da Lei nº 9.504/97. Provimento negado.   RECURSO - REPRESENTAÇAO nº3682004, Acórdão, Des. DRA. LIZETE ANDREIS SEBBEN, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 28/09/2004. (Grifei)

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. CONDUTA VEDADA AOS AGENTES PÚBLICOS EM CAMPANHAS ELEITORAIS. DIVULGAÇÃO DE PUBLICIDADE INSTITUCIONAL EM PERFIL PESSOAL NO FACEBOOK. BRASÃO DA PREFEITURA QUE APARECE DE FORMA INCIDENTAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. MULTA AFASTADA. REVALORAÇÃO JURÍDICA DO CONJUNTO FÁTICO PROBATÓRIO DOS AUTOS. 1. Trata–se de agravo interno manejado em face de decisão por meio da qual foi dado provimento ao recurso especial eleitoral para reformar o acórdão regional e afastar a multa que foi imposta ao agravado, prefeito do Município de Curitiba/PR, à época dos fatos, com fundamento no art. 73, VI, b, da Lei 9.504/97. 2. O Tribunal de origem manteve a multa imposta na sentença, por considerar que configura publicidade institucional divulgada em período vedado, uma única postagem na rede social do recorrente, na qual aparece símbolo oficial – brasão da cidade de Curitiba/PR –, em um evento envolvendo startups que ocupam co–workings do Município. 3. Não se vislumbra violação ao art. 73, VI, b da Lei 9.504/97, porquanto a jurisprudência desta Corte considera como exercício legítimo do direito da liberdade de expressão a divulgação de atos de realizações do governo municipal em perfil privado do gestor em rede social, desde que não haja o dispêndio de recursos públicos, o que não se verifica na espécie. 3. Para a imposição da multa prevista no § 4° do art. 73 da Lei n° 9.504/97, pelo exercício da conduta vedada no inciso VI, b, do mesmo artigo, é necessário que se trate de propaganda institucional, autorizada por agente público e paga pelos cofres públicos" (REspe 196–65, rel. Min. Fernando Neves, DJ de 9.8.2002, grifo nosso). 5. O provimento do recurso especial, na espécie, não demanda o reexame de fatos e provas, vedado pela Súmula 24 do TSE, mas apenas o reenquadramento jurídico das premissas fáticas constantes do aresto recorrido, o que é admitido pela jurisprudência desta Corte. Precedentes. Tribunal Superior Eleitoral. Agravo Regimental No Recurso Especial Eleitoral 060003945/PR, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos, Acórdão de 26/05/2022, Publicado no(a) Diário de Justiça Eletrônico 102, data 03/06/2022). (grifei)

 

B) DA UTILIZAÇÃO DE SERVIDORES E BENS DO MUNICÍPIO PARA CAPTAÇÃO DE IMAGENS DOS POÇOS ARTESIANOS:

Alega, ainda, que haveria a utilização da máquina pública, com utilização dos recursos materiais e humanos do Município de Quaraí para fins de produção de propaganda eleitoral em proveito do candidato à reeleição. Afirmam que no dia 1º de agosto, utilizando um automóvel da Secretaria de Obras, Transportes e Infraestrutura (SMOTI), o secretário de obras, Fábio Ferreira de Oliveira Barros, junto com o Sr. Tiago Espelocim, foram gravar propaganda política sobre poços artesianos para os requeridos. Para embasar essa acusação, utilizam uma sequência de "stories", aonde o sr. Tiago publica parte de uma propaganda gravada por ele, e outro com a troca do pneu da camionete da Prefeitura, e que a gravação da imagem e a troca do pneu ocorreram no mesmo dia.

Afirma, ainda, que o sr. Tiago foi contratado pela prefeitura para prestar serviços à campanha, utilizam uma foto em que o servidor Tiago publica, em serviço na Prefeitura Municipal, a qual é visível na tela do computador que o mesmo está trabalhando em arquivos de vídeo que tiveram sua última modificação no dia 17/08/2024, após as 22h.

Por fim, o autor alega que a fala do ex-secretário do governo Jackson Castro, na live de lançamento da campanha, prova que as propagandas eram feitas por servidores da prefeitura, a fala proferida é a seguinte: "então a gente quer convidar vocês agora pra assistir o nosso vídeo aí com a nossa produção, da nossa equipe de comunicação aqui do governo municipal." Em seguida inicia um vídeo da propaganda dos requeridos.

Em suas razões finais afirma que há diversas contradições nos depoimentos, levando a interpretação de ter ocorrido provável “construção” das narrativas.

Conforme depoimentos relacionados ao fato ocorrido no dia 1º de agosto:

Nilson Rocha Remeling, compromissado na forma da lei, afirmou que ajudou o secretário Fábio e Tiago com um pneu furado, acha que foi na parte da manhã, não foi informado o que eles estavam fazendo no momento, não recorda do dia exato nem tem certeza se era, ou não um veículo da prefeitura.

Cristan Blanco Bonfante, compromissado na forma da lei, explicou que pediu a chave para o secretário de obras, que a entrega da chave foi na parte da tarde e que não sabe se o Tiago era servidor da prefeitura.

Tiago Espelocim Lima, ouvido na condição de informante, afirma que a "filmagem da laranja" não foi feita no mesmo dia que estava em viagem com o secretário de obras, foi convidado para fazer banco de imagens para a prefeitura e que não viu a entrega da chave.

Fábio Ferreira de Oliveira Barros, ouvido na condição de informante, afirma que sempre que vai viajar para o interior leva alguém junto, nesse dia convidou o sr. Tiago para aproveitar e fazer algumas imagens. Afirma que não sabe se o Tiago viu a entrega da chave ao servidor Cristian, que a entrega foi na parte da tarde.

Sobre a contratação do servidor Tiago Espelocim Lima:

Tiago Espelocim Lima, ouvido na condição de informante, explicou que trabalhava fora do expediente normal para poder finalizar os trabalhos da prefeitura, não soube precisar quando foi contratado, afirma que foi contratado entre agosto e junho. Disse que recebeu aumento salarial sem aumento de trabalho, na sequência diz que tinha que fazer "outras coisas".

A prova testemunhal, majoritariamente, girou em torno da suposta utilização do veículo da SMOTI, junto com o secretário de obras, para a captação de imagens para utilização na campanha eleitoral dos requeridos. A maioria das testemunhas foram ouvidas na condição de informantes, e apesar de algumas contradições não há indícios suficientes para afirmar que a filmagem dos poços artesianos, e a viagem do dia 1º de agosto ocorreram no mesmo dia. Tanto o sr. Cristian Blanco, quanto o secretário de obras Fábio, afirmam que a viagem foi para a entrega de uma chave para executar as obras.

A afirmação do senhor Tiago Espelocim Lima de que foi contratado pela prefeitura "entre junho e agosto" causa estranheza, pois conforme apresentado pelos autores no documento de ID 123333196, o mesmo foi contratado em fevereiro de 2024. Porém, tal situação não é prova cabal de sua contratação com dinheiro público para trabalhar na campanha eleitoral dos investigados.

A fala do sr. Jackson Castro também causa estranheza ao juízo, pois a afirmação que a propaganda eleitoral teria sido feita pela equipe de comunicação do governo municipal é uma afirmação grave. Entretanto, não foram trazidas aos autos provas para corroborar esta afirmação. Não pode o juízo basear-se apenas em uma frase proferida por um terceiro em um evento de campanha, mesmo que este seja secretário do município, considerando a gravidade das sanções previstas na lei. 

Além do mais, apenas "estranhezas" não são elementos suficientes para aplicação das sanções requeridas na inicial, sendo que era ônus da parte autora fazer prova contundente de suas alegações, considerando que as penalidades previstas em lei, ao fim e ao cabo, afastam a soberania do voto popular que, no Município de Quaraí, reelegeu o atual prefeito Jeferson da Silva Pires e a candidata a vice-prefeita, Patrícia Moraes, com mais de 54% dos votos válidos.

Por fim, apenas para destacar a fragilidade da utilização da frase dita pelo Secretário Municipal Jackson Castro como único fundamento para se reconhecer o abuso do poder político, destaco que não há vedação legal que servidores do município participem de campanha eleitoral, desde que fora do horário do expediente. Assim, nada impede que a "equipe de comunicação do governo municipal" (ou parte dela), mencionada na fala do apoiador e Secretário Municipal Jackson Castro,  efetivamente produzisse o material, desde que sem utilização de recursos públicos e fora do horário de expediente na prefeitura. A prova contundente necessária para o reconhecimento da ilicitude alegada não foi produzida pela parte autora, ônus que lhe incumbia.

 

C) DA SUPOSTA SIMILARIDADE ENTRE AS IMAGENS DA PUBLICIDADE INSTITUCIONAL E DA CAMPANHA DO REPRESENTADO:  

A parte autora afirma, em síntese, que todo o material produzido para a propaganda eleitoral do Prefeito e candidato à reeleição, Jeferson Pires, possui exatamente o mesmo padrão de captação, produção e edição de imagens e vídeos realizados pela própria Prefeitura Municipal, inclusive mediante o uso de drone.

Para isso apresentam 2 vídeos da campanha e 2 vídeos da prefeitura. Entretanto, limita-se a fazer a afirmação que são idênticas, sem fazer uma análise aprofundada das imagens.

Entretanto, ao examiná-las, logo nos primeiros segundos, é possível perceber as diferenças do estilo de filmagem, paleta de cores e qualidade das gravações. Ainda, mesmo que fossem iguais, é preciso fazer a conexão dos valores pagos pela prefeitura com os supostos trabalhos executados para a campanha, fato que não ocorreu. Aliás, é importante mencionar que tanto o senhor Tiago quanto a empresa Altamidia prestaram serviço para prefeitura e para a campanha dos investigados, o que também não é vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Afirmam os autores, ainda, que a empresa Altamidia continua recebendo valores dos cofres municipais para serviços de captação de imagens, coberturas fotográficas e captura de imagens aéreas de drone, mesmo após o período de vedação de publicidade institucional e que estas captações seriam para a campanha eleitoral. Assim, foi requerido e deferido, que a empresa demonstrasse as imagens que foram pagas através dos empenhos 6288, 7016, 7966 e 8006, o que passo a examinar na sequência.

 

C.1) DAS MIDIAS JUNTADAS PELA EMPRESA ALTAMIDIA:

Os autores fazem o destaque que a apresentação das fotos pela empresa Altamidia foi de maneira desorganizada e chegam a impugnar, intempestivamente, o formato de alguns arquivos apresentados.

Entretanto, é possível perceber que a organização das imagens apresentadas pela empresa foi de maneira adequada ao rito, os arquivos recebidos foram separados por empenho e evento, junto com suas referidas datas. Organização essa que faltou na apresentação da inicial, na qual os arquivos ficaram soltos, sem numeração sequencial, o que dificulta até mesmo a análise dos argumentos trazidos, seja pelo juízo, seja pela própria defesa. Ainda, causa estranheza essa afirmação apenas em suas alegações finais, sendo que o sr. Pedro Itamar, sócio-diretor da empresa foi ouvido em audiência e tal tópico não foi levantando em sua inquirição e nem mesmo após tomarem conhecimento do material apresentado em cumprimento da liminar ou após o deferimento do pedido de complementação do material em audiência.

Sobre a data das imagens do encontro dos professores ficou esclarecido pelo sr. Pedro Itamar, em seu depoimento, que, ao adquirir o equipamento, não alterou a data no sistema da câmera. Assim, as datas ficaram "desconfiguradas", o que não é um argumento implausível. Aliás, comparando com o restante das mídias apresentadas, apenas esse evento está com a data incorreta. Ainda, sequer houve aprofundamento de tal questão em momento apropriado, que seria durante a coleta da prova oral, quando ouvido o representante da empresa.

Passo ao exame dos serviços pagos pelos empenhos 6288, 7016, 7966 e 8006.

Empenho 6288 (ID 123333199): refere-se a 4 coberturas fotográficas, 2 imagens aéreas e 1 captação de imagens de vídeo.

Empenho 7016 (ID 123333200): refere-se a 6 coberturas fotográficas, 3 imagens aérea 1 captação de imagens de vídeo.

Empenho 7966 (ID 123333204): refere-se a 3 coberturas fotográficas e 3 captações de imagens de vídeos

Empenho 8006 (ID 123333203): refere-se a 2 coberturas fotográficas, 1 captação de imagens de vídeo e 1 imagem aérea (ausente pois o drone apresentou defeito).

Fazendo análise dos documentos apresentados pela empresa Altamidia, percebe-se que no empenho 7016 foi apresentado apenas 1 captação de imagens de vídeo quando deveriam ter sido apresentadas 2 captações. Em contrapartida, no empenho 7966 foram apresentadas 3 captações de vídeo e foram pagas apenas 2. Não foi apresentada a captação de imagens por drone no empenho 8006, pois, segundo o sr. Pedro Itamar, o drone apresentou defeito e foi enviado para conserto.

Diante de todo o contexto acima destacado, somente com base nas alegações da parte autora e do que veio aos autos a título de prova, não é possível aferir qualquer ilegalidade que configure abuso do poder político e uso da máquina pública em relação à utilização do contrato da empresa Altamidia com o Município para prestar serviços à campanha dos investigados. Aliás, vale destacar que não há informação nos autos que indique que a empresa Altamidia fosse contratada com caráter de exclusividade para prestar serviços somente ao Município de Quaraí, o que não impede, portanto, que também prestasse serviços à coligação dos investigados.

 

C.2) QUANTO AO SEGUNDO LOTE DE MÍDIAS APRESENTADO:

Os autores afirmam que os relatórios não foram apresentados de maneira correta, que a empresa deveria ter juntado os relatórios em formato "gravação de tela do aplicativo", onde seria possível verificar por onde o drone sobrevoou, e que não é possível visualizar os arquivos sem o próprio drone.

Entretanto, com uma breve pesquisa no "Google", é possível compreender que os arquivos apresentados são relatórios dos voos dos drones, e que é possível visualizá-los sem nenhum equipamento específico.

[...]

 Assim, caso a parte quisesse uma "gravação dos relatórios de voo" deveria especificar dessa maneira no próprio pedido, o que não fez.

Ainda, cabe ressaltar que conforme determinado em audiência (ID 124379566) após a apresentação dos relatórios pela empresa Altamidia, as partes teriam 3 dias para manifestação, assim, caso necessário complemento da prova, poderia ter sido requerido nesse prazo. Entretanto, conforme certidão ID 124418934, as partes foram intimadas dia 03/10/2024, entretanto, apenas retiraram a mídia apresentada após a intimação para alegações finais (ID 124503827), no dia 09/10/2024 conforme certidão de ID 124503828, demonstrando desinteresse na prova apresentada, perdendo a oportunidade de se manifestar sobre os arquivos apresentados e sua eventual complementação.

Conforme o próprio autor afirma em suas alegações finais, as fotos apresentadas no segundo lote de imagens se referem a material feito pela empresa Altamidia posteriormente aos empenhos referidos no processo, e também posteriores ao ajuizamento da ação, não se podendo concluir que as fotos apresentadas no cartão de memória foram pagos com os valores dos empenhos questionados na inicial.

Ademais, não foi requerido que a empresa apresentasse as imagens referentes ao empenho pago no mês de setembro. Logo, não é possível fazer a conexão das fotos de campanha com o valor pago no referido mês. Vale destacar que o autor se limitou a informar que o valor  "pode ser verificado junto ao portal transparência do município", sem se dar ao trabalho, ao menos, de apresentar print de tal informação. 

Inclusive o sr. Pedro afirmou em seu depoimento que presta serviços à Coligação Quaraí no Rumo Certo!, o que pode facilmente explicar as imagens no cartão de memória.

Mais uma vez cabe destacar que compete ao autor provar o que alega para além de conjecturas, pois a partir de ideias, possibilidade e meras suposições, não se caracteriza o abuso de poder político capaz de justificar o acolhimento dos pedidos iniciais.

O entendimento jurisprudencial é pacífico ao entender que para se caracterizar o abuso de poder é necessária prova robusta, inequívoca dos fatos que possam influenciar de maneira significativa o resultado do pleito, conforme já decidiu o Egrégio Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul:

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). ELEIÇÕES 2022. CANDIDATOS. DEPUTADO FEDERAL E ESTADUAL. REELEIÇÃO. FEDERAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. PROPAGANDA IRREGULAR. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. FINANCIAMENTO EMPRESARIAL IRREGULAR. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PRELIMINARES. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS - INADEQUAÇÃO PARCIAL DA VIA ELEITA. AUSÊNCIA DO INTERESSE DE AGIR. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA EMPRESA E DA FEDERAÇÃO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. FRAGILIDADE PROBATÓRIA DAS ALEGAÇÕES. IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. EXTINÇÃO. ART. 487, INC. I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 
[...] 5. O autor não se desincumbiu do ônus processual imposto pelo art. 373 do Código de Processo Civil de apresentar provas que comprovem suas alegações. A cassação de um mandato requer a demonstração evidente da ocorrência de ilícito e de sua repercussão ou alcance, visto que meras ilações não autorizam a aplicação das severas sanções pleiteadas na inicial. 6. Improcedência dos pedidos. Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº060198070, Acórdão, Des. Voltaire De Lima Moraes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 06/11/2023. 

Recurso. Investigação judicial eleitoral. Alegado abuso de poder e captação ilícita de sufrágio. Improcedência. Prazo recursal a ser observado nas demandas investigatórias nas quais se cumulam a apuração de abuso de poder e a captação ilícita de sufrágio (artigo 41-A da Lei das Eleições) é o estabelecido no artigo 258 do Código Eleitoral. Ausência de prova robusta e incontroversa para a caracterização do abuso do poder econômico e sua potencial influência no resultado do pleito. Provimento negado. Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 176, Acórdão, Des. DES. FEDERAL MARGA INGE BARTH TESSLER, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, 12/03/2010. 

 No mesmo sentido é o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral:

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. CANDIDATOS A PRESIDENTE E VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA. PRELIMINARES. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL E INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. REJEIÇÃO. ABUSO DE PODER POLÍTICO. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. JORNAL IMPRESSO. PREVALÊNCIA DA LIBERDADE DE IMPRENSA. VEÍCULO DE COMUNICAÇÃO MANTIDO PELO ESTADO. PECULIARIDADES. BALIZAS MAIS ESTREITAS. USO. BEM PÚBLICO. COAÇÃO. SERVIDORES. CONDUTA VEDADA E ABUSO NÃO CONFIGURADOS. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA. INEXISTÊNCIA DE GRAVIDADE. IMPROCEDÊNCIA.1. Não é inepta a petição inicial que descreve os fatos, os fundamentos do pedido e possibilita à parte o efetivo exercício do direito de defesa, corroborada com início de prova documental.2. O candidato supostamente beneficiado pelo abuso de poder é parte legítima para figurar no polo passivo de ação de investigação judicial eleitoral, ainda que a conduta investigada não seja a ele atribuída. Precedentes.3. A ação de investigação judicial eleitoral proposta em desfavor de candidatos a presidente e vice-presidente da República, em litisconsórcio com supostos autores de ato ilícito configurador de abuso, submete-se à relatoria do Corregedor-Geral da Justiça Eleitoral, na forma do artigo 22 da Lei Complementar 64/1990, operando-se o julgamento perante o Plenário do TSE, razão pela qual não há inadequação da via eleita.4. Para se caracterizar o abuso de poder, impõe-se a comprovação, de forma segura, da gravidade dos fatos imputados, demonstrada a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo). A mensuração dos reflexos eleitorais da conduta, não obstante deva continuar a ser ponderada pelo julgador, não se constitui mais em fator determinante para a ocorrência do abuso de poder, sendo agora revelado, substancialmente, pelo desvalor do comportamento.5. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que fato ocorrido na imprensa escrita possui alcance inegavelmente menor em relação a outros veículos de comunicação social, como o rádio e a televisão, em face da própria característica do meio impresso, cujo acesso à informação tem relação direta com o interesse do leitor (Respe 56173/SC, Relatora Ministra Luciana Lóssio, DJe de 17.6.2016).6. Os veículos impressos de comunicação podem assumir posição favorável em relação a determinada candidatura, inclusive divulgando atos de campanha e atividades parlamentares, sem que isso caracterize, por si só, uso indevido dos meios de comunicação social, devendo ser punidos pela Justiça Eleitoral os eventuais excessos (RO 7569-30IRJ, Relator Ministro João Otávio de Noronha, DJe de 5.11.2015).7. Apesar de o jornal pertencer ao Governo da Paraíba e receber recursos públicos, circunstâncias que hão de estreitar as balizas para a liberdade de imprensa, porquanto não se poderia admitir que um veículo de comunicação estatal fosse utilizado deliberadamente como instrumento para favorecer determinada campanha, o conjunto fático-probatório não ostenta os elementos necessários a assim emoldurar as condutas descritas na inicial, tampouco a revelar gravidade suficiente para a imposição das penalidades que a espécie comporta.8. A Corte Suprema assegurou a "manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento nos ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos" (ADPF 548/DF, sessão de 31.10.2018).9. Inexistência de acervo probatório seguro a demonstrar o uso abusivo de um canal público de comunicação (jornal) em prol de determinada candidatura e em detrimento de outra, assim como ausência de condutas vedadas consistentes no uso de bem público e na coação de servidores do Estado. 10. O Tribunal Superior Eleitoral firmou orientação no sentido de que, para afastar legalmente determinado mandato eletivo obtido nas urnas, compete à Justiça Eleitoral, com base na compreensão da reserva legal proporcional e fundamento em provas robustas admitidas em direito, verificar a existência de grave abuso de poder, suficiente para ensejar as rigorosas sanções de cassação do registro, diploma ou mandato e inelegibilidade. Precedentes.11. Ação de Investigação Judicial Eleitoral que, rejeitadas as preliminares, julga-se improcedente.Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº060182324, Acórdão, Min. Jorge Mussi, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 26/09/2019. (grifei)

Sob essa perspectiva, não se pode concluir, a partir dos fatos apresentados aos autos, que houve abuso de poder político por parte dos requeridos. Ainda que a prova testemunhal não tenha sido plenamente imparcial, já que a maioria das pessoas arroladas possuíam algum tipo de vínculo com a coligação da qual fazem parte os candidatos Jeferson Pires e Patrícia Moraes, sendo ouvidas como meros informantes, a parte autora ficou bastante distante de comprovar de forma contundente as alegações da exordial.

Um dos princípios de maior relevo da Constituição Federal, é o constante no parágrafo único do artigo 1º, o qual enuncia que todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Nesse sentindo, qualquer decisão jurisdicional no sentido de declarar a inelegibilidade, cassar o registro ou diploma, deve ser concebida pela linha da exceção, apenas quando presentes provas robustas e elementos com envergadura significativa e suficiente para macular o pleito. Não pode tal decisão, de impacto substancial na própria democracia representada em seu mais alto grau pelo voto popular, ser sustentada por conjecturas e suposições frágeis que não encontraram o mínimo respaldo na prova produzida durante o curso processual.

Há que se ressaltar, ainda, que este Juízo teve a cautela de possibilitar a mais ampla dilação probatória à parte autora por entender que este é justamente o objetivo da ação de investigação judicial eleitoral, tanto que todos os pedidos formulados no sentido de ampliação da instrução probatória e busca de elementos foram deferidos.

Finalmente, nunca é demais reforçar que qualquer decisão judicial que desconsidere a soberania do voto deve ser respaldada em elementos concretos e inequívocos, pois a preservação da democracia demanda que a escolha do povo seja respeitada.

No caso dos candidatos eleitos em Quaraí, é crucial que a análise dos fatos e das provas respeite a escolha soberana dos eleitores, garantido que a intervenção judicial não anule, sem fundamento robusto, o direito democrático da população de ver seus representantes exercendo o mandato outorgado. A preservação da estabilidade institucional e da confiança na democracia está diretamente vinculada ao respeito à soberania do voto popular que, no caso de Quaraí, elegeu Jeferson da Silva Pires e Patrícia Moraes com mais de 54% dos votos válidos.

Em suma, a soberania popular, enquanto fundamento do Estado Democrático de Direito, exige que os eleitos pelo voto tenham seu mandato resguardado, salvo em situações em que se comprove, de forma irrefutável, que a legitimidade do pleito foi afetada por condutas ilícitas capazes de comprometer a escolha democrática, o que absolutamente não se verificou no caso em tela.

Portanto, pelas razões expostas, considerando ainda o bem lançado parecer do Ministério Público Eleitoral, que acolho integralmente e em relação ao qual peço venia para adotar também como reforço à argumentação acima exposta, a improcedência da presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral é medida que se impõe.  (grifos nossos)

 

Apesar do inconformismo da recorrente, suas razões recursais não são suficientes para se infirmar a conclusão da sentença.

Passo à análise individualizada dos fatos:

Fato 1 – vídeos gravados na rua Francisco Carlos Reverbel (26.07.2024, 01.08.2024 e 13.08.2024) com utilização de servidores e estrutura do município:

Os três vídeos, ditos como irregulares, foram veiculados nas redes sociais privadas do candidato à reeleição Jéferson Pires (Instagram e facebook), sem que se tenha demonstrado o uso de servidores ou de recursos públicos para a elaboração do material; tampouco que o acesso ao local de gravação fosse restrito ao candidato, muito menos que tenha havido interrupção das obras ou da apresentação dos alunos.

Ocorre que não há ilegalidade nas postagens realizadas, em seu perfil de rede social, pelo candidato à reeleição como prefeito de Quaraí, pois a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral relativa a caso análogo ao presente definiu que a divulgação de realizações do governo em perfil pessoal do agente público, voltada à exaltação de determinada candidatura, não é apta à configuração da conduta vedada, consistindo em exercício legítimo da liberdade de pensamento e expressão (art. 5º, incs. IV e IX, da Constituição Federal), indissociáveis ao debate político e à formação da vontade do eleitor em um ambiente genuinamente democrático:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. CONDUTA VEDADA. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. VEICULAÇÃO EM PERFIL PARTICULAR DE REDE SOCIAL. UTILIZAÇÃO DA MÁQUINA PÚBLICA NÃO DEMONSTRADA. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno contra decisão que negou seguimento a recurso especial eleitoral interposto para impugnar acórdão que manteve sentença de improcedência da ação de investigação judicial eleitoral por uso indevido dos meios de comunicação social e conduta vedada.

2. O desequilíbrio gerado pelo emprego da máquina pública é a essência da vedação à publicidade institucional prevista no art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997, que objetiva assegurar a igualdade de oportunidades entre os candidatos.

3. A veiculação de postagens sobre atos, programas, obras, serviços e/ou campanhas de órgãos públicos federais, estaduais ou municipais em perfil privado de rede social não se confunde com publicidade institucional autorizada por agente público e custeada com recursos públicos, a qual é vedada nos três meses que antecedem as eleições (art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997).

4. É lícito aos cidadãos, inclusive os servidores públicos, utilizarem–se das redes sociais tanto para criticar quanto para elogiar as realizações da Administração Pública, sem que tal conduta caracterize, necessariamente, publicidade institucional.

5.Da moldura fática do acórdão regional se extrai que: (i) houve divulgação de realizações do governo municipal, por meio de fanpage gerenciada pelo primeiro agravado, servidor público, fora do seu horário de trabalho; (ii) não há notícia do emprego de recursos ou equipamentos públicos para a produção e divulgação das postagens, integralmente feitas sob responsabilidade do agravado, inclusive no que diz respeito à digitalização de encarte distribuído pela Prefeitura antes do período vedado; e (iii) inexiste prova de que tenha havido o uso de algum artifício nas postagens impugnadas que permitisse caracterizá–las como redirecionamento dissimulado de publicidade institucional autorizada ou mantida por agente público em período vedado.

6. Acertada, portanto, a conclusão de que tal conduta está protegida pela liberdade de expressão (arts. 5º, IV e IX, e 220 da Constituição Federal) e não configura publicidade institucional.

7. Não se conhece de recurso especial eleitoral por dissídio jurisprudencial nos casos em que inexiste similitude fática entre as hipóteses tratadas nos acórdãos confrontados (Súmula nº 28/TSE).

8. O adequado desempenho do dever de fundamentação pelos órgãos judiciais colegiados não exige que, no julgamento, todos os argumentos trazidos por voto divergente sejam refutados pelos demais juízes. Proclamado o resultado, considera–se fundamentado o acórdão pela tese jurídica prevalecente nos votos que compuseram a maioria vencedora, como ocorreu, no caso, em relação à atipicidade da conduta.

9. Agravo interno a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 37615, Acórdão, Relator(a) Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 74, Data 17.04.2020.)   (Grifo nosso)

 

A jurisprudência deste Tribunal está alinhada ao entendimento firmado pelo TSE sobre o tema, tendo esta Corte decidido, na sessão de 14.12.2020, nos autos do RE n. 0600370-31.2020.6.21.0067, da relatoria do ilustre Des. Eleitoral Amadeo Henrique Ramella Buttelli, ser lícito aos candidatos à reeleição publicar em perfil de rede social anúncios de obras e creditar “ao seu trabalho” os feitos que enaltecem a candidatura:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PROPAGANDA IRREGULAR. PUBLICAÇÃO DE VÍDEO EM REDES SOCIAIS. RECEBIMENTO COMO AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PRELIMINARES. CERCEAMENTO DE DEFESA. ILEGITIMIDADE PASSIVA E INÉPCIA DA INICIAL. AFASTADAS. MÉRITO. VEREADORA CANDIDATA À REELEIÇÃO. DEMONSTRAÇÃO DE REALIZAÇÕES DURANTE O MANDATO. MANIFESTAÇÃO PERMITIDA. IMPROCEDÊNCIA. AFASTADA A MULTA. PROVIMENTO.

1. Recurso interposto em face de sentença que julgou parcialmente procedente representação, determinando a exclusão em definitivo de vídeo postado no Facebook. Aplicação de multa por violação do art. 73, § 4º, da Lei n. 9.504/97. Recebimento como Ação de Investigação Judicial Eleitoral e conclusão pela ocorrência de propaganda institucional. Ausência de prejuízo no processamento, respeitadas as devidas oportunidades às partes.

2. Matéria preliminar afastada. 2.1. Inépcia da inicial. Inexistência de discordância entre as partes sobre a especificação da postagem, sendo que a peça processual oferece elementos suficientes a delimitar a publicação refutada e imagens do carro adesivado, tomado como propaganda irregular. Ausência de defeito. 2.2. Ilegitimidade passiva. Inequívoca a participação da candidata na gravação como personagem central, figurando nas imagens portando a câmera em mãos. Ademais, a postagem do vídeo foi reproduzida em sua própria rede social. 2.3. Cerceamento de defesa. Pedido de produção de prova oral. Providência que não acrescentaria elementos úteis ao julgamento.

3. Não há falar em propaganda institucional, que se refere à publicidade, subsidiada por verbas públicas, de atos, programas, obras, serviços e campanha dos órgãos públicos. O caso em tela, a despeito de ser a candidata vereadora concorrendo à reeleição, não se conforma à previsão legal.

4. O fato de estar ausente a URL da postagem já fragiliza a representação. Demonstrada, a partir do pouco conteúdo acessado, manifestação absolutamente adequada e pertinente à propaganda regular de candidato a mandato sucessivo na Câmara de Vereadores. Legítimo “anunciar obra” e creditar “ao seu trabalho” os feitos anteriores que enaltecem a candidatura. Não vislumbrado resquício de irregularidade na publicação, muito menos publicidade institucional.

5. Provimento. Improcedência da ação. Afastada a multa.

(RE - 0600370-31.2020.6.21.0067 - Encantado – RS – Rel. DES. ELEITORAL AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, j. 14.12.2020.)

 

Fato 2 – utilização de servidores e bens do município para captação de imagens de poços artesianos em poço artesianos

A coligação recorrente sustenta que o Secretário de Obras, Fábio Ferreira de Oliveira Barros, e Tiago Espelocim teriam realizado gravação de propaganda eleitoral em horário de trabalho, mediante a utilização de automóvel do município.  Aduz que Tiago estaria trabalhando em arquivo de vídeo no dia 17.8.2024, após as 22h, e que o ex-secretário do governo Jackson Castro teria convidado, na live de lançamento da campanha, os presentes para assistirem a vídeo produzido “pela comunicação do governo municipal”.

 Inicialmente, é importante registrar que não há vedação legal no sentido de que servidores trabalhem em prol de determinada candidatura, desde que não haja conflito com a jornada laboral dentro da repartição pública, como reiteradamente decidido pelo Tribunal Superior Eleitoral:

[...] Conduta vedada a agentes políticos conforme o art. 73, III e V, da Lei das Eleições. Afastamento. Não há vedação peremptória à participação de agentes públicos em atos de campanha [...] 3. A norma do art. 73, inciso III, da Lei n. 9504/97 não proíbe a participação de agente público em campanha eletiva; ela somente preserva a impessoalidade e a legalidade do agente público no exercício de suas funções. [...]. NE: Trecho do voto do relator: “[...] a legislação não proíbe peremptoriamente a participação de agentes públicos em atos de campanha. A ratio da norma é evitar que a máquina pública — no caso, seu componente pessoal — seja utilizada para fins eleitorais, configurando abuso do poder político. O fato de agentes públicos, fora do horário de expediente e sem desvio de função, participarem de militância política não representa, per si, ilícito eleitoral.[...].

(Ac. de 27.8.2024 no RO-El n. 060429779, rel. Min. Floriano de Azevedo Marques, red. designado Min. André Ramos Tavares.) 

 

Estabelecido esse parâmetro, resta evidente que cumpria à autora da ação a demonstração do fato, ônus do qual não se desincumbiu, pois, como mencionado pela sentença, em relação à fala do ex-secretário de governo Jackson Castro, não foram trazidas aos autos provas para corroborar o quanto afirmado, no sentido de elaboração da propaganda eleitoral pela “comunicação do governo municipal”.

Dessa forma, em consonância com o entendimento do juízo a quo, “apenas "estranhezas" não são elementos suficientes para aplicação das sanções requeridas na inicial, sendo que era ônus da parte autora fazer prova contundente de suas alegações, considerando que as penalidades previstas em lei, ao fim e ao cabo, afastam a soberania do voto popular que, no Município de Quaraí, reelegeu o atual prefeito Jeferson da Silva Pires e a candidata a vice-prefeita, Patrícia Moraes, com mais de 54% dos votos válidos.

Fato 3 – similaridade entre a publicidade institucional e a campanha dos recorridos Jeferson e Patrícia

Sustenta a recorrente que o material de campanha dos recorridos possui o mesmo padrão de captação, produção e edição de imagens daquele utilizado pela Prefeitura, afirmando que a mesma empresa de publicidade (Altamidia) teria prestado serviços à campanha e à Prefeitura com custeio de recursos públicos, inclusive com o uso de drone.

Pois bem, novamente aqui importante registrar que não há vedação de que a mesma empresa de publicidade preste serviços a um ente público e a uma campanha eleitoral, desde que, obviamente, o custeio desta última seja realizado às expensas do candidato e/ou partido e/ou coligação.

Na espécie, apesar da vasta documentação juntada aos autos (relatórios dos voos do drone, notas de empenho), não ficou demonstrada a associação, a conexão entre o material de campanha produzido para os recorridos e os valores  pagos à empresa Altamidia pelo município.

Assim é que, na ausência de prova  robusta e inconteste da ocorrência de dispêndio de verba pública à realização da campanha dos recorridos, deve ser mantida integralmente a sentença de improcedência da ação, pois a jurisprudência do e. Tribunal Superior Eleitoral é firme no sentido de que é imprescindível a existência de prova idônea e cabal dos fatos, “não sendo suficientes meros indícios ou presunções” para a desconstituição de mandato obtido soberanamente com o voto popular (TSE - AgR-REspe n. 471-54; Relator: Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, DJe de 19.9.2019; e AgR-REspe n. 272-38, Relator: Min. Jorge Mussi, DJe de 02.4.2018):

Eleições 2022. [...] Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE). Abuso de poderes político e econômico. Candidata ao cargo de deputado estadual. Superfaturamento em processos licitatórios. Ausência de prova robusta. [...] 2. Para fins de julgamento da AIJE, é imprescindível a prática de abusos com gravidade suficiente para malferir os bens jurídicos tutelados pelas normas eleitorais que a regulamentam, em especial a legitimidade e normalidade das eleições. Além disso, para a configuração do abuso dos poderes político e econômico, a firme jurisprudência desta Corte Superior entende que há a necessidade da existência de prova contundente, inviabilizada qualquer pretensão com respaldo em conjecturas e presunções. Precedente. [...].”

(Ac. de 19/9/2024 no AgR-RO-El n. 060165936, rel. Min. André Mendonça.)

Eleições 2018 [...] Abuso do poder econômico. [...] Utilização eleitoreira de programa filantrópico denominado dentistas sem fronteiras. Ausência de prova robusta. Promessa de entrega de insumos odontológicos em troca de votos. Diálogos no Whatsapp. Licitude. [...] 6.4. É tênue o liame entre as ações filantrópicas e os atendimentos gratuitos com caráter eleitoreiro, mormente quando verificado o aumento do programa em ano eleitoral. Nessa hipótese, para fins de se reconhecer eventual abuso, faz–se mister prova robusta de que os serviços altruísticos visaram vincular a imagem do postulante a cargo eletivo às ações filantrópicas, a evidenciar o viés eleitoral, sob pena de criminalizar essa importante ação social em anos eleitorais. [...] 6.6. Esta Corte Superior exige ‘provas robustas e incontestes para a procedência da AIJE por abuso do poder econômico e da representação eleitoral por captação ilícita de sufrágio, não sendo suficientes meros indícios ou presunções’ [...] 6.7. No caso, a conclusão do acórdão regional acerca do uso abusivo do programa Dentistas Sem Fronteiras lastreou–se no depoimento isolado da responsável legal da clínica alugada devido à expansão do programa filantrópico e na apreensão, no referido local, de cartões de visita da recorrente em que consta seu nome, foto, telefone e redes sociais. Não há nenhum outro elemento probatório que corrobore as suspeitas aduzidas pela referida testemunha, sendo certo que nenhum beneficiário dos atendimentos odontológicos foi ouvido em Juízo. 6.8. Nesse contexto, a circunstância de ter sido verificado um aumento da demanda por atendimentos odontológicos – que motivou o aluguel de um espaço maior – e o fato de a recorrente possuir patrimônio elevado não são hábeis a retirar o caráter presuntivo das declarações prestadas pela testemunha de acusação. Também ausente o quantitativo – ainda que estimado – de beneficiários dos atendimentos odontológicos realizados no âmbito do programa Dentistas sem Fronteiras, o que impossibilita aferir o grau de extensão dos supostos benefícios advindos das condutas narradas. [...] 6.10. Inexistente elementos probatórios que sustentem o cenário fático narrado na AIJE, é inviável a condenação pelo cogitado abuso do poder econômico. [...]”.

(Ac. de 14.3.2023 no RO-El n. 060173077, rel. Min. Raul Araújo.)

 

ANTE O EXPOSTO, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pela COLIGAÇÃO PARA QUARAÍ VOLTAR A SORRIR.