REl - 0600233-36.2020.6.21.0039 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/11/2020 às 14:00

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

De outro lado, ressalto a possibilidade excepcional de que, em recursos que versem sobre registro de candidatura, a parte apresente documentos. A posição decorrente de jurisprudência do TSE (v.g. AgRg em RESPe n 128166, julgado em 30.9.2017, Rel. Min. LUIZ FUX) guarda coerência sistêmica, sobretudo porque, em primeiro grau de jurisdição, o requerimento de registro de candidatura é considerado expediente de natureza eminentemente administrativa – ou seja, o recurso em RCAND é, a rigor, o primeiro momento de produção de prova em ambiente jurisdicional propriamente dito.

Mérito

No mérito, o recorrente teve o registro de sua candidatura indeferido por duas razões: (1) indeferimento do DRAP do partido pelo qual o recorrente pretende concorrer ao pleito 2020 e (2) ausência de comprovação de filiação partidária.

Quanto ao primeiro motivo, o indeferimento do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) do seu partido, importante ressaltar que, em sessão realizada em 03.11.2020, o recurso do MDB (RE n. 0600218-67.2020.6.21.0039), de minha relatoria, foi provido, conforme ementa que segue:

RECURSO. DEMONSTRATIVO DE REGULARIDADE DE ATOS PARTIDÁRIOS (DRAP). APRESENTAÇÃO INTEMPESTIVA E INOBSERVÂNCIA DE COTAS DE GÊNERO. PRELIMINAR. CONHECIMENTO DE DOCUMENTOS EM SEDE RECURSAL. POSSIBILIDADE. RECEPÇÃO DA MÍDIA E TRANSMISSÃO DO DRAP REALIZADOS APÓS ESCOAMENTO DO PRAZO. ABERTURA DO CARTÓRIO APÓS HORÁRIO DE EXPEDIENTE. AUTORIZAÇÃO DO MAGISTRADO. EXPECTATIVA LEGÍTIMA GERADA PELO PODER PÚBLICO. PRIMADO DA BOA-FÉ. COTA DE GÊNERO. INCLUSÃO DE CANDIDATA FEMININA. IRREGULARIDADES SUPERADAS. DEFERIMENTO DO REGISTRO. PROVIMENTO.

1. Recurso contra a sentença que indeferiu o requerimento de registro para concorrer ao pleito proporcional de 2020, em virtude do DRAP ter sido apresentado intempestivamente à Justiça Eleitoral e sem a observância dos percentuais legais mínimos exigidos para o registro de candidaturas de cada gênero, em descumprimento às disposições do art. 9º, inc. XI, da Resolução TSE n. 23.624/20 e do art. 17, caput e § 2º, da Resolução TSE n. 23.609/19.

2. Possibilidade de conhecimento de documentação trazida com o recurso, ainda que oportunizada previamente a sua juntada, com respaldo na interpretação ampliativa conferida ao enunciado da Súmula n. 3 pelo Tribunal Superior Eleitoral, mais consentânea às particularidades do processo de registro de candidatura (RO n. 060057426, Relator Ministro Edson Fachin, Publicação na sessão de 27.11.2018).

3. O art. 9º, incs. X e XI, da Resolução TSE n. 23.624/20, que ajustou, em atenção à EC n. 107/20, os marcos temporais concernentes à entrega dos pedidos de registro de candidatura à Justiça Eleitoral, definiu que a apresentação do DRAP e do Requerimento de Registro de Candidatura (RRC) à Justiça Eleitoral deveria ser feita por meio de transmissão pela internet até as 8 h do dia 26.9.2020, ou, alternativamente, em meio físico, mediante a entrega da mídia respectiva ao juízo competente, até as 19 h do dia 26.9.2020.

4. Na hipótese, a apresentação do DRAP à Justiça Eleitoral envolveu circunstâncias fáticas peculiares, demandando tratamento que assegure a efetividade e a adequação da prestação jurisdicional, com vistas a garantir o exercício da capacidade eleitoral passiva, direito fundamental de índole constitucional, em maior amplitude possível a todas as partes atingidas pelo julgamento da lide. Independentemente da definição da causa que levou ao desatendimento dos prazos, foi autorizado pelo juiz eleitoral a reabertura do cartório eleitoral quando já encerrado o expediente forense, para que o servidor designado recepcionasse a mídia e transmitisse eletronicamente os dados relativos ao DRAP, ato que se efetivou às 20h47min. No mesmo dia, entregue em mídia eletrônica o DRAP relativo ao pedido de registro dos seus candidatos aos cargos de prefeito e vice-prefeito, o qual foi transmitido às 20h48min. O ato autorizativo emanado do magistrado da zona eleitoral gerou uma expectativa legítima quanto à tempestividade da entrega, a qual não pode ser desconsiderada pelo órgão julgador, na medida em que possui indiscutível relevância jurídica no plano do exercício dos direitos de cidadania.

5. A proteção de expectativas legítimas, geradas em particular por atos do próprio Poder Público, decorre da obrigação estatal de agir conforme os ditames do primado da boa-fé, constituindo, por assim dizer, um imperativo do Estado Democrático de Direito, ao qual os princípios da segurança jurídica e da confiança se tornam especialmente essenciais e indispensáveis quando as expectativas suscitadas são motivadas por comportamentos objetivos do Estado, dos quais se denota a aparente existência de direitos que, em verdade, não existem, mas, nem por isso, ficam à margem da tutela jurisdicional, como ensinam os estudos concernentes à Teoria da Aparência (TSE, PET n. 5904620156000000/DF, Relator Ministro LUIZ FUX, DJE de 26.9.2016, pp. 34-36).

6. Embora não observados os prazos fixados no art. 9º, incs. X e XI, da Resolução TSE n. 23.624/20, superada a irregularidade atinente à intempestividade da apresentação do DRAP à Justiça Eleitoral. Demonstrado em sede recursal o requerimento de registro de seis candidaturas femininas, integralizando 31,58% dos 19 candidatos registrados pela agremiação, restando, por consequência, atendida a norma disposta no art. 17, caput e § 2º, da Resolução TSE n. 23.609/19.

7. Superadas as falhas e oportunizado o contraditório e a ampla defesa, o processo encontra-se maduro para o julgamento de mérito por este Tribunal, tornando cabível e recomendável, diante da exiguidade dos prazos que devem ser obedecidos no período eleitoral, que se dispense o retorno dos autos à origem para novo pronunciamento judicial, com base no art. 1.013, § 1º, do Código de Processo Civil. Deferido o registro.

8. Provimento.

(Grifei.)

 

Caso fosse esse o fundamento exclusivo para o não acolhimento do pedido de registro de candidatura do recorrente pelo magistrado de piso, poder-se-ia prover o presente apelo para o fim de reformar a sentença.

Entretanto, o recorrente não comprovou sua filiação partidária, deixando de observar, assim, a condição de elegibilidade prevista no art. 9º, § 1º, inc. V, da Resolução TSE n. 23.609/19.

Com efeito, primeiramente, sublinho que, em consulta efetuada pela minha assessoria, não consta nenhum registro do recorrente no Sistema de Filiação Partidária (FILIA).

Nesse passo, alega o recorrente que juntou cópia da ficha e ata de filiação partidária, atas de reuniões da agremiação e ata da escolha dos candidatos para o pleito de 2020.

É cediço que outras formas de comprovação do atendimento do requisito poderiam ser apresentadas, na esteira do verbete da Súmula n. 20 do TSE, segundo o qual “a prova de filiação partidária daquele cujo nome não constou da lista de filiados de que trata o art. 19 da Lei nº 9.096/1995 pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública”.

TODAVIA, a documentação trazida aos autos é constituída por documentos unilaterais, desprovidos de valor probante na linha da jurisprudência do TSE e desta Corte, inviabilizando o acolhimento da pretensão do recorrente.

Colaciono ementa de julgado deste Tribunal:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. REGISTRO DE CANDIDATURA. CARGO. VEREADOR. INDEFERIMENTO. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. ART. 9º, CAPUT, DA LEI N. 9.504/97. NÃO ATENDIDA. AUSENTE FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADO. OITIVA DE TESTEMUNHA. IRRELEVANTE. DOCUMENTOS PRODUZIDOS UNILATERALMENTE. DESTITUÍDOS DE FÉ PÚBLICA. SÚMULA N. 20 DO TSE. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE NÃO ATENDIDA. INDEFERIMENTO DO REGISTRO. DESPROVIMENTO.

1. Indeferimento de pedido de registro de candidatura ao cargo de vereador, em razão da ausência de prova da filiação tempestiva ao partido pelo qual pretende concorrer.

2. Afastada a preliminar. Alegado cerceamento de defesa na decisão que considerou desnecessária a prova testemunhal para fins de demonstração de filiação partidária. Consignado na sentença que, na hipótese, a prova deve ser feita por meio documental.

3. Conforme se constata do art. 9º da Lei n. 9.504/97, para concorrer às Eleições 2020, o candidato deverá estar com a filiação deferida pelo partido no prazo de 06 (seis) meses antes da data do pleito. Apresentação de declaração do partido, ficha de filiado, lista de filiação interna e print de tela do sistema de filiação, todos documentos unilaterais, destituídos de fé pública, insuficientes para demonstrar o vínculo, nos termos da Súmula TSE n. 20.

4. Desatendido o disposto no art. 9º da Lei n. 9.504/97 e no art. 10 da Resolução TSE n. 23.609/19, razão pela qual deve ser mantida a decisão que indeferiu seu requerimento de registro de candidatura.

5. Desprovimento.

(TRE - RE - Recurso Eleitoral n. 060022630 - Gravataí/RS, ACÓRDÃO de 29/10/2020, Relator(a) ROBERTO CARVALHO FRAGA, Publicação:PSESS - Publicado em Sessão, Data: 03/11/2020.)

 

Vale dizer, exige-se expressamente a fé pública da documentação apresentada, ônus do qual o recorrente não se desincumbiu.

Outra não é a direção do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (ID 8117533), conforme se infere:

A ficha de filiação e as atas de reunião partidária apresentadas consistem em documentos unilaterais, não são dotados de fé pública e não são capazes de comprovar a filiação partidária. Nesse sentido, toda a documentação juntada pelo recorrente é unilateral, sendo essa inclusive a natureza das atas de reuniões partidárias, as quais não se prestam, por isso, a fazer prova da filiação, conforme já decidiu esse egrégio Tribunal:

REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO FEDERAL. ELEIÇÕES 2018. ALFABETIZAÇÃO. COMPROVADO O REQUISITO. AUSÊNCIA DE FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE EXIGIDA PELO ART. 14, § 3º, INC. V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INDEFERIMENTO.

1. Pedido de registro de candidatura. Comprovação da alfabetização. Após intimado, o candidato realizou declaração de próprio punho, para demonstrar sua alfabetização, na presença de servidor da Justiça Eleitoral, de acordo ao preconizado no art. 28, § 3º, da Resolução TSE 23.548/17.

2. Ausente o registro de filiação perante o Sistema Filiaweb da Justiça Eleitoral. Juntada de certidão de composição do órgão de direção da agremiação municipal, na qual consta como secretário-geral, cuja composição encerrou-se em 26.10.2016, e ata de congresso do partido realizada no dia 18.8.2017, na qual o candidato foi escolhido para integrar o diretório municipal.

3. Cópias de atas de reuniões partidárias, conforme pacífica jurisprudência, são documentos produzidos unilateralmente pelo partido e não possuem a fidedignidade necessária para a demonstração da filiação tempestiva. Inteligência do disposto na Súmula n. 20 do Tribunal Superior Eleitoral. Com referência à anotação da composição do órgão partidário, na qual o candidato consta como secretário, o TSE entende que a “certidão emitida pela Justiça Eleitoral, atestando que o candidato compõe órgão partidário, possui fé pública e comprova regular filiação”. Entretanto, o exercício das atribuições encerrou-se em 26.10.2016, constando como “inativo”, o que, de fato, só permite concluir que o candidato esteve efetivamente filiado, no mínimo, até 26.10.2016, não sendo possível presumir que permaneceu vinculado à agremiação após a referida data. Ausência da condição de elegibilidade prevista no art. 14, § 3º, inc. V, da Constituição Federal.

4. Indeferimento do registro de candidatura.

(REGISTRO DE CANDIDATURA (11532) - 0600594-44.2018.6.21.0000 - Porto Alegre - RIO GRANDE DO SUL RELATOR: GERSON FISCHMANN, julgamento em 17.09.2018.)

 

Portanto, a manutenção da sentença é medida que se impõe.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo conhecimento do recurso e por seu desprovimento, mantendo o indeferimento do pedido de registro de candidatura de GILNEI DE SOUZA PACHECO ao cargo de vereador, pelo MDB, em Rosário do Sul, no pleito de 2020.