REl - 0600158-02.2020.6.21.0102 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/10/2020 às 10:00

VOTO

 

O recurso é regular e tempestivo, de forma que comporta conhecimento.

Quanto ao mérito, traço breves considerações sobre o direito de resposta, que está previsto no art. 58 da Lei das Eleições e é assegurado a candidato, a partido ou à coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

Para fins de direito de resposta, o fato sabidamente inverídico é aquele que não demanda investigação, sendo perceptível de plano (TSE, Rp n. 1431–75/DF, rel. Min. Admar Gonzaga, PSESS em 2.10.2014).

Relevante consignar também que “o conteúdo da informação deve ser sabidamente inverídico, absolutamente incontroverso e de conhecimento da população em geral, não podendo ser alvo de direito de resposta um conteúdo passível de dúvida, controvérsia ou de discussão na esfera política” (TSE, Representação n. 108357, Acórdão, Relator(a) Min. Admar Gonzaga, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data: 09.9.2014).

Tendo em vista tais parâmetros, passo à análise da manifestação, conforme trecho constante na inicial:

—Já que entramos no tema de estradas, não podemos deixar de lembrar do assunto que mais assusta o bolso de nossos agricultores, a hora máquina.

—É incabível cobrar a hora máquina mais cara que a empresa de cidadãos que terceirizam esse serviço.

—O nosso povo está cansado de pagar um verdadeiro absurdo por um hora máquina.

—Temos que enfrentar esse problema de frente, com coragem e competência e parar de onerar o povo mediante um serviço que deve ser prestado, a hora maquina deve estar dentro das condições financeiras de nossos agricultores e lembrar, principalmente, que a prefeitura é um órgão público, que não enfatiza lucro, apenas o custeio de seus gastos.

 

Antecipo que o recurso não merece prosperar. 

Isso porque o caso dos autos não é de extrapolação do regular exercício da liberdade de expressão, mas sim de crítica à gestão municipal.

Veja-se que não há menção, direta ou indireta, à figura do candidato ou de terceiro, de forma que devem ser afastadas alegações que remetam à calúnia, à injúria ou à difamação. Restaria a possível ocorrência de difusão de fato sabidamente inverídico, o que também não vislumbro.

A fim de evitar tautologia, adoto expressamente, como razões de decidir, os fundamentos que colho do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral:

De fato, as transmissões impugnadas limitam-se a apontar uma possível gestão dos bens públicos inadequada. O representante deve aprofundar o debate utilizando do espaço que possui para apresentar sua candidatura de modo a esclarecer os valores e as condições em que o serviço mencionado é prestado pela prefeitura, pois "é cabível o direito de resposta quando assacada uma inverdade escancarada, evidente, manifesta, e não quando o fato narrado admite contestação e abre espaço para uma discussão política."

O espaço de debate eleitoral é um importante mecanismo da democracia, que norteia-se pela busca da participação dos cidadãos na formação da vontade coletiva. Para tanto, informações e pontos de vista distintos sobre temas de interesse público e sobre a conduta dos candidatos são expostos, a fim de que os eleitores formem as suas próprias opiniões, o que só é possível mediante a garantia da liberdade de expressão para o livre confronto de ideias.

Trata-se, não há como negar, de crítica à administração do município. Ocorre, contudo, que o TSE tem assentado que críticas, ainda que veementes, são naturais do embate político, cabendo aos competidores eleitorais buscar, no espaço a eles franqueado de forma ordinária, responder às acusações.

A respeito da liberdade de expressão e do espaço público de debate, José Jairo Gomes leciona:

A liberdade de expressão apresenta uma relevante interface com o Direito Eleitoral.

A livre circulação de ideias, pensamentos, valorações, opiniões e críticas promovida pela liberdade de expressão e comunicação é essencial para a configuração de um espaço público de debate, e, portanto, para a democracia e o Estado Democrático. Sem isso, a verdade sobre os candidatos e partidos políticos pode não vir à luz, prejudicam-se o diálogo e a discussão públicos, refreiam-se as críticas e os pensamentos divergentes, tolhem-se as manifestações de inconformismo e insatisfação, apagam-se, enfim, as vozes dos grupos minoritários e dissonantes do pensamento majoritário.

Depois de lembrar que o direito eleitoral constitui um importante campo de incidência da liberdade de expressão, Aline Osório (2017, p. 129) assinala que

“Durante períodos eleitorais, a importância da liberdade de expressão é amplificada. Partidos e candidatos devem prestar contas de suas ações passadas e expor suas opiniões, propostas e programas futuros. Os meios de comunicação devem funcionar como canais de disseminação de informações, críticas e pontos de vista variados. Os cidadãos precisam de plena liberdade não só para acessarem tais informações, mas para manifestarem livremente as suas próprias ideias, críticas e pontos de vista na arena pública. Nesse processo, é necessário que todas as questões de interesse público – incluindo, é claro, a capacidade e a idoneidade dos candidatos e a qualidade de suas propostas – sejam abertas e intensamente discutidas e questionadas. A efetividade das eleições como mecanismo de seleção de representantes e o próprio funcionamento do regime democrático dependem de um ambiente que permita e favoreça a livre manifestação e circulação de ideias. [...]. Em regimes representativos, o voto e a liberdade de expressão configuram dois importantes instrumentos de legitimação da democracia, permitindo que os interesses e as opiniões dos cidadãos sejam considerados na formação do governo e na atuação dos representantes.

[...]”.

Por outro lado – no âmbito do direito de informação –, os cidadãos têm direito a receber toda e qualquer informação, positiva ou negativa, acerca de fatos e circunstâncias envolvendo os candidatos e partidos políticos que disputam o pleito;

sobretudo acerca de suas histórias, ideias, programas e projetos que defendem. Só assim estarão em condições de formar juízo seguro a respeito deles e definir seus votos de forma consciente e responsável.

É, pois, fundamental que todo cidadão seja informado acerca da vida política do país, dos governantes e dos negócios públicos.

(Direito Eleitoral, 16. ed. – São Paulo: Atlas, 2020, edição eletrônica).

Ante a ausência de prática desobediente às normas de regência, não há fundamento para o deferimento de direito de resposta.

Ante o exposto, VOTO por NEGAR PROVIMENTO ao recurso, e para manter a sentença pelos seus próprios fundamentos.