E.Dcl. - 7385 - Sessão: 30/09/2020 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração opostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, com pedido de atribuição de efeitos infringentes, contra o acórdão que, à unanimidade, negou provimento ao recurso eleitoral. (fls. 223-226)

O Ministério Público Eleitoral (fls. 223-237) sustenta a existência de omissão quanto à aplicação da penalidade de suspensão das quotas do Fundo Partidário por um ano, conforme previsto nos arts. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95 e 47, inc. II, da Resolução TSE n. 23.464/15, visto que reconhecido o recebimento de recursos de origem não identificada. Requer o acolhimento dos embargos para sanar as omissões apontadas, com a concessão de efeitos modificativos para determinar a suspensão do repasse de recursos do Fundo Partidário até que a agremiação recolha ao Tesouro Nacional a importância irregularmente recebida, observado o período mínimo de 10 (dez) meses, considerando que a irregularidade corresponde a 83,91% da receita financeira do partido.

É o relatório.


 

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

Os embargos de declaração constituem recurso cabível tão somente para sanar os defeitos do ato judicial, taxativamente indicados no art. 1.022 do Código de Processo Civil, ou seja, obscuridade, contradição, omissão ou erro material.

Daniel Amorim Assumpção Neves, citando lição de Barbosa Moreira, ensina que

esses vícios compõem de maneira distinta tanto o juízo de admissibilidade como o de mérito, sendo no primeiro caso demandado do julgador uma análise em abstrato do vício, enquanto no segundo caso a análise deverá ser feita em concreto. Significa dizer que a mera alegação do embargante sobre a existência de um dos vícios descritos pela lei já é suficiente para o seu cabimento, sendo a análise da existência concreta de tal vício matéria de mérito. Alegado o vício, o recurso é admissível; existente o vício alegado, o recurso é provido; caso contrário, nega-se provimento ao recurso.

(NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil -Volume único. 9. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 1702.)

 

Tendo em conta essa lição, anoto que o embargante menciona, no decorrer de suas razões, a ocorrência de omissões e contradições, o que autoriza que a interposição seja considerada adequada, tempestiva e comporte conhecimento. No presente caso, todavia, não se evidencia na decisão embargada a existência de qualquer das hipóteses acima mencionadas.

Ao contrário do que sustenta o embargante, o acórdão foi claro nas razões pelas quais excluiu a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário. Observe-se o trecho do acórdão embargado (fls. 225-226):

No tocante à sanção cabível, o art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95 estabelece que “no caso de recursos de origem não mencionada ou esclarecida, fica suspenso o recebimento das quotas do Fundo Partidário até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral”.

Contudo, tal dispositivo recebeu interpretação restritiva desta Corte, a qual entende que há suspensão do fundo enquanto não esclarecida a origem dos valores ou até o julgamento das contas. Isso porque, em uma interpretação sistemática, as possibilidades de esclarecimento estão naturalmente adstritas ao procedimento judicial, encerrando-se com o julgamento e trânsito da decisão de julgamento das contas, e também para evitar o sancionamento perpétuo do partido, alinhando-se ao entendimento do TSE.

(…)

Dessa forma, tratando-se de contas relativas ao exercício financeiro de 2016, além do recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação, a sanção aplicável está adstrita àquela prevista no art. 37, caput, da Lei n. 9.504/97, qual seja, a multa de até 20% sobre a importância considerada irregular.

 

Se, durante a tramitação processual, o partido político recolher o valor dos recursos de origem não identificada ao Tesouro Nacional ou esclarecer sua origem, em qualquer um dos casos, está sanada a irregularidade e não haverá motivo para a manutenção da suspensão.

Uma vez transitada em julgado a prestação de contas, a agremiação não terá mais a oportunidade de esclarecimento da origem dos recursos recebidos. Exatamente por isso, não se justifica a permanência da suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário. O que restará é a obrigação de pagar, advinda da condenação de devolução dos valores ao Tesouro Nacional, o que será objeto de cumprimento de sentença.

A matéria em questão resta pacificada por este Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. AFASTAMENTO, DE OFÍCIO, DA PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO REPASSE DE NOVAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DESPROVIMENTO. 

1. Afastada preliminar de nulidade da sentença devido à suposta deficiência do exame técnico e falta de análise dos documentos juntados pela grei. Documentação devidamente considerada por esta Corte, sem alterações quanto à garantia da ampla defesa, ao procedimento técnico de exame e à fundamentação da sentença recorrida.

2. Recebimento de recursos sem a identificação do CPF dos doadores, em dissonância com o art. 13 da Resolução TSE n. 23.464/15. Insuficiência dos documentos declinando nomes e números de contas bancárias dos contribuintes para suprir a falta de indicação de suas inscrições no CPF. 

3. Falha que representa 85,08 % do montante auferido pelo partido no exercício financeiro em análise. Manutenção do recolhimento ao erário e da aplicação de multa. Afastada a penalidade de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário imposta de modo a persistirem seus efeitos até que os esclarecimentos sobre a origem dos recursos sejam aceitos pela Justiça Eleitoral. Proposta a discussão do tema para as prestações de contas do exercício financeiro de 2019, a fim de conferir efetividade e compatibilidade entre as sanções de suspensão de recebimento de quotas do Fundo Partidário e de recolhimento dos recursos ao Tesouro Nacional, estabelecidas no inc. I do art. 36 e no § 3º do art. 37 da Lei n. 9.096/1995, respectivamente. 

4. Desprovimento.

(RE n. 8-98, Rel. Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julg. em 09.03.2020.)

 

Dessa forma, cogitar manter a suspensão para além do trânsito em julgado, no caso de recebimento de recursos de origem não identificada (arts. 36, I e II, da Lei n. 9.096/95 e 47, II, da Resolução TSE n. 23.464/15), afigura-se medida atípica, o que não se justifica na presente situação em que há meio típico eficiente para o cumprimento da decisão.

 

DIANTE DO EXPOSTO, VOTO pelo conhecimento e REJEIÇÃO dos embargos de declaração opostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL.

É como voto, Senhor Presidente.