REl - 0600043-34.2020.6.21.0052 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/10/2020 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

A fim de evitar tautologia, colho do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral o exame da tempestividade recursal:

O prazo para interposição de recurso contra sentença proferida em representação sobre propaganda eleitoral irregular é de 24 horas (um dia), nos termos do art. 96, § 8º, da Lei 9.504/971.

Saliente-se que subsiste o prazo de 24 horas “mesmo que a decisão seja proferida fora do período eleitoral, não sendo aplicável o prazo de três dias previsto no art. 258 do Código Eleitoral” (Agravo de Instrumento nº 13904,Acórdão, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJE, Tomo 187, 30/09/2013, P. 42)2.

No caso sob análise, que tramita em meio eletrônico, a sentença foi comunicada ao representado (ora recorrente) no dia 20.08.2020 (ID 6819283),quinta-feira, na forma do art. 51, caput, da Resolução TRE-RS n. 338/20193, ou seja, por meio eletrônico, mediante o sistema PJE. O prazo de 10 (dez) dias para consumação da intimação tem início no dia seguinte à disponibilização do ato de comunicação no sistema (art. 55, inc. I, da Resolução TRE-RS n.º 338/2019) e a intimação se perfectibiliza no décimo dia, quando há expediente judiciário, ou no primeiro útil seguinte (art. 55, inc. II, da Resolução TRE-RS n.º 338/2019), pelo que o ora recorrente foi dado por intimado em 31.08.2020, segunda-feira, passando a contar daí as 24 horas a que se refere o § 8º do art. 96 da Lei nº9.504/97. Tendo o recurso sido interposto em 31.08.2020,verifica-se que observou o prazo legal.

Como se depreende do excerto, o recurso é tempestivo.

Estando preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, a irresignação comporta conhecimento.

Inicialmente, anoto que a inicial da representação relata a existência de propaganda eleitoral antecipada contida em vídeo publicado em perfil de rede social (https://www.facebook.com/rogerio.camargo).

Conforme disposto no art. 17, inc. III e § 2o, da Resolução TSE n. 23.608/19, a petição inicial da representação relativa à propaganda irregular veiculada em ambiente de internet será instruída, sob pena de não conhecimento, “com a identificação do endereço da postagem (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN) e a prova de que a pessoa indicada para figurar como representado é o seu autor”, “cabendo ao órgão judicial competente aferir se ficou demonstrada a efetiva disponibilização do conteúdo no momento em que acessada a página da internet”:

Art. 17. A petição inicial da representação relativa à propaganda irregular será instruída, sob pena de não conhecimento:

I - com prova da autoria ou do prévio conhecimento do beneficiário, caso não seja alegada a presunção indicada no parágrafo único do art. 40-B da Lei nº 9.504/1997;

II - naquelas relativas à propaganda irregular no rádio e na televisão, com a informação de dia e horário em que foi exibida e com a respectiva transcrição da propaganda ou trecho impugnado; e

III - no caso de manifestação em ambiente de internet, com a identificação do endereço da postagem (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN) e a prova de que a pessoa indicada para figurar como representado é o seu autor.

§ 1º Desconhecida a autoria da propaganda, a petição inicial poderá ser endereçada genericamente contra o responsável, desde que requerida liminarmente diligência para a identificação deste e fornecidos os elementos indispensáveis para a obtenção dos dados, sob pena de indeferimento da petição inicial.

§ 2º A comprovação da postagem referida no inciso III deste artigo pode ser feita por qualquer meio de prova admitido em Direito, não se limitando à ata notarial, cabendo ao órgão judicial competente aferir se ficou demonstrada a efetiva disponibilização do conteúdo no momento em que acessada a página da internet.

Cópia do referido vídeo foi juntada à exordial e não houve qualquer impugnação acerca da existência da publicação, de sua autoria ou sobre sua identificação. Anoto, ainda, que o juízo a quo determinou a remoção da publicação liminarmente (ID 6818833).

Pois bem.

Objetivando garantir a isonomia entre os candidatos, a normatização de regência proíbe a veiculação de propaganda eleitoral até o 26 de setembro do corrente ano, conforme dispõe o inc. IV do art. 1º da Emenda Constitucional n. 107, de 02 de julho de 2020:

Art. 1º As eleições municipais previstas para outubro de 2020 realizar-se-ão no dia 15 de novembro, em primeiro turno, e no dia 29 de novembro de 2020, em segundo turno, onde houver, observado o disposto no § 4º deste artigo.

§ 1º Ficam estabelecidas, para as eleições de que trata o caput deste artigo, as seguintes datas:

[..]

IV - após 26 de setembro, para o início da propaganda eleitoral, inclusive na internet, conforme disposto nos arts. 36 e 57-A da Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997, e no caput do art. 240 da Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965;

[..] (Grifei.)

Por conseguinte, o art. 3º da Resolução TSE n. 23.610/19, que regulamenta a propaganda eleitoral para as eleições de 2020, reproduzindo o teor do art. 36-A da Lei n. 9.504/97, possibilita que os pretensos candidatos desenvolvam ações que, embora ocorram antes do aludido prazo, não configuram propaganda antecipada.

Assim, é possível que haja menção à pretensa candidatura, a exaltação de qualidades pessoais dos pré-candidatos, o pedido de apoio político, a divulgação das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver, desde que não haja pedido explícito de voto:

Art. 3º Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, caput, I a VII e §§):

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates na rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, da discussão de políticas públicas, dos planos de governo ou das alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades serem divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;

III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos;

IV - a divulgação de atos de parlamentares e de debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;

V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive em redes sociais, blogs, sítios eletrônicos pessoais e aplicativos (apps);

VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido político, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias;

VII - campanha de arrecadação prévia de recursos na modalidade prevista no inciso IV do § 4º do art. 23 da Lei nº 9.504/1997.

§ 1º É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias, sem prejuízo da cobertura dos meios de comunicação social (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, § 1º).

§ 2º Nas hipóteses dos incisos I a VII do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver, observado o disposto no § 4º deste artigo (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, § 2º).

§ 3º O disposto no § 2º deste artigo não se aplica aos profissionais de comunicação social no exercício da profissão (Lei nº 9.504/1997, art. 36-A, § 3º).

§ 4º A campanha a que se refere o inciso VII deste artigo poderá ocorrer a partir de 15 de maio do ano da eleição, observadas a vedação a pedido de voto e as regras relativas à propaganda eleitoral na internet (Lei nº 9.504/1997, art. 22-A, § 3º; vide Consulta TSE nº 0600233-12.2018). (Grifei.)

Recentemente, esta Corte se debruçou sobre a questão da configuração de propaganda eleitoral na pré-campanha, tendo em conta as substanciais alterações trazidas pela edição da Lei n. 13.165/15, em especial a possibilidade de menção à pretensa candidatura e de exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, restringindo-se apenas o pedido explícito de voto, no contexto de concessão de maior liberdade durante a pré-campanha em razão da dramática redução do período efetivo de campanha eleitoral.

Naquela ocasião, ficou consignado, na ementa do precedente, que “a exposição de ideias em redes sociais e todo e qualquer meio que viabilize a difusão de informações, além de ir ao encontro da norma jurídica, contribui para a informação do eleitor, permitindo a igualdade de oportunidades e atendendo ao direito de liberdade de expressão” (Recurso Eleitoral n. 0600013-29.2020.6.21.0042, Relator DES. FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, julgamento em 08.9.2020).

Apoiado nesse parâmetro, tenho que deve ser dado provimento ao recurso.

A fim de analisar a manifestação que deu origem à representação eleitoral, valho-me da transcrição do conteúdo do vídeo realizada pela Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer:

Com efeito, o vídeo, com fala do pré-candidato em um tempo total de 4min50seg, possui o seguinte conteúdo (ID 6818733):

Bom dia amigos, das redes sociais. Eu quero aqui (…) convidar vocês, compartilhar deste momento. De um decisão que eu tomei juntamente com minha família, de participar do pleito eleitoral de 2020. Trago comigo a esperança e o entusiasmo, de ver as coisas acontecer no nosso município, na nossa querida Bossoroca. E imagino que a nossa comunidade tem potencial, logística, história, turismo, cultura, que tem que ser preservada e explorada. Trago o meu nome à disposição da comunidade, e venho pedir um voto de confiança a você, caro eleitor, que acredita que as coisas podem acontecer. Eu venho de Espumoso, minha cidade, terra natal. Vim pra Bossoroca, constituí família, maravilhosa. Quero que os meus filhos tenham orgulho dessa terra, que fiquem aqui em Bossoroca. Que essa terra, como muito promissora, solo fértil, logística, se desenvolva. E, no futuro, eles tenham orgulho de morar na nossa terra. Quero contribuir com o que eu puder para o desenvolvimento dessa cidade, para que um dia a gente tenha orgulho de ter somado para colocar um tijolinho no crescimento do município. Eu não tenho adversário político. Eu procuro companheiros pra aquilo que for certo, que traga o desenvolvimento para o nosso município. Talvez o momento da política está se renovando, aonde novas esperanças estão surgindo. Temos que combater a corrupção e a maneira de ajeitar. Temos que olhar para os trabalho social, respeitando as entidades, respeitando quem produz, e principalmente o trabalhador. Quero aqui deixar meu nome a pré-candidato a vereador de Bossoroca. Espero não desapontar ninguém se caso receber esse voto de confiança. Com certeza eu vou trabalhar para buscar o que for de melhor pra Bossoroca, para nossas família, pra nossa comunidade. Tenho certeza disso. Não estou colocando o meu nome à disposição somente para um gancho de emprego, um salário ou até mesmo diárias, que sou contra. Quero botar o meu nome à disposição pra me doar naquilo que for possível para o desenvolvimento. E conto com o apoio de todos. Muito obrigado.

Como se percebe, a manifestação do recorrente ocorreu dentro de um contexto de apresentação pessoal e de exteriorização de suas propostas. Como apontado pelo Parquet eleitoral, nota-se que a declaração foi feita de forma improvisada, enquanto dirigia veículo, que não houve edição do vídeo e que não é o pedido de votos que se sobressai da fala.

Da mesma forma, é perceptível o conteúdo inexpressivo do pedido de voto de confiança, considerando a totalidade da duração do vídeo.

Ademais, sobressai que a manifestação do recorrente não foi engendrada de forma a caracterizar ilegalidade, como bem assinala o Parquet em seu parecer (ID 6903233):

Não houve qualquer produção, sendo um vídeo totalmente “caseiro”. Dos 290 segundos de vídeo, a referência à expressão “voto de confiança” corresponde a, somando os dois momentos em que feita, no máximo 10 segundos, ou seja, 3,44% do tempo do ato de pré-campanha, importando em conteúdo inexpressivo diante da íntegra das declarações.

Nessa via, os trechos reputados como ilegais tem um impacto muito menor sobre a formação da vontade do eleitorado do que a divulgação da pré-candidatura e a exaltação das qualidades pessoais, manifestações estas permitidas pela legislação e que representam 96,66% do conteúdo da declaração do representado.

Assim, entendemos que não houve por parte do representado a intenção de burlar o dispositivo legal, mas tão somente de realizar um ato de pré-campanha dentro dos moldes permitidos pela legislação.

Outrossim, também não se constata uma eventual violação ao princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos, visto que, em tese,está ao alcance de qualquer candidato médio a postagem de textos ou vídeos na rede social Facebook divulgando sua pré-candidatura, exprimindo opiniões e projetos políticos e pedindo apoio político. Ademais, não se está falando de meios de propagada de alto custo, tampouco de divulgação pela internet mediante a utilização de robôs ou pagamento de impulsionamento. Trata-se apenas de publicação de vídeo postado diretamente pelo representado na sua conta no Facebook.

Com amparo nesses fundamentos, o recurso deve ser provido para julgar improcedente a representação, pois não caracterizada o ocorrência de propaganda eleitoral extemporânea.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO por dar provimento ao recurso para julgar improcedente a representação.

É como voto, Senhor Presidente.