Cta - 0600039-56.2020.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/04/2020 às 14:00

VOTO

A legislação prevê a consulta ao Tribunal Regional Eleitoral, observados os requisitos do art. 30, inc. VIII, do Código Eleitoral:

Art. 30. Compete, ainda, privativamente, aos Tribunais Regionais:

[...]

VIII – responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou partido político.

Como se vê, a legislação exige a formulação da consulta sem contornos a possibilitarem a identificação de caso concreto. Tal comando evita que o Tribunal se adiante em eventual apreciação jurisdicional, sem que tenha havido dilação probatória adequada.

Na espécie, o consulente atende ao requisito subjetivo, ao deter legitimidade para realizar a consulta, pois se trata de presidente estadual de agremiação e ocupante do cargo de deputado federal.

Quanto ao requisito objetivo, a indagação diz respeito ao manejo de pesquisas de intenção de voto para análise interna de campanha eleitoral, sem publicização, e pode ser considerado em tese, eis que genericamente formulado. Dito de outro modo, todo e qualquer competidor eleitoral pode se valer da resposta a ser apresentada pela Corte, de forma que conheço da consulta.

À análise.

Exemplo 01 - Caso o Partido “X”, por seus colaboradores, de forma voluntária, resolvessem elaborar e realizar uma pesquisa de intenção de votos, NÃO levando a registro no Sistema de Registro de Pesquisas Eleitorais (PesqEle), com eleitores de determinado município “Y”, para consumo interno, de forma que não fosse publicada ou levada a público, servindo apenas como forma de avaliação de seus candidatos e montagem de estratégias eleitorais partidária, esse Partido:

a) estaria infringindo dispositivos da Resolução 23.600/2019? ou

b) estaria permitido a realizar dita pesquisa para consumo interno?

Exemplo 02 - Caso o Partido “X”, resolvesse contratar determinada empresa ou entidade para realizar uma pesquisa de intenção de votos, NÃO levando a registro no Sistema de Registro de Pesquisas Eleitorais (PesqEle), com eleitores de um determinado município “Y”, para consumo interno, de forma que não fosse publicada ou levada a público, servindo apenas como forma de avaliação de seus candidatos e montagem de estratégias eleitorais partidária, esse Partido:

a) estaria infringindo dispositivos da Resolução 23.600/2019? ou

b) estaria permitido a realizar dita pesquisa para consumo interno?

A Resolução TSE n. 23.600/19 é o normativo que dispõe sobre as pesquisas eleitorais. É bem verdade que estabelece, nos incisos de seu art. 2º, uma série de informações a serem registradas no PesqEle (Sistema de Registro de Pesquisas Eleitorais) pelas entidades ou empresas que realizarem pesquisa eleitoral:

Art. 2º A partir de 1º de janeiro do ano da eleição, as entidades e as empresas que realizarem pesquisas de opinião pública, relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, no Sistema de Registro de Pesquisas Eleitorais (PesqEle), até 5 (cinco) dias antes da divulgação, as seguintes informações (Lei n° 9.504/1997, art. 33, caput, I a VII e § 1º):

I - contratante da pesquisa e seu número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ);

II - valor e origem dos recursos despendidos na pesquisa, ainda que realizada com recursos próprios;

III - metodologia e período de realização da pesquisa;

IV - plano amostral e ponderação quanto a gênero, idade, grau de instrução, nível econômico do entrevistado e área física de realização do trabalho a ser executado, bem como nível de confiança e margem de erro, com a indicação da fonte pública dos dados utilizados;

V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII - quem pagou pela realização do trabalho com o respectivo número de inscrição no CPF ou no CNPJ;

VIII - cópia da respectiva nota fiscal;

IX - nome do estatístico responsável pela pesquisa, acompanhado de sua assinatura com certificação digital e o número de seu registro no Conselho Regional de Estatística competente;

X - indicação do estado ou Unidade da Federação, bem como dos cargos aos quais se refere a pesquisa.

[…] (Grifei.)

A leitura do caput não deixa dúvida de que a legislação estabeleceu que as exigências para a espécie de pesquisa sejam levadas a “conhecimento público”.

No caso, parece-me que basilares princípios de interpretação do ordenamento jurídico enquanto sistema (mormente as espécies gramatical, a contrario sensu, e teleológica) impõem que as exigências do art. 2º da Resolução TSE n. 23.600/19 sejam aplicadas somente àquelas pesquisas que venham a ser publicadas (ou publicizadas), exatamente porque elas é que possuem o condão de influenciar o eleitor indeciso – diversos estudos de ciência política já abordaram o deletério “efeito manada” que pesquisas eleitorais podem produzir. Por todos, Venturi, G. Pesquisas Pré-Eleitorais: Legitimidade, Influência e Contribuições à Cidadania. Opin. Pública 2015, 3, 129-145.

E a jurisprudência segue tal linha de raciocínio:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2012. PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT). APROVAÇÃO COM RESSALVAS. (...) 4. Pesquisas eleitorais. Somente as pesquisas destinadas ao "conhecimento público" sujeitam-se à exigência de registro perante a Justiça Eleitoral, nos termos do art. 33 da Lei 9.504/97. In casu, tratou-se de pesquisas para consumo interno, não tendo havido divulgação para o público externo. (...)

(TSE - PC - Prestação de Contas n. 24381 - BRASÍLIA – DF - Relator Min. Admar Gonzaga – DJE 01.6.2018.)

Além disso, uma circunstância que não pode ser desprezada é a utilidade, aos partidos e candidatos, de dados de intenção de voto, com o fito de melhor abordar esta ou aquela parcela do eleitorado.

Dessarte, compartilho do entendimento da Procuradoria Regional Eleitoral de que “o registro só é obrigatório em relação às pesquisas que almejam divulgação pública. Isto é, a contratação de pesquisas para o ‘consumo interno’, sem apresentação de seu resultado à sociedade, não é vedada pela legislação eleitoral e prescinde de registro na Justiça Eleitoral” (ID 548003).

A título de desfecho, relembro apenas o caráter não vinculante das consultas efetuadas às Cortes eleitorais.

Diante do exposto, VOTO no sentido de que a consulta seja respondida nos seguintes termos:

A realização de pesquisa eleitoral para utilização interna em campanha eleitoral, seja ela contratada ou efetuada pelo próprio partido político/candidato, não infringe dispositivos da Resolução TSE n. 23.600/19, desde que a referida pesquisa, ou qualquer de seus dados, não seja publicada.