Pet - 0600104-51.2020.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/07/2020 às 14:00

VOTO

O requerente DEOCLECIO LOURENÇO DE MELLO ajuizou ação de decretação de perda de cargo eletivo em face de MARCELO SOARES REINALDO e JOÃO LUIS MOREIRA DA SILVA.  Alegou, como causa de pedir, a ocorrência de desfiliação dos requeridos do Partido Solidariedade e posterior filiação a outros partidos, a caracterizar infidelidade partidária.

Importante gizar, desde logo, que os requeridos não são titulares, e sim suplentes, do cargo eletivo de deputado estadual. 

A matéria é tratada pelo art. 22-A da Lei n. 9.096/95, introduzido pela Lei n. 13.165/15, e regulamentada pela Resolução TSE n. 22.610/07. Em suma, ambos os normativos estabelecem que, “quando o partido político não formular o pedido dentro de 30 (trinta) dias da desfiliação, pode fazê-lo, em nome próprio, nos 30 (trinta) subseqüentes, quem tenha interesse jurídico”, referindo-se à decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa. Confira-se:

Lei n. 9.096/95:

Art. 22-A - Perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

Parágrafo único. Consideram-se justa causa para a desfiliação partidária somente as seguintes hipóteses: (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

I - mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

II - grave discriminação política pessoal; e (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

III - mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

 

Resolução TSE n. 22.610/07:

Art. 1º - O partido político interessado pode pedir, perante a Justiça Eleitoral, a decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa.

§ 1º - Considera-se justa causa:

I) incorporação ou fusão do partido;

II) criação de novo partido;

III) mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário;

IV) grave discriminação pessoal.

[…].

§ 2º - Quando o partido político não formular o pedido dentro de 30 (trinta) dias da desfiliação, pode fazê-lo, em nome próprio, nos 30 (trinta) subsequentes, quem tenha interesse jurídico ou o Ministério Público eleitoral.

§ 3º - O mandatário que se desfiliou ou pretenda desfiliar-se pode pedir a declaração da existência de justa causa, fazendo citar o partido, na forma desta Resolução. (Grifei.)

A norma de regência prevê, expressamente, que apenas o parlamentar detentor de mandato é legitimado a figurar como parte nas referidas ações eleitorais, de forma que a jurisprudência é monolítica: o suplente de cargo proporcional ostenta mera expectativa de assunção à vaga e, enquanto não ocorrida a respectiva posse, a disciplina e a fidelidade partidária representam matéria interna corporis, cujo enfrentamento refoge à competência da Justiça Eleitoral.

Consequência lógica de tal raciocínio também vem estampada em precedente deste Regional:

Agravo regimental. Irresignação contra decisão monocrática que extinguiu, sem julgamento do mérito, ação de perda de mandato eletivo. Ilegitimidade passiva do requerido e ausência de interesse processual do requerente. Primeiro e segundo suplentes de vereador. Resolução TSE n. 22.610/07. Eleições 2012.

Conhecimento do recurso diante do caráter terminativo da decisão proferida, em conformidade com o disposto no art. 118, § 1º, do Regimento Interno deste Tribunal.

Somente pode figurar no polo passivo da ação quem é detentor de cargo eletivo. Decisão do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o exercício do mandato pelo suplente, no caso de licença do titular, deve ser superior a 120 dias para que incida a regra da infidelidade partidária. No caso dos autos, a assunção ao cargo, a título precário, deu-se por dez dias.

A legitimidade ativa restringe-se aos partidos políticos e, subsidiariamente, a quem tenha interesse jurídico ou ao Ministério Público. Somente em caso de inércia da agremiação, no prazo de trinta dias da desfiliação, poderá outro interessado exercer a pretensão.

A eventual mudança de sigla política daquele que não exerce mandato eletivo constitui matéria intrapartidária, estranha ao julgamento da Justiça Eleitoral.

Provimento negado.

(TRE-RS, PET 28-86, Rel. Desa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère, julg. Em 29.4.2014.)

Nessa mesma senda, o Tribunal Superior Eleitoral estabelece que (1) “conta-se da data da posse do suplente no cargo eletivo o prazo de 30 dias para o ajuizamento da ação por infidelidade partidária”; e que (2) “falta interesse de agir ao partido na ação de decretação de perda de cargo eletivo por infidelidade partidária em desfavor de suplente que se desligou da agremiação, se tal demanda for ajuizada antes da posse do pretenso infiel” (Recurso Ordinário n. 2275, Acórdão, Relator Min. Marcelo Ribeiro, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data: 02.8.2010, Página 213).

Assim, o interesse jurídico do requerente em tomar lugar em espaço parlamentar conquistado nas urnas surgirá apenas a partir da efetiva posse do trânsfuga no cargo, nos termos do § 2º do art. 1º da Resolução TSE n. 22.610/07, até mesmo porque o art. 4º assinala que o polo passivo da demanda é preenchido pelo “mandatário que se desfiliou”. Aliás, na doutrina, salienta Frederico Franco Alvim que, em relação ao suplente, "[...] enquanto nessa condição não possui cargo a perder, conclui-se que somente quando convocado a assumir funções é que, efetivamente, poderá ver contra si pedido de declaração de vacância".  (Curso de direito eleitoral. Curitiba: Juruá, p. 581.)

Conclui-se, portanto, que o interesse jurídico do requerente surgirá apenas a partir da posse do trânsfuga no cargo eletivo, sobremodo quando incontroverso (pois o próprio requerente noticiou) que o objetivo da demanda era o de evitar que os suplentes tomassem posse. 

Desse modo, forçoso o indeferimento da petição inicial, frente à ausência de interesse processual, art. 330, inc. III, do CPC,

Ante o exposto, VOTO por indeferir a inicial e julgar extinto o processo, sem resolução de mérito, forte no art. 485, incs. I e VI, do Código de Processo Civil.