REl - 0600236-49.2020.6.21.0149 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/10/2020 às 14:00

VOTO

Passo ao exame das razões de reforma da sentença.

Inicialmente, observa-se a perda superveniente do interesse recursal em relação ao pedido de remoção da postagem impugnada, uma vez que, nas razões recursais, o Progressistas informa que a publicação foi excluída do Facebook no curso da ação.

Quanto ao requerimento de quebra do anonimato e à determinação de que a rede social informe os dados de autoria da postagem, o partido alega, no recurso, que a publicação é totalmente inverídica e compromete a lisura do pleito.

Segundo a agremiação, foi utilizado um perfil anônimo no Facebook e realizada uma montagem das fotografias do pré-candidato ao cargo de prefeito Leandro Marciano Horlle e do Prefeito de Igrejinha, Joel Leandro Wilhelm, para a propagação de desinformação em grupo público da rede social, tendo sido comprovado tratar-se de divulgação de informações falsas e difamatórias.

Na montagem, aparecem as fotografias do pré-candidato ao cargo de prefeito Leandro Marciano Horlle e do Prefeito de Igrejinha, Joel Leandro Wilhelm, acompanhadas de um balão representando a seguinte fala, comum a ambos: “Não aguento mais meus pré-candidatos fazendo festa no bar do Astor no XV”.

De acordo com os arts. 39 e 40, inc. I, da Resolução TSE n. 23.610/19, a procedência do pedido impõe a comprovação de fundados indícios da ocorrência de ilícito eleitoral:

Art. 39. O provedor responsável pela guarda somente será obrigado a disponibilizar os registros de conexão e de acesso a aplicações de internet, de forma autônoma ou associados a dados cadastrais, a dados pessoais ou a outras informações disponíveis que possam contribuir para a identificação do usuário, mediante ordem judicial, na forma prevista nesta Seção (Lei nº 12.965/2014, art. 10, caput e § 1º).

Art. 40. A parte interessada poderá, com o propósito de formar conjunto probatório em processo judicial, em caráter incidental ou autônomo, requerer ao juiz eleitoral que ordene ao responsável pela guarda o fornecimento dos dados constantes do art. 39 desta Resolução (Lei nº 12.965/2014, art. 22).

§ 1º Sem prejuízo dos demais requisitos legais, o requerimento deverá conter, sob pena de inadmissibilidade (Lei nº 12.965/2014, art. 22, parágrafo único):

I - fundados indícios da ocorrência do ilícito de natureza eleitoral;

II - justificativa motivada da utilidade dos dados solicitados para fins de investigação ou instrução probatória;

III - período ao qual se referem os registros.

§ 2º A ausência de identificação imediata do usuário responsável pela divulgação do conteúdo não constitui circunstância suficiente para o deferimento liminar do pedido de quebra de sigilo de dados.

§ 3º A ordem judicial que apreciar o pedido deverá conter, sob pena de nulidade, fundamentação específica quanto ao preenchimento de todos os requisitos legais previstos nos incisos I a III do § 1º deste artigo.

 

De acordo com o art. 11, inc. II, da Resolução TSE n. 23.624/20, é permitida a propaganda eleitoral na internet a partir de 27 de setembro de 2020. O § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.610/19, por sua vez, prevê que: “A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatos, partidos ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos”.

Do exame dessas disposições, tem-se que, antes do dia 27.9.2020, a divulgação de propaganda eleitoral contendo veiculação de fato sabidamente inverídico relativo a pré-candidatos constitui ilícito eleitoral, ainda que o conteúdo da publicação não seja ofensivo à honra ou à imagem do prejudicado.

Na hipótese em apreço, a par da alegação de que o pré-candidato a prefeito Leandro Marciano Horlle não proferiu a fala retratada no balão existente na imagem, “não aguento mais meus pré-candidatos fazendo festa no bar do Astor no XV”, entendo que o fato não se caracteriza como propaganda eleitoral negativa, tal como concluiu a sentença recorrida, verbis:

Sabe-se que em período eleitoral a liberdade de expressão deverá ser assegurada de forma mais ampla, a fim de resguardar o processo democrática, salvo quando comprovado ofensa a honra pessoal do candidato ou da agremiação.

Nesse sentido é o que dispõe o artigo 38 da Resolução 23.610/2019 do TSE:

Art. 38. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei n° 9.504/1 997, ad. 57-J).

§ 1° Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.

§ 2º A ausência de identificação imediata do usuário responsável pela divulgação do conteúdo não constitui circunstância suficiente para o deferimento do pedido de remoção de conteúdo da internet.

§ 3º A publicação somente será considerada anônima caso não seja possível a identificação dos usuários após a adoção das providências previstas no art. 40 desta Resolução.

§ 4º A ordem judicial que determinar a remoção de conteúdo divulgado na internet fixará prazo razoável para o cumprimento, não inferior a 24 (vinte e quatro) horas, e deverá conter, sob pena de nulidade, a URL e, caso inexistente esta, a URI ou a URN do conteúdo específico, observados, nos termos do art. 19 da Lei n° 12.965/2014, o âmbito e os limites técnicos de cada provedor de aplicação de internet.

§ 5º Em circunstâncias excepcionais devidamente justificadas, o prazo de que trata o parágrafo anterior poderá ser reduzido.

§ 6º O provedor responsável pela aplicação de internet em que hospedado o material deverá promover a sua remoção dentro do prazo razoável assinalado, sob pena de arcar com as sanções aplicáveis à espécie.

§ 7° Realizada a eleição, as ordens judiciais de remoção de conteúdo da internet não confirmadas por decisão de mérito transitada em julgado deixarão de produzir efeitos, cabendo à parte interessada requerer a remoção do conteúdo por meio de ação judicial autônoma perante a Justiça Comum.

§ 8º Os efeitos das ordens de remoção de conteúdo da internet relacionadas a candidatos que disputam o segundo turno somente cessarão após a realização deste.

§ 9º As sanções aplicadas em razão da demora ou do descumprimento da ordem judicial reverterão aos cofres da União.

 

Analisando a publicação não constato ofensa à honra do pré-candidato ou de agremiação, mas sim crítica de eleitor, a qual todos àqueles que se submetem ao processo eleitoral estão expostos, inclusive como forma de participação no processo democrático.

Outrossim, da imagem é visível a percepção de montagem com as fotografias do atual prefeito e o pré-candidato, o que evidencia a crítica.

Assim, não sendo fato sabidamente inverídico ou que ridicularize pré-candidato o pedido de retirada da publicação merece ser indeferido, sob pena de prévia censura da Justiça Eleitoral.

Este, inclusive é o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2018. RECURSO INOMINADO. REPRESENTAÇÃO. FAKE NEWS. FACEBOOK. TWITTER. YOUTUBE. REMOÇÃO DE CONTEÚDO. LIMINAR. PERDA DA EFICÁCIA. DESPROVIMENTO.

1. Nos termos do art. 33, caput e § 1º da Res.-TSE 23.551, a atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático, a fim de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, limitando-se às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.

2. Na linha da jurisprudência desta Corte, as ordens de remoção de propaganda irregular, como restrições ao direito à liberdade de expressão, somente se legitimam quando visam à preservação da higidez do processo eleitoral, à igualdade de chances entre candidatos e à proteção da honra e da imagem dos envolvidos na disputa. Assim, eventual ofensa à honra, sem repercussão eleitoral, deve ser apurada pelos meios próprios perante a Justiça Comum.

3. Ultimado o período de propaganda eleitoral, a competência para a remoção de conteúdos da internet passa a ser da Justiça Comum, deixando as ordens judiciais proferidas por este Tribunal de produzir efeitos, nos termos do § 6º do art. 33 da Res.-TSE 23.551. Recurso a que se nega provimento. ( 0601765-21.2018.6.00.0000 , Min. Relator(a) Min. Admar Gonzaga )

 

Também é o entendimento do Tribunal Regional Eleitoral:

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. ELEIÇÕES 2018. IMPROCEDÊNCIA. PEDIDO LIMINAR PARA REMOÇÃO DO MATERIAL INDEFERIDO. INTERNET. VEICULAÇÃO DE VÍDEO. FACEBOOK. ALEGADO CONTEÚDO INVERÍDICO. CRÍTICAS DIRIGIDAS A FIGURA PÚBLICA. VEDADO CERCEAMENTO. IMPROCEDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

Alegada postagem de mensagem na internet com conteúdo tendencioso e inverídico. O pedido liminar de remoção do material da internet foi indeferido com fundamento na garantia do exercício da liberdade de expressão.

Verificada a presença de forte crítica política com relação a atuação do candidato como chefe do poder executivo, no período de 2009 até 2016, em relação a obras realizadas no hospital municipal. Não evidenciada agressão à honra pessoal do candidato ou da agremiação. Críticas dirigidas a postura de homem público, exposto à análise do eleitor, o que não pode ser objeto de cerceamento, sob pena de violação ao princípio democrático.

Esta corte assentou entendimento de que o exercício da liberdade de expressão é especialmente amplificado no período eleitoral, uma vez que a discussão sobre a capacidade e idoneidade dos candidatos é de interesse público, sendo necessária ao debate eleitoral, prevalecendo o disposto no art. 33 da Resolução TSE n. 23.551/17, que impõe a atuação da Justiça Eleitoral com a menor interferência possível no debate democrático. Desprovimento. (Representação n 0601991-41, ACÓRDÃO de 04/10/2018, Relator(aqwe) JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão )

 

Quanto ao pedido de que o Facebook forneça os dados do perfil, entendo que não foram preenchidos os requisitos do art. 40, § 1º da Resolução 23.610/2019 do TSE, especificamente fundados indícios da ocorrência de ilícito de natureza eleitoral, pois não comprovada ofensa à honra do pré-candidato ou à agremiação.

Por fim, importante referir que a Lei 13.709/2018 disciplina a proteção dos dados pessoais, a fim de assegurar a privacidade, a liberdade de expressão, comunicação e opinião, que devem ser ampliadas durante o período eleitoral, razão pela qual o pedido também vai indeferido.

Ante o exposto, acolho a promoção ministerial e JULGO IMPROCEDENTE a representação.

 

De fato, para as eleições de 2020, a divulgação de propaganda eleitoral antes de 27.9.2020 caracteriza irregularidade sancionada com multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) ou equivalente ao custo da propaganda, se este for maior (Lei n. 9.504/97, art. 36, § 3º).

Entretanto, tendo em conta que a publicação impugnada neste feito não se caracteriza como propaganda eleitoral negativa, mas tão somente exercício de crítica política, não está preenchido o requisito de procedência do pedido atinente à demonstração de indícios da ocorrência de ilícito eleitoral.

Definiu o Tribunal Superior Eleitoral que configuram propaganda eleitoral antecipada negativa “críticas que desbordam os limites da liberdade de informação, em contexto indissociável da disputa eleitoral do pleito vindouro” (TSE, ac. de 10.02.2011 no AgR-REspe n. 3967112, rel. Min. Arnaldo Versiani), e que “a divulgação de fatos que levem o eleitor a não votar em determinada pessoa, provável candidato, pode ser considerada propaganda eleitoral antecipada, negativa” (TSE, ac. de 23.10.2002 no REspe n. 20073, rel. Min. Fernando Neves).

Tais elementos não se encontram presentes nos autos, tal como concluiu a Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer:

Pela análise dos documentos anexos à inicial, não se verifica a veiculação de informação sabidamente falsa e tampouco de ofensa à honra de candidato, como muito bem observado pelo MPE em primeira instância (ID7144633) e conforme constou da sentença proferida pelo Juízo da 149ª Zona Eleitoral de Uruguaiana, da qual se colhe, verbis:

Analisando a publicação não constato ofensa à honra do pré-candidato ou de agremiação, mas sim crítica de eleitor, a qual todos àqueles que se submetem ao processo eleitoral estão expostos, inclusive como forma de participação no processo democrático.

Outrossim, da imagem é visível a percepção de montagem com as fotografias do atual prefeito e o pré-candidato, o que evidencia a crítica.

Assim, não sendo fato sabidamente inverídico ou que ridicularize pré-candidato o pedido de retirada da publicação merece ser indeferido, sob pena de prévia censura da Justiça Eleitoral.

 

De fato, a postagem questionada limita-se a apontar uma possível contradição nas condutas dos agentes políticos e os riscos à saúde destas decorrentes. A montagem feita para inserir a imagem dos políticos não se caracteriza como uma “falsidade”, senão como um mero recurso de identificação visual da crítica.

Da mesma forma, o fato do perfil no facebook haver se identificado como "Larissa Silva", ainda que sem uma foto pessoal, não justifica a remoção do conteúdo, exatamente como dispõe o art. 38, § 2º, da Resolução n. 23.610/2019 do TSE.

Vê-se, portanto, que o recorrente não logrou demonstrar que a postagem que deu origem à representação veicula mensagens sabidamente inverídicas ou ofensivas à honra ou imagem dos candidatos.

Destarte, o desprovimento do recurso interposto é medida que se impõe.

 

Além disso, não se verifica qualquer ilegalidade em relação ao uso de montagem fotográfica no caso dos autos, pois a vedação prevista no inc. II do art. 45 da Lei n. 9.504/97, além de ser direcionada às emissoras de rádio e televisão, em sua programação normal e em seus noticiários, foi declarada inconstitucional pelo STF no julgamento da ADIN 4.451.

Desse modo, considerando que deve ser assegurado aos eleitores o exercício da liberdade de expressão, a qual será limitada somente em caso de violações às regras eleitorais ou de ofensa a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral, e que a mera ausência de identificação imediata do usuário responsável pela divulgação do conteúdo não constitui circunstância suficiente para o deferimento do pedido de remoção, a sentença merece ser mantida.

Portanto, merece ser desprovido o recurso interposto.

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.