REl - 0600124-98.2024.6.21.0130 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/06/2025 00:00 a 24/06/2025 23:59

VOTO

O recurso é tempestivo, e tem em si os demais pressupostos de admissibilidade, de forma que está a merecer conhecimento.

No mérito, FLÁVIA DA SILVEIRA COELHO recorre contra a sentença que desaprovou suas contas de campanha, apontou ausência de contratos relativos a despesas realizadas com recursos recebidos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, e determinou o recolhimento dos valores considerados irregulares.

No recurso, a prestadora registra a juntada dos documentos faltantes em sede de embargos de declaração, ainda que se posicione no sentido de que eles seriam desnecessários.

Destaco, preambularmente, que o conhecimento de documentos juntados após a sentença é prática aceita por este Tribunal na classe processual sob exame, desde que não acarrete prejuízo à tramitação do processo e se trate de documento simples, capaz de esclarecer as irregularidades apontadas sem a necessidade de diligências complementares. A medida visa, sobretudo, salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha e a celeridade processual, conforme precedente desta Corte.

A matéria de comprovação de gastos eleitorais está disciplinada no art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, ao que importa:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

§ 1º Além do documento fiscal idôneo, a que se refere o caput, a Justiça Eleitoral poderá admitir, para fins de comprovação de gastos, qualquer meio idôneo de prova, inclusive outros documentos, tais como:

I – contrato;

Especificamente as despesas apontadas como não comprovadas são as seguintes: (i) fornecedor PIERRE CRUZ VEIGA, Produção de programas de rádio, televisão ou vídeo, valor de 5.000,00; (ii) prestador LUCAS LAZARI SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA, Serviços advocatícios, R$ 4.333,33; e (iii) prestador RODRIGO FERREIRA NARDON – CONTABILIDADE, Serviços contábeis, R$ 890,00.

Alega a recorrente que os gastos estariam comprovados desde o início, por meio de notas fiscais e, posteriormente, através dos contratos.

À análise propriamente dita da questão. 

Saliento, inicialmente, que de fato há previsão de comprovação de despesa por meio de contratos. Porém, para que tal jaez de documento defina peremptoriamente o destino probatório de um fato, há a necessidade de se pressupor (1) a ausência da nota fiscal ou (2) dúvida razoável quanto à sua lisura.

Neste sentido, o julgamento do Ac. de 27.02.2023 na PC-PP n. 060023545, rel. Min. Benedito Gonçalves, red. designado Min. Raul Araújo, o qual consignou que a leitura conjugada do art. 18, caput e § 1º, da Res.- TSE n. 23.546/17 permite concluir que, se o partido político apresenta nota fiscal formalmente regular, contendo todos os detalhes da contratação – com destaque para o serviço prestado ou o material fornecido –, não cabe em regra exigir provas adicionais, exceto no caso de dúvida sobre a idoneidade do documento ou a execução do objeto.

Veja-se, ainda:

ELEIÇÕES 2022. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CANDIDATA A DEPUTADA FEDERAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA: APROVADAS, COM RESSALVAS, E DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. IMPUGNAÇÃO SUFICIENTE DAS RAZÕES DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO PROVIDO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO. COMPROVAÇÃO DE DESPESA. APRESENTAÇÃO DE CONTRATO E NOTA FISCAL COM DESCRIÇÃO PORMENORIZADA DOS SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO, PUBLICIDADE E MARKETING. DOCUMENTOS IDÔNEOS. INEXISTÊNCIA DE DÚVIDA QUANTO À EFETIVA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS CONTRATADOS. CUMPRIMENTO SATISFATÓRIO DA EXIGÊNCIA DO §1º E DO CAPUT DO ART. 60 DA RESOLUÇÃO N. 23.609/2019 DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. DESCONFORMIDADE DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL SUPERIOR. RECURSO ESPECIAL AO QUAL SE DÁ PROVIMENTO.

1. O reenquadramento jurídico do acervo fático-probatório delineado na decisão recorrida não se confunde com reexame do acervo dos autos e, por isso, não esbarra no óbice na Súmula n. 24 deste Tribunal Superior.

2. Pelo quadro fático delineado no acórdão e constante da decisão agravada, conclui-se que a decisão proferida pelo Tribunal de origem não se harmoniza com a orientação deste Tribunal Superior.

3. A apresentação de nota fiscal idônea com a descrição pormenorizada dos serviços prestados ao contratante é suficiente para a comprovação da despesa paga com recursos públicos.

4. Agravo em recurso especial e recurso especial providos para afastar a determinação de recolhimento do valor de R$ 58.300,00 ao erário.

Recurso Especial Eleitoral nº060602919, Acórdão, Min. Benedito Gonçalves, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, 22/05/2024.

(Grifei.)

Sublinho que, em verificação às notas fiscais apresentadas na entrega da contabilidade, os documentos de ID 45844953, ID 45844954 e ID 45844955, respectivamente referentes à prestação de serviço contábil, de assessoria advocatícia e de produção de programa de rádio, mostram-se regulares, sem rasuras, e todos emitidos no curso do mês de setembro - no período admitido para contratação de despesas.

Nessa linha de pensamento, deve ser dado provimento ao recurso interposto para que as contas de sua campanha sejam aprovadas em conformidade com o art. 74, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Diante do exposto, VOTO para dar provimento ao recurso de FLÁVIA DA SILVEIRA COELHO, para julgar as contas aprovadas e afastar a ordem de recolhimento de valores.