REl - 0600564-12.2024.6.21.0028 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/06/2025 00:00 a 20/06/2025 23:59

VOTO

Cuida-se de examinar recurso de GILBERTO FRANCESCATTO, candidato eleito ao cargo de vereador em Ibiraiaras, contra sentença do Juízo da 028ª Zona Eleitoral de Lagoa Vermelha, que julgou desaprovadas suas contas relativas à arrecadação e aos gastos para a campanha na Eleição 2024, aplicando-lhe multa de 100% sobre o valor de R$ 401,49, relativo ao excesso de autofinanciamento.

A sentença consignou o que segue (ID 45816993):

 

A unidade técnica, em seu Parecer Conclusivo, ID 126182536, apontou extrapolação do limite de autofinanciamento, em R$ 401,49; e despesas realizadas com combustíveis com a utilização de veículo próprio do candidato, no valor de R$ 750,00. Assim, concluiu que o total das regularidades perfez o montante de R$ 1.151,49.

Em relação à extrapolação do limite de autofinanciamento, a matéria objeto de análise se encontra disciplinada no art. 23, § 2°-A, da Lei n. 9.504/97 e no art. 27, §1°, da Resolução TSE n. 23.607/2019, in verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pela doadora ou pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º) .

§ 1º A candidata ou o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A)”.

(…)

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita a infratora ou o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de a candidata ou o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º) .

No que tange à vedação referente às despesas realizadas com combustíveis, a vedação legal consta no artigo 35, §6º, alínea “a”, da Resolução TSE 23.607/19, a seguir transcrita:

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal da candidata ou do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pela candidata ou pelo candidato na campanha;”

[…]

No caso em tela, o candidato reconhece que ultrapassou o teto estabelecido para autofinanciamento e que o aporte de recursos financeiros realizados pelo próprio candidato em prol de sua campanha, no montante de R$ 2.180,00, ultrapassou em R$ 401,49 o limite de autofinanciamento previsto para o cargo de vereador (qual seja, R$ 1.598,51).

Ainda, a realização de despesas com combustíveis com a utilização de veículo próprio do candidato, no valor de R$ 750,00, incidiu na vedação legal do artigo 35, §6º, alínea “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19, uma vez que se trata de gasto de natureza pessoal do candidato, o qual não pode ser pago com recursos da campanha.

Considerando que o total das irregularidades apontadas foi de R$ 1.151,49 do montante de recursos financeiros e estimáveis recebidos (R$ 7.680,00), entendo que não se enquadra no parâmetro de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade para aprovar com ressalvas as contas, uma vez que as irregularidades representam 15,35% do dispendido para realização de sua campanha e seu valor absoluto é superior a R$ 1.064,10.

 

Ainda, necessária a imposição da multa prevista no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/2019, a qual fixo no valor de 100% (cem por cento) da quantia em excesso de autofinanciamento, isto é, R$ 401,49. Quanto à irregularidade com gastos de combustíveis, deixo de aplicar sanção de recolhimento, haja vista que não foram utilizados recursos públicos para o pagamento.

 

 

Pois bem.

O limite de gastos para o cargo disputado pelo recorrente era R$ 15.985,08, sendo o limite de gastos de recursos próprios o valor de R$ 1.598,51 (10%).

O parecer conclusivo de ID 45816989 considerou que o total de gastos com recursos próprios atingiu o montante de R$ 2.000,00, excedendo em R$ 401,49, o limite previsto (R$ 1.598,51).

Para o cálculo dos recursos próprios utilizados na importância total de R$ 2.000,00, foi considerada a despesa de R$ 750,00 a título de combustível para abastecer veículo do próprio candidato e por ele utilizado na campanha.

Contudo, as despesas com combustíveis com a utilização de veículo próprio do candidato não são gastos eleitorais, conforme dispõe o art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19, pois se trata de gasto de natureza pessoal do candidato.

Não desconheço que a regra acima proíbe o pagamento de gastos de natureza pessoal com recurso de campanha. Entretanto, tenho que a interpretação desse dispositivo normativo compreende apenas vedação apenas de uso de recursos públicos (FEFC) para pagamento de despesa de natureza pessoal, entendimento consentâneo com a principiologia da proibição de locupletamento pessoal do candidato de verba pública.

Significa dizer, o recorrente declarou essa despesa de combustível, que sequer precisaria constar na prestação de contas por ser de caráter pessoal, e demonstrou que pagou as três notas fiscais de R$ 250,00, a título de despesa de combustível, com recurso próprio, o que tenho como possível e lícito. Aliás, trago julgado nesse sentido:

 

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. CARGO . VEREADOR. ELEIÇÕES 2020. AQUISIÇÃO DE COMBUSTÍVEL PARA ABASTECIMENTO DE VEÍCULO DO PRÓPRIO CANDIDATO. IMPOSSIBILIDADE . COMBUSTÍVEL ADQUIRIDO COM RECURSOS FINANCEIROS DO CANDIDATO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. IRREGULARIDADE AFASTADA.

1 . O emprego de combustível no veículo do candidato utilizado para sua campanha, à primeira vista, fere a literalidade do disposto no art. 35, § 6º, alínea a, da Resolução TSE nº 23.607/2019, que prevê não podem ser pagas com recursos da campanha despesas com combustível e manutenção de veículo automotor utilizado pelo candidato na campanha.

2 . No caso em tela, verifica-se o emprego de recursos próprios para pagamento de combustível utilizado em veículo do candidato, cedido à campanha. 3. No entanto, a origem da receita que pagou a despesa com combustível é privada, decorrente de doação do próprio candidato para sua campanha, não havendo a utilização de recursos públicos em campanha. A vedação contida no art . 35, § 6º, da Resolução TSE nº 23.607/2019 visa resguardar a regular aplicação de recursos públicos em campanha, razão pela qual afasto a irregularidade.

4. Recurso eleitoral provido . Contas aprovadas.

 

(TRE-SE - RE: 06007101720206110046 PEDRA PRETA - MT 28578, Relator.: Des. GILBERTO LOPES BUSSIKI, Data de Julgamento: 13/05/2021, Data de Publicação: DEJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 3422, Data 20/05/2021, Página 8-9)

 

Nessa linha de intelecção, tendo como regular a despesa e sendo ela de natureza pessoal (R$ 750,00), deve ser excluída do montante de recursos próprios aplicados na campanha (R$ 2.000,00).

Com isso, tem-se o valor de R$ 1.250,00 como recursos próprios, quantia que não supera o limite estipulado para o cargo de vereador no Município de Ibiraiaras, equivalente a R$ 1.598,51, devendo ser afastada a multa aplicada na decisão recorrida e aprovadas as contas, pois suprida a única irregularidade constante na sentença.

A propósito, esse entendimento alinha-se ao que tem sido decidido pelo egrégio Tribunal Superior Eleitoral e por este Tribunal a partir do pleito de 2020 no sentido de excluir a cessão de veículo próprio do limite de gastos de autofinanciamento:

 

RECURSO. ELEIÇÃO 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADORA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. MULTA. EXCESSO DE AUTOFINANCIAMENTO. CESSÃO DE VEÍCULO PRÓPRIO PARA A CAMPANHA. VALOR QUE NÃO INTEGRA O CÔMPUTO PARA AFERIÇÃO DO LIMITE DE GASTOS. AFASTADA A IRREGULARIDADE. NÃO EXCEDIDO O LIMITE ESTIPULADO PARA O CARGO DE VEREADOR. AFASTADA A MULTA APLICADA. APROVAÇÃO DAS CONTAS. PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que aprovou com ressalvas as contas de candidata ao cargo de vereadora nas eleições de 2020, devido ao excesso de aplicação de recursos próprios na campanha. Aplicação de multa.

2. Cessão de veículo pessoal para uso na campanha eleitoral. Recente entendimento firmado pelo TSE no sentido de que a cessão de veículo próprio não integra o limite de gastos de autofinanciamento. Excluída a doação estimável do cômputo dos valores para fins de apuração do limite de gastos, a quantia utilizada na campanha não supera o limite estipulado para o cargo de vereador no município. Aprovação das contas. Afastada a multa aplicada.

3. Provimento.

(TRE/RS – REl n. 0600382-17.2020.6.21.0044, Relatora Desembargadora Patricia da Silveira Oliveira, Publicação: DJE, 20/06/2023)

 

 

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para reformar a sentença e aprovar as contas, afastando a sanção de multa no valor de R$ 401,49.