REl - 0600164-40.2020.6.21.0027 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/10/2020 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

A intimação da sentença foi realizada no dia 08.10.2020 e o recurso foi apresentado no dia seguinte, sendo, portanto, tempestivo.

Estando preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, a irresignação comporta conhecimento.

Inicialmente, anoto que a inicial da representação relata a existência de propaganda eleitoral antecipada contida em vídeo publicado na página do pré-candidato João Vestena, na rede social Facebook, no link https://www.facebook.com/jvestena/posts/2625234897693412?__xts__[0]=68.ARAou_DScPUlWSpLu1Qaww2Mgdei8W_oYP-fKs3hBkireUWMytgilzJtQLx9JvNKsP1VFJKBPKCq1Xw0x7afT8O3ODDGPbRrumhYoBghlDcTm7x-8x.

Conforme disposto no art. 17, inc. III e § 2o, da Resolução TSE n. 23.608/19, a petição inicial da representação relativa à propaganda irregular veiculada em ambiente de internet será instruída, sob pena de não conhecimento, “com a identificação do endereço da postagem (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN) e a prova de que a pessoa indicada para figurar como representado é o seu autor”, “cabendo ao órgão judicial competente aferir se ficou demonstrada a efetiva disponibilização do conteúdo no momento em que acessada a página da internet”:

Art. 17. A petição inicial da representação relativa à propaganda irregular será instruída, sob pena de não conhecimento:

I - com prova da autoria ou do prévio conhecimento do beneficiário, caso não seja alegada a presunção indicada no parágrafo único do art. 40-B da Lei nº 9.504/1997;

II - naquelas relativas à propaganda irregular no rádio e na televisão, com a informação de dia e horário em que foi exibida e com a respectiva transcrição da propaganda ou trecho impugnado; e

III - no caso de manifestação em ambiente de internet, com a identificação do endereço da postagem (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN) e a prova de que a pessoa indicada para figurar como representado é o seu autor.

§ 1º Desconhecida a autoria da propaganda, a petição inicial poderá ser endereçada genericamente contra o responsável, desde que requerida liminarmente diligência para a identificação deste e fornecidos os elementos indispensáveis para a obtenção dos dados, sob pena de indeferimento da petição inicial.

§ 2º A comprovação da postagem referida no inciso III deste artigo pode ser feita por qualquer meio de prova admitido em Direito, não se limitando à ata notarial, cabendo ao órgão judicial competente aferir se ficou demonstrada a efetiva disponibilização do conteúdo no momento em que acessada a página da internet.

A postagem está especificamente individualizada e efetivamente disponibilizada, tendo sido, inclusive, determinada sua remoção na decisão recorrida.

Pois bem.

Objetivando garantir a isonomia entre os candidatos, a normatização eleitoral proíbe a veiculação de propaganda eleitoral até 26 de setembro do corrente ano, conforme dispõe o inc. IV do art. 1º da Emenda Constitucional n. 107, de 02 de julho de 2020:

Art. 1º As eleições municipais previstas para outubro de 2020 realizar-se-ão no dia 15 de novembro, em primeiro turno, e no dia 29 de novembro de 2020, em segundo turno, onde houver, observado o disposto no § 4º deste artigo.

§ 1º Ficam estabelecidas, para as eleições de que trata o caput deste artigo, as seguintes datas:

[..]

IV - após 26 de setembro, para o início da propaganda eleitoral, inclusive na internet, conforme disposto nos arts. 36 e 57-A da Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997, e no caput do art. 240 da Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965;

[..] (Grifei.)

Por conseguinte, o art. 3º da Resolução TSE n. 23.610/19, que regulamenta a propaganda eleitoral para as eleições de 2020, reproduzindo o teor do art. 36-A da Lei n. 9.504/97, possibilita que os pretensos candidatos desenvolvam ações que, embora ocorram antes do aludido prazo, não configuram propaganda antecipada.

Assim, é possível que haja menção à pretensa candidatura, a exaltação de qualidades pessoais dos pré-candidatos, o pedido de apoio político, a divulgação das ações políticas desenvolvidas e das que se pretendem desenvolver, desde que não haja pedido explícito de voto:

Art. 3º Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, caput, I a VII e §§):

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates na rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, da discussão de políticas públicas, dos planos de governo ou das alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades serem divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;

III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos;

IV - a divulgação de atos de parlamentares e de debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;

V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive em redes sociais, blogs, sítios eletrônicos pessoais e aplicativos (apps);

VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido político, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias;

VII - campanha de arrecadação prévia de recursos na modalidade prevista no inciso IV do § 4º do art. 23 da Lei nº 9.504/1997.

§ 1º É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias, sem prejuízo da cobertura dos meios de comunicação social (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, § 1º).

§ 2º Nas hipóteses dos incisos I a VII do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver, observado o disposto no § 4º deste artigo (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, § 2º).

§ 3º O disposto no § 2º deste artigo não se aplica aos profissionais de comunicação social no exercício da profissão (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, § 3º).

§ 4º A campanha a que se refere o inciso VII deste artigo poderá ocorrer a partir de 15 de maio do ano da eleição, observadas a vedação a pedido de voto e as regras relativas à propaganda eleitoral na internet (Lei nº 9.504/1997, art. 22-A, § 3º; vide Consulta TSE nº 0600233-12.2018). (Grifei.)

Recentemente, esta Corte se debruçou sobre a questão da configuração de propaganda eleitoral na pré-campanha, tendo em conta as substanciais alterações trazidas pela edição da Lei n. 13.165/15, em especial a possibilidade de menção à pretensa candidatura e de exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, restringindo-se apenas o pedido explícito de voto, no contexto de concessão de maior liberdade durante a pré-campanha em razão da dramática redução do período efetivo de campanha eleitoral.

Naquela ocasião, ficou consignado, na ementa do precedente, que “a exposição de ideias em redes sociais e todo e qualquer meio que viabilize a difusão de informações, além de ir ao encontro da norma jurídica, contribui para a informação do eleitor, permitindo a igualdade de oportunidades e atendendo ao direito de liberdade de expressão” (Recurso Eleitoral n. 0600013-29.2020.6.21.0042, Relator DES. FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, julgamento em 08.9.2020).

Na hipótese, a sentença recorrida reconheceu a existência de propaganda antecipada, sobretudo considerando o contexto do discurso, que revelava a utilização das chamadas “palavras mágicas”, consignando que:

fica claro que os apoiadores Beto Albuquerque e Dep. Lisiane Bayer ao fazerem menção à "nova eleição de João Vestena" e à "mais 4 anos Júlio de Castilhos possa ser cuidada", estão fazendo uso das apregoadas fórmulas mágicas para pedir votos ao candidato apoiado, ainda que não de forma direta, fazendo uso de meio de propaganda eleitoral vedado pela legislação.

Tenho que o conteúdo da mensagem impugnada deve ser examinado em seu contexto.

No caso dos autos, entretanto, é de se considerar que a mensagem impugnada violou a igualdade de oportunidades, considerando o período de pré-campanha. É perceptível o uso de elementos classicamente reconhecidos como caracterizadores de propaganda – desacompanhados de pedido explícito e direto de votos –, o que não acarretaria irregularidade, visto que exaltam as qualidades dos pré-candidatos para o exercício do mandato e divulgam seus planos de governo, não fosse a gravação possuir uma expressão econômica relevante no cenário local.

Embora o vídeo postado seja identificado como “live”, trata-se, em verdade, de gravação de 28min e 34seg, com edição requintada, onde podem ser verificados mensagem de abertura, cortes precisos, cenários bem escolhidos, falas de quatro apoiadores locais que não poderiam ser caracterizadas como “de improviso”, além de palavras de apoio, todas nos limites das expressões permitidas, proferidas por Beto Albuquerque, pelo Senador Luis Carlos Heinze, pelos Deputados Federais Lisiane Bayer, Jerônimo Goergen, Heitor Schuch e Pedro Westphalen, todos devidamente identificados por legenda no vídeo, além de narração de abertura com música de fundo.

Estão presentes os seguintes elementos: gravação que observou parâmetros técnicos, realizada por equipe especializada para tal finalidade (em relação aos candidatos e apoiadores locais), com edição profissional pertinente a essas falas e às demais obtidas junto aos apoiadores já detentores de mandato eletivo, e vídeo de considerável duração (quase meia hora).

Mesmo que a gravação não tenha envolvido o dispêndio de valores vultosos, é perceptível que foge ao que se tem como padrão para as divulgações de pré-campanha – declarações improvisadas ou realizadas pelo próprio candidato, em especial para cidades como Júlio de Castilhos, com menos de 15 mil eleitores.

Diferentemente de outros casos que chegaram ao conhecimento da Corte por meio de recurso, aqui não vemos declarações espontâneas, com os erros comuns nas falas cotidianas, hesitações, momentos de silêncio ou trechos vazios: o vídeo dos autos é uma peça publicitária bem elaborada, por isso deve ser distinguido dos casos precedentes, sobretudo considerando as características de um pequeno município do interior do Rio Grande do Sul.

Deve ser mantida, portanto, a decisão da juíza eleitoral que reconheceu a existência da propaganda eleitoral antecipada e condenou JOÃO VESTENA e MARIA DE FÁTIMA FERREIRA ao pagamento da multa prevista no § 3º do art. 36 da Lei n. 9.504/97, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

ANTE O EXPOSTO, VOTO por negar provimento ao recurso.

É como voto, Senhor Presidente.