Cta - 0600298-51.2020.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/08/2020 às 10:30

VOTO

Das Preliminares

A lei estabelece requisitos subjetivos e objetivos para o conhecimento da consulta, nos termos do art. 30, inc. VIII, do Código Eleitoral, devendo o questionamento versar sobre matéria eleitoral, bem como ser formulado em tese e por autoridade pública ou partido político, verbis:

Art. 30. Compete, ainda, privativamente, aos Tribunais Regionais:
(...)
VIII – responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou partido político.

No tocante ao requisito subjetivo, verifica-se que restou atendido, uma vez que a consulta foi formulada por diretório estadual de partido político, que detém legitimidade para atuar perante esta Corte (CTA 14776, Rel. Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, DEJERS de 12.9.2016, e CTA 7526, Rel. Des. Eleitoral Hamilton Langaro Dipp, DEJERS de 19.6.2015).

As demais exigências de admissibilidade foram, igualmente, observadas, pois a indagação contempla a hipótese de fixação da sede partidária regional fora da capital do Estado em que situado o diretório, temática que envolve os requisitos para a criação e anotação do órgão estadual junto ao Tribunal Regional, cuja disciplina consta na Lei n. 9.096/95 e na Resolução TSE n. 23.571/18. Portanto, a consulta trata de matéria eleitoral e foi elaborada em tese.

Outrossim, não incidem à hipótese vertente as vedações ao conhecimento de consultas constantes do parágrafo único do art. 92 do Regimento Interno deste Tribunal, porquanto ainda não se iniciou o período eleitoral, demarcado pela abertura das convenções partidárias, nem se trata de matéria já respondida por este Colegiado ou pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Ainda preliminarmente, o ilustre Procurador Regional Eleitoral entende que a consulta não deve ser conhecida, sob o seguinte fundamento:

(…) a definição da matéria tem de ser dada em caráter nacional, pois não nos parece adequado que, em cada Estado, pudesse haver um regramento distinto a respeito da necessidade ou não da localização da sede dos diretórios regionais na capital da Unidade da Federação. Nesse sentido, os partidos políticos têm caráter nacional, o mesmo se dando em relação às regras sobre sua organização e funcionamento.

Com a máxima vênia ao douto representante do Parquet Eleitoral, as normas atinentes aos partidos políticos, de fato, ostentam caráter nacional. Todavia, o mesmo ocorre com todas as demais matérias de competência desta Justiça Especializada, sempre disciplinada por atos legislativos emanados da União e com abrangência nacional.

Assim, a prosperar o raciocínio proposto, restariam completamente esvaziadas as possibilidades de consultas dirigidos aos Tribunais Regionais, resultando em negativa de vigência ao art. 30, inc. VIII, do Código Eleitoral, que estabelece tal competência específica.

Assim, atendidos os requisitos legais, conheço da consulta.

Do Mérito

No mérito, trilhando a senda do brilhante parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, entendo que os partidos políticos, em âmbito estadual, podem ter suas sedes localizadas em qualquer município da respectiva Unidade da Federação em que atuem.

Vejamos.

A redação original do art. 8º, § 1º, e do art. 15, inc. I, ambos da Lei n. 9.096/95, estabeleciam que o partido político de nível nacional deveria ter sua sede na Capital Federal, verbis:

Art. 8º O requerimento do registro de partido político, dirigido ao cartório competente do Registro Civil das Pessoas Jurídicas, da Capital Federal, deve ser subscrito pelos seus fundadores, em número nunca inferior a cento e um, com domicílio eleitoral em, no mínimo, um terço dos Estados, e será acompanhado de:
(…)
§ 1º O requerimento indicará o nome e função dos dirigentes provisórios e o endereço da sede do partido na Capital Federal.
(…)
Art. 15. O Estatuto do partido deve conter, entre outras, normas sobre:
I – nome, denominação abreviada e o estabelecimento da sede na Capital Federal;
(Grifei.)

A Lei n. 9.096/95 foi, então, regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral, inicialmente pela Resolução n. 19.406/95 e, posteriormente, pela n. 23.282/10, esta última revogando aquela. Ambos os diplomas regulamentares reproduziram em seus textos a obrigação legal de a sede do diretório nacional localizar-se na Capital Federal, contudo silenciaram quanto aos órgãos partidários estaduais.

Esse panorama modificou-se em 2015, com o advento da Resolução TSE n. 23.465, a qual, revogando a Resolução n. 23.282/10, passou a prescrever, em seu art. 41, § 2º, que a sede dos órgãos partidários estaduais deveria ser localizada na capital do respectivo Estado, em simetria com as normas endereçadas aos diretórios nacionais:

Art. 41. Os órgãos de direção regional e municipal devem manter atualizados perante a Justiça Eleitoral os seus dados de endereço, telefone, fac-símile e e-mail, bem como os de seus dirigentes.
(...)
§ 2º A sede estadual dos partidos políticos deve estar sempre localizada na capital do respectivo estado.

A Resolução TSE n. 23.465/15, por sua vez, foi substituída pela Resolução TSE n. 23.571/18, que se encontra atualmente vigente.

Esse último regulamento, novamente, reproduziu a exigência de instalação da sede partidária nacional na Capital Federal, conforme prescrito no art. 10, § 1º. Outrossim, em seu art. 41, § 2º, manteve a obrigatoriedade de a sede estadual das agremiações políticas localizar-se na capital do correspondente Estado.

Transcrevo as normas aludidas:

Art. 10. O requerimento do registro de partido político em formação, dirigido ao cartório competente do Registro Civil das Pessoas Jurídicas da capital federal, deve ser subscrito pelos seus fundadores, em número nunca inferior a 101 (cento e um), com domicílio eleitoral em, no mínimo, um 1/3 (um terço dos estados), e acompanhado de (Lei nº 9.096/1995, art. 8º, incisos I a III, §§ 1º e 2º):
(...).
§ 1º O requerimento deve indicar o nome e a função dos dirigentes provisórios e o endereço da sede nacional do partido político, que deverá ser sempre na capital federal (Res.-TSE nº 22.316/2006).

Art. 41. Os órgãos de direção estaduais e municipais devem manter atualizados perante a Justiça Eleitoral os seus dados de endereço, telefone, fac-símile e e-mail, bem como os de seus dirigentes.
(...)
§ 2º A sede estadual dos partidos políticos deve estar sempre localizada na capital do respectivo estado.

Todavia, sobreveio a Lei n. 13.877, de 27 de setembro de 2019, que, modificando os arts. 8º, § 1º, e 15, inc. I, da Lei n. 9.096/95, faculta aos partidos políticos organizarem a sede de seu diretório nacional em qualquer ponto da Federação. Eis a atual redação dos referidos dispositivos:

Art. 8º O requerimento do registro de partido político, dirigido ao cartório competente do Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede, deve ser subscrito pelos seus fundadores, em número nunca inferior a 101 (cento e um), com domicílio eleitoral em, no mínimo, 1/3 (um terço) dos Estados, e será acompanhado de:
(…)
§ 1º O requerimento indicará o nome e a função dos dirigentes provisórios e o endereço da sede do partido no território nacional.
(…)
Art. 15. O Estatuto do partido deve conter, entre outras, normas sobre:
I – nome, denominação abreviada e o estabelecimento da sede no território nacional;
(Grifei.)

Conforme elucida a doutrina de Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral. 7. ed. Juspodivm: 2020, p. 77), a alteração legislativa visou permitir a instalação descentralizada dos órgãos diretivos partidários:

Pela legislação anterior, o registro civil competente era exclusivamente o das Pessoas Jurídicas da Capital Federal. Contudo, agora, o requerimento do registro do partido político deve ser dirigido ao cartório competente do Registro Civil “do local da sua sede” (art. 8º, caput, da LPP, com a redação dada pela Lei nº 13.877/2019), ou seja, a aposta é na descentralização da sede nacional dos partidos políticos. No mesmo sentido, o §1º do art. 8º da LPP aduz que o requerimento indicará “o endereço da sede do partido no território nacional” (redação dada pela Lei nº 13.877/2019).

Diante da inteligência das disposições editadas pelo Congresso Nacional ampliando as possibilidades de funcionamento do diretório partidário nacional, entendo que os arts. 10, § 1º, e 41, § 2º, da Resolução TSE n. 23.571/18, porque não mais compatíveis com os preceitos legais atualmente vigentes, perderam seu fundamento de validade.

Em específico quanto ao objeto de questionamento, na atual quadra, em face de a legislação permitir que o diretório nacional da agremiação seja fixado em qualquer município do território nacional, por força do princípio da simetria, não subsiste razão para se manter a exigência ao órgão partidário estadual de que sua sede seja estabelecida na capital do Estado correspondente.

Assim, deve a consulta ser respondida afirmativamente, no sentido de ser facultada aos órgãos partidários regionais a instalação de sua sede em qualquer município do respectivo Estado.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo conhecimento da consulta e por respondê-la afirmativamente, no sentido de que, a partir da vigência da Lei n. 13.877/19, os órgãos partidários estaduais podem estabelecer sua sede em qualquer município dentro do território do respectivo Estado.