PC - 0600288-75.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/06/2020 às 14:00

VOTO

O órgão técnico verificou a existência das seguintes irregularidades, referentes: a) à falta de apresentação do comprovante de remessa da escrituração contábil à Receita Federal do Brasil; b) à utilização incorreta do Sistema de Prestação de Contas Anual (SPCA) devido ao encerramento e à posterior reabertura da prestação de contas; c) ao recebimento de recursos de fontes vedadas no valor de R$ 350,00; e d) ao recebimento de recursos de origem não identificada no total de R$ 1.991,40 (R$ 1.600,00 e R$ 391,40).

No tocante à primeira falha, constatou-se que a agremiação não apresentou comprovante de remessa da escrituração contábil à Receita Federal do Brasil, em desacordo com os arts. 29, inc. I, e 66 da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 29. O processo de prestação de contas partidárias tem caráter jurisdicional e se inicia com a apresentação, ao órgão da Justiça Eleitoral competente, das seguintes peças elaboradas pelo Sistema de Prestação de Contas Anual da Justiça Eleitoral:

I – comprovante de remessa, à Receita Federal do Brasil, da escrituração contábil digital.

Art. 66. A adoção da escrituração digital e o encaminhamento pelo Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), previstos no art. 26, § 2º, e 27, desta resolução são obrigatórios em relação às prestações de contas dos:

(…)

II – órgãos estaduais dos partidos políticos, a partir da apresentação de contas do exercício de 2016, a ser realizada até 30 de abril de 2017.

Conforme informado pelo órgão técnico, a falta de tal comprovante impossibilita aferir com segurança a validade das informações apresentadas no Balanço Patrimonial e no Demonstrativo de Resultados.

Destaca-se que é imprescindível a manutenção de Escrituração Contábil Digital para dar efetividade aos demonstrativos contábeis apresentados na prestação de contas. Por fim, o envio pelo SPED da escrituração digital à Receita Federal do Brasil e a apresentação do respectivo comprovante de remessa à Justiça Eleitoral são os atos garantidores da consistência das informações de cunho contábil prestadas à Justiça Eleitoral.

Ainda, verificou-se a utilização incorreta do Sistema de Prestação de Contas Anual (SPCA) pela agremiação, devido ao encerramento e à posterior reabertura da prestação de contas. Este procedimento impossibilita ao órgão técnico atestar se as informações prestadas foram mantidas, uma vez que o sistema foi reaberto e é passível de alterações e inclusões.

(…) a agremiação apresentou as contas com a utilização do Sistema de Prestação de Contas Anual (SPCA), e encerrou a prestação de contas, com impressão em 28/04/2018 às 19:02, sob o número de controle P51000388013RS5587352A. Em consulta ao referido sistema, na data de 25/06/2018, observa-se que a agremiação reabriu a prestação de contas do exercício em análise. Faz-se necessário o encerramento no Sistema SPCA e a reapresentação de todas as peças geradas, com novo número de controle, acompanhadas de nota explicativa com a justificativa da reabertura do Sistema SPCA. Cabe referir que os saldos e lançamentos efetuados no sistema SPCA devem guardar conformidade com os demais demonstrativos apresentados, em especial com o Balanço Patrimonial e Demonstrativo de Resultado de Exercício.

No tocante às irregularidades relativas ao recebimento de valores de fontes vedadas, identificou-se doação de pessoa jurídica (D'Marchand Comércio de Peças e Serviços Ltda.) no valor total de R$ 350,00.

Entretanto, o art. 12, inc. II, da Resolução TSE n. 23.464/15 veda expressamente a possibilidade de doação de pessoa jurídica a partidos políticos, in verbis:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

II – pessoa jurídica;

Nesse sentido, a quantia de R$ 350,00 deve ser considerada como procedente de fonte vedada, impondo-se o seu recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o disposto no art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Por fim, a unidade técnica verificou que foram creditados recursos pelo Diretório Municipal de Rio Grande sem a indicação do doador originário, no valor de R$ 1.600,00, bem como a doação de R$ 391,40, sem a identificação do CPF ou CNPJ dos doadores, em inobservância às disposições contidas nos arts. 5º, inc. IV,  7º, e 11, inc. III, todos da Resolução TSE n. 23.464/15, que dispõem:

Art. 5º Constituem receitas dos partidos políticos:

[...]

IV – doações de pessoas físicas e de outras agremiações partidárias, destinadas ao financiamento de campanhas eleitorais e das despesas ordinárias do partido, com a identificação do doador originário; (grifado)

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

Art. 11 Os órgãos partidários de qualquer esfera devem emitir, no prazo máximo de três dias contados do crédito na conta bancária, recibo de doação para:

[…]

III – as transferências financeiras ou estimáveis em dinheiros realizados entre níveis de direção partidária do mesmo partido político, com a identificação do doador originário;

Conforme se depreende do disposto nos dispositivos supracitados, é possível a doação realizada por outro partido, desde que identificado o doador originário.

A falta de indicação da origem dos valores impede a atuação fiscalizatória da Justiça Eleitoral quanto à licitude das aludidas receitas e, como consequência, malfere a transparência que deve revestir o exame contábil.

Dessa forma, a quantia de R$ 1.991,40 deve ser considerada como oriunda de origem não identificada, impondo-se o seu recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o disposto no art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15.

Diante do exposto, é possível concluir que o total das irregularidades importam em R$ 2.341,40 (R$ 350,00 + R$ 1.600,00 + R$ 391,40), quantia que representa 9,08% do total de recursos recebidos (R$ 25.781,40). Nessas hipóteses, esta Corte, na esteira da jurisprudência firmada no Tribunal Superior Eleitoral, tem entendido pela aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar a severa penalidade de desaprovação das contas. Entende-se possível o juízo de aprovação com ressalvas quando a baixa representação percentual das irregularidades não comprometa o balanço contábil como um todo, circunstância que afasta a sanção de multa de até 20% e a suspensão do Fundo Partidário:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS ORIUNDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES PÚBLICAS. IRRETROATIVIDADE DAS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 13.488/17. MANTIDO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADAS A SANÇÃO DE MULTA E A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Desaprovação das contas da agremiaçao em razão do recebimento de recursos de fonte vedada, oriundos de contribuições de ocupantes de cargos de chefia demissíveis ad nutum. Escorreita a aplicação, pelo juízo a quo, da legislação vigente à época do exercício financeiro a que se refere a prestação de contas, alinhando-se ao entendimento consolidado por esta Corte e na esteira da jurisprudência do TSE.

2. Irrelevante o argumento de o cargo ocupado por autoridade ser em governo administrado por integrante de partido adversário. Recebida a doação de servidor que se enquadre na categoria de autoridade pública, nos termos da Resolução TSE n. 23.464/2015, aplicável ao exercício em análise, incide o caráter objetivo da norma, sem espaço para eventual análise subjetiva.

3. Valores irregularmente recebidos que representam 2,83% do total de recursos arrecadados pela agremiação no exercício financeiro. Aplicados princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Mantido o recolhimento ao Tesouro Nacional. Afastadas a sanção de multa sobre a quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional e a penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário. (grifado)

4. Parcial provimento.

(Recurso Eleitoral n. 5482, ACÓRDÃO de 11.4.2019, Relatora MARILENE BONZANINI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data: 22.4.2019.)

Nessa hipótese, o recolhimento do valor indevidamente recebido ao Tesouro Nacional é mera consequência jurídica relacionada à vedação do enriquecimento ilícito e não possui natureza de penalidade. Segundo o TSE: “A aprovação das contas com ressalvas em função das irregularidades apuradas impõe sempre a devolução dos respectivos valores ao erário.” (PC n. 978-22/DF, redator para o acórdão Min. Dias Toffoli, DJe de 14.11.2014.)

Também é de ser considerado que o art. 36, inc. II, da Lei n. 9.096/95 efetivamente prevê que o recebimento de recursos de fontes vedadas sujeita o partido à sanção de suspensão da participação no Fundo Partidário por um ano:

Art. 36. Constatada a violação de normas legais ou estatutárias, ficará o partido sujeito às seguintes sanções:

I - no caso de recursos de origem não mencionada ou esclarecida, fica suspenso o recebimento das quotas do fundo partidário até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral;

II - no caso de recebimento de recursos mencionados no art. 31, fica suspensa a participação no fundo partidário por um ano;

III - no caso de recebimento de doações cujo valor ultrapasse os limites previstos no art. 39, § 4º, fica suspensa por dois anos a participação no fundo partidário e será aplicada ao partido multa correspondente ao valor que exceder aos limites fixados.

Este dispositivo vige até os dias atuais com a mesma redação da data da promulgação e nunca sofreu alterações, nada obstante o caput do art. 37 da Lei n. 9.096/95 tenha sido sucessivamente modificado pelo Congresso Nacional por meio das Leis n. 9.693/98 e n. 13.165/15:

Art. 37. A falta de prestação de contas ou sua desaprovação total ou parcial, implica a suspensão de novas quotas do fundo partidário e sujeita os responsáveis às penas da lei, cabíveis na espécie, aplicado também o disposto no art. 28.

(…)

Art. 37. A falta de prestação de contas ou sua desaprovação total ou parcial implica a suspensão de novas cotas do Fundo Partidário e sujeita os responsáveis ás penas da lei. (Redação dada pela Lei nº 9.693, de 1998)

Art. 37. A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento). (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

Em suma, pode-se dizer que o art. 37 da Lei dos Partidos estabeleceu, inicialmente, que a falta de contas ou sua desaprovação implicaria a suspensão de novas quotas do Fundo Partidário, mas, após duas modificações legislativas, prevê que, em caso de desaprovação, a penalidade a ser aplicada pela Justiça Eleitoral restringe-se à devolução da importância apontada como irregular acrescida de multa de até 20%.

Como se vê, os arts. 36 e 37 da Lei n. 9.096/95 são normas distintas, independentes entre si, e que não se confundem.

Na espécie, há de se considerar, então, em função do texto atual do art. 37, que, se a reprovação das contas enseja como única penalidade a devolução da quantia apontada como irregular acrescida de multa, como se poderia interpretar que em caso de aprovação, mesmo com ressalvas, a penalidade poderia ser mais grave?

E, desde a edição da Lei dos Partidos Políticos, ao interpretar o art. 36, o TRE-RS assentou que, em se tratando de aprovação com ressalvas, não há fixação da pena de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário, embora a previsão legal disponha sobre a cominação dessa sanção.

A transcrição de precedentes demonstra que em todos os casos de aprovação com ressalvas não houve um sequer no qual se tivesse, na parte dispositiva, aplicado a sanção, nessas hipóteses, de suspensão das quotas:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO 2015. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR AFASTADA. ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO. MÉRITO. AUSÊNCIA EMISSÃO DE RECIBO DE DOAÇÃO. OMISSÃO DESPESAS COM ADVOGADO. RECEBIMENTO RECURSOS DE FONTE VEDADA. AUSENTE AUTENTICAÇÃO LIVRO DIÁRIO. IRREGULARIDADE FORMAL. PROVIMENTO PARCIAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Preliminar. A Resolução TSE n. 23.464/15 regula o processamento das prestações de contas de exercício financeiro das agremiações e determina que a decisão que julga as contas deve ser cumprida apenas após o trânsito em julgado da sentença. Pedido não conhecido. 2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. No caso, o partido recebeu contribuição do presidente da agremiação, detentor de mandato eletivo de Prefeito. Apesar da ausência do recibo eleitoral para a doação, ficou devidamente identificado o doador originário do recurso. Doação julgada regular. 3. Demais falhas consideradas formais, permitindo o juízo de aprovação das contas com ressalvas, afastando a suspensão do Fundo Partidário. Provimento parcial.

(TRE-RS - RE: 1183 MATO CASTELHANO - RS, Relator: DR. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 18.12.2017, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 10, Data: 24.01.2018, p. 11.) (Grifei.)

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. AFASTADA A PRELIMINAR DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. MÉRITO. RECURSOS ADVINDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES. IRREGULARIDADES QUE SOMAM O PERCENTUAL DE 9,86% DAS RECEITAS AUFERIDAS PELA GREI NO EXERCÍCIO FINANCEIRO EM ANÁLISE, POSSIBILITANDO O JUÍZO DE APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVAS. REDUÇÃO DO VALOR A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADAS AS PENALIDADES DE SUSPENSÃO DO REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO E DE MULTA. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas. É vedado aos partidos políticos receber doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, quando ostentarem a condição de autoridades. 2. Inviável reconhecer a aduzida inconstitucionalidade do art. 65, inc. III, da Resolução TSE n. 23.546/17 por mostrar-se incompatível com o art. 60, § 4º, inc. III, da Constituição Federal. Embora o art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 13.488/17, considere regular as doações realizadas por autoridades públicas com vínculo partidário, essa regra alcança, tão somente, as doações efetuadas após a data da sua publicação, qual seja, 06.10.2017, não sendo aplicável a todo o exercício financeiro de 2017. Incidência da legislação vigente à época em que efetivadas as doações por autoridades públicas. 3. Irregularidades que somam o percentual de 9,86% da totalidade das receitas arrecadadas pela agremiação no exercício financeiro em análise, possibilitando o juízo de aprovação das contas com ressalvas, na esteira da jurisprudência firmada pelo Tribunal Superior Eleitoral, igualmente adotada no âmbito deste Tribunal. 4. Redução do valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional e afastadas as penalidades de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário e de multa. 5. Provimento parcial. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE: 1526 VIAMÃO - RS, Relator: MARILENE BONZANINI, Data de Julgamento: 14.5.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 88, Data: 17.5.2019, p. 8) (Grifei.)

Esse raciocínio não foi afetado pelas alterações legislativas implementadas no caput do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, pois, conforme já referido, o afastamento da penalidade de suspensão de quotas decorre da conclusão de que a aprovação das contas com ressalvas é incompatível com a fixação de penalidade aos partidos políticos.

A sanção é desconsiderada por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, uma vez que o apontamento de ressalva não descaracteriza o fato de que a contabilidade foi aprovada, ainda que não integralmente.

Apesar da previsão do art. 36 da Lei dos Partidos Políticos, o raciocínio é o de que a suspensão do recebimento de quotas não atende ao princípio da proporcionalidade em relação aos seus sub-princípios: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, este último tomado como máxima da necessidade, exigibilidade e adequação (vide Exames inerentes à proporcionalidade, em: ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios – da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 11 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 167-169).

Cumpre anotar, neste contexto, que, embora não se trate propriamente de um critério interno, a aferição da proporcionalidade de uma medida sancionatória há de partir também de um juízo de ponderação realizado com fundamento no dever de proporcionalidade.

Seguindo essa mesma diretriz, o Tribunal Superior Eleitoral entende que o recebimento de contribuições por autoridades demissíveis ad nutum é irregularidade que enseja apenas em tese a desaprovação das contas:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. IRREGULARIDADE. CONTRIBUIÇÕES DE AUTORIDADES PÚBLICAS. CARGOS DEMISSÍVEIS AD NUTUM. FONTE VEDADA. DESAPROVAÇÃO. SUSPENSÃO DAS COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. REDUÇÃO DA SANÇÃO. PRECEDENTES. DESPROVIMENTO.1. Quando da fixação da suspensão das cotas do Fundo Partidário, compete ao julgador ponderar todas as circunstâncias averiguadas no caso concreto e aferir qual penalidade se afigura mais adequada (AgR-REspe nº 33-50/RS, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 18.10.2016).2. No momento da aplicação da referida sanção, devem ser observados: i) a gravidade das irregularidades; ii) a expressividade do valor; e iii) o percentual do montante irregular em relação aos recursos arrecadados e movimentados pela agremiação. 3. Nos termos da jurisprudência deste Tribunal Superior, o recebimento de contribuições por autoridades demissíveis ad nutum é irregularidade que enseja, em tese, a desaprovação das contas. In casu, diante do valor apontado como irregular (R$ 22.440,00 - vinte e dois mil, quatrocentos e quarenta reais) e do percentual (36,52%), a suspensão das cotas pelo prazo de 2 (dois) meses se mostrou proporcional e adequada às peculiaridades do caso concreto.4. Agravo regimental ao qual se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 3757, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data: 02.8.2019.) (Grifei.)

De fato, o Tribunal Superior Eleitoral, em sucessivas decisões, afastou a penalidade de suspensão de quotas do Fundo Partidário nos casos em que houve recebimento de recursos de fontes vedadas de pequena monta, seguindo a diretriz jurisprudencial de que a aprovação com ressalvas não se coaduna com tal apenamento. Por essa razão, quando do provimento de recursos e consequente reforma de acórdãos regionais de desaprovação de contas para aprová-las com ressalvas, a Corte Superior Eleitoral afasta a suspensão do Fundo Partidário.

Cito, a propósito, a decisão proferida pelo Min. Sérgio Silveira Banhos no RESPE n. 7314220156260000, em 28.10.2019, no qual, após ser provido o recurso para aprovação das contas com ressalvas, foi afastada a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário:

Mais recentemente, assentou-se: “Esta Corte Superior admite aplicar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar contas com ressalvas quando a falha não inviabiliza o controle por parte da Justiça Eleitoral e representa percentual ínfimo” (AgR-REspe 63-39, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 30.8.2019).

Assim, considerado o percentual irregular de 1,87% e a inexistência de indícios de má-fé, é viável a aprovação com ressalvas, nos termos da jurisprudência acima apontada.

Por outro lado, inviável afastar a determinação de recolhimento dos recursos de fonte vedada, a qual, além de não se tratar propriamente de sanção, “atende aos princípios e às regras constitucionais que regem a prestação de contas, a transparência do financiamento eleitoral e a normalidade e legitimidade das eleições” (REspe 1224-43, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 5.11.2015).

Por essas razões e nos termos do art. 36, § 7º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral, dou provimento ao agravo interposto pelo Diretório Estadual do Partido Popular Socialista, a fim de prover parcialmente o recurso especial por ele interposto, para aprovar com ressalvas as suas contas do exercício financeiro de 2014, mantida a determinação de recolhimento do valor oriundo de fonte vedada.

(TSE - RESPE n. 7314220156260000 São Paulo/SP 44612019, Relator: Min. Sérgio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 28.10.2019, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico - 07.11.2019 - n. 215 - p. 5-8.) (Grifei.)

Ao reformar o acórdão do TRE-RS nos autos do RESPE n. 724220136210000, para aprovar as contas com ressalvas, o Min. Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin, de igual modo, suprimiu a penalidade:

Conforme relatado, o TRE/RS desaprovou contas do exercício financeiro de 2012 do recorrente, nos seguintes termos (fls. 565 e 568):

Em resumo: verificados recursos de origem não identificada, no valor de R$ 206,35 (duzentos e seis reais e trinta e cinco centavos), bem como identificados valores recebidos de fontes vedadas - especificamente pessoas detentoras de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades no total de R$ 47.071,00 (quarenta e sete mil e setenta e um reais).

(…)

De outra parte, ressalto ser possível aprovar com ressalvas as contas, em atenção ao princípio da proporcionalidade e razoabilidade, pois a soma de valores das falhas constatadas - R$ 47.277,35 - corresponde a aproximadamente 6,5% dos recursos movimentados na campanha, não sendo bastante para comprometer controle financeiro pela Justiça Eleitoral.

(...)

Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso especial do Partido Progressita (PP), nos termos do art.366,§ 7ºº, do RI-TSE, para aprovar com ressalvas as contas do exercício financeiro de 2012. Prejudicado o recurso do Parquet.

(TSE - RESPE n. 724220136210000 Porto Alegre/RS 67842016, Relator: Min. Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin, Data de Julgamento: 10.4.2017, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico - 02.5.2017 - p. 99-102.) (Grifei.)

 

Também é no mesmo sentido o seguinte acórdão da relatoria do Min. Luiz Fux:

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2010. DESAPROVAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO DE TITULAR DE CARGO DEMISSÍVEL AD NUTUM QUE OSTENTA A CONDIÇÃO DE AUTORIDADE. RECURSOS DE FONTE VEDADA. VALOR DIMINUTO. BOA-FÉ. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

Na origem, o Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas desaprovou as contas apresentadas pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) - Estadual, alusivas ao exercício financeiro de 2010, determinando a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo período de um ano, a teor do art. 36, II, da Lei nº 9.096/95, tendo em vista que a agremiação recebeu o montante de R$ 3.600,00 de onze agentes públicos ocupantes de cargo de chefia e direção na Administração Pública, que constituem recursos fonte vedada, nos termos do art. 31, II, da Lei dos Partidos Políticos. Eis a ementa do acórdão (fls. 1.258):

(…)

No caso sub examine, considerando que os recursos recebidos de fonte vedada totalizam a quantia de R$ 3.600,00, reputo serem aplicáveis os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na espécie, a fim de que as contas sejam aprovadas com ressalvas.

Isso porque o valor da irregularidade se revela diminuto em relação aos recursos movimentados pelo partido no exercício financeiro e não restou evidenciado no acórdão regional que a aludida irregularidade tenha comprometido a confiabilidade e a transparência das contas.

(...)

Esse entendimento encontra eco na jurisprudência sedimentada por esta Corte Superior nos seguintes termos:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PSC. DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2009. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO.

1[...]

4. Conforme a jurisprudência deste Tribunal, em se tratando de irregularidades que representam percentual ínfimo em relação aos recursos movimentados na campanha, é possível a aplicação do princípio da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas.

5. Contas aprovadas com ressalvas e determinação de restituição dos valores relativos às irregularidades na aplicação de recursos do Fundo Partidário.

(PC n. 948-84/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 28.5.2015.);

PARTIDO POLÍTICO. PARTIDO DEMOCRATAS (DEM). PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2009. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. NECESSIDADE. PRECEDENTES.

[...]

7. Na hipótese, além das irregularidades meramente formais, as demais são relativas a não comprovação de despesas ou aplicações inadequadas do Fundo Partidário, alcançando apenas 1,69% daqueles recursos - no montante de R$ 339.457,71 -, o que possibilita a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

8. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que, mesmo quando as irregularidades encontradas redundam na aprovação com ressalvas das contas apresentadas, é cabível a determinação de devolução dos respectivos valores ao Erário.

9. Contas aprovadas com ressalvas" .

(PC n. 978-22/DF, Redator designado Min. Dias Toffoli, DJe de 14.11.2014);

Prestação de contas. Doação por fonte vedada.

1. É de manter-se a decisão do Tribunal Regional Eleitoral que, em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, entendeu, diante das particularidades do caso, aprovar com ressalva as contas do candidato, considerando que a irregularidade alusiva à doação por fonte vedada - proveniente de sindicato - correspondeu a percentual ínfimo em relação ao total de recursos arrecadados para a campanha.

(...)

Ex positis, dou provimento ao recurso especial, com base no art. 36, § 7º, do RITSE, para aprovar com ressalvas a prestação de contas do PSDB referente ao exercício financeiro de 2010.

(TSE - RESPE n. 2508720116020000 Maceió/AL 31552014, Relator: Min. Luiz Fux, Data de Julgamento: 28.9.2015, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico - 04.02.2016 - p. 28-31.) (Grifei.)

Na hipótese de recebimento de recursos de origem não identificada de pequena monta, os quais também são sancionados pelo art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95 com a penalidade de suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário, o TSE igualmente não fixa a sanção quando da aprovação das contas com ressalvas:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL). DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2011. CONTAS APROVADAS COM RESSALVAS. IMPOSIÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO.

(…)

5. A prestação de contas se conecta umbilicalmente a princípios caros ao Direito Eleitoral, como a igualdade de chances entre os partidos políticos, a moralidade eleitoral, e, em última análise, a própria noção de Democracia. A prestação de contas evita ou, ao menos, amaina os reflexos nefastos do abuso do poder econômico que, no limite, desvirtuam a igualdade de chances entre os candidatos e as agremiações partidárias, ao mesmo tempo em que se franqueia maior legitimidade ao processo político-eleitoral, sob o prisma do diálogo com a moralidade eleitoral.

6. In casu, a) constataram-se as seguintes irregularidades relativas a: (i) recursos de origem não identificada, no valor de R$ 6.254,46 e (ii) recursos do fundo partidário, assim discriminadas: (a) ausência de documentos fiscais de despesas quitadas com recursos do Fundo Partidário no valor de R$ 28.715,61; (b) transferência a diretórios estaduais impedidos de receber recursos por contas julgadas desaprovadas, no valor de R$ 58.867,44; (c) apresentação de documentos fiscais inidôneos, vencidos há 3 (três) anos, no valor de R$ 29.400,00; e (d) apresentação de documento fiscal inidôneo pelo partido, porque divergente da informação prestada pela Prefeitura Estância Hidromineral de Poá, no valor de R$ 10.500,00; b) as irregularidades vinculadas a recursos do Fundo Partidário totalizam o montante de R$ 127.483,05, o qual corresponde ao percentual de 3,78%, de modo que não se vislumbra base para a desaprovação das contas do PSOL; c) as falhas apontadas dizem respeito a valores ínfimos, repita-se, 3,78% dos recursos oriundos do Fundo Partidário, o que autoriza a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, considerado o percentual irrisório em relação ao total da movimentação contábil. Precedentes.

7. A determinação de devolução ao Erário dos valores referentes às irregularidades apuradas é possível ainda que a análise da prestação de contas culmine na aprovação com ressalvas das contas apresentadas.

8. Contas apresentadas pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), relativas ao exercício financeiro de 2011, aprovadas com ressalvas, de acordo com o disposto no art. 27, III, da Res.-TSE nº 21.841/2004, com a determinação de recolhimento ao Erário do valor de R$ 133.737,51 (cento e trinta e três mil, setecentos e trinta e sete reais e cinquenta e um centavos): sendo R$ 127.483,05 referentes aos recursos do Fundo Partidário e R$ 6.254,46 relativos a recursos de origem não identificada; devidamente atualizado, a ser pago com recursos próprios, nos termos do art. 34, caput, da Res.-TSE nº 21.841/2004.

(Prestação de Contas n. 27098, Acórdão, Relator Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 43, Data: 02.3.2018, p. 48-49.) (Grifei.)

Portanto, a diretriz traçada por este Tribunal está alinhada ao entendimento do TSE segundo o qual a aprovação das contas com ressalvas não acarreta a sanção de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela aprovação com ressalvas da prestação de contas do exercício financeiro de 2017 do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PATRIOTA (PATRI) e determino o recolhimento do valor de R$ 2.341,40 ao Tesouro Nacional, correspondente à utilização irregular de recursos de fontes vedadas (R$ 350,00) e de recursos de origem não identificada (R$ 1.991,40).