REl - 0600202-92.2020.6.21.0046 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/10/2020 às 10:00

VOTO

No mérito, a representação busca a obtenção do direito de resposta previsto no art. 58 da Lei n. 9.504/97:

art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

Cediço que o pedido de direito de resposta postulado em face de veículos de comunicação social deve ser interpretado à luz da liberdade de imprensa, garantia fundamental constitucionalmente prevista, os quais exercem relevante papel no desenvolvimento democrático, por ser um espaço para a mais livre circulação de ideias, conforme assentou o Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADPF 130:

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). LEI DE IMPRENSA. ADEQUAÇÃO DA AÇÃO. REGIME CONSTITUCIONAL DA "LIBERDADE DE INFORMAÇÃO JORNALÍSTICA", EXPRESSÃO SINÔNIMA DE LIBERDADE DE IMPRENSA. A "PLENA" LIBERDADE DE IMPRENSA COMO CATEGORIA JURÍDICA PROIBITIVA DE QUALQUER TIPO DE CENSURA PRÉVIA. A PLENITUDE DA LIBERDADE DE IMPRENSA COMO REFORÇO OU SOBRETUTELA DAS LIBERDADES DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO, DE INFORMAÇÃO E DE EXPRESSÃO ARTÍSTICA, CIENTÍFICA, INTELECTUAL E COMUNICACIONAL. […] Determinação constitucional de momentânea paralisia à inviolabilidade de certas categorias de direitos subjetivos fundamentais, porquanto a cabeça do art. 220 da Constituição veda qualquer cerceio ou restrição à concreta manifestação do pensamento (vedado o anonimato), bem assim todo cerceio ou restrição que tenha por objeto a criação, a expressão e a informação, seja qual for a forma, o processo, ou o veículo de comunicação social. Com o que a Lei Fundamental do Brasil veicula o mais democrático e civilizado regime da livre e plena circulação das ideias e opiniões, assim como das notícias e informações, mas sem deixar de prescrever o direito de resposta e todo um regime de responsabilidades civis, penais e administrativas. Direito de resposta e responsabilidades que, mesmo atuando a posteriori, infletem sobre as causas para inibir abusos no desfrute da plenitude de liberdade de imprensa. […] 6. RELAÇÃO DE MÚTUA CAUSALIDADE ENTRE LIBERDADE DE IMPRENSA E DEMOCRACIA. A plena liberdade de imprensa é um patrimônio imaterial que corresponde ao mais eloquente atestado de evolução político-cultural de todo um povo. Pelo seu reconhecido condão de vitalizar por muitos modos a Constituição, tirando-a mais vezes do papel, a Imprensa passa a manter com a democracia a mais entranhada relação de mútua dependência ou retroalimentação. Assim visualizada como verdadeira irmã siamesa da democracia, a imprensa passa a desfrutar de uma liberdade de atuação ainda maior que a liberdade de pensamento, de informação e de expressão dos indivíduos em si mesmos considerados. O § 5º do art. 220 apresenta-se como norma constitucional de concretização de um pluralismo finalmente compreendido como fundamento das sociedades autenticamente democráticas; isto é, o pluralismo como a virtude democrática da respeitosa convivência dos contrários. A imprensa livre é, ela mesma, plural, devido a que são constitucionalmente proibidas a oligopolização e a monopolização do setor (§ 5º do art. 220 da CF). A proibição do monopólio e do oligopólio como novo e autônomo fator de contenção de abusos do chamado "poder social da imprensa". 7. RELAÇÃO DE INERÊNCIA ENTRE PENSAMENTO CRÍTICO E IMPRENSA LIVRE. A IMPRENSA COMO INSTÂNCIA NATURAL DE FORMAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA E COMO ALTERNATIVA À VERSÃO OFICIAL DOS FATOS. O pensamento crítico é parte integrante da informação plena e fidedigna. O possível conteúdo socialmente útil da obra compensa eventuais excessos de estilo e da própria verve do autor. O exercício concreto da liberdade de imprensa assegura ao jornalista o direito de expender críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero ou contundente, especialmente contra as autoridades e os agentes do Estado. A crítica jornalística, pela sua relação de inerência com o interesse público, não é aprioristicamente suscetível de censura, mesmo que legislativa ou judicialmente intentada. O próprio das atividades de imprensa é operar como formadora de opinião pública, espaço natural do pensamento crítico e "real alternativa à versão oficial dos fatos" (Deputado Federal Miro Teixeira). […]

(ADPF 130, Relator Min. Carlos Britto CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, DJe 05.11.2009.)

Assim, não se olvida que excessos praticados pela imprensa devam ser reparados, mas a definição do agir excessivo deve ser medido à luz da garantia constitucional da liberdade de expressão, a fim de permitir o confronto de ideias e das mais diversas interpretações acerca de fatos de interesse social.

Nessa linha de entendimento, o direito de resposta por ofensas ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos nos meios de comunicação deve ser apenas excepcionalmente admitido, conforme já se manifestou o Egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2014. REPRESENTAÇÃO. DIREITO DE RESPOSTA. IMPRENSA ESCRITA. FATO SABIDAMENTE INVERÍDICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA.

1. Na linha de entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, o exercício de direito de resposta, em prol da liberdade de expressão, é de ser concedido excepcionalmente. Viabiliza-se apenas quando for possível extrair, da afirmação apontada como sabidamente inverídica, ofensa de caráter pessoal a candidato, partido ou coligação.

2. Ao analisar o teor da matéria, constata-se que o vocábulo 'exceção', empregado entre aspas no título de capa e na chamada da página, refere-se a certo tipo de autorização, em caráter excepcional, para postagem de material de propaganda sem chancela ou estampa digital (registro). Trata-se de modalidade prevista em norma interna da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, que pode ser - e a reportagem noticia que teria sido - concedida a outros partidos ou clientes.

3. Representação julgada improcedente.

(TSE, Representação n. 136765, Acórdão de 30.9.2014, Relator Min. ADMAR GONZAGA NETO, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data: 30.9.2014.)

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ART. 45, II e III, DA LEI Nº 9.504/97. TRATAMENTO PRIVILEGIADO A CANDIDATO E VEICULAÇÃO DE PROPAGANDA POLÍTICA. INEXISTÊNCIA.

1. Segundo o entendimento desta Corte Superior, permite-se, "na seara eleitoral, não apenas a crítica a determinada candidatura, mas também a adoção de posição favorável a certo candidato salvo evidentes excessos, que serão analisados em eventual direito de resposta ou na perspectiva do abuso no uso indevido dos meios de comunicação" (RO n° 1919-42, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 8.10.2014).

2. A respeito da liberdade de imprensa, no julgamento da Ação Cautelar na ADI nº 4.451, de relatoria do Ministro Carlos Ayres Britto, o STF manifestou-se no sentido de que "o exercício concreto dessa liberdade em plenitude assegura ao jornalista o direito de expender críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero, contundente, sarcástico, irônico ou irreverente, especialmente contra as autoridades e aparelhos de Estado. Respondendo, penal e civilmente, pelos abusos que cometer, e sujeitando-se ao direito de resposta a que se refere a Constituição em seu art. 5º, inciso V".

3. Ao contrário do que entendeu a Corte Regional Eleitoral, dos textos reproduzidos no aresto recorrido, não se constata a existência de propaganda política ou de favorecimento nítido a determinado candidato, mas, sim, a veiculação de críticas ao então governador do estado, candidato à reeleição, e de notícia a respeito dos candidatos a governador e a senador, sem indicação de referências negativas.

4. O provimento do recurso especial não implicou reexame de fatos e provas, mas, sim, a revaloração jurídica das premissas fáticas devidamente delineadas no aresto recorrido, o que não encontra óbice nas Súmulas 279 do STF e 7 do STF. Nesse sentido, os seguintes julgados: AgR-REspe nº 4400-03, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 20.5.2015; AgR-REspe nº 1628- 44, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 13.5.2015; REspe nº 284-28, rel. Min. Laurita Vaz, rel. designado Min. Dias Toffoli, DJe de 25.2.2015.

Agravo regimental ao qual se nega provimento.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 96937, Acórdão de 18.12.2015, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data: 03.3.2016, pp. 107-108.)

Na hipótese dos autos, a recorrente alega que na charge impugnada o candidato opositor está na frente da disputa eleitoral, “retratada por ‘cavalinhos’, da mesma forma que o Programa Fantástico, da Rede Globo, exibe as posições dos times no Campeonato Brasileiro de acordo com a sua pontuação na tabela” e que o “cavalinho” que está em último lugar sempre é retratado como sem condições de chegar em primeiro lugar.

Entretanto, conforme concluiu o juízo a quo, cujas razões seguem transcritas, não se verifica, na imagem, a divulgação de pesquisa eleitoral ou de mensagem sabidamente inverídica apta a ensejar o direito de resposta:

Na forma do art. 58 da Lei nº 9.504/1997, a partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

Descreve a parte representante que teria sido atingida negativamente pela publicação de charge no jornal Folha Patrulhense, edição do dia 1º de outubro de 2020, haja vista a disposição dos cavalos e candidatos, argumentando que o candidato que representa a coligação “União Por Santo Antônio” foi favorecido.

A representada, por seu turno, esclarece que em nenhum momento é feita alusão a pesquisa de intenção de votos, sendo veiculado, apenas, que houve o início da corrida pela Prefeitura. Além disso, se dispôs, extrajudicialmente e em sua contestação, a publicar nota de esclarecimento no jornal a fim de evitar prejuízo a qualquer dos candidatos.

Compulsando os autos, observo que a matéria veiculada não atinge nenhum dos candidatos à Prefeitura, considerando que, ainda que a posição dos candidatos esteja disposta de uma forma, o conteúdo da publicação, em si, apenas expõe o início da disputa entre os aspirantes a Prefeito, não havendo imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica.

Isso porque a charge atacada na presente representação em nenhum momento faz alusão à intenção de votos dos eleitores, não se podendo concluir com a certeza necessária que há ofensa ao dispositivo legal supramencionado.

Gize-se que não restou comprovado qualquer prejuízo advindo ao representante, especialmente quando se considera que a representada ofereceu, extrajudicialmente, e também em sua resposta, a oportunidade de ser publicada no jornal nota de esclarecimento acerca da charge veiculada no dia 1º de outubro do corrente ano.

Assim, tenho que não se há falar em direito de resposta no caso em apreço, porquanto não houve ofensa pessoal ao candidato da representante, tampouco à própria coligação, ou prejuízo significativo, tendo em conta que as propagandas eleitorais começaram há poucos dias, motivo pelo qual a publicação, de forma isolada, não demonstra predileção por determinado candidato, e que há a possibilidade de resolver o conflito administrativamente, o que denota até mesmo a falta de interesse de agir para a presente demanda.

Logo, considerando que a matéria impugnada não traz no seu conjunto uma mensagem injuriosa ou sabidamente inverídica, de forma a gerar o direito de resposta, e não se verificando, ao menos nesse momento, intenção de favorecer ou prejudicar algum dos candidatos à Prefeitura, tenho que o caso é de indeferimento dos pedidos declinados na inicial.

Importante referir, por oportuno, que o Ministério Público, em seu parecer, descreve que acompanhará a situação e as postagens do jornal, a fim de evitar eventual prejuízo futuro aos candidatos, o que é salutar para a manutenção do equilíbrio da disputa eleitoral.

DIANTE DO EXPOSTO, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente representação.

Ademais, não se verifica conteúdo ofensivo na divulgação. Nesse ponto, ressalto que na sessão de 16.10.2020, no acórdão do Recurso Eleitoral n. 0600355-62, da minha relatoria, este Tribunal manteve a diretriz jurisprudencial, na linha do entendimento do TSE, no sentido de que o fato sabidamente inverídico a que se refere o art. 58 da Lei n. 9.504/97, para fins de concessão de direito de resposta, não deve ser considerado, objetivamente, de modo isolado porque “A afirmação sabidamente não verdadeira também deve caracterizar ofensa pessoal ao candidato afrontado”.

Ademais, a regra, no que se refere à imprensa escrita, é a plena liberdade, não se exigindo imparcialidade quanto ao pleito. Segundo jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, “os órgãos da imprensa escrita podem assumir posição favorável a candidato. Eventual abuso se apura por investigação judicial eleitoral” (Ac. de 14.11.2006 no ARP n. 1.333. rel. Min. Marcelo Ribeiro).

Desse modo, considerando que não se extrai do conteúdo da imagem a caracterização de ofensa pessoal, merece ser indeferido o pedido de direito de resposta, nada impedindo que a conduta do periódico seja apurada, em procedimento próprio, sob a ótica do abuso ou uso indevido dos meios de comunicação.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso interposto.