REl - 0600027-98.2020.6.21.0046 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/10/2020 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a demanda recursal envolve a postagem de vídeos, nos dias 02.9.2020 e 06.9.2020, nas páginas do recorrido e do PSDB de Caraá, ambas na rede social Facebook, nos quais Magdiel Silva realizaria propaganda eleitoral antecipada de forma vedada, conforme assim caracterizado na petição inicial (ID 7136483):

O ora representado MAGDIEL SILVA subiu em sua página da rede social Facebook dois vídeos em que se apresenta como pré-candidato a Prefeito do Município de Caraá. Referidos vídeos também constam na página do PSDB local (URL:https://www.facebook.com/psdbcaraars) na mesma rede social.

No primeiro vídeo, postado em 2 de setembro de 2020 (acessível pelo linkhttps://www.facebook.com/watch/?v=1255816114765212&extid=gSAbLuXIgw1oCppe), com o assunto “Agricultura”, o representado apresenta suas propostas a partir de perguntas de possíveis eleitores ou apoiadores.

No segundo vídeo, publicado em 6 de setembro de 2020, (acessível pelo linkhttps://www.facebook.com/watch/?v=457216558570347&extid=itnp0LohrgngLw8f), com o assunto “Educação”, igualmente o representado interage com possíveis eleitores e apresenta suas propostas, inclusive fazendo promessas acerca de possíveis contratações de profissionais acaso seja eleito.

 

Conforme o art. 36 da Lei n. 9.504/97, com as alterações trazidas pela Emenda Constitucional n. 107/20, a propaganda eleitoral somente é permitida após 26 de setembro do presente ano, inclusive na Internet.

Por outro lado, como é cediço, a Lei n. 13.165/15, ao modificar a redação do art. 36-A da Lei n. 9.504/97, conferiu maior liberdade no período de pré-campanha. Assim, nos termos do dispositivo, são autorizadas divulgações que contenham menção à pretensa candidatura, a exaltação de qualidades pessoais dos candidatos, bem como de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais, entre outros, sendo imperioso que não envolvam pedido explícito de voto.

Interpretando o dispositivo em comento, o TSE, no julgamento do AgRg-AI n. 924/SP, em 26.6.2018, de relatoria do Ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, estabeleceu os critérios hermenêuticos para a caracterização da propaganda eleitoral que transborde o permissivo legal para a pré-campanha, ficando assentado, no voto do e. Ministro Luiz Fux, que:

(a) o pedido explícito de votos, entendido em termos estritos, caracteriza a realização de propaganda antecipada irregular, independentemente da forma utilizada ou da existência de dispêndio de recursos;

(b) os atos publicitários não eleitorais, assim entendidos aqueles sem qualquer conteúdo direta ou indiretamente relacionados com a disputa, consistem em ‘indiferentes eleitorais’, situando-se, portanto, fora da alçada desta Justiça Especializada;

(c) o uso de elementos classicamente reconhecidos como caracterizadores de propaganda desacompanhado de pedido explícito e direto de votos, não enseja a irregularidade ‘per se’, e

(d) todavia, a opção pela exaltação de qualidades próprias para o exercício de mandato, assim como a divulgação de plataformas de campanha ou planos de governo acarreta, sobretudo, quando a forma de manifestação possua uma expressão econômica minimamente relevante, os seguintes ônus e exigências: (i) impossibilidade de utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda (outdoor, brindes, etc); e (ii) respeito ao alcance das possibilidades do pré-candidato médio.

 

Nessa senda, é necessário, em primeiro lugar, determinar se a mensagem veiculada possui conteúdo eleitoral, isso é, se está relacionada com a disputa. Caso contrário, constituirá um “indiferente eleitoral”, estando fora do alcance da Justiça Eleitoral.

Ressalta-se que a propaganda eleitoral antecipada também será identificada pelo uso de elementos que traduzam o pedido explícito de votos. Desse modo, "o pedido explícito de votos pode ser identificado pelo uso de determinadas 'palavras mágicas', como, por exemplo, 'apoiem' e 'elejam', que nos levem a concluir que o emissor está defendendo publicamente a sua vitória" (AgResp n. 29-31, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 3.12.2018).

Outrossim, ainda que ausente o pedido explícito de votos, haverá propaganda extemporânea com a utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda ou quando ocorrer a violação ao princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos, consubstanciado no uso de meios cuja expressão econômica ultrapasse as possibilidades de realização do pré-candidato médio.

Esses parâmetros foram explicitados igualmente em recente julgado do TSE:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL COM AGRAVO. ELEIÇÕES 2018. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESPROVIMENTO. 1. Agravo interno contra decisão monocrática que negou seguimento a agravo nos próprios autos interposto para impugnar decisão de inadmissão de recurso especial eleitoral.

2. Na análise de casos de propaganda eleitoral antecipada, é necessário, em primeiro lugar, determinar se a mensagem veiculada tem conteúdo eleitoral, isto é, relacionado com a disputa.

3. Reconhecido o caráter eleitoral da propaganda, deve–se observar três parâmetros alternativos para concluir pela existência de propaganda eleitoral antecipada ilícita: (i) a presença de pedido explícito de voto; (ii) a utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda; ou (iii) a violação ao princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos.

4. No caso, conforme já destacado na decisão agravada, (i) a expressão "conclamando à todos [sic] uma união total por Calçoene" não traduz pedido explícito de votos, bem como (ii) o acórdão regional não traz informações sobre o número de pessoas que tiveram acesso à publicação ou sobre eventual reiteração da conduta, de modo que não há como concluir pela mácula ao princípio da igualdade de oportunidades. Ademais, o impulsionamento de publicação na rede social Facebook não é vedado no período de campanha, mas, sim, permitido na forma do art. 57–C da Lei nº 9.504/1997.

5. Na ausência de conteúdo eleitoral, ou, ainda, de pedido explícito de votos, de uso de formas proscritas durante o período oficial de propaganda e de qualquer mácula ao princípio da igualdade de oportunidades, deve–se afastar a configuração de propaganda eleitoral antecipada ilícita, nos termos do art. 36–A da Lei nº 9.504/1997.6. Agravo interno a que se nega provimento.

(Agravo de Instrumento n. 060009124, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 25, Data: 05.02.2020.) (Grifei.)

 

Isso posto, entendo que, no caso concreto, não há elementos probatórios suficientes à aferição dos parâmetros insculpidos na legislação e na jurisprudência para a caracterização da propaganda eleitoral antecipada.

Com efeito, a prova material das postagens está limitada aos prints das telas que acompanham a peça inicial (ID 7136533), os quais aqui reproduzo:   

                                                   

 

Como se observa, não há nas imagens nenhum dos elementos passíveis de caracterização da propaganda eleitoral antecipada, especialmente o pedido explícito de voto ou a utilização das chamadas magic words equivalentes. Ao contrário, as publicações, nos limites em que vislumbradas na prova documental acostada, estão ao pleno albergue das autorizações estampadas no art. 36-A, caput, da Lei n. 9.504/97.

Por sua vez, o Ministério Público Eleitoral argumenta que as peças teriam sido produzidas em estúdio, com relevante despesa arcada pelo próprio pré-candidato, em violação ao princípio da igualdade de oportunidades, pois o meio utilizado desbordaria das possibilidades técnicas ou econômicas do pré-candidato médio, na linha do entendimento manifestado pelo TSE.

Com as devidas vênias, não há elemento probatório mínimo que ampare a pretensão ministerial, a qual demandaria a avaliação precisa do conteúdo da gravação e de suas circunstâncias intrínsecas, pois, como se sabe, a simples produção e publicação de vídeo em página do Facebook é ato acessível a qualquer pessoa que possua um celular com acesso à internet.

Entretanto, o material não se encontra mais disponível nas URLs indicadas na exordial, o que ocorreu, justamente, em cumprimento à ordem judicial de remoção do conteúdo, não havendo notícias de que a postagem tenha sido renovada, tornado inviável a aferição de sua complexidade, conteúdo ou eventual significação econômica.

Portanto, constata-se que o representante não logrou efetivar a conservação das publicações consideradas ilícitas para fins de prova processual, o que poderia ser alcançado, dentre outros meios, por simples gravação, em vídeo, da tela na qual exibida a integralidade da peça, a ser feita com ferramentas digitais especiais ou com um singelo smartphone que dispusesse de câmera.

Em relação ao ponto, a Procuradoria Regional Eleitoral opina que a alegação de que a peça publicitária foi produzida em estúdio não foi impugnada de forma específica na contestação, de modo que deve ser presumida verdadeira, nos termos do art. 341 do CPC.

Com as devidas vênias ao argumento, entendo que a questão relativa à representação econômica da divulgação restou específica e pontualmente rebatida na contestação, consoante o seguinte trecho (ID 7137483, fl. 07):

(...).

20. O digno representante do parquet ao buscar fundar as razões da representação ofertada trouxe a liça o argumento de que a supostamente os vídeos veiculados nas postagem identificadas na exordial ofertada “muito provavelmente paga com recursos financeiros, o que distancia a conduta do permissivo legal e a lança no terreno da ilicitude”.

21. Como facilmente se percebe no caso em comento a afirmação realizada a peça vestibular vem desacompanhada de quaisquer elementos probatórios que a estribem sendo, portanto, tão somente uma singela suposição.

22. Nestes termos, tem o ora Representado não haver o órgão ministerial se desincumbido do ônus probatório que toca ao autor, forte no art. 373, I, do CPC.

(...).

 

Assim, não há de se falar em presunção de veracidade concernente à alegação de custo expressivo do meio utilizado, pois o ônus probatório desse fato é atribuição da parte representante, na forma do art. 373, inc. I, do CPC, da qual não se desincumbiu a contento.

Desse modo, considero que não há, nos autos, provas que demonstrem a ocorrência dos fatos descritos na inicial, especialmente a relevância econômica do meio empregado, sendo forçoso manter a sentença de improcedência da representação eleitoral.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.