REl - 0600051-86.2020.6.21.0027 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/10/2020 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo.

Preenchidos os demais pressupostos recursais, conheço do apelo.

A inicial da representação do Ministério Público Eleitoral relata o cometimento de propaganda eleitoral antecipada, em publicações na rede social Facebook, de parte de JOÃO ANTÔNIO CARPES WEBER (ID 7031133).

O juízo de primeiro grau entendeu pela procedência do pedido, ao argumento central de que “(...) a apresentação do representado como candidato, enviando solicitação de 'curtir' aos usuários da rede, pode ser interpretado como propaganda eleitoral fora do período permitido. Com isso, verifica-se o desequilíbrio de oportunidades entre os candidatos, em razão de o representado, antes dos demais concorrentes, ter dado início a sua campanha eleitoral”.

Entretanto, e, aliás, de forma alinhada à manifestação apresentada pela Procuradoria Regional Eleitoral, o caso é de provimento do recurso, pois não restou caracterizada a irregularidade alegada na inicial.

Note-se que o teor das publicações não desobedeceu aos parâmetros da legítima manifestação de pré-candidatos, tema, aliás, que merece abordagem individualizada, com a análise das circunstâncias de cada caso concreto. Na espécie, o recorrente apenas mencionou ser pretenso candidato a vereador, agregando notícias de atos que já teria praticado.

Há de se levar em conta, como esta Corte vem monoliticamente entendendo, que houve flexibilização da exposição dos pré-candidatos em período anterior à data de início da campanha eleitoral. Nessa toada, a edição da Lei n. 13.165/15 autorizou a menção à pretensa candidatura e a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, vedando apenas o pedido explícito de voto (art. 36-A, caput, da Lei n. 9.504/97).

Ou seja, trata-se exatamente de instrumento nivelador das chances dos competidores. Ainda em relação ao art. 36-A da Lei n. 9.504/97, o Min. Luís Roberto Barroso, relator do Recurso Especial Eleitoral n. 060048973, assentou a nítida valorização do direito à liberdade de expressão, onde a figura do pré-candidato pode iniciar uma campanha eleitoral antes de 15 de agosto, e o entendimento do TSE tem sido de caracterizar propaganda eleitoral antecipada apenas o explícito pedido de voto (AgrRg-REspe n. 4346/SE – j. 26.6.2018 – Rel. Min. Jorge Mussi).

E o caso dos autos não é de extrapolação. Esclareço aos colegas que a manifestação do então pré-candidato foi realizada em seu perfil pessoal do Facebook, não possui expressão econômica de gasto eleitoral (aliás, sequer indica ter sido objeto de impulsionamento), e em tudo está adequada àquela manifestação regularmente realizável pelo “candidato médio”, assim tratado pela jurisprudência paradigmática, o voto do Ministro Luiz Fux no AgRg-AI n. 924/SP - j. 26.6.2018 – Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto:

[…]

(a) o pedido explícito de votos, entendido em termos estritos, caracteriza a realização de propaganda antecipada irregular, independentemente da forma utilizada ou da existência de dispêndio de recursos; (b) os atos publicitários não eleitorais, assim entendidos aqueles sem qualquer conteúdo direta ou indiretamente relacionados com a disputa, consistem em ‘indiferentes eleitorais’, situando-se, portanto, fora da alçada desta Justiça Especializada; e (c) o uso de elementos classicamente reconhecidos como caracterizadores de propaganda, desacompanhado de pedido explícito e direto de votos, não enseja irregularidade per se; todavia, a opção pela exaltação de qualidades próprias para o exercício de mandato, assim como a divulgação de plataformas de campanha ou planos de governo acarreta, sobretudo quando a forma de manifestação possua uma expressão econômica minimamente relevante, impõe os seguintes ônus e exigências: (i) impossibilidade de utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda (outdoor, brindes, etc); e (ii) respeito ao alcance das possibilidades do pré-candidato médio.

Tal esquadro analítico foi utilizado também por ocasião do julgamento do Agravo de Instrumento n. 060009124, Relator Min. Luís Roberto Barroso:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL COM AGRAVO. ELEIÇÕES 2018. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESPROVIMENTO. 1. Agravo interno contra decisão monocrática que negou seguimento a agravo nos próprios autos interposto para impugnar decisão de inadmissão de recurso especial eleitoral.

2. Na análise de casos de propaganda eleitoral antecipada, é necessário, em primeiro lugar, determinar se a mensagem veiculada tem conteúdo eleitoral, isto é, relacionado com a disputa.

3. Reconhecido o caráter eleitoral da propaganda, deve–se observar três parâmetros alternativos para concluir pela existência de propaganda eleitoral antecipada ilícita: (i) a presença de pedido explícito de voto; (ii) a utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda; ou (iii) a violação ao princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos.

4. No caso, conforme já destacado na decisão agravada, (i) a expressão "conclamando à todos [sic] uma união total por Calçoene" não traduz pedido explícito de votos, bem como (ii) o acórdão regional não traz informações sobre o número de pessoas que tiveram acesso à publicação ou sobre eventual reiteração da conduta, de modo que não há como concluir pela mácula ao princípio da igualdade de oportunidades. Ademais, o impulsionamento de publicação na rede social Facebook não é vedado no período de campanha, mas, sim, permitido na forma do art. 57–C da Lei nº 9.504/1997.

5. Na ausência de conteúdo eleitoral, ou, ainda, de pedido explícito de votos, de uso de formas proscritas durante o período oficial de propaganda e de qualquer mácula ao princípio da igualdade de oportunidades, deve–se afastar a configuração de propaganda eleitoral antecipada ilícita, nos termos do art. 36–A da Lei nº 9.504/1997.

6. Agravo interno a que se nega provimento.

(Agravo de Instrumento n. 060009124, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 25, Data: 05.02.2020.) (grifo nosso)

Em resumo, a tendência do TSE é de restringir os atos de pré-campanha pelo conteúdo (vedação do pedido explícito de voto e das “palavras mágicas” equivalentes) e forma (vetando atos de pré-campanha por formas proibidas de propaganda na campanha eleitoral), apontando uma postura de exame do caso concreto, dos custos da publicidade (especialmente quando a forma de pré-campanha extrapolar o limite do candidato médio).

E torna-se mister levar em consideração a evolução legislativa e jurisprudencial, inclusive em virtude dos arts. 926 e 927 do CPC, que apregoam a uniformização de jurisprudência.

Nessa linha, friso que este Tribunal (que em eleições municipais tem, primordialmente, a função de nivelamento das decisões de 1º grau) julgou recentemente caso um tanto semelhante: manifestação de pré-candidato na rede social Facebook. Muito embora não se tratasse de postagem direta, o pré-candidato interagiu com o eleitorado e exerceu seu direito à liberdade de expressão. Trata-se do REl n. 0600013-29, de relatoria do Des. Fed. Thompson Flores, julgado na sessão de 08.9.2020. Transcrevo a ementa do acórdão:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. ART. 36-A, § 2ª, DA LEI DAS ELEIÇÕES. DIVULGAÇÃO DE PRÉ-CANDIDATURA E PEDIDO DE APOIO POLÍTICO. REDE SOCIAL. FACEBOOK. CONDUTA LÍCITA E PERMITIDA. REFORMA DA SENTENÇA. PROVIMENTO.

1. Prefacial. O prazo para interposição de recurso contra sentença proferida em representação sobre propaganda eleitoral irregular é de 1 (um) dia, nos termos do art. 96, § 8º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 22 da Resolução TSE n. 23.608/19. Ainda que interposta fora do prazo, a irresignação deve ser conhecida, de modo a evitar prejuízo à parte, cujo patrono foi induzido em erro pelo prazo assinalado pelo juízo eleitoral.

2. Insurgência contra decisão de piso que jugou procedente a representação por propaganda extemporânea, ao entendimento de que restou caracterizada a captação de votos de forma antecipada, ferindo a igualdade de oportunidades entre os candidatos.

3. A edição da Lei n. 13.165/15 autorizou a menção à pretensa candidatura e a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, vedando apenas o pedido explícito de voto (art. 36-A, caput, da Lei n. 9.504/97). O motivo dessa maior liberdade por ocasião da pré-campanha decorreu da redução do período de campanha propriamente dita, anteriormente permitida a partir de 5 de julho do ano da eleição e que passou a ser após o dia 15 de agosto. Excepcionalmente, neste pleito de 2020, postergada para 27 de setembro em razão da pandemia relacionada à Covid-19 (EC 107/2020).

4. O § 2º do art. 36-A da Lei das Eleições autoriza o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura e das ações políticas que se pretende desenvolver, quando da divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais. Nesse sentido, e nos termos da jurisprudência do TSE, a exposição de ideias em redes sociais e todo e qualquer meio que viabilize a difusão de informações, além de ir ao encontro da norma jurídica, contribui para a informação do eleitor, permitindo a igualdade de oportunidades e atendendo ao direito de liberdade de expressão.

5. Provimento do recurso, para reformar a sentença e julgar improcedente a representação.

Tanto lá, como cá. Aqui, os dizeres se restringiram, em suma, a descrever sua atuação pretérita e colocar seu nome como pretenso candidato a vereador (ID 7031133).

No caso posto, portanto, o recurso merece provimento.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso.