PC - 0600257-55.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/06/2020 às 14:00

VOTO

Cuida-se da prestação de contas do Diretório Estadual do Partido Republicano Brasileiro (PRB) do Rio Grande do Sul, abrangendo o exercício de 2017.

Do parecer conclusivo (ID 4931033), extrai-se que o total de recursos financeiros arrecadados foi de R$ 157.981,11, sendo R$ 84.000,00 de verbas do Fundo Partidário e R$ 73.981,11 de recursos de Outra Natureza.

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria (SCI), após os procedimentos de exame da movimentação contábil partidária e da análise dos argumentos e documentos apresentados, concluiu pela existência de irregularidades, as quais passo a examinar.

1) Aplicação irregular de recursos financeiros do Fundo Partidário

Entendeu a Unidade Técnica que a documentação fiscal apresentada pela grei (ID 4574633), em resposta ao Exame da Prestação de Contas (ID 4158983), para comprovar o pagamento a Canoas Parque Hotel Ltda., que possui a seguinte descrição: “Discriminação dos Serviços: R$ 535,00 – salas R$ 1.300,00”, no valor total de R$ 1.835,00, não contempla a descrição detalhada do serviço prestado.

Depreende-se que restou não observado o art. 18 da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 18. A comprovação dos gastos deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

Além disso, cuidando-se de despesa com hospedagem, deveria constar na nota fiscal apresentada a respectiva identificação do hóspede, requisito não atendido pela agremiação (art. 18, § 7º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.464/15).

Assim, a ausência de adequada comprovação dos gastos efetivados com a verba do Fundo Partidário enseja o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional (R$ 1.835,00).

2) Recebimento de recursos de fonte vedada

A Unidade Técnica atestou, em seu parecer conclusivo (ID 4931033), que a agremiação partidária recebeu recursos de detentores de cargos de chefia ou direção demissíveis ad nutum da administração pública, dentre eles, chefe de gabinete e chefe de seção, no montante de R$ 1.110,00, in verbis:

Quanto aos créditos verificados nos extratos bancários, constatou-se a existência de contribuintes intitulados autoridades, os quais se enquadram na vedação prevista no art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/2015. Utilizando um banco de informações gerado a partir de respostas de ofícios, os quais requereram listas de pessoas físicas que exerceram cargos de chefia e direção na administração pública, entre o período de 01-01-2017 a 31-12-2017, e as receitas identificadas nos extratos bancários, esta unidade técnica observou a ocorrência de doações/contribuições oriundas de Fontes Vedadas no exercício de 2017, para a agremiação em exame, no valor de R$ 1.110,00.

Tratando-se de contas relativas ao exercício de 2017, quanto ao mérito, as irregularidades devem ser examinadas de acordo com as regras previstas na Resolução TSE n. 23.464/15, vigente ao tempo dos fatos, conforme estipula o inc. III do § 3º do art. 65 da Resolução TSE n. 23.546/17.

Com efeito, em relação à aplicação retroativa do art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, com a redação trazida pela Lei n. 13.488/17, este Tribunal posicionou-se pela irretroatividade das novas disposições legais, ainda que eventualmente mais benéficas ao prestador de contas, tendo preponderado os princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica.

Nesses termos, colaciono o seguinte julgado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

(...)

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

(...)

6. Provimento parcial.

(TRE-RS; Recurso Eleitoral n. 14-97, Relator: Des. El. Luciano André Losekann, julgado em 04.12.2017, por unanimidade.)

Portanto, as normas aplicáveis ao caso devem ser aquelas vigentes à época do exercício  da prestação de contas, ocasião em que foram arrecadados os recursos.

Fixado o regime jurídico incidente à espécie, é incontroverso que os doadores aludidos inserem-se no conceito de “autoridade pública” previsto no art. 31, inc. II, da Lei n. 9096/95, conforme regulamentação insculpida no art. 12, inc. IV e § 1°, da Resolução TSE n. 23.464/15, que vedava de forma irrestrita os auxílios pecuniários, aos diretórios, ofertados por pessoas físicas, filiadas ou não a partidos políticos, que exercessem cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

Seriam regulares apenas as doações ocorridas a partir de 06.10.2017, aplicando o art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95 em sua nova redação, que ressalva a licitude dos auxílios pecuniários advindos de detentores de cargos de livre nomeação e exoneração, quando filiados ao partido político.

Na espécie, foram identificadas doações realizadas por Gislaine Fontes Figueira após 06.10.2017. Entretanto, a doadora não é filiada a partido político, permanecendo, pois, como irregular o aporte de recurso à agremiação.

Assim, configurado o recebimento de recursos oriundos de fonte vedada no valor de R$ 1.100,00, a agremiação deverá efetuar o recolhimento da importância ao Tesouro Nacional.

3) Recebimento de recursos de origem não identificada

A Unidade Técnica, em seu parecer conclusivo, apontou ainda o ingresso de recursos creditados pelo Diretório Municipal do PRB de Porto Alegre na conta bancária da agremiação, no total de R$ 7.942,66, cujo doador originário não foi individualizado, caracterizando-se o valor recebido como de origem não identificada.

Efetivamente, a ausência de identificação dos doadores originários referentes às contribuições recebidas do diretório municipal do partido viola o disposto no art. 5º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 5º Constituem receitas dos partidos políticos:

[…]

IV – doações de pessoas físicas e de outras agremiações partidárias, destinadas ao financiamento de campanhas eleitorais e das despesas ordinárias do partido, com a identificação do doador originário;

A omissão na discriminação da origem dos recursos, com a individualização do doador originário, inviabiliza a fiscalização de eventual aporte de recursos de fontes vedadas pelo partido, configurando o valor recebido como recurso de origem não identificada.

Dessa forma, não sendo possível atestar a real procedência dessa quantia (R$ 7.942,66), impõe-se o recolhimento do montante ao Tesouro Nacional.

Ante o exposto, é possível concluir que o total das irregularidades importa em R$ 10.887,66 (R$ 1.835,00 – item 1; R$ 1.110,00 – item 2; R$ 7.942,66 – item 3), o que representa 6,89% do total da arrecadação (R$ 157.981,11). Nessas hipóteses, esta Corte tem entendido pela aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, possibilitando a incidência de juízo de aprovação das contas com ressalvas, circunstância que afasta a sanção de multa de até 20% e a suspensão do Fundo Partidário:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS ORIUNDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES PÚBLICAS. IRRETROATIVIDADE DAS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 13.488/17. MANTIDO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADAS A SANÇÃO DE MULTA E A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Desaprovação das contas da agremiaçao em razão do recebimento de recursos de fonte vedada, oriundos de contribuições de ocupantes de cargos de chefia demissíveis ad nutum. Escorreita a aplicação, pelo juízo a quo, da legislação vigente à época do exercício financeiro a que se refere a prestação de contas, alinhando-se ao entendimento consolidado por esta Corte e na esteira da jurisprudência do TSE.

2. Irrelevante o argumento de o cargo ocupado por autoridade ser em governo administrado por integrante de partido adversário. Recebida a doação de servidor que se enquadre na categoria de autoridade pública, nos termos da Resolução TSE n. 23.464/2015, aplicável ao exercício em análise, incide o caráter objetivo da norma, sem espaço para eventual análise subjetiva.

3. Valores irregularmente recebidos que representam 2,83% do total de recursos arrecadados pela agremiação no exercício financeiro. Aplicados princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Mantido o recolhimento ao Tesouro Nacional. Afastadas a sanção de multa sobre a quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional e a penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário.

4. Parcial provimento.

(Recurso Eleitoral n. 5482, ACÓRDÃO de 11.4.2019, Relatora DESA. MARILENE BONZANINI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data: 22.4.2019.) (Grifo nosso)

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela aprovação com ressalvas da prestação de contas do exercício financeiro de 2017 do DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO REPUBLICANO BRASILEIRO (PRB) e determino o recolhimento do valor de R$ 10.887,66 ao Tesouro Nacional, correspondente à utilização irregular de verba do Fundo Partidário (R$ 1.835,00), recursos de fontes vedadas (R$ 1.110,00) e de origem não identificada (R$ 7.942,66).