Pet - 0600543-96.2019.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/07/2020 às 14:00

VOTO

I. Preliminares

I.1. Do prazo e da legitimidade ativa

É incontroverso nos autos que Lindonês Kónig dos Santos sagrou-se eleito nas eleições municipais de 2016 pelo então Partido Progressista (PP), vindo a desfiliar-se em 06.6.2019, por meio de comunicação formal à agremiação (ID 3591483).

Por sua vez, Elizandro Pereira de Lima, eleito primeiro suplente ao cargo de vereador pela mesma agremiação em 2016 (ID 3590983, fl. 03), ajuizou a presente ação no dia 17.7.2019.

A Resolução TSE n. 22.610/07, diploma que disciplina o processo de perda de cargo eletivo por infidelidade partidária, no seu art. 1º, § 2º, preceitua que:

Art. 1º. (…).
§ 2º Quando o partido político não formular o pedido dentro de 30 (trinta) dias da desfiliação, pode fazê-lo, em nome próprio, nos 30 (trinta) subseqüentes, quem tenha interesse jurídico ou o Ministério Público Eleitoral.

Verifica-se, portanto, que a petição inicial foi oferecida dentro dos 30 dias subsequentes ao prazo que teria o Diretório do Progressistas para formular o pedido.

Além disso, o interesse jurídico do requerente está estampado em sua condição de suplente apto à sucessão imediata do vereador alegadamente infiel.

Assim, a ação é tempestiva e Elizandro Pereira de Lima detém legitimidade ativa e interesse jurídico para ajuizá-la.

I.2. Da desnecessidade de litisconsórcio passivo

A ação foi inicialmente proposta apenas contra o mandatário alegadamente infiel, sem observância do litisconsórcio passivo necessário com o partido político para o qual migrou, porque, naquele momento, a certidão extraída do sistema de filiação partidária do TSE apontou que o parlamentar não estava filiado a partido político (ID 3591033).

Diante disso, o requerente Elizandro Pereira de Lima postulou, na exordial, que eventual legenda partidária interessada no cargo eletivo fosse incluída como parte no feito, caso verificado o ingresso do requerido em nova agremiação no curso da tramitação (ID 3590933).

Por sua vez, em resposta à ação, o parlamentar noticiou sua filiação, em 20.5.2019, ao atual Republicanos, conforme ficha de filiação acostada (ID 4033883), pugnando, por tal razão, pela integração da legenda ao polo passivo da demanda.

Nessas circunstâncias, cabe ressaltar que as listas de filiação partidárias são submetidas pelos partidos à Justiça Eleitoral, anualmente, nos meses de abril e outubro (art. 19, Lei n. 9.096/95) e que a migração do requerido ocorreu em maio. Assim, a nova filiação apenas seria levada a registro junto ao TSE no mês de outubro vindouro.

Portanto, na época da propositura da demanda, o ingresso do requerido nos quadros do Republicanos não estava oficializado perante a Justiça Eleitoral, o que justifica o desconhecimento do fato pelo requerente.

Ocorre que, antes de cumprido o ato de citação do partido, o demandante informou que Lindonês Kónig dos Santos retirou-se dos quadros do Republicanos, estando, desde 11.01.2020, filiado ao Movimento Democrático Brasileiro – MDB de Terra de Areia, consoante faz prova a certidão acostada aos autos (ID 5906033).

Diante desse novo fato, flagrante a ilegitimidade passiva superveniente do  Republicanos para integrar a presente lide, uma vez que o mandato sob controvérsia é exercido por cidadão estranho aos seus quadros.

Em relação à nova filiação ao MDB de Terra de Areia, na forma anteriormente consignada em decisão monocrática (ID 5935033), o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral assentou entendimento de que, em ação de perda de cargo eletivo por infidelidade partidária, só há formação do litisconsórcio passivo necessário entre o candidato eleito e o partido ao qual se filiou, quando a nova filiação ocorrer dentro do prazo de 30 dias da desfiliação que deu causa à ação, conforme previsão do art. 1º, § 2º, da Resolução TSE n. 22.610/07.

Nessa linha, os seguintes julgados:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. PETIÇÃO. AÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO. DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. DEPUTADO FEDERAL ELEITO PELO PARTIDO REPUBLICANO PROGRESSISTA (PRP). MIGRAÇÃO PARA O PARTIDO DA MULHER BRASILEIRA (PMB). ALEGADA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO. PARTIDO REPUBLICANO (PR). INEXISTÊNCIA. APRECIAÇÃO MONOCRÁTICA. POSSIBILIDADE. LIMINAR CONCEDIDA NA ADI Nº 5.398/DF. VINCULAÇÃO DOS DEMAIS ÓRGÃOS DO PODER JUDICIÁRIO. DEVOLUÇÃO DO PRAZO DE 30 DIAS PARA FILIAÇÃO DOS MANDATÁRIOS AOS NOVOS PARTIDOS REGISTRADOS NO TSE, ATÉ A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.165/2015. (…). 4.  A controvérsia diz com a alegada ausência de justa causa à desfiliação do parlamentar do PRP, com a consequente filiação ao PMB, inexistindo substrato fático ou jurídico nos autos para que se questione a migração superveniente do agravado ao PR - ocorrida no transcurso do processo. 5. Desse modo, filiado o mandatário ao PMB à época da propositura da ação, contra quem pretende o autor ver reconhecida a infidelidade partidária, resta regularmente formalizada a relação processual, descabendo requerer o ingresso do PR no feito, atual legenda do parlamentar, por ser esta estranha à relação jurídica litigiosa (Pet nº 573-10/DF, Rel. Min. Henrique Neves, de 5.12.2016). (…).
(Petição n. 57492, Acórdão, Relatora Min. Rosa Weber, Publicação:  DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 163, Data 23.08.2017, Página 103/104.) (Grifei.)

ELEIÇÕES 2012. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CARGO. VEREADOR. AÇÃO PERDA DE CARGO ELETIVO POR DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DE PARTIDO POLÍTICO NA EXORDIAL. ACÓRDÃO REGIONAL QUE ASSENTOU A DECADÊNCIA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. AUSÊNCIA DE CERTEZA JURÍDICA ACERCA DA FILIAÇÃO A NOVO PARTIDO POLÍTICO NO MOMENTO DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO RECONHECIDA PELA JUSTIÇA ELEITORAL. SINGULARIDADE QUE AFASTA EVENTUAL DECADÊNCIA. RECURSO ESPECIAL AO QUAL SE DÁ PROVIMENTO. 1.
(...). 3. O litisconsorte passivo necessário reclama sua formação nos processos de perda de mandato eletivo por desfiliação partidária apenas e tão somente nas hipóteses em que o mandatário esteja filiado a novo partido político na data da propositura da ação, de sorte que descabe reconhecer a decadência do direito da ação pela ausência de indicação do litisconsorte sempre que a própria Justiça Eleitoral verificar que o parlamentar não se encontrava filiado a qualquer agremiação partidária. (…).
(Recurso Especial Eleitoral n. 23517, Acórdão, Relator Min. Luiz Fux, Publicação:  DJE - Diário de justiça eletrônico, Volume  , Tomo  175, Data 15.09.2015, Página 62/63.) (Grifei.)

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE PERDA DE MANDATO ELETIVO POR DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. FORMAÇÃO DO LITISCONSÓRCIO PASSIVO. PRAZO. CITAÇÃO. PARTIDO. INTERPRETAÇÃO. ART. 1, § 2º, E ART. 40 DA RESOLUÇÃO 22.61012007. PROVIMENTO.
1. Só há formação do litisconsórcio passivo necessário entre o candidato eleito e o partido ao qual se filiou se a filiação ocorrer dentro do prazo de trinta dias, previsto no art. 1º, § 2º, da Res.-TSE 22.610/2007.
2. Interpretação que afasta a possibilidade de o mandatário tido por infiel se beneficiar com nova filiação consumada somente após o prazo decadencial, afastando-se o controle da Justiça Eleitoral sobre a justa causa para a desfiliação partidária.
3. Recurso especial provido.
(TSE - REspe: 16887 SP, Relator: Min. FÁTIMA NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 11.09.2012, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 193, Data 05.10.2012, Página 15.) (Grifei.)

Com efeito, não é admissível que o parlamentar requerido possa, em tese, por meio de sucessivas migrações partidárias, obstar a estabilização subjetiva da demanda e, por consequência, postergar irrazoavelmente o termo do processo em que se pretende a perda de seu mandato.

Destarte, entendo que, no presente caso, despicienda a formação do litisconsórcio passivo necessário previsto no art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 22.610/07, sendo suficiente a citação do parlamentar requerido para a plena eficácia da decisão de mérito.

I.3. Do julgamento antecipado da lide

A carta de ordem para citação de Lindonês Kónig dos Santos, devidamente cumprida, foi acostada aos autos em 20.8.2019 (ID 3977783). Assim, o quinquídio para a resposta, estabelecido no art. 4º da Resolução TSE n. 22.610/07, alcançou seu termo em 26.8.2019 sem que o requerido tivesse apresentado qualquer manifestação.

Apenas em 28.8.2019, com os autos em vista ao Ministério Público Eleitoral, o parlamentar apresentou resposta, requerendo a expedição de ofício à Câmara de Vereadores de Terra de Areia para que fosse disponibilizado o áudio integral da sessão ordinária de 20.5.2019, bem como apresentando rol de testemunhas e protestando por todos os meios de prova em direito admitidos (ID 4033833).

Ocorre que, dada a celeridade exigida aos feitos eleitorais, em especial à ação por infidelidade partidária, cumpre à parte requerida pleitear as provas que pretende produzir, especificamente, no prazo para a defesa, inclusive com a apresentação de rol de testemunhas, nos termos do art. 5º da Resolução TSE n. 22.610/07, sob pena de preclusão.

Portanto, os requerimentos de prova extemporaneamente apresentados pela parte requerida não devem ser conhecidos, pois atingidos pela preclusão.

Nesse tocante, ratifico integralmente as razões deduzidas pelo eminente Des. Miguel Antônio da Silveira Ramos no despacho saneador prolatado na qualidade de Relator Substituto (ID 5935033):

Inicialmente, por aplicação mitigada dos efeitos da revelia, consigno que não conheço dos pedidos de prova contidos na resposta à ação apresentada pelo Vereador Lindonês Kónig dos Santos na petição do ID 4033833, pois é manifesta a intempestividade da peça.

O requerido foi citado em 6.8.2019, por oficial de justiça, constando do mandado a expressa advertência de que, em caso de não apresentação da defesa, seria decretada a sua revelia nos termos do parágrafo único do art. 4° da Resolução TSE n. 22.610/07.

A carta de ordem com o cumprimento do ato foi juntada ao feito em 20.8.2019 (ID 3977783), e o prazo defensivo de 5 dias transcorreu em 26.8.2019, às 23h59min.

Assim, é manifestamente intempestiva a resposta juntada em 28.8.2019, pelo ID 4033833.

Ademais, é incabível o pedido genérico de provas formulado pela defesa, pois o art. 5º da norma determina que na resposta o requerido junte provas e arrole testemunhas. É certo também que um áudio da sessão da Câmara de Vereadores na qual o parlamentar exerce suas atividades é prova que independe de requisição judicial para ser obtida e que poderia ter sido facilmente solicitada pela própria parte ao Poder Legislativo local.

Entretanto, tendo em vista que o feito versa sobre direito público e, portanto, indisponível, entendo ser inaplicável o instituto da confissão, podendo ser conhecidos os argumentos defensivos e os documentos juntados ao feito.

De fato, a Resolução TSE n. 22.610/07, em seu art. 4º, parágrafo único, “é expressa ao considerar que, diante da falta de resposta (que se equipara à resposta intempestiva), presumem-se verdadeiros os fatos narrados na inicial” (TSE, RESPE n. 17554720116260000, Relator Min. Arnaldo Versiani Leite Soares, decisão monocrática, DJE de 04.09.2012).

Decerto que a caracterização da revelia não retira do julgador a possibilidade de determinar eventuais provas consideradas imprescindíveis à elucidação dos fatos e ao exercício do contraditório e da ampla defesa.

Subsidiando tal exame, embora a peça defensiva nada esclareça quanto aos objetivos e à relevância das provas pretendidas, consoante bem destacado pela diligente Procuradoria Regional Eleitoral, pode-se buscar no agravo interno interposto contra a decisão retro citada (ID 4133733) a justificativa do requerido para seus requerimentos.

Assim, nas referidas razões recursais, acerca da necessidade de expedição de ofício à Câmara dos Vereadores de Terra de Areia para a obtenção do áudio integral da sessão legislativa do dia 20.5.2019, o requerido afirmou o seguinte:

Importante referir que na fala da Sessão Plenária do dia 20/05/2019, refere-se a áudio encaminhado pelo vereador Maicon Gonçalves de Oliveira ao vereador LINDONÊS com ameaça direta, dando prazo para tomar decisão, sob pena deter um inimigo - NESTE PONTE EXCELÊNCIA, apresentado pedido nos termos do Art. 5º da Resolução TSE n. 22610/07.
(…).
Importante frisar Excelência que o pedido apesar de ser simples, apresenta resistência na Câmara de Vereadores para deferimento, por isso, o presente pedido se funda nos autos, para que independente de posições políticas, o pedido apresentado virá para corroborar as afirmações aqui trazidas.

Como se percebe, o requerimento de prova visa expor uma simples referência a uma mensagem de áudio que teria sido encaminhada ao Vereador Lindonês.

Portanto, não se trata de uma comprovação efetiva quanto à existência e ao teor do envio, a qual seria melhor alcançada por meio da juntada da transcrição notarial da  mensagem, que, consoante narrativa de defesa, estaria sob a guarda do próprio requerido.

No entanto, nem a ata notarial nem o áudio da mensagem aportaram aos autos.

Além disso, o demandado não apresenta mínimo elemento documental que corrobore a sua alegação de que, a despeito da condição de vereador da Casa, a Câmara de Vereadores lhe tenha dificultado a obtenção direta da gravação da reunião legislativa, de modo a justificar a necessidade de intermediação judicial.

A ausência de plausibilidade deste argumento é reforçada pela ausência de indicativos de que o requerente tenha tido entraves para alcançar o registro audiovisual do pronunciamento do Vereador Lindonês na referida sessão, tal como trazido com a inicial (ID 3591383, 3591433 e 3591533).

De seu turno, sobre o pedido de oitiva de testemunhas, o requerido expôs os seguintes argumentos nas razões de agravo:

A bem da verdade, muito além dos meros dissabores cotidianos e   extrapolando os embates e enfrentamentos comuns da vida intrapartidária no PROGRESSISTAS o grupo do whatssapp servia para desabonar, desrespeitar, caluniar e ofender LINDONÊS, conforme junta aos autos extratos do grupo de whatssapp discriminação pessoal e individualizada pelo simples fato de possuir vontade de concorrer a prefeito do município. Pois a comprovação de grave discriminação ficou demonstrada pelo acervo probatório robusto relativo a fatos injustos, segregatórios e vexatórios que impossibilitaram a permanência do filiado na agremiação, sendo assim Excelência, dentro os pedidos da parte a fim de corroborar com todo o exposto, tivemos a recolhimento da produção oral de provas mediante o depoimento de testemunhas, (…).

Conforme o próprio requerido assevera, os extratos do grupo de whatsapp que acompanham a peça defensiva são suficientes à demonstração das supostas atitudes desonrosas sofridas pelo parlamentar. Desse modo, a prova testemunhal mostra-se desnecessária à corroboração de fatos que podem ser documentalmente comprovados.

Destarte, o que se constata, na hipótese, é a postulação de medidas probatórias desnecessárias e meramente protelatórias ao desfecho da lide.

Diante disso, não há razões objetivas para a mitigação dos efeitos da revelia quanto à preclusão dos requerimentos de dilação probatória, devendo ser prestigiada a celeridade na pacificação social pelo julgamento antecipado da lide, na forma prescrita pelo art. 6º da Resolução TSE n. 22.610/07.

II. Do mérito

O art. 22-A da Lei n. 9.096/95, com a redação conferida pela Lei n. 13.165/15, estabelece a perda do mandato do detentor de cargo eletivo que se desfiliar sem justa causa do partido pelo qual foi eleito, verbis:

Art. 22-A. Perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito.

As consequências jurídicas da infidelidade partidária são, ainda, reforçadas pelo art. 26 do mesmo diploma:

Art. 26. Perde automaticamente a função ou cargo que exerça, na respectiva Casa Legislativa, em virtude da proporção partidária, o parlamentar que deixar o partido sob cuja legenda tenha sido eleito.

Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, reconhecendo a força normativa do princípio constitucional da fidelidade partidária, assentou que o mandato eletivo obtido em eleição proporcional pertence ao partido político que alçou o candidato por ocasião do pleito, conforme ilustra a seguinte ementa:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ELEITORAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. RESOLUÇÃO Nº 22.610/2007 DO TSE. INAPLICABILIDADE DA REGRA DE PERDA DO MANDATO POR INFIDELIDADE PARTIDÁRIA AO SISTEMA ELEITORAL MAJORITÁRIO. 1. Cabimento da ação. Nas ADIs 3.999/DF e 4.086/DF, discutiu-se o alcance do poder regulamentar da Justiça Eleitoral e sua competência para dispor acerca da perda de mandatos eletivos. O ponto central discutido na presente ação é totalmente diverso: saber se é legítima a extensão da regra da fidelidade partidária aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário. 2. As decisões nos Mandados de Segurança 26.602, 26.603 e 26.604 tiveram como pano de fundo o sistema proporcional, que é adotado para a eleição de deputados federais, estaduais e vereadores. As características do sistema proporcional, com sua ênfase nos votos obtidos pelos partidos, tornam a fidelidade partidária importante para garantir que as opções políticas feitas pelo eleitor no momento da eleição sejam minimamente preservadas. Daí a legitimidade de se decretar a perda do mandato do candidato que abandona a legenda pela qual se elegeu. 3. O sistema majoritário, adotado para a eleição de presidente, governador, prefeito e senador, tem lógica e dinâmica diversas da do sistema proporcional. As características do sistema majoritário, com sua ênfase na figura do candidato, fazem com que a perda do mandato, no caso de mudança de partido, frustre a vontade do eleitor e vulnere a soberania popular (CF, art. 1º, parágrafo único; e art. 14, caput). 4. Procedência do pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade.
(ADI 5081, Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 27.05.2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-162 DIVULG 18-08-2015 PUBLIC 19-08-2015.) (Grifei.)

Por outro lado, o parágrafo único do art. 22-A da Lei n. 9.096/95 prevê as hipóteses de justa causa para a desfiliação partidária, ou seja, situações excepcionais e taxativas que conferem ao parlamentar o direito de conservar o mandato eletivo, ainda que em sigla partidária distinta daquela pela qual se consagrou nas urnas:

Art. 22-A. (…).
Parágrafo único. Consideram-se justa causa para a desfiliação partidária somente as seguintes hipóteses: (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)
I - mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)
II - grave discriminação política pessoal; e (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)
III - mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

Os pressupostos para a perda do mandato por infidelidade partidária são, por conseguinte, o efetivo e voluntário rompimento com a agremiação pela qual o mandatário foi eleito e a ausência de justa causa para a desfiliação, independentemente de eventual migração para outra legenda.

In casu, a efetiva desfiliação partidária do vereador requerido está sobejamente demonstrada (ID 3591483 e 3591033) e sequer é controvertida nos autos.

Sobre o requerido, reverte o ônus de alegar e demonstrar a ocorrência de qualquer das hipóteses de justa causa para a retirada da agremiação, na condição de fatos extintivos do direito do autor, nos termos do art. 8º da Resolução TSE n. 22.610/07 e do art. 373, inc. II, do CPC, a elidir a perda do mandato por infidelidade partidária.

Colaciono julgado do TSE na mesma direção:

AÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO POR INFIDELIDADE PARTIDÁRIA. ELEIÇÕES 2014. DEPUTADO FEDERAL. AUSÊNCIA. JUSTA CAUSA. PROVA APENAS TESTEMUNHAL. PROXIMIDADE DOS DEPOENTES COM O REQUERIDO. CIÊNCIA DOS FATOS POR TERCEIROS. CONTRADIÇÕES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. PERDA DO MANDATO. 1. Cuida-se de ação de perda de cargo eletivo por desfiliação partidária sem justa causa ajuizada pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) em desfavor do requerido, Deputado Federal por Alagoas eleito em 2014, e do Partido Social Democrático (PSD), legenda para a qual o parlamentar migrou. 2. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, é ônus do parlamentar que se desfiliou comprovar uma das hipóteses de justa causa previstas na legislação de regência. (…). 7. Procedência do pedido para decretar a perda de cargo eletivo por desfiliação partidária sem justa causa.
(Petição n. 51689, Acórdão, Relator Min. Luciana Lóssio, Publicação:  DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 10.12.2018, Página 44.) (Grifei.)

No aspecto, Lindonês Kónig dos Santos sustenta, inicialmente, que houve total e irrestrita anuência do Diretório Municipal do Progressistas com a sua retirada, tanto que o partido não buscou judicialmente o mandato e não publicou qualquer espécie de nota de repúdio à desfiliação.

Além disso, alega que o abandono da legenda ocorreu em razão de grave discriminação política pessoal, evidenciada nos seguintes fatos:

a) ameaças realizadas pelo vereador Maicon Gonçalves de Oliveira, dando-lhe prazo para tomar uma decisão sobre a filiação partidária, sob pena de ter um inimigo;

b) envio de mensagens denegrindo sua imagem em grupo de whatsapp do Progressistas de Terra de Areia, em razão de sua intenção de concorrer para a Prefeitura; e

c) seu afastamento das discussões e decisões do diretório por ausência de convites para participar das reuniões partidárias.

Em relação à aventada anuência do partido com a desfiliação, de fato, apesar de não contemplada expressamente pela lei como justa causa, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a concordância da agremiação é suficiente para descaracterizar a infidelidade partidária.

Confiram-se a esse respeito reiterados precedentes do TSE:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE JUSTIFICAÇÃO DE DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. VEREADOR. GRAVE DISCRIMINAÇÃO PESSOAL. RECONHECIMENTO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO. 1. Nos termos da jurisprudência deste Tribunal, "havendo consonância do Partido quanto à existência de fatos que justifiquem a desfiliação partidária, não há razão para não declarar a existência de justa causa" (AgR-AC nº 734-25/RN, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 22.10.2012). (E ainda: AgR-Pet nº 894-16/PE, Rel. Min. Henrique Neves, DJe 29.8.2014). 2. In casu, a Corte Regional julgou procedente o pedido do agravado de desfiliação partidária por justa causa, em razão de grave discriminação pessoal, sem perda de mandato eletivo, tendo em vista que o partido anuiu à saída do filiado. A modificação desse entendimento, para acolher a alegação de que não houve discriminação, demandaria o reexame de fatos e provas, o que é inadmissível em sede de recurso especial. 3. Agravo regimental desprovido.
(TSE - RESPE: 00000642420156200000 JARDIM DO SERIDÓ - RN, Relator: Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, Data de Julgamento: 03.03.2016, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 06.04.2016.) Grifei.

AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO POR DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA SEM JUSTA CAUSA. ELEIÇÕES 2010. DEPUTADO FEDERAL. AUTORIZAÇÃO DO PARTIDO POLÍTICO. DESPROVIMENTO.
1. Segundo a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, autorizada a desfiliação pelo próprio partido político, não há falar em ato de infidelidade partidária a ensejar a pretendida perda de cargo eletivo. Precedentes.
2. No caso, o posicionamento da Comissão Executiva Nacional do PMDB, concordando em não reivindicar o mandato eletivo de deputado federal que fora outorgado ao agravado, tem efeito jurídico similar à autorização para desfiliação partidária sem a perda do cargo.
3. Agravo regimental não provido. (Agravo Regimental em Petição nº 89853,
Acórdão de 24.6.2014, Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 148, data 12.8.2014, página 103.) Grifei.

 ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL AÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO. DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. AUTORIZAÇÃO DO PARTIDO. JUSTA CAUSA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. DESPROVIDO.
1. Para que o agravo obtenha êxito, é necessário que os fundamentos da decisão agravada sejam especificamente infirmados, sob pena de subsistirem suas conclusões. Nesse sentido, é firme a jurisprudência deste Tribunal Superior (REspes nos 25.948/BA, DJ de 19.2.2008, Rei. Min. Gerardo Grossi; 26.034/GO, DJ de 27.9.2007, Rei. Min. Caputo Bastos e EDcIRcI nº 448/MG, DJ de 28.9.2007, Rei. Min. Cezar Peluso).
2. Autorizada a desfiliação pelo próprio partido político, não há falar em ato de infidelidade partidária a ensejar a perda de cargo eletivo.
3. Agravo regimental desprovido.
(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 67303, Acórdão de 27.11.2012, Relator  Min. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 243, Data 19.12.2012, Página 206.) Grifei.

Conforme se extrai da jurisprudência, esta anuência deve ser revestida de uma manifestação inequívoca, a exemplo de ata deliberativa da direção partidária ou documento escrito produzido por ocasião da comunicação de desfiliação, ou mesmo ser corroborada por depoimentos de testemunhas ou outros meios de prova.

Seguindo tal diretriz, este Tribunal Regional já considerou configurada a anuência partidária mediante “declaração pública em jornal, do presidente da agremiação partidária ao qual pertencia o desfiliado, consignando a não reivindicação da cadeira do mandatário” (Pet n. 19909, Relatora Des. Eleitoral Maria De Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez, DEJERS de 15.07.2016) e “ata de reunião da direção executiva municipal, na qual a sigla deliberou por não tomar nenhuma medida quanto à situação do requerido” (Pet. n. 0600468-57, Relator Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, Sessão de 17.12.2019).

Na espécie, porém, sequer há elementos indiciários que autorizem conclusão semelhante, pois a mera ausência de censura pública não se confunde com prova de aquiescência com a desfiliação.

Do mesmo modo, o efeito direto da inércia da grei partidária em retomar judicialmente o cargo eletivo dentro do prazo decadencial é a legitimação do suplente imediato e do Ministério Público Eleitoral para o ajuizamento da ação, a teor do art. 1º, § 2º, da Resolução TSE n. 22.610/07. Logo, inviável a equiparação dessa omissão processual à justa causa para a desfiliação, pois a própria legislação prevê consequências jurídicas contrárias a este entendimento.

Nessa linha, destaco julgado da Corte Superior:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO POR DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. VEREADOR. JUSTA CAUSA E CONCORDÂNCIA DO PARTIDO. NÃO COMPROVAÇÃO. REEXAME DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. AÇÃO CAUTELAR. EFEITO SUSPENSIVO. PREJUDICIALIDADE. (…). 7. Consignado pelo Tribunal a quo que não há nos autos documento hábil a comprovar a suposta liberação do parlamentar para se desfiliar da agremiação e à míngua de concordância expressa do partido quanto à caracterização de fatos justificadores da desfiliação partidária, a tese recursal de que a inércia, por si só, da agremiação em requerer a decretação da perda do cargo eletivo configuraria aceitação tácita do desligamento esbarra no disposto no § 2º do art. 1º da Res. TSE 22.610, segundo o qual, em tal hipótese e após o prazo de trinta dias contados do desligamento, é facultado àquele que tenha interesse jurídico ou ao Ministério Público Eleitoral fazê–lo, em nome próprio, nos trinta dias subsequentes. (…).
(Agravo de Instrumento n. 060065476, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação:  DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 157, Data 15.08.2019.) (Grifei.)

No que concerne à justa causa pela grave discriminação política pessoal, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que meros aborrecimentos, frustrações em projetos pessoais e outros enfrentamentos comuns à vida política e intrapartidária não configuram a hipótese.

Exige-se, para tanto, a demonstração robusta de fatos certos e determinados dirigidos ao isolamento, depreciação ou impedimento da atividade política do parlamentar, tornando verdadeiramente insustentável a manutenção do vínculo partidário.

Nessa toada, anoto precedentes desta Corte:

PETIÇÃO. AÇÃO DE PERDA DE MANDATO ELETIVO POR DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA IMOTIVADA. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. QUESTÕES DE ORDEM INDEFERIDAS. PRELIMINAR. AFASTADA. MÉRITO. MIGRAÇÃO PARTIDÁRIA. HIPÓTESES DE JUSTA CAUSA. ART. 22-A, INC. II, DA LEI N. 9.096/97. RESOLUÇÃO TSE N. 22.610/07. GRAVE DISCRIMINAÇÃO PESSOAL NÃO COMPROVADA. DECRETADA A PERDA DO MANDATO ELETIVO. CONVOCAÇÃO DO PRIMEIRO SUPLENTE. AÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.
(…).
 4. Tese defensiva alegando a ocorrência da justa causa lastreada na grave discriminação política pessoal. Para a caracterização da hipótese descrita na legislação, exige-se a prova robusta da segregação pessoal capaz de tolher a atividade no cargo, sendo insuficiente a mera diminuição de representatividade no âmbito partidário ou eventuais divergências entre membros de uma mesma legenda. Oscilações de forças e atritos internos são comuns, naturais, nas relações intrapartidárias, e mesmo o fato de o parlamentar ter sofrido a penalidade de suspensão não caracteriza, prima facie, a grave discriminação política. Trata-se de tema interna corporis, de caráter disciplinar, cuja presunção é de legalidade, não havendo evidência de que tenha sido imposta indevidamente ou contrariamente às regras da agremiação. Contexto probatório  indicando uma opção pessoal, após a realização de uma avaliação política individual, o que gerou meros atritos internos, incapazes de caracterizar justa causa para desfiliação.
 5. Convocação do primeiro suplente para ocupar o cargo, ainda que já tenha se desfiliado da agremiação peticionante. Necessidade de sua assunção efetiva ao cargo de vereador, para que seja possível, em eventual ação própria, verificar se sua desfiliação ocorreu, ou não, acobertada pela justa causa.
 6. Procedência parcial.
(Petição n 0600262-77, ACÓRDÃO de 13.11.2018, Relator Des. Eleitoral EDUARDO AUGUSTO DIAS BAINY, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data 16.11.2018.) (Grifei.)

Ação de perda de cargo eletivo por desfiliação partidária. Resolução TSE n. 22.610/07. Matéria preliminar afastada. Possibilidade jurídica do pedido. A perda do cargo eletivo por infidelidade partidária é decretada pela Justiça Eleitoral, não se tratando de matéria interna corporis. Cerceamento de defesa não vislumbrado. Pretensão da agremiação peticionante de reaver o cargo do vereador que se desligou da sua legenda para filiar-se a partido diverso. Tese defensiva alegando a ocorrência da justa causa, lastreada no desvio reiterado do programa partidário e na grave discriminação pessoal. (…). 2. A discriminação grave, suficiente para justificar a saída do partido, exige a individualização de atos que indiquem a segregação ou preterição do parlamentar por motivos injustos, não razoáveis ou preconceituosos, que tornem insustentável a sua permanência na agremiação. Meros dissabores ou perda de espaço político não equivalem à perseguição pessoal. Justa causa não vislumbrada. Corolário é a decretação da perda do mandato eletivo. Pedido procedente.
(TRE-RS - PET: 15757 CAXIAS DO SUL - RS, Relator: DRA. MARIA DE LOURDES GALVÃO BRACCINI DE GONZALEZ, Data de Julgamento: 29.01.2016, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 20, Data 05.02.2016, Página 2.) (Grifei).

A doutrina de José Jairo Gomes, ao tratar da aludida previsão de justa causa, assim leciona:

Na concretização da presente cláusula, há que se encarecer os princípios da tolerância e da convivência harmônica, de sorte que meras idiossincrasias não poderão ser havidas como grave discriminação política pessoal. Somente fatos objetivos, sérios, repudiados severamente pela consciência jurídico-política-moral poderão ser assim considerados. (Direito eleitoral. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 136)

No caso concreto, o requerente aponta que teria sofrido ameaças em sua atuação política por parte de Maicon Gonçalves de Oliveira, também vereador e filiado ao Progressistas, juntando suposta reprodução de troca de mensagens pelo aplicativo whatsapp, ocorrida em data não especificada, com a seguinte conversa (ID 4033933):

[Maicon] Pq não foi na convenção hoje?
[Lindones] Estava em curso da saúde i dia todo mano
[Maicon] Hummm
Mas podia ter ido ali
Ficou bem ruim pra ti
Tu foi na convenção do PRB e não foi na do teu partido
Acho melhor tu tomar uma decisão na próxima segunda ou tu fica no PP ou tu vai para o PRB
Eu vou te segurar a tua barra até segunda, depois disso, eu lavo minhas mãos
E a boca vai ficar feia para o teu lado
Até segunda meio-dia, se tu não decidir. Eu só lamento, mas meu apoio tu nunca mais vai ter

No diálogo transcrito, não se evidencia mínimo conteúdo discriminatório ou segregatório em desfavor da atuação partidária do requerido. Ao contrário, o diálogo expõe, justamente, a dura exortação feita pelo então correlegionário para que o Vereador Lindonês participasse das reuniões da agremiação e deixasse de envolver-se nas atividades de outras legendas em detrimento de seu próprio partido.

Destaca-se, ainda, que o não comparecimento do ora requerido, no particular, foi justificado por compromissos paralelos aprazados ao mesmo tempo, e não pelo desconhecimento ou pela ausência de chamamento para o evento.

É possível inferir que o mesmo contexto estaria presente no suposto “áudio encaminhado pelo vereador Maicon Gonçalves de Oliveira ao vereador LINDONÊS com ameaça direta, dando prazo para tomar decisão, sob pena de ter um inimigo”, aludido pelo requerente em sua peça defensiva.

Muito embora a íntegra da aludida mensagem não tenha sido encartada nos autos, do conjunto probatório é possível depreender a presença de tensão intrapartidária em razão dos contatos do vereador Lindonês com o diretório do PRB e de aparente menoscabo em relação às atividades da própria agremiação.

Nessas circunstâncias, possíveis exigências de maior engajamento nos projetos e realizações do diretório municipal, ainda que enfáticas e peremptórias, não excedem a normalidade dos embates da vida política e partidária.

Impende salientar que o requerido não refuta sua pública aproximação com legenda diversa. Na verdade, consoante aduz em defesa, motiva sua conduta pela alegada perseguição e discriminação pessoal grave “pelo simples fato de em determinado momento ter dito o REQUERIDO possuir vontade de concorrer a prefeito e que gostaria de disponibilizar o seu nome para concorrer na Convenção Partidária de julho de 2020”.

Para demonstrar os supostos ataques pessoais à sua honra, o requerente colaciona reproduções de mensagens que teriam sido enviadas no grupo de whatsapp denominado “PP de Terra de Areia” (IDs 4033983, 4034033, 4034083, 4034133 e 4034183):

[Prof M. Helena] O Lindones já está em campanha a tempo!!! Kkkkk
[~Josi] Por isso q falei
[Prof M. Helena] Sim ele já faz um ano que anda se preparando !!! Kkkk
[~Josi] Ele diz que já esta ganha já convidou até uma pessoa pra trabalhar no gabinete
E já firmou contrato com a empresa de desodorante pelos 4 anos de seu governo

[João Academ] Está certo pelo prb
[Prof M. Helena] Vai ser uma graça ele de prefeito
[~Maicon Gonçalves] Se falarmos mal dele, vamos estar fazendo campanha para ele
[~Josi] Quando foi o mais votado na eleição ele já saiu se candidatando a prefeito
Ridículo
[~Maicon Gonçalves] Por enquanto ele ainda é pp, deixamos ele queito, se trocar de partido, na hora certa a casa dele vai tbm
[Prof M. Helena] Tens razão Maicon
[João Academ] Não né so candidato prefeito incompetente já temos o atual
[Tamires] Mas ele e uma pessoa boa só não tem pulso e nem competência.

[Prof M. Helena] Está se achando é até de rir. Kkkkkkk
[Bel]: Levou até café pros colegas no esf 2
[Tamires] Kkkk
[Prof M. Helena] Depois vão ficar rindo dele pois votar em troca de café bobalhão.
[Tamires] Tá ganhando nas pesquisas do face. Mas os eleitores são de três forquilhas.kkllKkkk
[Prof M. Helena] Kkkkkkkkkkk
[João Academ] O gente olha só que vamos enfrentar na campanha que barbada o MDB tá se dissolvendo e doi vem Lindones a Prefeito isso é piada né
[Tamires] Ele via a prefeito mesmo
[Prof M. Helena] É verdade.

[Prof M. Helena] cada dia fico mais enojada dessa gente.
[João Academ] Sim pra quem não sabe o Lindones vai ser candidato a prefeito pelo prb quando fui candidato a vereador e ele foi também vi na campanha o mal caratismo dele e falei qui ele ia ser o pior vereador do pp eu tava certo traidor to falando porque o Eridio me procura toda semana me convidando pra ir pro partido eu falei pra ele que o Lindones não tem meu voto nem pra vereador
[~Maicon Gonçalves] Vamos meter no face
[Thais Medeiros] Eu acho que sim
[Bel] Meu também não. Saio do partido mais esse falco profeta não ganha meu voto
[Prof M. Helena] Não faço campanha, não saio do partido e não voto nele.

É estão me pressionando pra ir com eles
Deus me livre não to loco
Tá certo Maico mais não se iluda
Acho que você tem razão enquanto ele tiver no partido tem que aturar mais ele só tá esperando pra dar o golpe
[Joao] [link para postagem de Eridio Menguer no facebook, contendo o   título “Na expectativa para a confraternização republicana!”]
Olha quem tá sempre presente Lindones
Eu não vou mais fazer comentário vou deixar pras pessoas que são influente no partido

Longe de configurar atos de discriminação injusta e despidos de qualquer razoabilidade, as críticas representam manifestações de opiniões pessoais, tendo em foco as notórias tratativas do requerente com o Republicanos, a fim de instrumentalizar sua candidatura à Prefeitura por agremiação diversa da que o elegeu à Câmara Legislativa.

Ademais, embora não haja clareza sobre as datas em que enviadas ou sobre a identidade dos interlocutores, pelo aspecto contextual, as manifestações são incapazes de caracterizar um tratamento ofensivo grave que tenha dado “causa” ao abandono do partido. Ao contrário, são vertidas em “consequência” da iminente mudança partidária para a futura candidatura ao cargo no Poder Executivo local.

Finalmente, a resistência ao desejo pessoal do vereador Lindonês de disputar o mandato de prefeito nas próximas eleições, igualmente, não se amolda à hipótese legal de grave discriminação pessoal, uma vez que as divergências quanto à relevância política e eleitoral de determinado filiado são inerentes à democracia interna dos partidos.

Sufragando este posicionamento, elenco os seguintes julgados do TSE:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE PERDA DE MANDATO POR DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. VEREADOR. CLÁUSULA DE DESEMPENHO INDIVIDUAL PRESCRITA NO ART. 108 DO CÓDIGO ELEITORAL. INAPLICABILIDADE AO SUPLENTE. PREVISÃO LEGAL EXPRESSA DO ART. 112, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CE. INCONSTITUCIONALIDADE DO DISPOSITIVO. INOVAÇÃO RECURSAL. LEGITIMIDADE PARA PROPOSITURA DA AÇÃO. PRAZO. TERMO INICIAL. DATA DA DESFILIAÇÃO. TEMPESTIVIDADE. INTERPOSIÇÃO DURANTE O TRINTÍDIO CONFERIDO AOS LEGITIMADOS SUPLETIVOS. ART. 22–A, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DA LEI N° 9.096/95. JUSTA CAUSA POR GRAVE DISCRIMINAÇÃO POLÍTICA PESSOAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. DESAVENÇAS ENTRE OS ÓRGÃOS PARTIDÁRIOS. AUSÊNCIA DE CARÁTER PESSOAL E ATUALIDADE DOS FATOS ALEGADOS. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO–PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 24/TSE. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO A QUE NEGA PROVIMENTO. (…). 8. Na linha da jurisprudência desta Corte, "eventual dificuldade ou resistência da agremiação em lançar o ocupante do cargo como candidato em eleições futuras não é fato suficiente para a aferição de grave discriminação pessoal" (RO n° 263/PR, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 31.3.2014). 9. Meras desavenças políticas entre órgãos partidários ou entre seus filiados são inábeis à configuração de grave discriminação política pessoal. Tampouco se afigura motivo suficiente para legitimar a desfiliação a insatisfação do trânsfuga em relação à opção da agremiação em não o lançar como candidato no pleito, visto que essas circunstâncias não desbordam os acontecimentos afetos à vida política partidária. (…).
(Recurso Especial Eleitoral n. 060046225, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação:  DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 105, Data 28.05.2020.) (Grifei.)

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO. AÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO POR DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. VEREADOR. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. NULIDADE AFASTADA. MPE. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. INTERESSE JURÍDICO. DEFESA DA ORDEM JURÍDICA E DO REGIME DEMOCRÁTICO. INFIDELIDADE PARTIDÁRIA. CARACTERIZAÇÃO. JUSTA CAUSA. GRAVE DISCRIMINAÇÃO POLÍTICA PESSOAL. NÃO DEMONSTRAÇÃO. DESÍDIA DA GREI. DISSOLUÇÃO DO ÓRGÃO LOCAL. JUSTIFICATIVAS INSUFICIENTES. ATIVIDADE PARLAMENTAR PRESERVADA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO COMPROVAÇÃO. VERBETE SUMULAR Nº 28 DO TSE. FUNDAMENTOS NÃO AFASTADOS. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
(…).
5. A grave discriminação política pessoal que legitima a justa causa para a desfiliação partidária exige a demonstração concreta de fatos que tenham o condão de afastar o mandatário do convívio do partido ou que revelem situações claras de desprestígio ou perseguição, não sendo motivo suficiente a eventual dificuldade ou resistência da grei em lançar o ocupante do cargo como candidato em eleições futuras, pois a disputa e a divergência internas fazem parte da vida partidária. Precedentes.
(…).
7. Negado provimento ao agravo interno.
(TSE - AI: 06001840820186130000 EWBANK DA CÂMARA - MG, Relator: Min. Og Fernandes, Data de Julgamento: 12.05.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 113, Data 09.06.2020.) (Grifei).

Desse modo, os fatos demonstrados pelo requerido não são suficientes para a caracterização de qualquer das hipóteses de justa causa a autorizar a sua desfiliação da agremiação com a manutenção do mandato.

Em realidade, resta evidente que a sua saída do partido está relacionada a interesses pessoais de candidatura ao cargo de prefeito nas eleições de 2020.

Assim, merece amparo o pedido formulado pelo requerente, no sentido de decretar-se a perda da vaga parlamentar.

III. Dispositivo

Ante o exposto, VOTO para julgar PROCEDENTE a ação de infidelidade  partidária ajuizada por ELIZANDRO PEREIRA DE LIMA, decretando-se a perda do mandato eletivo de LINDONÊS KÓNIG DOS SANTOS, com execução imediata do presente acórdão, nos termos do art. 10 da Resolução TSE n. 22.610/07.

Comunique-se a presente decisão à Mesa da Câmara Municipal de Terra de Areia para o devido cumprimento, devendo assumir a respectiva cadeira o primeiro suplente do partido Progressistas (PP) no pleito de 2016, ELIZANDRO PEREIRA DE LIMA, conforme consta no resultado oficial divulgado pela Justiça Eleitoral daquele município.