REl - 0600040-84.2020.6.21.0018 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/10/2020 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

O presente recurso é tempestivo. A intimação da sentença ocorreu no dia 06.10.2020, e o recurso foi apresentado no dia seguinte, observando, portanto, o prazo legal.

Estando preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, a irresignação comporta conhecimento.

Primeiramente, anoto que a inicial da representação, distribuída em 16 de setembro de 2020, relata a existência de propaganda eleitoral antecipada contida em página publicada na rede social (https://www.facebook.com/Matheusbrondanidompedrito/).

Conforme disposto no art. 17, inc. III e § 2o, da Resolução TSE n. 23.608/2019, a petição inicial da representação relativa à propaganda irregular veiculada em ambiente de internet será instruída, sob pena de não conhecimento, “com a identificação do endereço da postagem (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN) e a prova de que a pessoa indicada para figurar como representado é o seu autor”, “cabendo ao órgão judicial competente aferir se ficou demonstrada a efetiva disponibilização do conteúdo no momento em que acessada a página da internet”:

Art. 17. A petição inicial da representação relativa à propaganda irregular será instruída, sob pena de não conhecimento:

I - com prova da autoria ou do prévio conhecimento do beneficiário, caso não seja alegada a presunção indicada no parágrafo único do art. 40-B da Lei nº 9.504/1997;

II - naquelas relativas à propaganda irregular no rádio e na televisão, com a informação de dia e horário em que foi exibida e com a respectiva transcrição da propaganda ou trecho impugnado; e

III - no caso de manifestação em ambiente de internet, com a identificação do endereço da postagem (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN) e a prova de que a pessoa indicada para figurar como representado é o seu autor.

§ 1º Desconhecida a autoria da propaganda, a petição inicial poderá ser endereçada genericamente contra o responsável, desde que requerida liminarmente diligência para a identificação deste e fornecidos os elementos indispensáveis para a obtenção dos dados, sob pena de indeferimento da petição inicial.

§ 2º A comprovação da postagem referida no inciso III deste artigo pode ser feita por qualquer meio de prova admitido em Direito, não se limitando à ata notarial, cabendo ao órgão judicial competente aferir se ficou demonstrada a efetiva disponibilização do conteúdo no momento em que acessada a página da internet.

Na hipótese, a inicial indica que o conteúdo que supostamente caracterizaria propaganda eleitoral antecipada foi retirado pelo pré-candidato, e o próprio recorrente reconhece a divulgação das informações indicadas na exordial em sua página ao expor suas razões.

Assim, penso que não há controvérsia sobre a disponibilização de mensagem/página, residindo o debate apenas sobre seu conteúdo.

Preliminarmente, o recorrente postula seja declarada a perda de objeto do pedido, visto que a página foi adequada antes do recebimento da notificação.

Não há como acolher a alegação, sobretudo considerando que o pedido contido na inicial consiste na aplicação de multa por divulgação de propaganda eleitoral antecipada, e não em remoção de conteúdo.

Assim, rejeito a preliminar de perda de objeto do pedido.

Passando à análise do mérito, anoto que, objetivando garantir a isonomia entre os candidatos, a normatização eleitoral proíbe a veiculação de propaganda eleitoral até o dia 26 de setembro do corrente ano, conforme dispõe o inc. IV do art. 1º da Emenda Constitucional n. 107, de 02 de julho de 2020:

Art. 1º As eleições municipais previstas para outubro de 2020 realizar-se-ão no dia 15 de novembro, em primeiro turno, e no dia 29 de novembro de 2020, em segundo turno, onde houver, observado o disposto no § 4º deste artigo.

§ 1º Ficam estabelecidas, para as eleições de que trata o caput deste artigo, as seguintes datas:

[..]

IV - após 26 de setembro, para o início da propaganda eleitoral, inclusive na internet, conforme disposto nos arts. 36 e 57-A da Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997, e no caput do art. 240 da Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965;

[..]

(Grifei.)

Por conseguinte, o art. 3º da Resolução TSE n. 23.610/19, que regulamenta a propaganda eleitoral para as eleições de 2020, reproduzindo teor do art. 36-A da Lei n. 9.504/97, possibilita que os pretensos candidatos desenvolvam ações que, embora ocorram antes do aludido prazo, não configuram propaganda antecipada.

Assim, é possível que haja menção à pretensa candidatura, a exaltação de qualidades pessoais dos pré-candidatos, o pedido de apoio político, a divulgação das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver, desde que não haja pedido explícito de voto:

Art. 3º Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, caput, I a VII e §§):

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates na rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, da discussão de políticas públicas, dos planos de governo ou das alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades serem divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;

III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos;

IV - a divulgação de atos de parlamentares e de debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;

V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive em redes sociais, blogs, sítios eletrônicos pessoais e aplicativos (apps);

VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido político, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias;

VII - campanha de arrecadação prévia de recursos na modalidade prevista no inciso IV do § 4º do art. 23 da Lei nº 9.504/1997.

§ 1º É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias, sem prejuízo da cobertura dos meios de comunicação social (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, § 1º).

§ 2º Nas hipóteses dos incisos I a VII do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver, observado o disposto no § 4º deste artigo (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, § 2º).

§ 3º O disposto no § 2º deste artigo não se aplica aos profissionais de comunicação social no exercício da profissão (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, § 3º).

§ 4º A campanha a que se refere o inciso VII deste artigo poderá ocorrer a partir de 15 de maio do ano da eleição, observadas a vedação a pedido de voto e as regras relativas à propaganda eleitoral na internet (Lei nº 9.504/1997, art. 22-A, § 3º; vide Consulta TSE nº 0600233-12.2018).

(Grifei.)

Recentemente, esta Corte debruçou-se sobre a questão da configuração de propaganda eleitoral na pré-campanha, especialmente tendo em conta as substanciais alterações trazidas pela edição da Lei n. 13.165/1, em particular a autorização para menção à pretensa candidatura e a exaltação das qualidade pessoais dos pré-candidatos, a restrição apenas do pedido explícito de voto, no contexto de concessão de maior liberdade no período de pré-campanha em razão da dramática redução do período efetivo de campanha eleitoral.

Naquela ocasião, ficou consignado na ementa do precedente que “a exposição de ideias em redes sociais e todo e qualquer meio que viabilize a difusão de informações, além de ir ao encontro da norma jurídica, contribui para a informação do eleitor, permitindo a igualdade de oportunidades e atendendo ao direito de liberdade de expressão” (Recurso Eleitoral n. 0600013-29.2020.6.21.0042, Relator DES. FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, julgamento de 08.9.2020).

Apoiado nesse parâmetro, tenho que deve ser dado provimento ao recurso.

A fim de analisar a publicação que deu origem à representação eleitoral, colho da sentença:

Trata-se de representação por propaganda eleitoral extemporânea protocolada pelo Ministério Público Eleitoral em face de Matheus Brondani May.

Alega o Parquet que chegou ao seu conhecimento que o Representado teria criado uma página no Facebook (https://www.facebook.com/Matheusbrondanidompedrito/) com a finalidade “divulgar sua pré-candidatura ao cargo de vereador no Município de Dom Pedrito, intitulando-se ´Matheus Brondani – Vereador 2020´ e utilizando o número de candidato ´40555´, com a mensagem ´O futuro não espera e a mudança começou´”.

Foram juntadas imagens pelo MPE, a fim de comprovar a prática desviante, entre as quais destaca-se a seguinte:

[IMAGEM]

No entanto, conforme apontado pelo representante, o representado retirou o seu número de candidato das redes sociais, o que não afastaria a prática de propaganda eleitoral antecipada, pois tal prática teria lhe proporcionado vantagem indevida em relação aos demais candidatos.

Por fim, requeu o MPE a determinação de diligência para a confirmação da permanência da página e a condenação do representado ao pagamento de multa prevista no art. 36, §3º, da Lei n. 9.504/97.

[...]

O representado pondera que decidiu criar uma página na rede social Facebook para expor a sua pré-candidatura e que por “inexperiência técnica com recursos tecnológicos, não percebeu que a página da internet, que seria um esboço a ser divulgado por ocasião da candidatura oficial, acabou sendo publicada.”

Ainda, informa que a publicação em questão permaneceu no ar por menos de 24 horas e que nunca teve a intenção de promover antecipadamente a sua candidatura, atribuindo a publicação a um erro na elaboração do conteúdo de sua rede social.

(Grifei.)

Como se percebe, a imposição da multa decorreu da divulgação da mensagem "Matheus Brondani – Vereador 2020" e do número de candidato "40555", acompanhados do slogan "O futuro não espera e a mudança começou", tudo contido em página da rede social Facebook.

O apenamento por tal conduta com a imposição de multa parece excessivo, sobretudo considerando que não há qualquer notícia da repercussão da página, de dispêndio de valores para impulsioná-la, de contratação de profissionais para seu desenvolvimento ou do uso de qualquer artifício inacessível aos demais candidatos.

Pelo contrário: o próprio candidato aparentemente estava desenvolvendo sua página, tanto que admite erro e desconhecimento ao realizar a publicação dos dados e sua correção poucas horas depois de tomar ciência de que o conteúdo estava acessível ao público.

Aliás, a publicidade impugnada tem um impacto muito menor sobre a formação da vontade do eleitorado do que a divulgação da pré-candidatura e a exaltação das qualidades pessoais, sendo que estas últimas são expressamente permitidas pela legislação.

Concordo com as bem expostas razões contidas no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral acerca da influência junto ao eleitorado das diferentes ações que poderiam ser realizadas por pré-candidatos (ID 7373933):

Aqui cumpre uma indagação. O que pode importar em maior influência junto ao eleitorado, a notícia da pré-candidatura em um perfil do Facebook com pedido de apoio ou a colocação de outdoors pela cidade parabenizando pelo Dia das Mães, com a fotografia e/ou o nome do pré-candidato. Não tenho a menor dúvida de que a segunda situação, apesar de não fazer qualquer referência à eleição ou pedir o apoio à candidatura, teria uma aptidão muito maior para angariar votos, vez que fixaria a imagem e/ou o nome do pré-candidato junto a um número elevado de eleitores. E essa segunda situação é exatamente a que pode violar a igualdade de oportunidade entre os candidatos, pois nem todos podem pagar por outdoors.

Nessa perspectiva, a divulgação do nome do candidato, número da candidatura e slogan por poucas horas em página da rede social Facebook não constitui conduta que possa comprometer a igualdade de chances entre aqueles que disputam cargos eletivos em Dom Pedrito para fins de atrair a imposição de multa por propaganda eleitoral extemporânea.

Com amparo nestes fundamentos, o recurso deve ser provido para julgar improcedente a representação em virtude de não estar caracterizada propaganda eleitoral extemporânea.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO por rejeitar a preliminar e, no mérito, por dar provimento ao recurso para julgar improcedente a representação.

É como voto, senhor Presidente.