REl - 0600360-18.2020.6.21.0089 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/10/2020 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a representação busca a obtenção do direito de resposta previsto no art. 58 da Lei n. 9.504/97, verbis:

Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

 

Na hipótese dos autos, é incontroverso que as recorrentes publicaram em seus perfis na rede social Facebook mensagens com referências à candidata TERESINHA MARCZEWSKI ZAVASKI.

As postagens realizadas por MARIA DE LOURDES ROGOSKI PREISSLER DO ROSÁRIO consignaram os seguintes termos:

(1) Amigos tirem um tempo e vejam...

Porque não concordo com a Candidata do MDB?? Pq onde ela ela vai fazer campanha a mesma fala: Que depois de eleita ela voltará a fazer consultas médicas no Posto de saúde. Para ganhar mais, amigos é isso que o povo????

Quantas vezes vcs não foram atendidas por a Médica Terezinha, havia atendidas as 12 fichas.

Quantas vezes a Médica Terezinha hoje aposentada com um super salário, em vez de atender vcs, não atendeu pq era dia das Gestantes?

Quantas vezes a Médica Terezinha, deixou de encaminhar paciente que estavam muito doente e muitos a beira da morte, pq não quis, pois não sairia nada do bolso dela?

Quantas vezes a Médica Terezinha recebeu super salário, que se vc tivesse na tua conta era como vc tivesse acertado na loteria????

Daí em algumas casas a Médica Terezinha, ainda diz que ano que vem vai voltar a atender no posto de saúde?

Ah! Mas o salário de prefeito não é suficiente, pq atender no posto de saúde Ela pode receber no final do mês um salário acima de 20.000&&&&.

Será que a Médica Terezinha assumirá o cargo que está concorrendo???? Será que ela chegará a sentar na cadeira para exercer a função de prefeita???? Com certeza o vice Fabio que assumira a função pois a Médica Terezinha irá se licenciar, já que nas suas visitas ela sonha em voltar ao Posto de saúde como Médica.

O PP tem um vice Prefeito o Sr. Juca Pés, uma homem que tem seu capital trabalhando honestamente, e o mesmo estará lá na prefeitura ao lado do Prefeito Gustavo, atendendo suas necessidades quando vcs amigos precisarem dele.

Pois mesmo sendo um comerciante, quando vc precisou sempre o ajudou.

Por isso dia 15/11. Vá votar e vote consciente vota na COLIGAÇÃO onde juntos vão continuar fazendo o município de Alegria estar no mapa. Vote 11. Vote 11. Vote 11. E vamos juntos a vitória de Alegria, DEM, PP, PDT, PTB”.

 

(2) “Isso era o salário da então candidata a Médica Terezinha. E mesmo assim não cumpria suas obrigações do cargo”. (Acompanhando imagem de acesso ao Portal Transparência do Município de Alegria)

 

(3) “Amigos vc acham eu a Médica Terezinha, vai trocar um Super salário no Posto de saúde, pela cadeira de Prefeita??? Quem será eleito será o Fábio Schakofski, esse será o Prefeito que vcs querem????

 

Por sua vez, CAMILA DANIELA HULLEN publicou a seguinte mensagem:

Vi uma publicação no face, e me surpreendi com o autor do texto que se esconde por traz de gente humilde, e que se prestam ao papel de dar voz para aqueles que se escondem no submundo do anonimato... “mastreia” já conheço este vocabulário. Pois me senti na obrigação de fazer um desabafo, sem querer ofender ninguém, mais como sou funcionária pública da saúde a 19 anos, e sempre fui uma servidora que mesmo não tendo o maior salário do Município, sempre me preste a cumpri minha obrigação e quem faz concurso público e entrou pela porta da frente e que tem como principal função tratar bem a quem paga nosso salário, e fora do horário de trabalhado, tendo participado ativamente nas entidades, CTG, APAE, IGREJA e outros... Ainda sobre as pessoas que ocuparam cargo e ao longo dos 30 anos da sua vida profissional sempre sangrou os cofres públicos com Função Gratificada de Diretora Clínica do Hospital, com plantões e convocação de 20 horas pra dobrar o salário, e que nunca mostrou boa vontade para evitar o fechamento do HOSPITAL, pois o seu amigo e o ex coordenador de saúde, aliado do Deputado Terra que se prestou para um papel de deixar o município de ALEGRIA sem saída... enquanto em ALEGRIA que o prefeito é do PP, queriam lavrar as portas do São Sebastião e ao mesmo tempo no município de ALECRIM que tinha um Prefeito do MDB, criaram a alternativa para manutenção do Hospital daquela cidade criando a umidade de tratamento prolongado pra viabilizar financeiramente o seu funcionamento. AGORA a pergunta que não quer calar... a Médica que é aliada e do mesmo partido do Deputado Terra não tinha interesse em salvar o hospital ou não tinha o mesmo prestígio das lideranças do vizinho município de ALECRIM.

Poderia ter feito não fez... Agora vai fazer????

 

Pois bem.

Como se sabe, a regra no contexto democrático é a liberdade de pensamento, devendo se pautar esta Justiça Especializada pela mínima interferência possível no que diz respeito à fiscalização da propaganda eleitoral, privilegiando a pluralidade e a riqueza inerentes ao debate político e eleitoral.

Sobre o tema, impende colacionar o disposto na Resolução TSE n. 23.610/19 que assim dispõe:

Art. 27. (...).

§ 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatos, partidos ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos.

 

(...).

 

Art. 38. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J).

§ 1º Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.

 

Tomadas essas premissas, divergindo da manifestação lançada pela Procuradoria Regional Eleitoral, entendo que as postagens realizadas por MARIA DE LOURDES ROGOSKI PREISSLER DO ROSARIO, ainda que limítrofes, não excederam a crítica tolerável na cena eleitoral a recomendar o direito de resposta.

Como se percebe, a recorrida usou um expediente provocativo, sugerindo situações e questionando o leitor sobre eventuais posturas que seriam tomadas pela candidata no exercício de sua atividade como médica no posto de saúde do município.

No entanto, não houve a atribuição direta de qualquer fato determinado ou determinável do qual se poderia concluir pela imperícia, negligência ou incapacidade da profissional. Trata-se aqui de uma indagação crítica sobre a qualidade do atendimento oferecido pela médica no serviço público local de saúde, a qual sequer é o núcleo da mensagem exposto na publicação.

Em realidade, o aspecto central apresentado nas postagens impugnadas é a remuneração percebida pela candidata pelo cargo de médica do município em comparação com o subsídio de prefeito. Assim, os comentários enfocam se, sobrevinda eventual vitória nas eleições, a candidata abriria mãos dos valores percebidos em seu trabalho como médica para se dedicar ao governo ou acabaria por entregar a administração pública ao seu vice-candidato.

Há, nesse ponto, novamente um questionamento provocativo sobre possível futura ação que poderia ser tomada pela candidata, sem lhe imputar fato ou ofensa específica que macule a honra ou dignidade pessoal suscetível de reparação por direito de resposta, pois as publicações, cuja remoção foi determinada pela diligente magistrada a quo, podem ser rebatidas no espaço destinado à propaganda da candidata ou seu próprio perfil na rede social.

Da mesma maneira, no tocante à publicação de CAMILA DANIELA HULLEN, vê-se que há uma contextualização de sua realidade pessoal e uma crítica sobre alegada falta de empenho da candidata e de seu grupo de apoio político na manutenção do hospital local, o que claramente se aloca na seara da liberdade de opinião e interpretações de fatos políticos, pois ausentes quaisquer ofensas diretas à ora representante.

Consoante bem consignou o Procurador Regional Eleitoral acerca da mensagem em tela: “Há uma crítica quanto às opções que a candidata poderá representar para a política de saúde do município, bastante incisiva até, mas que não veicula expressões caluniosas, difamatórias ou injuriosas, tampouco veicula fatos sabidamente inverídicos”.

Com efeito, ao tratar da matéria ora em análise, Olivar Coneglian ensina que “o direito de resposta só cabe quando o texto dito ofensivo contenha injúria, calúnia, difamação, inverdade ou erro, e quando constitui ofensa direta a pessoa, física ou jurídica” (Propaganda Eleitoral. São Paulo: Juruá, 2014, p. 311).

Portanto, o direito de resposta não se presta para rebater questões que podem ser debatidas nas vias próprias para a exposição das qualificações e da vida pregressa do candidato, pois o exercício do direito de resposta, no âmbito da Justiça Eleitoral, é viável apenas quando for possível extrair, das afirmações apontadas, ofensa à honra ou fato sabidamente inverídico apto a agredir, em caráter pessoal, o candidato, partido ou coligação.

Nesse sentido, os seguintes julgados:

ELEIÇÕES 2018. RECURSO INOMINADO. REPRESENTAÇÃO. PEDIDO DE DIREITO DE RESPOSTA. ART. 58 DA LEI nº 9.504/1997. PUBLICAÇÃO DE MATÉRIA JORNALÍSTICA COM AFIRMAÇÃO SABIDAMENTE INVERÍDICA. AUSÊNCIA. NECESSIDADE DE INVERDADE VERIFICÁVEL DE PLANO. PRECEDENTES. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. A concessão do direito de resposta previsto no art. 58 da Lei das Eleições pressupõe a divulgação de mensagem ofensiva ou afirmação sabidamente inverídica reconhecida de plano ou que extravase o debate político–eleitoral.

2. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o fato sabidamente inverídico [...] é aquele que não demanda investigação, ou seja, deve ser perceptível de plano (Rp nº 1431–75/DF, rel. Min. Admar Gonzaga, PSESS em 2.10.2014).

(...)

4. É preciso preservar, tanto quanto possível, a intangibilidade da liberdade de imprensa, notadamente porque a função de controle desempenhada pelos veículos de comunicação é essencial para a fiscalização do poder e para o exercício do voto consciente.

5. Recurso conhecido e desprovido.

(Recurso em Rp n. 0601007–42/DF, Rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS de 11.9.2018.)

 

Destarte, as pessoas que se lançam às candidaturas estão sujeitas a maior exposição e suscetíveis a avaliações da sociedade e da mídia, especialmente por suas realizações ou insucessos em cargos público, visto que tal circunstância é relevante como critério de escolha eleitoral.

Nessas circunstâncias, a discussão acerca de fatos de interesse político-comunitários e sobre as ações públicas dos concorrentes ao pleito, sob diversas perspectivas, são essenciais ao debate eleitoral e à construção da vontade informada do eleitor, não cabendo o cerceamento liminar da liberdade de expressão, sob pena de vulneração do próprio debate democrático.

Vê-se que estamos a tratar de críticas relacionadas à vida pregressa do candidato representante, relacionadas com o exercício do cargo público de médica municipal, e não à sua vida pessoal.

Diante do crivo público a que se submetem os concorrentes a cargos eletivos, "a liberdade de expressão não abarca somente as opiniões inofensivas ou favoráveis, mas também aquelas que possam causar transtorno ou inquietar pessoas, pois a democracia se assenta no pluralismo de ideias e pensamentos" (ADI n. 4439/DF, rel. Min. Roberto Barroso, rel. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, DJe de 21.6.2018).

Quanto ao tema, colaciono trecho de decisão de lavra do Min. Edson Fachin, nos autos do Recurso Especial Eleitoral n. 0600044-34.2020.6.26.0002 (decisão monocrática de 23.10.2020, publicado no Mural em 24.10.2020), que bem delineia os aspectos valorativos envolvidos com a liberdade de expressão para a concessão de direito de resposta:

Desse modo, sob a égide do postulado constitucional da plena liberdade de manifestação, a veiculação de propaganda que exponha os aspectos negativos relacionados aos candidatos afigura–se, em linha de princípio, legítima, notadamente como forma de ampliar o leque de informações disponibilizadas ao eleitorado. Logo, as campanhas de publicidade negativa não conflitam, necessariamente, com os valores fundantes do ordenamento eleitoral; pelo contrário, dentro de certas condições a propaganda crítica desempenha uma sorte de função estrutural, relacionada com o desenvolvimento de um debate que se pretende abarcador dos acertos e dos falhanços eventualmente cometidos pelos agentes que disputam a preferência popular. Em definitivo, interessa notar que a manutenção da comunicação eleitoral em termos puramente positivos teria o efeito indesejável de criar uma atmosfera informativa artificial e distópica, no bojo da qual os postulantes seriam apresentados ao corpo de eleitores como indivíduos infalíveis, na esteira de suas próprias e enviesadas perspectivas.

 

No mesmo passo, anota a doutrina de José Jairo Gomes (Direito Eleitoral. 12ª ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 579):

Dada a natureza de suas atividades, o código moral seguido pelo político certamente não se identifica com o da pessoa comum em sua faina diuturna. Tanto é que os direitos à privacidade, ao segredo, e à intimidade sofrem acentuada redução em sua tela protetiva. Afirmações a apreciações desairosas, que, na vida privada, poderiam ofender a honra objetiva e subjetiva de pessoas, chegando até mesmo a caracterizar crime, perdem esse matiz quando empregadas no debate político-eleitoral. Assim, não são de estranhar assertivas apimentadas, críticas contundentes, denúncias constrangedoras, cobranças e questionamentos agudos. Tudo isso insere-se na dialética democrática.

 

Destarte, no caso sob exame, não se percebe divulgação de fato sabidamente inverídico e ofensivo à imagem ou à candidatura da recorrida, na acepção conferida à espécie pela doutrina e pela jurisprudência, capaz de atrair a incidência do direito previsto no art. 58 da Lei das Eleições, a reforma da sentença é medida que se impõe.

 

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, a fim de julgar improcedente o pedido de direito de resposta.