Cta - 0600032-64.2020.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/05/2020 às 14:00

VOTO

A lei estabelece requisitos subjetivos e objetivos para o conhecimento da consulta, nos termos do art. 30, inc. VIII, do Código Eleitoral, devendo o questionamento versar sobre matéria eleitoral e ser elaborado em tese e por autoridade pública ou partido político:

Art. 30. Compete, ainda, privativamente, aos Tribunais Regionais:

(...)

VIII – responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou partido político.

No caso dos autos, os elementos relacionados à legitimidade de parte e à pertinência da questão foram atendidos: a matéria da consulta está relacionada às condutas vedadas aos agentes públicos em ano eleitoral e o consulente exerce o cargo de prefeito.

Porém, conforme apontado pelo nobre Procurador Regional Eleitoral Substituto, o requisito que impõe seja o questionamento formulado em tese não se encontra presente: a todo efeito, a consulta foi realizada sobre situação concreta e identificável.

Inicialmente, observa-se que a indagação envolve a interpretação jurídica deste Tribunal de legislação municipal vigente na cidade de Arroio dos Ratos, e não de situação hipotética, como afirma o consulente, tendo em vista que, em 5 de dezembro de 2019, o prefeito sancionou a Lei Complementar n. 1/19, que Disciplina o Sistema Tributário do Município, consolida Leis e dispõe sobre o Código Tributário Municipal.

Dessa forma, é perfeitamente identificável o questionamento sobre a possibilidade de apresentação de projeto de lei implementando parcelamento fiscal com vistas a atenuar o aumento de tributos promovido no município em questão.

Devido à falta de abstração do caso em análise, é vedada a manifestação prévia da Justiça Eleitoral a respeito da conduta jurídica a ser adotada pela parte, pois a questão pode vir a ser discutida no âmbito de representação eleitoral ajuizada com fundamento em violação do art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97, dispositivo que proíbe à administração pública a concessão de benefícios à população no ano do pleito:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(…)

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.

Portanto, este Tribunal não pode antecipar o julgamento do mérito sobre a questão posta à apreciação, sob pena de realizar prévio enfrentamento de caso concreto.

Não é só.

Conforme jurisprudência colacionada aos autos pela Seção de Produção e Gestão de Conhecimento Técnico-Jurídico (SEPGE), este Tribunal, adotando a diretriz jurisprudencial firmada no âmbito do TSE, já assentou que as indagações que versam acerca das condutas vedadas previstas no art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97 não serão respondidas quando formuladas no ano da eleição, após iniciado o período de incidência da norma (ID 5367683):

Consulta. Programa municipal de regularização fundiária. Art. 30, inc. VIII, do Código Eleitoral.

1. Consulente, prefeito municipal, detentor de legitimidade para formular consulta. Requisito subjetivo satisfeito.

2. Indagações que versam acerca de condutas vedadas, previstas no art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97. Formulação a destempo, quando já iniciado o período de incidência da norma. Requisito temporal não satisfeito.

3. A sequência de questionamentos apresentados, a permitir uma série de soluções jurídicas cogitáveis, também obsta a elaboração de respostas, sob pena de enfrentamento de caso concreto. Requisito objetivo não preenchido.

4. Exceção feita à primeira indagação, formulada em tese, possibilitando a superação dos obstáculos mencionados para o seu esclarecimento.

Consulta conhecida em parte.

(CTA 120-93, Rel. Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja, j. 22.8.2016.) (Grifei.)

Há entendimento estabelecendo que a resposta à eventual consulta após o início da incidência da norma questionada pode comprometer a paridade de armas entre os candidatos:

Consulta. Prefeito. Publicidade de festival gastronômico. Art. 73, inc. VI, al. "b", da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016. Indagação acerca da possibilidade de realização de campanha publicitária de festival gastronômico tradicional no município. Impossibilidade de pronunciamento sobre a matéria por fundamentos diversos:

1. Pelo entendimento firmado na Justiça Eleitoral no sentido de que não devem ser apreciadas as consultas após iniciado o período eleitoral em sentido lato, quando incidem as normas sobre as quais recai a dúvida ou o processo eleitoral, sob pena de comprometimento da paridade de armas entre os candidatos;

2. Por restar caracterizado pedido de autorização de publicidade institucional nos três meses antes do pleito, cuja competência para apreciação é do juiz eleitoral;

3. Pela inobservância do requisito objetivo estabelecido no inc. VIII do art. 30 do Código Eleitoral, caracterizado o caso concreto. Não conhecimento.

(Consulta n. 11571, Acórdão de 20.7.2016, Relator RAFAEL DA CÁS MAFFINI, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 136, Data: 28.7.2016, Página 8.)

Além disso, foi juntado aos autos acórdão no qual o TSE assenta que “A validade ou não de lançamento de Programa de Recuperação Fiscal (Refis) em face do disposto no art. 73, § 10, da Lei n° 9.504/1997 deve ser apreciada com base no quadro fático-jurídico extraído do caso concreto” (ID 5367783), e não na forma de consulta à Justiça Eleitoral (CTA 368-15, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, redator para o acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 3.3.2015).

Com efeito, os demais julgados apresentados tratam de ações eleitorais nas quais foi debatida a caracterização de prática de abuso de poder em virtude do encaminhamento de projetos de lei versando sobre matéria tributária (ID 5367833, 5367883, 5367933, 5367983).

Também é preciso considerar que, para cada eleição, o Tribunal Superior Eleitoral expede resolução regulamentando referida disposição legislativa, razão pela qual a solução almejada pelo consulente demanda exame específico da matéria pertinente, caracterizando manifesta indagação sobre fato com contornos de caso concreto.

Portanto, a presente consulta não respeitou a exigência de formulação em tese e seu conteúdo não pode ser considerado como abstrato, situação que causa óbice ao seu conhecimento.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo não conhecimento da consulta.