E.Dcl. - 6290 - Sessão: 09/03/2020 às 11:00

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração opostos por PARTIDO PROGRESSISTA (PP), OTOMAR OLEQUES VIVIAN, CELSO BERNARDI (fls. 820-829) e MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL (fls. 832-840) em face do acórdão que, de forma unânime, declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19, e, no mérito, aprovou com ressalvas as contas da agremiação relativas ao exercício de 2015, determinando o recolhimento de R$ 30.506,85 (trinta mil, quinhentos e seis reais e oitenta e cinco centavos) ao Tesouro Nacional (fls. 809-815v.).

Em suas razões (fls. 820-829), o PARTIDO PROGRESSISTA (PP), OTOMAR OLEQUES VIVIAN e CELSO BERNARDI, para fins de possibilitar o manejo de recurso à instância superior, alegam omissão, no corpo do acórdão, no ponto que julgou a matéria preliminar acerca da existência, nos autos, das certidões de filiação partidária extraídas dos registros da Justiça Eleitoral, “à exceção de Gislaine Monza da Silveira (R$ 1.568,00 – 4x de R$ 392,00) e Roseana Fasolo de Oliveira (R$ 236,00)”, acrescentando, ainda, que essas duas filiações não comprovadas somam R$ 1.804,00. Quanto ao pagamento de despesas com recursos do Fundo Partidário, os embargantes sustentam omissão no apontamento do comando legal que autorizaria a aplicação de pena quando verificada inconsistência no uso dos recursos públicos. No que toca ao recebimento de recursos de origem não identificada, argumentam que o alcance de valores mediante boleto bancário atende aos requisitos da norma de regência, havendo contradição no que tange aos fundamentos legais que embasaram a necessidade de recolhimento do numerário, sobretudo com transcrição parcial do disposto no art. 13 da Resolução TSE n. 23.432/14. Defendem, também, a existência de omissão quanto à forma de recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores tidos como irregulares, invocando a aplicação do disposto no art. 48 da mencionada resolução. Requerem sejam recebidos e processados os aclaratórios, bem como o registro do prequestionamento dos temas contidos em suas razões.

O Ministério Público Eleitoral (fls. 832-840) sustenta haver omissão no julgado diante da falta de incidência da pena de suspensão das quotas do Fundo Partidário, sob dois aspectos, uma vez que: a) foi reconhecido o alcance de doações provindas de autoridades, caracterizando recebimento de recursos oriundos de fonte vedada, conforme previsto no art. 36, inc. II, da Lei n. 9.096/95 e art. 46, inc. I, da Resolução TSE n. 23.432/14;  b) houve o recebimento de recursos de origem não identificada, incidindo o previsto no art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95 e no art. 46, inc. II, daquela resolução. Requer sejam conhecidos e acolhidos os embargos para sanar as omissões apontadas, com a concessão de efeitos modificativos, de modo a determinar a suspensão do repasse de recursos do Fundo Partidário, pelo período mínimo de um mês, em qualquer circunstância, seja pelo recebimento de valores de fontes vedadas, seja pela obtenção de recursos de origem não identificada, sendo que, neste último caso específico, até recolher a importância de R$ 16.485,65.

É o sucinto relatório. 

VOTO

Senhora Presidente,

Eminentes colegas:

Os embargos de declaração constituem recurso cabível tão somente para sanar os defeitos do ato judicial, taxativamente indicados no art. 1.022 do Código de Processo Civil, ou seja, (a) obscuridade, (b) contradição, (c) omissão ou (d) erro material.

Daniel Amorim Assumpção Neves, citando lição de Barbosa Moreira, ensina que

esses vícios compõem de maneira distinta tanto o juízo de admissibilidade como o de mérito, sendo no primeiro caso demandado do julgador uma análise em abstrato do vício, enquanto no segundo caso a análise deverá ser feita em concreto. Significa dizer que a mera alegação do embargante sobre a existência de um dos vícios descritos pela lei já é suficiente para o seu cabimento, sendo a análise da existência concreta de tal vício matéria de mérito. Alegado o vício, o recurso é admissível; existente o vício alegado, o recurso é provido; caso contrário, nega-se provimento ao recurso.

(NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil -Volume único. 9. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 1702.)

 

Tendo essa lição em conta, anoto que os embargantes mencionam, do decorrer de suas razões, a existência de omissões e contradições, o que autoriza que as interposições sejam consideradas adequadas e comportem conhecimento.

No mérito, inicialmente enfrento os argumentos formulados pelo PARTIDO PROGRESSISTA (PP), OTOMAR OLEQUES VIVIAN e CELSO BERNARDI.

De modo a viabilizar o manejo de recurso à instância superior, os embargantes postulam seja consignado na decisão que constam nos autos as certidões de filiação partidária extraídas dos registros da Justiça Eleitoral, “à exceção de Gislaine Monza da Silveira (R$ 1.568,00 – 4x de R$ 392,00) e Roseana Fasolo de Oliveira (R$ 236,00)”, acrescentando que essas duas filiações não comprovadas resultaram em doações no valor de R$ 1.804,00.

Constou na decisão embargada (fls. 812v.-813) que:

Diante da proibição de recebimento de doações provenientes de ocupantes de cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta, foi identificado o ingresso de recursos oriundos de doadores ocupantes de cargos de Delegado Regional, Coordenador, Chefe de Seção, Diretor, Chefe de Gabinete, Gerente Executivo e Chefe de Divisão de órgãos da administração pública direta e indireta, no valor de R$ 11.292,20 (tabela da fl. 749v.).

[…]

Portanto, os cargos comissionados ocupados pelos doadores ao tempo das liberalidades inserem-se no conceito de autoridade pública previsto no art. 31, inc. II, da Lei n. 9096/95, com a redação vigente ao tempo dos fatos, conforme regulamentação insculpida no art. 12, inc. XII e § 2°, da Resolução TSE n. 23.432/14, acima transcritos, e a norma, à época dos fatos, coibia o recebimento pelo partido, de doações procedentes de autoridades públicas.

Anoto que a Lei n. 13.488/17 consagrou a faculdade de os filiados contribuírem para a manutenção dos partidos políticos, mas a aplicação retroativa de suas disposições é obstada, por serem as prestações de contas regidas pela lei vigente à época dos fatos – tempus regit actum -, em prol, resumidamente, dos princípios da isonomia e da segurança jurídica.

 

Como a decisão afastou o emprego retroativo da disposição legal que passou a permitir a doação por filiados, as certidões emitidas pelo Sistema de Filiação Partidária da Justiça Eleitoral, constantes nas fls. 778-796, não foram examinadas.

Embora tal ausência não deva ser entendida como lacuna na decisão, tenho que é possível contemplar a postulação do embargante, agregando aos fundamentos da decisão que foram juntados tais documentos, sendo que:

a) seu conteúdo não foi examinado;

b) não constam quaisquer informações acerca das doadoras Gislaine Monza da Silveira (três doações de R$ 392,00) e Roseana Fasolo de Oliveira (aporte de R$ 236,00);

c) a data registrada de filiação de Giovani de Cezaro (doação de R$ 661,00) é 08.8.2016 (fl. 782) e o exercício sob exame é relativo a 2015;

d) a certidão da fl. 789 informa que Leonir Fronza (doação de R$ 191,00) não está filiado a partido político.

Prosseguindo, a alegada omissão no apontamento do comando legal que autorizaria a aplicação de pena quando verificada inconsistência na comprovação do uso dos recursos públicos, para fins de compreensão da controvérsia, peço vênia para transcrever os argumentos dos embargantes (fl. 823):

Inobstante a clareza meridiana que cerca a certificação da falha havida nas notas fiscais juntadas – ausência do CNPJ partidário -, não divisamos no corpo do julgado explicitação de agir que subsuma aos núcleos normativos evocados para calcificar a determinação de recolhimento dos valores envolvidos na operação financeira glosada - §2º do art. 62 da Resolução-TSE no 23.432/2014: “impropriedade ou irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário”.

Noutras palavras, a comprovação da regular aplicação do Fundo Partidário foi devidamente comprovada nos autos, na esteira do que determina o inciso I do § 1º do art. 17 da Resolução-TSE nº. 23.432/2014. Não houve debate quanto a este fato.

Com efeito, vê-se que a controvérsia recai meramente na forma pela qual foram emitidos os documentos fiscais comprobatórios, haja vista que ausente um dos elementos os exigidos pelo art. 18 da resolução normativa incidente, já ventilado. Porém, tal dispositivo normativo, por si só, não atraí a aplicação da "sanção” em evidência. Aliás, inexiste no texto normativo citado previsão expressa de sanção.

Nesta base, ressalve-se ainda que não há qualquer indicação de que o pagamento não tenha chegado ao fornecedor, e nem sequer de que a forma de pagamento tenha desatendido o disposto no § 4º do art. 18 em comento (cheque nominal ou transferência bancária), como também que os serviços detalhados na nota fiscal não tenham sido prestados.

Não se vislumbra no julgado a indicação de qualquer elemento probatório/argumentativo que certifique impropriedade ou irregularidade na aplicação dos recursos em debate. Como ventilado, a falha de origem traduz-se em mera inconsistência no documento fiscal comprobatório.

Conclui-se, então, que com a máxima decisória que arrima o julgado: "Ausente um dos elementos que deveria constar no documento fiscal, considera-se que o gasto não foi devidamente comprovado.”, respeitosamente, não se efetiva qualquer correlação entre tal premissa e o defeito evidenciado para a subsunção deste nos núcleos normativos que formam o § 2º do art. 62.

Nestes termos, REQUER-SE, desde já, seja suprido o acórdão com a elucidação desta possível omissão, notadamente em cotejo com os ora argumentos esgrimidos, forte no inciso II do §1º do art. 489 do CPC.

 

Por seu turno, constou na decisão impugnada (fls. 811v.-812) que:

A Resolução TSE n. 23.432/14, aplicável à espécie, estipula em seu art. 18 que a “comprovação dos gastos deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço”.

A análise técnica procedida nos autos apontou que as notas fiscais juntadas nas fls. 309-313 e 316 não indicam o CNPJ do partido, de modo que não permitem seja aferida a esfera partidária (estadual, municipal ou nacional) do diretório que contratou a despesa.

O prestador de contas admite a incorreção e argumenta que tais irregularidades não devem ensejar a desaprovação das contas, sobretudo diante dos modestos valores envolvidos e da existência de outras notas fiscais regulares emitidas pelas mesmas empresas.

Aduz que a falha no controle dos elementos formais do documento fiscal não compromete a transparência e a confiabilidade da escrituração apresentada, de modo que a inconsistência deveria ser objeto de recomendação para contabilidades futuras.

A redação do art. 18 da Resolução TSE n. 23.432/14 é clara, de modo que a violação deve ser enfrentada de forma objetiva.

Ausente um dos elementos que deveria constar no documento fiscal, considera-se que o gasto não foi devidamente comprovado.

A aptidão da falha para determinação de rejeição das contas deverá ser analisada no contexto da movimentação do exercício, sendo que individualmente e apenas em razão de seu montante não se reveste de gravidade acentuada.

No entanto, mesmo que as falhas não ensejem, em tese, a desaprovação das contas, é impositiva a determinação de recolhimento, ao Tesouro Nacional, dos valores cujo gasto não foi devidamente comprovado.

Nesse sentido, colho do § 2º do art. 61 da resolução de regência que, em sendo verificada “impropriedade ou irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário ou no recebimento dos recursos de que tratam os arts. 12 e 13 desta Resolução, o órgão partidário e os seus responsáveis serão notificados para fins de devolução ao erário, se já não demonstrada a sua realização”.

Na mesma linha, trago precedente do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que: “A determinação de devolução aos cofres públicos decorre da natureza pública dos recursos que constituem o Fundo Partidário e independe da sorte do processo de prestação de contas, consoante previsto no art. 64 da Res.-TSE nº 23.432/2014” (Prestação de Contas n. 79347, Acórdão, Relatora Min. Luciana Lóssio, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 206, Data: 29.10.2015, p. 58).

Em razão da falha na comprovação da realização de despesas com recursos do Fundo Partidário, determino o recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 2.729,00.

 

A leitura deste trecho da decisão evidencia que o acórdão considerou que alguns dos documentos fiscais apresentados foram reputados inidôneos, o que reflete, consequentemente, na falta de comprovação dos gastos que estes representam, tudo nos termos do art. 18 da Resolução TSE n. 23.432/14.

Da mesma forma, foi consignado que a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional decorre da ausência de comprovação dos gastos por documentos fiscais idôneos, o que representa impropriedade ou irregularidade na aplicação dos recursos públicos, com base no § 2º do art. 61 da resolução mencionada.

Dito de outra forma: a nota fiscal irregular não comprova o gasto efetuado com recursos públicos e o valor do dispêndio não comprovado deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, sendo esta a correlação que nos parece clara e decorrente dos dispositivos invocados da norma aplicável.

Assim, não verifico a omissão descrita nas razões dos embargantes quanto ao ponto.

Em continuação, os embargantes argumentam que o recebimento de recursos mediante boleto bancário atende aos requisitos da norma de regência, havendo contradição no que tange aos fundamentos legais que embasaram a necessidade de recolhimento de valores considerados de origem não identificada.

No pertinente à suposta contradição, inicialmente consigno que a sigla afirma, durante toda a instrução probatória, que as doações foram identificadas no “demonstrativo de doações recebidas”, o que, a contrario sensu, permite concluir a admissão de que não houve a individualização do CPF na transação bancária.

Ademais, ficou expresso que “a norma que veda objetivamente o recebimento de valores em conta bancária sem identificação do CPF do doador impede que se busque em outros documentos produzidos pelo prestador de contas o esclarecimento acerca da origem dos valores, de forma que a irregularidade não pode ser afastada.”

A indicação do CPF dos doadores no boleto emitido pela agência bancária não atende ao requisito de identificação do doador, assim como a enumeração de tais dados no demonstrativo de doações recebidas. A verificação do CPF dos doadores deve ocorrer quando da transação bancária.

Da mesma forma, a decisão aclarada reafirmou o dever de cuidado do partido em relação à identificação das doações, atribuição que não pode ser repassada à instituição bancária, ao referir que (fl. 814v.) a

“A Resolução, diante da possibilidade de ingresso de recursos de origem não identificada, estipulou que os partidos políticos pudessem “recusar doação identificável que seja creditada em suas contas bancárias indevidamente, promovendo o estorno do valor para o doador identificado até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito” (art. 11, § 3º), o que impõe o dever de vigilância sobre os depósitos recebidos e afasta a responsabilidade da instituição bancária.

 

Ainda, em nenhum momento a decisão afirmou que o boleto bancário fosse meio vedado de recebimento de doações.

Tal forma é perfeitamente viável, desde que a agremiação não se descuide em verificar se os créditos estão identificados com o CPF ou CNPJ dos doadores. Na hipótese, a falha consistiu exatamente em não ser possível constatar na transação bancária a individualização dos doadores, tal qual exige o § 2º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.432/14.

Ao transcrever o inc. I do art. 13 da mesma resolução em sua peça, argumentando que não se exige que nome e inscrição no CPF sejam indicados simultaneamente, os embargantes parecem desconsiderar a continuidade da redação do dispositivo, o qual estabelece que deve haver “correspondência entre o nome ou a razão social e a inscrição no CPF ou CNPJ informado” e explicita que ambas informações devem existir para verificar sua congruência.

Já sobre a forma de recolhimento dos valores, não há qualquer omissão a ser sanada.

Embora os embargantes argumentem que o art. 48, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14 autorize “proceder-se o recolhimento dos valores por meio do desconto de futuros repasses do Fundo Partidário”, o § 3º do mesmo dispositivo restringe a aplicabilidade da permissão ao dispor que a “sanção de desconto só poderá ser aplicada aos órgãos partidários nacionais”, caso que não é o dos autos.

Ademais, a forma de recolhimento dos valores poderá ser discutida após o trânsito em julgado da decisão, sendo indesejável tal debate nesta etapa processual.

Assim, os embargos declaratórios do PARTIDO PROGRESSISTA (PP), de OTOMAR OLEQUES VIVIAN e de CELSO BERNARDI devem ser providos tão somente para agregar ao julgado que constam certidões de filiação partidária nos autos, nos termos da fundamentação aqui explicitada.

Passo ao exame dos argumentos do MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL (fls. 832-840).

Em seus aclaratórios, o Parquet entende cabível a imposição de suspensão do repasse de recursos do Fundo Partidário por um mês em razão do recebimento de recursos de fontes vedadas e, até o recolhimento da importância de R$ 16.485,65, identificada como de origem não identificada, observado o período mínimo de um mês de suspensão.

Tenho que tal sanção não é cabível na hipótese.

Explico.

Em relação aos recursos de origem não identificada e de fonte vedada, o partido tem o dever de recolher o montante ao Tesouro Nacional, segundo o que disciplina o art. 14 da Resolução TSE n. 23.432/14:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 desta Resolução sujeitará o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º desta Resolução, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput deste artigo também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas, que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 3º do art. 11, os quais deverão, nesta hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

 

O art. 36 da Lei n. 9.096/95 estabelece que, no caso de recursos de origem não mencionada ou esclarecida, fica suspenso o recebimento das quotas do Fundo Partidário até que a elucidação seja aceita pela Justiça Eleitoral. O mesmo dispositivo estipula a suspensão do repasse desses recursos públicos por um ano quando da constatação do ingresso proveniente de fonte vedada.

Ocorre que o caso dos autos é bastante peculiar.

Colho da decisão embargada (fl. 815):

À guisa de conclusão, repriso que considerei como

- gastos não devidamente comprovados as despesas pagas com recursos do Fundo Partidário, no valor de R$ 2.729,00;

- provenientes de fonte vedada as doações realizadas por autoridades ao partido político, no valor de R$ 11.292,20;

- recursos de origem não identificada os depósitos relacionados no verso da fl. 306, que perfazem o total de R$ 16.485,65.

As máculas acima especificadas atingem o quantitativo de R$ 30.506,85 e representam 1,8% das receitas do exercício (R$ 1.691.704,81 – fl. 748v.), comprometimento financeiro que, considerando a boa-fé do prestador ao esclarecer os apontamentos do órgão técnico, permite a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovação das contas com ressalvas.

 

Veja-se: os recursos de fonte vedada (R$ 11.292,20) e origem não identificada (R$ 16.485,65), excluídos os valores relativos aos gastos não comprovados com recursos do Fundo Partidário, correspondem a R$ 27.777,85, o que representa 1,64% das receitas do exercício.

Aplicando-se estritamente a proporcionalidade, tal percentual autorizaria a suspensão do recebimento dos recursos do Fundo Partidário pelo período de 06 (seis) dias.

Tenho que o bom senso recomenda que a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário possa ser cogitada quando a irregularidade seja equivalente a, pelo menos, 16 dias do mês. Ainda nessa conjectura, a imposição da penalidade deveria ser analisada com o sopesamento dos dados constantes dos autos, visto que o “arredondamento para cima” representa prejuízo à agremiação.

Na hipótese, o insignificante comprometimento contábil diante das irregularidades apontadas pelo Ministério Público Eleitoral impõe o afastamento da pena pleiteada pelo embargante em prestígio aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Assim, entendo por dar parcial provimento aos embargos do órgão ministerial tão somente para explicitar que a suspensão do repasse do Fundo Partidário é incabível diante do ínfimo percentual (1,64%) de comprometimento das contas em face das irregularidades atinentes ao recebimento de recursos de fonte vedada e origem não identificada.

A título de comentário, nota-se, inclusive, um aprimoramento da legislação eleitoral no ponto, visto que, a partir da Lei n. 13.165, de 2015, a qual não é aplicável ao caso sob análise em razão de ter sido editada no curso do exercício, se estabeleceu multa de até 20% a ser recolhida sobre importância reconhecida como irregular (art. 37 da Lei n. 9.096/95), de forma a incentivar um maior controle sobre o ingresso de recursos.

Por fim, na linha do disposto no art. 1.025 do Código de Processo Civil, consideram-se incluídos no acórdão os elementos que os embargantes suscitaram para fins de prequestionamento.

DIANTE DO EXPOSTO, VOTO pelo conhecimento e pelo parcial provimento dos embargos de declaração opostos pelo PARTIDO PROGRESSISTA (PP), OTOMAR OLEQUES VIVIAN, CELSO BERNARDI e MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, tão somente para agregar ao julgado que constam certidões de filiação partidária nos autos, nos termos da fundamentação exarada, e para explicitar que a suspensão do repasse do Fundo Partidário, na hipótese, é incabível diante do ínfimo percentual de comprometimento das contas pelas irregularidades atinentes ao recebimento de recursos de fonte vedada e origem não identificada.

É como voto, Senhora Presidente.