REl - 0600436-77.2020.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/10/2020 às 10:00

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 3 (três) dias previsto no art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.609/19.

Mérito

Em suas razões, o recorrente sustenta ter demonstrado satisfatoriamente a condição de alfabetizado, por meio da declaração de próprio punho realizada na presença de servidor do cartório eleitoral.

Tenho que não lhe assiste razão.

A questão decorre de previsão contida na Constituição Federal que, no art. 14, § 4º, determina serem inelegíveis os analfabetos:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: [...]

§ 4º - São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos.

A Lei Complementar n. 64/90 reproduziu o comando constitucional, verbis:

Art. 1º São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

a) os inalistáveis e os analfabetos;

[...]

A Resolução TSE n. 23.609/19, que disciplina o registro de candidatura para o pleito deste ano, reza, em seu art. 27, § 5º, que o documento apto a suprir o comprovante de escolaridade é a “declaração de próprio punho preenchida pelo interessado, em ambiente individual e reservado, na presença de servidor de qualquer Cartório Eleitoral do território da circunscrição em que o candidato disputa o cargo, ainda que se trate de eleições gerais”.

Como é cediço, não há um consenso acerca do conceito de analfabetismo, uma vez que, para alguns, ser alfabetizado é ter domínio gramatical, ou seja, saber ler, escrever e interpretar o texto, ao passo que, para outros, cujo cotidiano não mantém proximidade com o mundo das letras, ser alfabetizado é saber o suficiente para o seu trabalho que, a mais das vezes, tem caráter braçal, não necessitando de grande conhecimento da língua.

Sobre o tema, Adriano Soares da Costa afirma o seguinte (Instituições de Direito Eleitoral – 6ª ed. rev. ampl. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, pp. 162-163):

Há, na aplicação do signo, em casos concretos, a necessidade de ponderações e temperanças com vista à finalidade da sua exigência: a obtenção do direito de ser votado. Por isso, necessário levar em consideração alguns aspectos importantes: (a) toda análise dos eleitores, quanto ao seu grau de alfabetização, deve ser feita individualmente, caso por caso; b) o grau de alfabetização exigido é mínimo, apenas o necessário para que se afaste a hipótese de analfabetismo total, porquanto é inelegível o analfabeto, não o semi-analfabeto; (c) deve-se dar atenção à leitura, mais do que a escrita, pois mais importa ao mandatário a compreensão do texto já escrito, do que escrevê-lo (até porque outros poderão escrever para ele, ao passo que a leitura feita por outros acarreta maiores dificuldades e perigos).

Segue o doutrinador dizendo que, na sua opinião, as gradações de analfabetismo devem ser analisadas perante a importância do cargo em disputa e que um candidato a vereador de cidade pequena não necessita apresentar os mesmos predicados intelectuais de um candidato de uma metrópole:

O que poderá ser tolerável numa câmara municipal de cidade pequena de interior, poderá ser algo desbragadamente escandaloso em uma cidade mais desenvolvida. De modo que não endossamos a zelosa preocupação de Pedro Henrique Niess, quando vergasta o fato da aplicação de diferentes critérios e provas para aferir o grau de analfabetismo dos candidatos nas diversas zonas eleitorais. Tal diversidade é necessária, justamente pelas dissimilitudes da vida, das comunidades e de seu desenvolvimento.

Não desconheço o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, seguido por esta Corte, no sentido de que uma interpretação rigorosa quanto ao quesito alfabetização dificultaria a ascensão política de minorias e excluiria importantes lideranças do acesso a cargos eletivos (RO n. 060247518, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, PSESS 18.9.2018 / REspe n. 8941, Rel. Min. Luciana Lóssio, PSESS 27.9.2016).

No caso concreto, todavia, a suposta declaração, a rigor, apenas repetições do nome do recorrente (ID 8131983), não demonstra o mínimo de escrita, revelando tratar-se, até prova em contrário, à míngua de qualquer outro adminículo probante, de pessoa analfabeta.

A informação juntada pelo cartório eleitoral noticia, a respeito, que “o candidato compareceu ao cartório eleitoral em 05.10.2020 para firmar declaração de alfabetização e não conseguiu escrever o que lhe foi solicitado”.

De qualquer sorte, ainda que assim não fosse, há outro óbice ao deferimento do registro, qual seja a ausência de certidão de objeto e pé relativa à juntada anteriormente aos autos de certidão positiva (ID 8132533).

No ponto, extraio da sentença o seguinte trecho:

Além disso, a certidão criminal estadual de 2º Grau restou incompleta, pois pelo §7º da Resolução TSE nº 23.609/2019, quando as certidões criminais a que se refere o inciso III do caput forem positivas, o RRC também deverá ser instruído com as respectivas certidões de objeto e pé atualizadas de cada um dos processos indicados, bem como das certidões de execuções criminais, quando for o caso. A certidão juntada no ID 16197078 não atende a essas exigências, não sendo possível concluir a respeito da pena, do trânsito em julgado e também da data da extinção da pena.

Como se observa, ao contrário do alegado pelo recorrente, a certidão não foi desconsiderada pelo magistrado a quo por ter sido juntada a destempo, mas porque, resultando positiva, não foi observado o disposto no art. 27, § 7º, da Resolução TSE n. 23.609/19, verbis:

Art. 27.

[...]

§ 7º Quando as certidões criminais a que se refere o inciso III do caput forem positivas, o RRC também deverá ser instruído com as respectivas certidões de objeto e pé atualizadas de cada um dos processos indicados, bem como das certidões de execuções criminais, quando for o caso.

[...]

Assim, como bem definiu a Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer, “a ausência de tais informações inviabiliza ao juízo célere do registro de candidatura apurar a existência de condenações criminais, a causa de tais condenações, a data do trânsito em julgado, bem como o status da eventual execução criminal”.

Logo, na esteira do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, a manutenção da sentença que indeferiu o registro de candidatura subjacente é medida que se impõe.

 

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, para confirmar a sentença que indeferiu o registro de candidatura de PAULO ROBERTO RIBEIRO DA SILVA ao cargo de vereador, nas eleições de 2020, requerido pelo Partido Comunista do Brasil (PC do B) do Município de Santo Ângelo.