REl - 0600060-88.2020.6.21.0143 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/10/2020 às 14:00

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois foi interposto em 24.9.2020 (ID 7015483), dia seguinte ao da disponibilização do ato de intimação da sentença (ID 7015233 a 7015383), respeitando-se o prazo de 1 (um dia), estabelecido no art. 22, caput, da Resolução TSE n. 23.608/19 (art. 96, § 8º, da Lei n. 9.504/97), assim como preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

VOLMIR JOSÉ MIKI BREIER e MAURÍCIO ROGÉRIO DE MEDEIROS TONOLHER (respectivamente, Prefeito e Vice-Prefeito de Cachoeirinha e candidatos à reeleição ao tempo dos fatos) buscam a reforma da sentença de improcedência proferida pelo Juízo da 143ª Zona Eleitoral de Cachoeirinha (ID 7015183), com a condenação de TIAGO DE SOUZA BARBOSA (à época, pré-candidato ao cargo de vereador) à remoção de propaganda eleitoral negativa, veiculada no blog “Cachoeirinha é Tri News”, na rede social Facebook, assim como ao pagamento da penalidade da multa correspondente (art. 28, § 5º, da Resolução TSE n. 23.610/19).

De início, consigno que os RECORRENTES, na petição por meio da qual emendaram a inicial (ID 7014233), em cumprimento à determinação do magistrado de primeira instância, informaram os endereços eletrônicos das postagens, comprovando, também, a autoria das publicações, com o que restou satisfeito o requisito exigido pelo art. 17, inc. III, da Resolução TSE n. 23.608/19, quanto às manifestações em ambiente de internet, para o conhecimento da presente representação.

Adentrando a análise do mérito, é importante referir, primeiramente, que, a partir da Reforma Eleitoral introduzida pela Lei n. 13.165/15, o legislador passou a adotar uma postura liberalizante com relação à propaganda eleitoral no período da pré-campanha, considerando legítimas as condutas elencadas no art. 36-A da Lei n. 9.504/97, dentre as quais a exaltação das qualidades pessoais do pré-candidato, a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais, e o pedido de apoio político, desde que não envolvam o pedido explícito de votos.

A ampliação conceitual coaduna-se com a necessidade de igualarem-se as condições de disputa entre os concorrentes ao pleito gerada pelo encurtamento do período de campanha, aproximadamente 45 dias, introduzido pela Minirreforma Eleitoral de 2015, e que, no corrente ano, se tornou mais evidente devido à postergação do seu início de 5 de julho para 27 de setembro de 2020, por força das limitações provocadas pela Pandemia da COVID-19 (art. 11, inc. II, da Resolução TSE n. 23.624/19, com a alteração promovida pela EC n. 107/20).

Como pontuou a Procuradoria Regional Eleitoral, o maior espaço à liberdade de expressão durante a pré-campanha permite aos eleitores conhecer os futuros candidatos, especialmente aqueles com menor exposição e visibilidade perante o eleitorado, por não se encontrarem no exercício de cargos públicos, com a ampliação do debate sociopolítico, o que atende ao anseio de renovação na política, bem assim aos princípios da alternância no Poder, do pluralismo político (art. 1º, inc. V, da Constituição Federal), concretizando, com isso, no plano substancial, a democracia representativa (art. 1º, parágrafo único, da Constituição Federal), por meio do voto consciente do eleitor.

Nesse sentido, cito a decisão paradigmática do Tribunal Superior Eleitoral ao julgar o REsp n. 51-24, em acórdão de relatoria do Ministro Luiz Fux (DJE de 18.10.2016):

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. (LEI DAS ELEIÇÕES, ART. 36-A). DIVULGAÇÃO DE MENSAGEM EM FACEBOOK. ENALTECIMENTO DE PARTIDO POLÍTICO. MENÇÃO À POSSÍVEL CANDIDATURA. AUSÊNCIA DE PEDIDO EXPLÍCITO DE VOTOS. NÃO CONFIGURAÇÃO. LEGÍTIMO EXERCÍCIO DA LIBERDADE JUSFUNDAMENTAL DE INFORMAÇÃO. ULTRAJE À LEGISLAÇÃO ELEITORAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO.

1. A liberdade de expressão reclama proteção reforçada, não apenas por encerrar direito moral do indivíduo, mas também por consubstanciar valor fundamental e requisito de funcionamento em um Estado Democrático de Direito, motivo por que o direito de expressar-se – e suas exteriorizações (informação e de imprensa)– ostenta uma posição preferencial (preferred position) dentro do arquétipo constitucional das liberdades.

2. A proeminência da liberdade de expressão deve ser trasladada para o processo político-eleitoral, mormente porque os cidadãos devem ser informados da variedade e riqueza de assuntos respeitantes a eventuais candidatos, bem como das ações parlamentares praticadas pelos detentores de mandato eletivo.

3. A ratio essendi subjacente ao art. 36, caput, da Lei das Eleições, que preconiza que a propaganda eleitoral somente será admitida após 15 de agosto do ano das eleições, é evitar, ou, ao menos, amainar a captação antecipada de votos, visando a não desequilibrar a disputa eleitoral, vulnerar o postulado da igualdade de chances entre os candidatos e, no limite, comprometer a própria higidez do prélio eleitoral.

4. A ampla divulgação de ideias fora do período eleitoral propriamente dito se ancora em dois postulados fundamentais: no princípio republicano, materializado no dever de prestação de contas imposto aos agentes eleitos de difundirem atos parlamentares e seus projetos políticos à sociedade; e no direito conferido ao eleitor de acompanhar, de forma abrangente, as ideias, convicções, opiniões e plataformas políticas dos representantes eleitos e dos potenciais candidatos acerca dos mais variados temas debatidos na sociedade, de forma a orientar a formação de um juízo mais consciente e responsável, quando do exercício de seu ius suffragii.

5. A propaganda eleitoral extemporânea consubstancia, para assim ser caracterizada, ato atentatório à isonomia de chances, à higidez do pleito e à moralidade que devem presidir a competição eleitoral, de maneira que, não ocorrendo in concrecto quaisquer ultraje a essa axiologia subjacente, a mensagem veiculada encerrará livre e legítima forma de exteriorizar seu pensamento dentro dos limites tolerados pelas regras do jogo democrático.

6. O limite temporal às propagandas eleitorais encontra lastro no princípio da igualdade de oportunidades entre partidos e candidatos, de forma a maximizar três objetivos principais: (i) assegurar a todos os competidores um mesmo prazo para realizarem as atividades de captação de voto, (ii) mitigar o efeito da (inobjetável) assimetria de recursos econômicos na viabilidade das campanhas, no afã de combater a plutocratização sobre os resultados dos pleitos; e (iii) impedir que determinados competidores extraiam vantagens indevidas de seus cargos ou de seu acesso aos grandes veículos de mídia, antecipando, em consequência, a disputa eleitoral.

7. A menção à pretensa candidatura e a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, nos termos da redação conferida ao art. 36-A pela Lei nº 13.165/2015, não configuram propaganda extemporânea, desde que não envolvam pedido explícito de voto.

(…)

 

De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral, o sancionamento da propaganda antecipada com a aplicação da penalidade de multa exige, alternativamente, o pedido explícito de voto, a utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda ou a violação ao princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos, como colho do seguinte precedente:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL COM AGRAVO. ELEIÇÕES 2018. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno contra decisão monocrática que negou seguimento a agravo nos próprios autos interposto para impugnar decisão de inadmissão de recurso especial eleitoral.

2. Na análise de casos de propaganda eleitoral antecipada, é necessário, em primeiro lugar, determinar se a mensagem veiculada tem conteúdo eleitoral, isto é, relacionado com a disputa.

3. Reconhecido o caráter eleitoral da propaganda, deve–se observar três parâmetros alternativos para concluir pela existência de propaganda eleitoral antecipada ilícita: (i) a presença de pedido explícito de voto; (ii) a utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda; ou (iii) a violação ao princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos.

4. No caso, conforme já destacado na decisão agravada, (i) a expressão "conclamando à todos [sic] uma união total por Calçoene" não traduz pedido explícito de votos, bem como (ii) o acórdão regional não traz informações sobre o número de pessoas que tiveram acesso à publicação ou sobre eventual reiteração da conduta, de modo que não há como concluir pela mácula ao princípio da igualdade de oportunidades. Ademais, o impulsionamento de publicação na rede social Facebook não é vedado no período de campanha, mas, sim, permitido na forma do art. 57–C da Lei nº 9.504/1997.

5. Na ausência de conteúdo eleitoral, ou, ainda, de pedido explícito de votos, de uso de formas proscritas durante o período oficial de propaganda e de qualquer mácula ao princípio da igualdade de oportunidades, deve–se afastar a configuração de propaganda eleitoral antecipada ilícita, nos termos do art. 36–A da Lei nº 9.504/1997.6. Agravo interno a que se nega provimento.

(AI n. 060009124, Relator Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 05.02.2020). (Grifei.)

 

No tocante à propaganda eleitoral negativa, na jurisprudência da Corte Eleitoral Superior, o voto de reprovação (“não voto”), as críticas que excedem os limites da liberdade de expressão e informação em contexto atrelado à disputa eleitoral e a divulgação de fatos que induzem o eleitor a não votar em determinado candidato constituem referenciais à sua caracterização, aferida em face das circunstâncias de cada caso concreto.

Para o pleito de 2020, o legislador expressamente associou a propaganda eleitoral negativa, inclusive no período da pré-campanha, às situações de ofensa à honra e à imagem de candidatos, partidos políticos ou coligações, ou de divulgação de fato sabidamente inverídico, tendentes a desigualar a disputa entre os concorrentes ao pleito, em contexto que desborde dos limites delineados pelo princípio democrático dentro do espaço político-eleitoral, e que, por essa razão, requeiram a imposição de restrição ao exercício da liberdade de pensamento e de expressão, segundo o teor do art. 27, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 27. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57- A). (Vide, para as Eleições de 2020, art. 11, inciso II, da Resolução nº 23.624/2020)

§ 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatos, partidos ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos.

§ 2º O disposto no § 1º deste artigo se aplica, inclusive, às manifestações ocorridas antes da data prevista no caput, ainda que delas conste mensagem de apoio ou crítica a partido político ou a candidato, próprias do debate político e democrático.

 

Nessa senda de garantia do direito de liberdade de manifestação do pensamento (art. 5º, inc. IV, da Constituição Federal), a intervenção da Justiça Eleitoral, por intermédio da remoção de conteúdos da internet, deve ser parcimoniosa, limitando-se à restauração do equilíbrio das forças em disputa, sempre que houver ofensa a direitos das pessoas que participam do processo eleitoral ou a difusão de informações falsas, que induzam o eleitor em erro sobre dado relevante à formação da sua convicção, conforme dispõe o art. 38, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 38. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J).

§ 1º Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.

 

No caso concreto, as postagens publicadas no blog “Cachoeirinha é Tri News”, do qual o RECORRIDO é o gestor na rede social Facebook, nos dias 31.6.2020, 1º.8.2020, 06 e 09.9.2020, contêm os seguintes dizeres (ID 7014233):

Troco Gol G5 por lâmpada LED de Cachoeirinha

Pessoa tá investindo em lâmpada LED de Cachoeirinha. Investimento certo não desvaloriza nem na PANDEMIA.

Prefeitura está estudando lançar a nota ainda esse mês

Nova nota de R$ 2 mil reais, pra você que quer comprar uma lâmpada LED sem parcelar no cartão Kkkk

 

DESAFIO A PREFEITURA DE CACHOEIRINHA

O contrato da nova iluminação pública de Cachoeirinha que está sendo investigado pelo TCE, diz que será trocado 11 mil lâmpadas em toda cidade. O custo chega a 22 milhões: cerca de 2 mil reais por lâmpada.

Então, decidi virar trocador de lâmpada e faço um desafio, me contratem!

Faço desconto em quantidade!!!

 

O CURIOSO CASO DOS 50 MILHÕES DO PAC DA MOBILIDADE QUE NINGUÉM COBRA

Instalo lâmpada LED R$ 1.999,00

 

Os RECORRENTES sustentam que as mensagens acima transcritas veiculam informação manifestamente inverídica acerca do custo individual de lâmpadas de LED, adquiridas pela prefeitura para a reordenação luminotécnica da rede de iluminação pública do Município de Cachoeirinha, facilmente verificável pelo próprio RECORRIDO, que tinha plena ciência dos termos e das condições do contrato firmado com o Consórcio IP Brasil para tal finalidade.

Afirmam que o conteúdo dos textos veiculados, associado às ilustrações jocosas que o acompanham, especialmente da nota de R$ 2.000,00 contendo a figura de uma lâmpada e a fotografia de VOLMIR, possui nítido caráter eleitoreiro e induz os eleitores a acreditar ter havido o superfaturamento da contratação, denegrindo a imagem pessoal e a administração dos RECORRENTES, atuais gestores municipais, causando-lhes prejuízo na disputa à reeleição à chefia do Poder Executivo local durante a pré-campanha deste ano, configurando propaganda eleitoral negativa, vedada pela legislação eleitoral.

Contudo, a análise do conteúdo das postagens revela, antes disso, o mero questionamento e a crítica, por meio de sátiras e recursos humorísticos, aos valores que foram empregados no projeto de remodelação da iluminação municipal, objeto do contrato celebrado com o Consórcio IP Brasil, inserindo-se no campo do embate travado entre adversários políticos a respeito da eficiência administrativa dos gestores públicos na consecução de interesse comunitário, dentro de limites aceitáveis e inerentes ao jogo democrático, sendo, portanto, inapto a traduzir excesso passível de contenção ou sancionamento pela Justiça Eleitoral.

Nesse aspecto, é importante ponderar que, no que se refere ao direito de crítica à atuação de autoridades públicas, a preservação da liberdade de expressão é ainda mais ampla, porque a circulação de ideias e opiniões apresenta-se como um instrumento legítimo de controle social da gestão administrativa e de formação de juízos críticos por parte do eleitor, sendo, por conseguinte, fundamental à própria conformação do Estado Democrático de Direito.

Desse modo, as críticas ostensivas e veementes, ainda que desabonadoras da atuação de determinado governante, não configuram necessariamente ofensa à sua imagem ou honra, estando, assim, circunscritos à esfera legítima da manifestação do pensamento, albergada pelo direito à liberdade de expressão.

A respeito dessa temática, o Tribunal Superior Eleitoral tem reiteradamente afirmado que os exercentes de mandatos eletivos, dada a natureza pública das funções desempenhadas e a projeção política exercida no meio social, devem desenvolver maior tolerância ao juízo crítico dos cidadãos, especialmente durante o processo eleitoral, permeado pelo acirramento das divergências ideológicas relacionadas à consecução das políticas públicas (TSE, RESPE n. 219225/AP, Relatora Ministra ROSA WEBER, DJE de 11.4.2018, pp. 31-32), premissa que também vem orientando as decisões deste Regional, como se extrai da ementa do seguinte aresto:

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. ELEIÇÕES 2018. IMPROCEDÊNCIA. PEDIDO LIMINAR PARA REMOÇÃO DO MATERIAL INDEFERIDO. INTERNET. VEICULAÇÃO DE VÍDEO. FACEBOOK. ALEGADO CONTEÚDO INVERÍDICO. CRÍTICAS DIRIGIDAS A FIGURA PÚBLICA. VEDADO CERCEAMENTO. IMPROCEDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

Alegada postagem de mensagem na internet com conteúdo tendencioso e inverídico. O pedido liminar de remoção do material da internet foi indeferido com fundamento na garantia do exercício da liberdade de expressão.

Verificada a presença de forte crítica política com relação a atuação do candidato como chefe do poder executivo, no período de 2009 até 2016, em relação a obras realizadas no hospital municipal. Não evidenciada agressão à honra pessoal do candidato ou da agremiação. Críticas dirigidas a postura de homem público, exposto à análise do eleitor, o que não pode ser objeto de cerceamento, sob pena de violação ao princípio democrático.

Esta corte assentou entendimento de que o exercício da liberdade de expressão é especialmente amplificado no período eleitoral, uma vez que a discussão sobre a capacidade e idoneidade dos candidatos é de interesse público, sendo necessária ao debate eleitoral, prevalecendo o disposto no art. 33 da Resolução TSE n. 23.551/17, que impõe a atuação da Justiça Eleitoral com a menor interferência possível no debate democrático.

Desprovimento.

(RP n. 0601991-41, Relator Des. Eleitoral JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA, publicado na sessão de 04.10.2018.) (Grifei.)

 

Essa orientação foi recentemente reforçada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento da ADI n. 4.451/DF, proposta pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT), oportunidade em que declarou a inconstitucionalidade dos incs. II e III (na parte impugnada) do art. 45 da Lei n. 9.504/97, bem como, por arrastamento, dos §§ 4º e 5º do mesmo dispositivo legal, em acórdão relatado pelo Ministro Alexandre de Moraes (DJe n. 44 de 06.3.2019), cuja ementa transcrevo abaixo:

LIBERDADE DE EXPRESSÃO E PLURALISMO DE IDEIAS. VALORES ESTRUTURANTES DO SISTEMA DEMOCRÁTICO. INCONSTITUCIONALIDADE DE DISPOSITIVOS NORMATIVOS QUE ESTABELECEM PREVIA INGERÊNCIA ESTATAL NO DIREITO DE CRITICAR DURANTE O PROCESSO ELEITORAL. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL AS MANIFESTAÇÕES DE OPINIÕES DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E A LIBERDADE DE CRIAÇÃO HUMORÍSTICA.

1. A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar funcionamento do sistema democrático.

2. A livre discussão, a ampla participação política e o princípio democrático estão interligados com a liberdade de expressão, tendo por objeto não somente a proteção de pensamentos e ideias, mas também opiniões, crenças, realização de juízo de valor e críticas a agentes públicos, no sentido de garantir a real participação dos cidadãos na vida coletiva.

3. São inconstitucionais os dispositivos legais que tenham a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável ao regime democrático. Impossibilidade de restrição, subordinação ou forçosa adequação programática da liberdade de expressão a mandamentos normativos cerceadores durante o período eleitoral.

4. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das mais variadas opiniões sobre os governantes.

5. O direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias. Ressalte-se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a guarda dessa garantia constitucional.

6. Ação procedente para declarar a inconstitucionalidade dos incisos II e III (na parte impugnada) do artigo 45 da Lei 9.504/1997, bem como, por arrastamento, dos parágrafos 4º e 5º do referido artigo. (Grifei.)

 

Ademais, contrariamente ao parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (ID 7056333), entendo que o acesso do RECORRIDO aos termos do Contrato de Prestação de Serviços n. 098/2019, firmado entre o Município de Cachoeirinha e o Consórcio IP Brasil (ID 7013733), notadamente ao teor da sua cláusula 3.1 e do Anexo II – que demonstram estarem incluídos, no objeto e valor da contratação, além do custo das lâmpadas de LED, o serviço de troca, manutenção e pagamento da conta de luz referente à iluminação pública do município –, é insuficiente para considerar que as postagens veiculam fato sabidamente inverídico, diante do qual restaria justificada a ordem de remoção da propaganda por esta Justiça Especializada e a imposição de multa, nos termos do art. 27, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.610/19 e art. 36, § 3º, da Lei das Eleições.

E isso porque a qualificação do fato como sabidamente inverídico exige que a falsidade seja perceptível de plano, isto é, seja incontestável e indiscutível, independentemente de investigação prévia, e não admita, sequer, a crítica política, a qual constituiu o conteúdo primordial das publicações do RECORRIDO na rede social Facebook (Representação n. 367783, Relator Ministro Henrique Neves da Silva, publicado na sessão de 26.10.2010; RP n. 139448, Relator Ministro ADMAR GONZAGA, publicado na sessão de 02.10.2014).

Por essas razões, estou encaminhando meu voto no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso interposto, mantendo a decisão de primeiro grau, por considerar não configurada a prática de propaganda eleitoral negativa em desfavor dos RECORRENTES.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo conhecimento e desprovimento do recurso, mantendo integralmente a sentença que julgou improcedente a presente representação.