PC - 0603030-73.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/02/2020 às 14:00

VOTO

O acórdão recorrido julgou não prestadas as contas do candidato, em razão de não existir nos autos instrumento de mandato para constituição de advogado, consoante prevê o art. 77, inc. IV e § 2º, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Conquanto devidamente intimado, de forma pessoal, por meio de carta (ID 3385633), para, no prazo de três dias, apresentar procuração, o prestador de contas deixou transcorrer in albis o prazo assinado, que findou em 26.7.2019.

Ocorre que, quando o feito já se encontrava concluso para julgamento, com pareceres do órgão técnico e do Ministério Público Eleitoral, foi acostada aos autos pelo candidato, em 09.10.2019, instrumento de mandato conferindo ao causídico poderes para representá-lo processualmente (ID 4426583).

No que concerne a este aspecto, constata-se que a decisão embargada não teceu enfrentamento específico quanto à admissão ou repúdio da procuração apresentada extemporaneamente, incorrendo, desse modo, em omissão quanto ao ponto, nos termos do art. 1.022, inc. II, do CPC.

Passa-se, assim, a integração do acórdão quanto à referida análise.

Quanto ao tema, a jurisprudência de nossos Tribunais Regionais tem conferido tratamento especial à procuração ad judicia apresentada intempestivamente, privilegiando o papel essencial da advocacia no funcionamento da Justiça Eleitoral e a própria garantia de acesso do jurisdicionado aos órgãos jurisdicionais.

Nessa linha, diversamente de outros documentos contábeis sujeitos à preclusão se omitidos na oportunidade própria, a representação processual pode ser regularizada até a data da sessão de julgamento das contas.

Nessa linha, colaciono o seguinte julgado deste Tribunal:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADO ESTADUAL. JULGADAS NÃO PRESTADAS. ALEGADA OCORRÊNCIA DE OMISSÃO E ERRO MATERIAL. CARACTERIZADOS OS VÍCIOS. ATRIBUIÇÃO DE EFEITOS INFRINGENTES. REMESSA DOS AUTOS À UNIDADE TÉCNICA. CONHECIMENTO E ACOLHIMENTO.

1. Alegada omissão e erro material no acórdão. Contas de candidato julgadas não prestadas em razão da ausência de instrumento de mandato para a constituição de advogado, consoante o disposto no art. 77, inc. IV e § 2º, da Resolução TSE n. 23.553/17. A referida peça foi apresentada, intempestivamente, cinco dias antes da sessão de julgamento.

2. Configurada a omissão. A decisão embargada não elaborou enfrentamento específico quanto à admissão ou recusa da procuração apresentada extemporaneamente, tornando-se omissa quanto ao ponto, nos termos do art. 1.022, inc. II, do Código de Processo Civil.

3. Jurisprudência do TSE e de outros Regionais Eleitorais no sentido de aceitar a entrega de procuração até a data da sessão do julgamento, privilegiando o papel essencial da advocacia no funcionamento da Justiça Eleitoral e a própria garantia de acesso do jurisdicionado aos órgãos jurisdicionais.

4. Impossibilidade da apreciação do mérito da contabilidade, diante da insuficiência de elementos para tanto. Determinado o retorno dos autos à unidade técnica para regular tramitação e análise das contas de campanha, conforme as disposições previstas no art. 72 e seguintes da Resolução TSE n. 23.553/17.

5. Atribuição de efeitos infringentes para desconstituir a decisão recorrida.

6. Conhecimento e acolhimento.

(TRE-RS – PC 0602332-67.2018.6.21.0000, Relator Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Data de Julgamento: 05.9.2019, Publicação: DEJERS, Data: 10.9.2019.) Grifei.

 

Relaciono precedentes de outras Cortes Regionais no mesmo sentido:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. APRESENTAÇÃO DA PROCURAÇÃO, AINDA QUE INTEMPESTIVA E ANTES DO JULGAMENTO, PERMITE O RECONHECIMENTO DA REGULARIZAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL, A FIM DE VIABILIZAR O CONHECIMENTO DAS CONTAS, COM O CONSEQUENTE PROSSEGUIMENTO DO FEITO. PRECEDENTES.

(TRE-SP - PC 060660636 SÃO PAULO - SP, Relator: MARCUS ELIDIUS MICHELLI DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 30/05/2019, Data de Publicação: DJESP - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-SP, Data 07/06/2019)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CAMPANHA ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. PROCURAÇÃO. JUNTADA ANTES DO JULGAMENTO DAS CONTAS. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE EXTRATOS BANCÁRIOS. FALHA QUE, POR SI SÓ, COMPROMETE A REGULARIDADE DAS CONTAS. CONTAS DESAPROVADAS.

(TRE-AM - PC 060161359 MANAUS - AM, Relator: ABRAHAM PEIXOTO CAMPOS FILHO, Data de Julgamento: 19/02/2019, Data de Publicação: DJEAM - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 38, Data 25/02/2019, Página 11) Grifei.

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ELEIÇÕES 2014. 1. Omissão na entrega das prestações de contas parciais. Erro meramente formal, que não prejudicou a análise das contas. 2. Procuração ad judicia juntada antes da sessão de julgamento. O candidato, após ser intimado, não constituiu advogado e nem se manifestou no prazo de 72 horas. Todavia, no dia 7 de julho de 2015, juntou aos autos procuração ad judicia, sendo o caso de se aceitar o referido documento, uma vez que foi juntado antes do julgamento da prestação de contas. Aprovação das contas com ressalvas.

(TRE-MG - PC 335391 BELO HORIZONTE - MG, Relator: MARIA EDNA FAGUNDES VELOSO, Data de Julgamento: 07.07.2015, Data de Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico, Data 16.07.2015.) Grifei.

No mesmo sentido, a ilustre Ministra Rosa Weber, em decisão monocrática proferida em agravo de instrumento no TSE, igualmente concluiu pelo afastamento do julgamento de contas não prestadas quando, ainda que intempestivamente, a procuração exigida é apresentada antes do julgamento do processo, destacando que “o atual Código de Processo Civil procurou estabelecer o princípio da primazia da decisão de mérito, sendo certo que o julgamento das contas apresentadas atende melhor à finalidade do instituto do que tê-las simplesmente como não prestadas” (TSE, AI n. 16734, decisão monocrática de 29.10.2018, Relatora Min. Rosa Maria Pires Weber, publicada no DJE – Diário de justiça eletrônico, em 06.11.2018, pp. 26-28).

Portanto, na esteira da jurisprudência das Cortes eleitorais, verificada a apresentação do instrumento de mandato para a constituição de advogado antes do julgamento das contas, incabível o juízo de não prestação com base em tal fundamento.

In casu, ocorreu a regularização processual antes da data de julgamento do ajuste contábil. Logo, merecem acolhimento os embargos, atribuindo-lhes efeitos infringentes, de modo a desconstituir a decisão recorrida, devendo ser proferida outra, que analise o mérito da contabilidade.

O feito se encontra maduro para julgamento, não se fazendo necessária a adoção de ulteriores diligências, porquanto, em que pese tenha tramitado sem o necessário instrumento de mandato, foi seguido o rito de contas prestadas.

Anoto que o candidato foi regular e pessoalmente intimado, por meio de carta, para se manifestar quanto ao exame técnico (ID 2690133) e ao parecer ministerial (ID 3638033), porém se manteve silente, operando-se, portanto, a preclusão.

Assim, passo a examinar as contas de campanha de JAIR CARLINHOS LAUXEN, candidato ao cargo de deputado federal, relativamente à arrecadação de recursos e realização de despesas relativas ao pleito de 2018.

O órgão técnico apontou a falta de apresentação de extratos bancários, o recebimento de recursos de origem não identificada no valor R$ 8.627,85 e de depósitos em dinheiro, efetuados por pessoas físicas, de forma diversa da transferência bancária para valores superiores a R$ 1.064,09, no total de R$ 2.400,00. Em razão das irregularidades, concluiu pela desaprovação das contas e pelo recolhimento de R$ 11.027,85 ao erário, devido ao recebimento de recursos de origem não identificada (ID 3832533).

A Procuradoria Regional Eleitoral, em parecer, opinou pelo julgamento das contas como não prestadas, vez que naquele momento não havia procuração acostada aos autos, e pelo recolhimento de R$ 11.027,85 ao Tesouro Nacional (ID 3973683). Posteriormente, manifestou-se pelo provimento do recurso, unicamente para o fim de desaprovar as contas, afastando-se, consequentemente, a penalidade de impedimento de obter certidão de quitação eleitoral até o final da legislatura (ID 5218033).

Quanto à primeira falha, ausência dos extratos bancários, saliento que são considerados peças obrigatórias nas contas pelo art. 56, inc. II, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.553/17, cuja ausência esvazia a confiabilidade das declarações contábeis e inviabiliza a aplicação dos procedimentos técnicos de exame.

No que tange à segunda inconsistência, o órgão técnico constatou que o candidato recebeu duas doações financeiras oriundas de pessoas físicas, nos valores de R$ 1.150,00 e R$ 1.250,00, totalizando R$ 2.400,00, de forma diversa da transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário, em contrariedade ao que prescreve o art. 22, inc. I e § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17:

Art. 22. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

[…].

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

 

O escopo da norma é possibilitar o cruzamento de informações com o Sistema Financeiro Nacional, de modo a permitir que a fonte declarada seja confirmada por meio dos mecanismos técnicos de controle da Justiça Eleitoral.

Dessarte, a ausência de demonstração segura da fonte doadora caracteriza o recurso como de origem não identificada, cujo valor correspondente, ou seja, R$ 2.400,00, deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos dos arts. 22, § 3º, e 34, caput, da Resolução TSE n. 23.553/17.

No que concerne à terceira irregularidade, o órgão técnico apurou, no curso dos procedimentos de exame, que, consoante informação da Prefeitura Municipal de Porto Alegre/UF e da Receita Estadual/RS, houve a emissão de duas notas fiscais contra o CNPJ do prestador, nos valores de R$ 7.477,85 e R$ 1.150,00, cujas despesas correspondentes não foram registradas nas contas de campanha.

Dessa forma, as informações obtidas dos órgãos fazendários, aliadas à ausência de explicações por parte do prestador, indicam a omissão de registro de despesas, contrariando o disposto no art. 56, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.553/17, segundo o qual a prestação de contas deve ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, com especificação completa.

Ademais, as despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos débitos, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal do candidato, caracterizando-se como recursos de origem não identificada por falta de discriminação da fonte de receita, nos termos do art. 34, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Assim, impõe-se também o recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 8.627,85 a título de recursos de origem não identificada, conforme determina o art. 34, caput, da multicitada Resolução.

Na mesma linha, destaco o seguinte precedente:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. FALHA QUE ALCANÇA 3,27% DO VALOR ARRECADADO DA CAMPANHA. QUANTIA INEXPRESSIVA. APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO DA QUANTIA IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Emissão de notas fiscais contra o CNPJ do prestador, cujas despesas correspondentes não foram registradas às contas de campanha. Caracterizada a omissão de registro de despesa, em dissonância com o disposto no art. 56, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.553/17, o qual estabelece que a prestação de contas deve ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, com especificação completa.

2. Irregularidade que representa apenas 3,27% sobre o total da receita movimentada em campanha. Percentual inexpressivo frente ao conjunto da contabilidade. Aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, para afastar o juízo de desaprovação das contas e aprová-las com ressalvas, consoante entendimento do Tribunal Superior Eleitoral e desta Corte.

3. Recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional, a título de recurso de origem não identificada, conforme determina o art. 34, caput, da Resolução TSE n. 23.553/17.

4. Aprovação com ressalvas.

 

(TRE-RS; 0602716-30.2018.6.21.0000; Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, julgado em 04.10.2019, DJE de 08.10.2019.) (Grifei.)

 

Assim, o somatório de R$ 11.027,85, por configurar recursos de origem não identificada, sujeita-se a recolhimento ao Tesouro Nacional, na forma do art. 34, caput, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Ultimada a análise, tem-se que o total das irregularidades apuradas nestes autos, sobremaneira superiores ao total de receitas declaradas (R$ 554,71), inviabiliza a aplicação dos princípios da proporcionalidade ou razoabilidade para atenuar a importância das máculas sobre a regularidade do conjunto das contas.

Desse modo, impõe-se a desaprovação das contas, cumulada com a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 11.027,85, considerados como recursos de origem não identificada, na forma dos arts. 22, § 3º, e 34, caput, da Resolução TSE n. 23.553/17.

 

Ante o exposto, VOTO pelo conhecimento e acolhimento dos embargos declaratórios, atribuindo-lhes efeitos infringentes, a fim de desconstituir a decisão recorrida e desaprovar as contas de JAIR CARLINHOS LAUXEN, com base no art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17, com a determinação de recolhimento da quantia de R$ 11.027,85 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.