RE - 14360 - Sessão: 06/04/2020 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso inominado interposto pela UNIÃO, por meio da ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO, contra a sentença (fl. 204-v.) proferida pelo Juízo Eleitoral da 124ª Zona, que extinguiu o cumprimento de sentença em virtude do reconhecimento da prescrição intercorrente.

Em suas razões, a União sustenta a ausência de prescrição intercorrente capaz de levar à extinção do feito. Alega, ainda, que em nenhum momento requereu a suspensão do processo e que, conforme entendimento do STJ, para o reconhecimento da prescrição intercorrente, é imprescindível a intimação do exequente para que dê andamento ao feito. Ao final, requer a reforma da decisão e o prosseguimento do cumprimento de sentença (fls. 208-213).

Intimada (fl. 217), a agremiação não ofereceu contrarrazões (fl. 217-v.)

Os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo provimento do recurso (fls. 220-223-v.).

É o relatório.

 

VOTO

Sobre a admissibilidade, observe-se que os autos do processo aportaram na Advocacia-Geral da União em 23.08.2019, sexta-feira (fl. 206-v.), e o recurso foi interposto no dia 27.08.2019, terça-feira (fl. 208).

O recurso cabível de decisão que extingue a execução é a apelação (art. 1.009 do CPC). Contudo, é possível conhecer do apelo por meio da aplicação do princípio da fungibilidade recursal, pois atendidos todos os pressupostos de admissibilidade.

No mérito, trata-se de examinar a existência de prescrição intercorrente.

Entendeu o juízo a quo por considerar caracterizada hipótese de "espumeira processual", quando o credor estaria limitado a “articular diligências infrutíferas apenas para fins de movimentação mecânica do feito, quando resta claro que não se mostra possível prosseguir na satisfação do crédito". (fl. 204-v.)

Analisando os autos, observo que, em 08.01.2018, a Advocacia-Geral da União requereu o cumprimento de sentença (fls. 147-152). Após, diante da ausência de pagamento espontâneo, o credor realizou diversas tentativas de expropriação durante os anos de 2018 e 2019, sem, todavia, obter êxito.

Não identifico a existência da dita "espumeira processual" na conduta da exequente, pois imprimiu diversas tentativas de realização do crédito, da forma que entendeu mais eficiente.

Ademais, a disciplina do art. 921 e §§ do CPC estabelece rito para o início da contagem do prazo prescricional. Apenas após a inércia de 01 (um) ano começaria a contagem do prazo prescricional, o que inocorreu no caso concreto.

Há precedente do Superior Tribunal de Justiça em reforço ao argumento:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. AUSÊNCIA DE BENS PASSÍVEIS DE PENHORA. SUSPENSÃO DO PROCESSO. INÉRCIA DO EXEQUENTE. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INOCORRÊNCIA. ATO PROCESSUAL ANTERIOR AO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MANUTENÇÃO DA SEGURANÇA JURÍDICA. NECESSIDADE DE PRÉVIA INTIMAÇÃO DO EXEQUENTE PARA DAR ANDAMENTO AO FEITO PARA INÍCIO DA CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL.

1. A prescrição intercorrente ocorre no curso do processo e em razão da conduta do autor que, ao não prosseguir com o andamento regular ao feito, se queda inerte, deixando de atuar para que a demanda caminhe em direção ao fim colimado.

2. No tocante ao início da contagem desse prazo na execução, vigente o Código de Processo Civil de 1973, ambas as Turmas da Seção de Direito Privado sedimentaram a jurisprudência de que só seria possível o reconhecimento da prescrição intercorrente se, antes, o exequente fosse devidamente intimado para conferir andamento ao feito.

3. O Novo Código de Processo Civil previu regramento específico com relação à prescrição intercorrente, estabelecendo que haverá a suspensão da execução "quando o executado não possuir bens penhoráveis" (art. 921, III), sendo que, passado um ano desta, haverá o início (automático) do prazo prescricional, independentemente de intimação, podendo o magistrado decretar de ofício a prescrição, desde que, antes, ouça as partes envolvidas. A sua ocorrência incorrerá na extinção da execução (art. 924, V).

4. O novel estatuto trouxe, ainda, no "livro complementar" (arts. 1.045-1.072), disposições finais e transitórias a reger questões de direito intertemporal, com o fito de preservar, em determinadas situações, a disciplina normativa já existente, prevendo, com relação à prescrição intercorrente, regra transitória própria: "considerar-se-á como termo inicial do prazo da prescrição prevista no art. 924, inciso V [prescrição intercorrente], inclusive para as execuções em curso, a data de vigência deste Código" (art. 1.056).

5. A modificação de entendimento com relação à prescrição intercorrente acabaria por, além de surpreender a parte, trazer-lhe evidente prejuízo, por transgredir a regra transitória do NCPC e as situações já consolidadas, fragilizando a segurança jurídica, tendo em vista que o exequente, com respaldo na jurisprudência pacífica do STJ, estaria ciente da necessidade de sua intimação pessoal, para fins de início do prazo prescricional.

6. Assim, seja em razão da segurança jurídica, seja pelo fato de o novo estatuto processual estabelecer dispositivo específico regendo a matéria, é que, em interpretação lógico-sistemática, tem-se que o atual regramento sobre prescrição intercorrente deve incidir apenas para as execuções ajuizadas após a entrada em vigor do CPC/2015 e, nos feitos em curso, a partir da suspensão da execução, com base no art. 921.

7. Na hipótese, como o deferimento da suspensão da execução ocorreu sob a égide do CPC/1973 (ago/1998), há incidência do entendimento jurisprudencial consolidado no sentido de que não tem curso o prazo de prescrição intercorrente enquanto a execução estiver suspensa com base na ausência de bens penhoráveis (art. 791, III), exigindo-se, para o seu início, a intimação do exequente para dar andamento ao feito.

8. Recurso especial provido.

(REsp 1620919/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 10.11.2016, DJe 14.12.2016.) (Grifo nosso)

 

Por fim, é entendimento do Tribunal Superior Eleitoral que o prazo prescricional para a cobrança das multas eleitorais é de 10 (dez) anos, conforme o art. 205 do Código Civil e na esteira do verbete da Súmula n. 56:

A multa eleitoral constitui dívida ativa de natureza não tributária, submetendo-se ao prazo prescricional de 10 (dez) anos, nos moldes do art. 205 do Código Civil.

 

Portanto, não há falar em prescrição intercorrente, visto não ter sido adotado o rito previsto no art. 921 do CPC e tampouco transcorrido o prazo de 10 (dez) anos previsto no art. 205 do Código Civil. A decisão deve ser reformada para que o cumprimento de sentença tenha prosseguimento.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso, para determinar o retorno dos autos à origem para o prosseguimento do cumprimento de sentença.