PC - 0600270-54.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 21/09/2020 às 14:00

VOTO

Do parecer conclusivo (ID 5382033), extrai-se que a receita financeira arrecadada pela agremiação foi de R$ 514.936,92, oriunda de Outros Recursos. O partido não recebeu repasses do Fundo Partidário no exercício de 2017.

Após os procedimentos de exame da movimentação contábil partidária e análise dos argumentos e documentos apresentados, o órgão técnico constatou uma única irregularidade, consistente no recebimento de recurso de fonte vedada, nos seguintes termos, in verbis:

2) Conforme item “2” do Exame da Prestação de Contas (ID 4649383), constatou-se a existência de contribuinte intitulado autoridade, o qual se enquadra na vedação prevista no inciso IV do art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/20153. Utilizado, para tanto, banco de informações gerado a partir de ofícios encaminhados a órgãos públicos, nos quais requerida a lista de pessoas físicas que exerceram cargos de chefia e direção na administração pública no período de 01-01-2017 a 31-12-2017. Essa informação foi interligada, via sistema, com as contribuições de Pessoas Físicas declaradas pelo partido.

Em que pese a manifestação da agremiação, apresentando argumentos jurídicos, através do ID 5246833, item 2, a Lei n 13.488/175 entrou em vigor no dia 06.10.2017, revogando a vedação das doações advindas de autoridades públicas para aquelas filiadas a partido político, posterior a essa data, mantendo a vedação de contribuições efetuadas em data anterior a publicação da mesma lei. Nesse sentido, esta unidade técnica observou a ocorrência de doação/contribuição oriunda de fonte vedada no exercício de 2017, para a agremiação em exame, no valor de R$ 42.287,60, conforme demonstrado na tabela a seguir:

 

Em seguida, a unidade técnica dispôs, em planilha detalhada (ID 5382033), todas as doações advindas de fonte vedada, realizadas por 23 (vinte e três) doadores detentores de cargos de chefia ou direção. O valor total das doações alcançou a cifra de R$ 42.278,60.

O dispositivo legal aplicável é o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, antes da alteração promovida pela Lei n. 13.488/17. Ou seja, a doação de autoridade pública, com ou sem filiação, até a entrada em vigor da citada lei (06.10.2017), constituía fonte vedada.

Dessa forma, quanto à irregularidade, as contribuições anteriores a 06.10.2017 são regidas pelo disposto no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, e as posteriores àquela data, pelo inc. V do mesmo art., com a redação dada pela Lei n. 13.488/17:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…]

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

V – pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário,ressalvados os filiados a partido político.

 

Ressalto que a unidade técnica, em parecer conclusivo, considerou irregulares apenas as doações de filiados realizadas antes da vigência da alteração do art. 31 da Lei dos Partidos Políticos.

Vale dizer que, mesmo na redação anterior, o referido dispositivo legal restou interpretado pela Resolução TSE n. 22.585/07, que pacificou o conceito de “autoridade” no sentido de abranger os detentores de cargos de chefia ou direção demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, Estados e Municípios.

Posteriormente, a Resolução TSE n. 23.464/15 não deixou dúvidas de que os exercentes de cargos de chefia e direção se enquadram no conceito de autoridade pública para fins da vedação prevista no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, com a redação vigente à época dos fatos, conforme art. 12, inc. IV, da mencionada resolução:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…]

IV – autoridades públicas;

§ 1º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso IV do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

 

Assim, no exercício de 2017, até 06.10.2017, não havia dúvida a respeito de quem era considerado autoridade pública para fins da vedação legal.

Importante salientar que a racionalidade da norma, como bem ressaltou o Ministro Cezar Peluso ao proferir o voto condutor do acórdão na Resolução TSE n. 22.585/07, está em “desestimular a nomeação, para postos de autoridade, de pessoas que tenham tais ligações com partido político e que dele sejam contribuintes”.

Logo, a vedação imposta pela referida resolução do TSE tinha a função de evitar a partidarização da administração pública, especialmente diante dos princípios da moralidade, da dignidade do servidor e da necessidade de preservação contra abuso de autoridade e do poder econômico.

Configurado o recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas no valor total de R$ 42.278,60, a agremiação deverá efetuar o recolhimento da importância ao Tesouro Nacional.

Igualmente, não há se falar em aplicação retroativa das disposições previstas pela Lei n. 13.488/17, diante do entendimento sufragado pela Corte de que as prestações de contas são regidas pela lei vigente à época dos fatos – tempus regit actum –, além da obrigatoriedade de despender-se tratamento isonômico aos partidos políticos, sem alterar as regras aplicáveis a exercícios financeiros já encerrados, em razão do princípio da isonomia e da segurança jurídica – art. 926 do CPC/15.

Nesse sentido, inclusive já se posicionou reiteradas vezes este TRE-RS:

AGRAVO REGIMENTAL. DIRETÓRIO ESTADUAL DE PARTIDO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXECUÇÕES. INVIÁVEL O PARCELAMENTO MEDIANTE DESCONTOS DOS REPASSES DO FUNDO PARTIDÁRIO. POSSIBILIDADE COM RECURSOS PRÓPRIOS. ART. 44 DA LEI 9.096/95. RESOLUÇÃO TSE N. 21.841/04. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2012.

1. As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15 ao art. 37 da Lei 9.096/95 não se aplicam às prestações de contas partidárias de exercícios anteriores. A nova redação dada retirou a suspensão de quotas do Fundo Partidário e estabeleceu exclusivamente a imposição de multa de até 20% sobre o valor a ser recolhido. Tratando-se de prestação de contas do exercício financeiro de 2012, devem ser observadas as normas de direito material previstas na Resolução TSE n. 21.841/04.

2. Irretroatividade da Lei n. 13.488/17, in casu, por ser processo de exercício anterior a sua vigência. Obediência aos princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica.

3. Agremiação condenada a recolher valores ao Fundo Partidário e ao Tesouro Nacional. Possibilidade de parcelamento. Vedado o uso de recursos do Fundo Partidário na medida em que o art. 44 da lei9.096/95 prevê hipóteses taxativas de sua aplicação

.4. Negado provimento.

(TRE-RS, PC n. 6380, Acórdão de 31.01.2018, Relator DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS.)

 

Entretanto, o valor da irregularidade representa 8,21% do total de recursos recebidos, autorizando a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para permitir o juízo de aprovação das contas com ressalvas, circunstância que não se compatibiliza com o sancionamento de multa de 20% e a imposição de suspensão do Fundo Partidário:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS ORIUNDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES PÚBLICAS. IRRETROATIVIDADE DAS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 13.488/17. MANTIDO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADAS A SANÇÃO DE MULTA E A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Desaprovação das contas da agremiação em razão do recebimento de recursos de fonte vedada, oriundos de contribuições de ocupantes de cargos de chefia demissíveis ad nutum. Escorreita a aplicação, pelo juízo a quo, da legislação vigente à época do exercício financeiro a que se refere a prestação de  contas, alinhando-se ao entendimento consolidado por esta Corte e na esteira da jurisprudência do TSE.

2. Irrelevante o argumento de o cargo ocupado por autoridade ser em governo administrado por integrante de partido adversário. Recebida a doação de servidor que se enquadre na categoria de autoridade pública, nos termos da Resolução TSE n. 23.464/2015, aplicável ao exercício em análise, incide o caráter objetivo da norma, sem espaço para eventual análise subjetiva.

3. Valores irregularmente recebidos que representam 2,83% do total de recursos arrecadados pela agremiação no exercício financeiro. Aplicados princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Mantido o recolhimento ao Tesouro Nacional. Afastadas a sanção de multa sobre a quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional e a penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário.

4. Parcial provimento.

(Recurso Eleitoral n 5482, ACÓRDÃO de 11.4.2019, Relatora: Desa. MARILENE BONZANINI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data: 22.4.2019.) (Grifo nosso)

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela aprovação com ressalvas da prestação de contas do exercício financeiro de 2017 do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) e determino o recolhimento do valor de R$ 42.287,60 ao Tesouro Nacional.