PC - 0602842-80.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 30/09/2020 às 14:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

Conheço dos embargos, porque tempestivos.

Mérito

No mérito, não há razões para o acolhimento dos aclaratórios.

Trata-se de embargos de declaração em face de decisão que rejeitou os primeiros aclaratórios, o que impõe, pela própria natureza da irresignação, que o limite de conhecimento da matéria a ser aqui enfrentada fique adstrito àquele constante na decisão que deu azo à oposição.

Sob esse prisma, não há como reconhecer a suposta contradição na decisão embargada, porque as teses veiculadas no recurso constante do ID 6339133 dizem respeito à instrução probatória do processo de prestação de contas do ora embargante em comparação à instrução probatória de outro candidato, o que teria levado à alegada diferenciação no julgamento pela Corte, embora os fatos fossem alegadamente os mesmos.

Para tanto, o embargante sustenta que o candidato Miguel Soldatelli Rossetto foi beneficiado pelo fato de não ter cumprido a obrigação normativa de entrega da mídia, enquanto ele (Gaudêncio), embora tenha entregue a retificadora no prazo, teve negado seu pedido de abertura de prazo para diligência.

Transcrevo excerto das razões que delineiam o pedido constante nos aclaratórios:

Segundo o trecho do voto acima exposto a diferença entre os dois casos é que o candidato Miguel Soldatelli Rossetto, ao entregar a retificadora não entregou a mídia respectiva. A prevalecer o referido entendimento o candidato Miguel Rossetto foi beneficiado pelo fato de não ter cumprido a obrigação de entregar ao TRE o pendrive com as mídias. O ora embargante, que de igual forma entregou a prestação e a retificadora no prazo, não teria o direito ao mesmo tratamento concedido a Rossetto pelo fato de ter entregue a mídia. Ou seja, há uma punição ao candidato pelo fato de a sua equipe jurídica ter acompanhado a tramitação do processo. Caso o advogado ora signatário tivesse atuado com desleixo, sem cobrar o contador da obrigatoriedade da entrega das mídias, seria contemplado com o benefício de um segundo parecer conclusivo. (Grifo original)

Segundo o embargante, sua contabilidade foi prejudicada, tendo ele sofrido punição pelo regular acompanhamento da tramitação do processo por seu advogado.

Não foi esse o ocorrido.

O candidato Rossetto apresentou a prestação de contas retificadora dentro do prazo, porém sem a mídia respectiva. E, na primeira oportunidade de manifestação, o estado de saúde do contador foi levado ao conhecimento do relator daquele processo.

Em outro vértice, caracteriza-se a situação do candidato Gaudêncio, na qual o pedido de diligências baseou-se em documentos apresentados a destempo, quando o processo já se encontrava pautado para julgamento, momento em que o problema de saúde do contador foi trazido ao conhecimento do juízo, embora tenha tido oportunidades anteriores de manifestação nos autos.

Assim, na hipótese dos autos, é manifesto o inconformismo do embargante com a decisão que lhe foi desfavorável.

Com efeito, no aresto ora atacado, a decisão de não recepcionar a documentação trazida a destempo foi sobejamente fundamentada, conforme se verifica no trecho abaixo destacado, in verbis:

Por fim, com a finalidade de prequestionamento, o embargante assevera a violação ao art. 926 do Código de Processo Civil e ao princípio da isonomia, por ter sido conferido tratamento diferenciado às contas do candidato Gaudêncio Cardoso Fidelis em comparação ao precedente relacionado à contabilidade do candidato Miguel Soldatelli Rossetto, no qual foi deferida a remessa dos autos ao órgão técnico para segundo parecer conclusivo.

Argumenta tratar-se da mesma situação, motivo pelo qual as contas do embargante deveriam respeitar igual procedimento, a favor da uniformização da jurisprudência desta Casa.

(…)

Infere-se do texto da norma a preocupação do legislador em prestigiar os princípios da segurança jurídica e da isonomia, que possuem envergadura constitucional.

O foco da cautela retratada no referido dispositivo é a integridade da jurisprudência, mediante a coerência e a estabilidade das decisões judiciais tomadas pelos tribunais nos julgamentos dos processos a eles submetidos.

A intenção, com isso, traduz-se em dar importância aos entendimentos dominantes de um tribunal.

Nesse contexto, sobressaem os precedentes, ou seja, a compreensão aplicada na decisão judicial de um caso concreto é, também, fixada em casos posteriores, desde que os fatos e o conteúdo jurídico assim autorizem.

Com suporte nisso, o embargante entende que o processo n. 0602572-56, referente aos autos da prestação de contas do candidato ao cargo de governador, Miguel Soldatelli Rossetto, julgado em 09.3.2019, da relatoria do Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, seria um precedente a servir de referência ao julgamento dos presentes autos.

Verifica-se, entretanto, que as circunstâncias fáticas e processuais que envolveram as contas do candidato Rossetto são bem diferentes das particularidades da atual contabilidade.

Trago uma passagem do despacho exarado naqueles autos, a fim de destacar a desigualdade pontual entre os dois casos (ID 3899883):

No caso dos autos, em 2.5.2019 os prestadores foram intimados a retificar as contas e juntar diversos documentos fiscais, apontando-se expressamente a necessidade de registro no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral (SPCE-Cadastro) junto dos documentos probantes, de transmissão dos dados pela internet, e de entrega da mídia eletrônica com a documentação no protocolo do Tribunal (ID 2392433).

Todavia, o parecer conclusivo refere que o procedimento não foi observado porque não houve entrega da mídia com os documentos vinculados às contas no protocolo do TRE-RS, circunstância que impossibilitou o exame técnico da prestação de contas retificadora.

Essa diligência foi cumprida somente em 14.8.2019, por meio dos IDs 3892383, 3892433, 3892483, mesma data em que foi apresentado o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral pela desaprovação das contas e recolhimento de R$ 2.989.474,04 (dois milhões, novecentos e oitenta e nove mil, quatrocentos e setenta e quatro reais e quatro centavos) ao Tesouro Nacional (ID 3897283).

Dessa forma, determino a intimação dos prestadores para que, no prazo improrrogável de 24 (vinte e quatro) horas, justifiquem a demora no cumprimento da diligência solicitada no exame preliminar, e comprovem a juntada da nota explicativa exigida pelo art. 74, § 2º, da Res. TSE n. 23.553/2017 para a hipótese de retificação das contas.

(Grifo nosso)

Observa-se que, nas contas do candidato Rossetto, o laudo de exame (ID 2392433) apontou a necessidade de apresentação da retificadora na forma do art. 74 da Resolução TSE n. 23.553/17, com o registro dos arquivos de documentos digitalizados referentes às despesas declaradas na contabilidade.

Na sequência, o parecer conclusivo (ID 3707733) ressalva que, embora os candidatos (governador e vice) tenham juntado a peça no SPCE, deixaram de cumprir o procedimento de entrega da mídia com os documentos vinculados a cada registro realizado no sistema no protocolo deste Tribunal. Em razão disso, a unidade técnica ficou impossibilitada de proceder ao exame das eventuais informações prestadas na retificadora solicitada, bem como dos documentos comprobatórios das despesas eventualmente presentes na referida prestação de contas retificadora. Desse modo, permaneceram as falhas anteriormente destacadas.

Em seguida, quando intimados do parecer conclusivo, veio aos autos, além de inúmeras justificativas, a informação sobre o estado de saúde do contador.

Importante salientar: o candidato Rossetto enviou a prestação de contas retificadora dentro do prazo, mas sem a mídia respectiva. Com base nisso e nos esclarecimentos apresentados, o Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes entendeu plausível deferir o pedido de diligência e enviar os autos novamente para SCI (ID 3974683).

Diferentemente, no cenário aqui exposto, o parecer conclusivo foi emitido a partir da retificadora, mediante a análise dos documentos nela constantes, tendo sido constatada a redução das falhas.

E, após a emissão do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, o candidato Gaudêncio trouxe nova retificadora.

Percebe-se, assim, que o pedido de diligências do embargante baseia-se em documentos apresentados a destempo, quando o processo já estava em pauta de julgamento, e exigiriam exame técnico de alta complexidade, dado o volume de informações adicionais e a quantidade de registros. Foi também nessa fase processual que, nestes autos, se tomou conhecimento do estado de saúde do contador, embora o prestador já tivesse sido intimado para manifestar-se sobre as irregularidades, sendo que se utilizou da oportunidade para solicitar dilação de prazo, sem, no entanto, prestar esclarecimento quanto ao impedimento do profissional de contabilidade ou quanto às retificações das falhas apontadas no exame técnico.

Repito, por salutar à compreensão da diferença entre os dois contextos, nas contas do candidato Rossetto a retificadora foi apresentada dentro do prazo, o primeiro parecer conclusivo não considerou a documentação em virtude da falta de entrega da mídia, e o conhecimento sobre o estado de saúde do profissional de contabilidade veio após a emissão do referido parecer. Motivos que autorizaram o deferimento do pedido de nova diligência.

Nas contas do ora embargante, o parecer conclusivo foi fundamentado na retificadora apresentada, e o deferimento do pedido de realização de nova diligência implicaria a análise de volume expressivo de documentos acrescentados de modo intempestivo.

Desse ponto de vista deu-se a fundamentação exposta no corpo do acórdão atacado, o que reflete mais uma vez a intenção do embargante de rediscussão da causa, camuflando a investida de reanálise do mérito no debate de pontos supostamente contraditórios, obscuros ou carentes de prequestionamento.

Da mesma forma, inexiste a alegada contradição relativa à “posição do tribunal no julgamento ocorrido em 03/12/2019, quando ao julgar a preliminar arguida não sustentou a existência de diferença entre o presente processo e o processo n. 0602572-56.2018.6.21.0000, e a posição assumida no julgamento ocorrido em 07/07/2020, quando expôs a existência de diferença entre os dois processos.”

Com efeito, a contradição autorizadora de embargos declaratórios, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça seria aquela “interna, verificada entre os elementos que compõem a estrutura da decisão judicial, e não entre a solução alcançada e a solução que almejava o jurisdicionado” (REsp 1.250.367/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe de 22/8/2013, citado nos EDcl no AgRg no REsp 1427222/PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 02/08/2017).

Por essas razões, e considerando o contexto específico dos autos, entendo que não restaram configuradas as hipóteses de cabimento dos aclaratórios (art. 275 do Código Eleitoral), devendo o acórdão impugnado ser mantido nos seus exatos termos.

Assim sendo, evidenciado o mero inconformismo com a decisão que desaprovou as contas, deve ser mantido hígido o acórdão embargado.

Eventual insurgência deverá ser apreciada pela superior instância, por intermédio do recurso cabível, de forma que fica desde já advertido o prestador de contas que a oposição de novo recurso de mesma natureza poderá ser considerada como de natureza protelatória, nos termos do art. 80, inc. VII, do Código de Processo Civil.

Diante do exposto, VOTO por rejeitar os embargos.